
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5903643-40.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: JOAO EVANGELISTA MARQUES DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: MAURICIO DA SILVA SIQUEIRA - SP210327-N, RICARDO LUIZ DA MATTA - SP315119-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO EVANGELISTA MARQUES DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MAURICIO DA SILVA SIQUEIRA - SP210327-N, RICARDO LUIZ DA MATTA - SP315119-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5903643-40.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: JOAO EVANGELISTA MARQUES DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: MAURICIO DA SILVA SIQUEIRA - SP210327-N, RICARDO LUIZ DA MATTA - SP315119-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO EVANGELISTA MARQUES DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MAURICIO DA SILVA SIQUEIRA - SP210327-N, RICARDO LUIZ DA MATTA - SP315119-N
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Desembargadora Federal GABRIELA ARAUJO (Relatora): Trata-se de agravo interno interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (Id. 304792313), com fulcro no artigo 1.021 do Código de Processo Civil, contra a decisão monocrática (Id. 303181889) que negou provimento à sua apelação e deu parcial provimento ao recurso da parte autora para reconhecer a natureza especial dos períodos entre 27/09/1989 a 16/01/1991, 26/02/1992 a 28/02/2007 e de 01/05/2014 a 30/04/2014, e conceder aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do requerimento administrativo - DER (07/06/2017), observando-se o Tema Repetitivo 1.124 do Superior Tribunal de Justiça.
Sustenta a autarquia previdenciária, em síntese, a impossibilidade de reconhecimento da atividade especial do trabalhador em lavoura de cana-de-açúcar por mera presunção de nocividade ou penosidade, destacando que, mesmo antes da Lei nº 9.032/95, a atividade também não se enquadrava no código 2.2.1 do Anexo ao Decreto nº 53.831/64, uma vez que tal dispositivo era aplicável apenas à agropecuária, o que não é o caso do cortador de cana. Aduz que, no caso, inexiste comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos, não fazendo jus o agravado ao referido benefício.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5903643-40.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: JOAO EVANGELISTA MARQUES DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: MAURICIO DA SILVA SIQUEIRA - SP210327-N, RICARDO LUIZ DA MATTA - SP315119-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO EVANGELISTA MARQUES DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: MAURICIO DA SILVA SIQUEIRA - SP210327-N, RICARDO LUIZ DA MATTA - SP315119-N
V O T O
A Excelentíssima Desembargadora Federal GABRIELA ARAUJO (Relatora): Recebo o recurso tempestivo de agravo interno, nos termos do artigo 1.021 do Código de Processo Civil.
Não assiste razão à parte agravante.
A pretensão da parte autora consiste na concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante reconhecimento atividade de natureza especial.
A matéria trazida à análise comporta o julgamento monocrático, conforme o disposto no artigo 932, incisos IV e V, do Código de Processo Civil, pois as questões discutidas encontram-se pacificadas na jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Com efeito, também restou observado o regramento contido no artigo 927 do Código de Processo Civil, in verbis:
"Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados."
Quanto ao reconhecimento do tempo de serviço especial, a decisão agravada teve a seguinte fundamentação:
"Da atividade especial e do reconhecimento do tempo de serviço especial
A respeito da demonstração de atividade especial, o entendimento jurisprudencial preconiza que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, consoante o preceito tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.310.034-PR).
No tocante aos instrumentos para comprovação de exercício da atividade em condições especiais, até 28/04/95, bastava que o segurado exercesse uma das atividades descritas dos anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, cujo rol é exemplificativo, nos termos da Súmula 198 do extinto TFR.
Pelo advento da Lei nº 9.032/95, passou-se a exigir, a partir de 29/04/95, a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo por meio de formulário específico ante a Autarquia Previdenciária.
A Lei nº 9.528 de 10/12/97 (decorrente da Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96), por sua vez, dispôs que a comprovação da efetiva sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde deveria ser formalizada mediante laudo técnico.
Quanto ao tema, considerando ainda não estar totalmente sedimentada a jurisprudência sobre o assunto, acompanho o entendimento desta E. Décima Turma, acerca da exigência de laudo técnico ou perícia técnica somente a partir da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, uma vez que essa norma legal concedeu supedâneo jurídico válido ao Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em homenagem ao princípio constitucional da estrita legalidade.
Nesse sentido, precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça:
'PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A RUÍDO. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE LAUDO TÉCNICO. NÃO RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL A QUO. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ.
(...) 2. E ainda, nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, até o advento da Lei 9.032/1995, é possível o reconhecimento do tempo de serviço especial em face do enquadramento na categoria profissional do trabalhador. A partir dessa lei, a comprovação da atividade especial se dá por meio dos formulários SB-40 e DSS-8030, expedidos pelo INSS e preenchidos pelo empregador, situação modificada com a Lei 9.528/1997, que passou a exigir laudo técnico.
3. Contudo, o STJ orienta-se no sentido de que o reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído só se dá por laudo pericial; caso contrário, não é possível o reconhecimento do labor em condição especial. Precedente: REsp 1.657.238/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 5/5/2017.
(...) 7. Agravo conhecido para não conhecer do Recurso Especial."
(AREsp 1773720/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/02/2021, DJe 01/07/2021)
Em síntese, o reconhecimento do tempo de trabalho especial, decorrentes da efetiva exposição a agentes considerados prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, de modo permanente, não ocasional nem intermitente, submete-se às principais normas de regência, reconhecidas pela jurisprudência das Cortes Superiores, a saber:
1) até 28/04/1995: o reconhecimento da especialidade do trabalho ocorre mediante a prova do exercício da atividade, segundo as normas de regência da época, especialmente os Decretos nº 53.831, de 25/03/1964 e 83.080, de 24/01/1979, admitindo-se qualquer meio probatório, independentemente da existência de laudo técnico.
No entanto, com relação aos agentes nocivos ruído, calor e frio, necessária a aferição dos níveis de exposição mediante apresentação de: a) laudo técnico ou perícia técnica, realizada no curso da instrução processual; b) ou PPP, emitido pela empresa, equiparado ao laudo técnico de condições ambientais do trabalho (LTCAT), conforme jurisprudência consolidada.
2) a partir de 29/04/1995: com a publicação da Lei nº 9.032, em 29/04/1995, foi extinto o enquadramento das atividades especiais por categoria profissional, passando a ser imprescindível a demonstração da exposição ao agente nocivo, admitindo-se a apresentação de formulário-padrão (DIRBEN-8030, DSS-8030, DISES BE 5235, SB-40) preenchido pela empresa (art. 260 da IN INSS 77, de 21/01/2015), independentemente de laudo técnico. Reiteradas as anotações acima relativas aos agentes nocivos ruído, calor e frio.
3) a partir de 11/12/1997: a Lei nº 9.528 de 10/12/97, deu supedâneo ao previsto no Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, que regulamentou as disposições do art. 58 da LBPS, estabelecendo que o reconhecimento de tempo de serviço especial está atrelado à comprovação da efetiva sujeição do segurado a quaisquer agentes agressivos mediante apresentação de formulário-padrão, elaborado com base em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) ou perícia técnica.
4) a partir de 01/01/2004: por força do artigo 148 da IN INSS/DC nº 95, de 07/10/2003 é obrigatória a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), que substituiu os formulários e o laudo pericial, nos termos do Incidente de Uniformização de Jurisprudência (Pet 10.262/RS, DJe 16/02/2017).
Do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP
Posteriormente a toda normatização supramencionada, o art. 58, § 4º, da Lei 8.213/91, com a redação conferida pela Lei 9.528 de 10/12/97, instituiu o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, o qual é apto à demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, devendo ser confeccionado com suporte no LTCAT – Laudo Técnico de Condições Ambientais, consoante atual regulação a ele conferida pelos Decretos 3.048/99 e 8.123/13.
Por sinal, o PPP eventualmente não contemporâneo ao exercício das atividades não obsta a verificação da respectiva natureza especial, desde que inexistentes alterações substanciais no ambiente de trabalho.
E caso constatada a presença de agentes nocivos em data posterior ao trabalho realizado, a conclusão será, via de regra, que tal insalubridade sempre existiu, à vista dos avanços tecnológicos e da segurança tendentes à minimização dessas condições.
Acerca das informações referentes à habitualidade e permanência, é de se ter presente que o PPP - formulário padronizado, confeccionado e fornecido pelo INSS – não contém campo específico sobre tais requisitos (diferentemente dos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030), razão pela qual não se exige uma declaração expressa nesse sentido.
A ausência de indicação de responsável técnico no PPP torna esse documento incapaz de provar as condições de trabalho às quais o segurado está submetido. Nesse sentido, precedente desta E. Corte:
“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL/0007409-56. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
- Não há, no acórdão embargado, qualquer omissão ou contradição a ser esclarecida via embargos de declaração.
- O aresto combatido examinou toda a matéria colocada "sub judice", com a minuciosa apreciação das provas dos autos e das razões de apelação. - A especialidade não foi reconhecida em razão das irregularidades dos PPPs juntados pelo próprio autor e por ele não impugnados oportunamente. - Inocorrente o cerceamento de defesa, uma vez que o autor sequer requereu a regularização do PPP, sendo seu o ônus de instruir o feito com os documentos essenciais à demanda, a ele cabendo as providências para sanar os documentos apresentados.
- Houve a devida valoração das provas juntadas aos autos, não competindo a esta Corte suprir a deficiência probatória cujo ônus é do próprio autor.
- O julgado considerou que o trabalho especial não restou comprovado, pois os formulários juntados aos autos não indicaram responsável técnico pelos registros ambientais, tampouco foram colacionados laudos técnicos a corroborar as informações contidas nos PPPs, irregularidades que tornam os documentos inaptos a provar as condições de trabalho às quais o trabalhador estava submetido, não havendo que se falar em contradição.
- Não podem ser acolhidos os embargos de declaração com o propósito de instaurar nova discussão sobre a controvérsia jurídica já apreciada, ou com fim de prequestionamento, se não restarem evidenciadas as hipóteses indicadas no art. 1.022 do CPC/2015.
- Embargos de declaração rejeitados.”
(ApCiv 0007409-56.2015.4.03.9999, Desembargadora Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, TRF3 - 7ª Turma, DJEN DATA: 02/12/2022).
Contudo, se houver indicação de responsável técnico no PPP para período posterior àquele em discussão, bem como estiver demonstrado que a parte autora sempre desenvolveu as mesmas atribuições, e, considerando ainda que a evolução tecnológica faz presumir serem as condições ambientais de trabalho pretéritas mais agressivas ou ao menos idênticas do que no momento da execução dos serviços, entendo que a ausência de indicação de responsável técnico no PPP não pode ser utilizada para prejudicar o segurado.
Observe-se, por último, que, no caso de constar no PPP o uso de EPI, tal elemento não tem o condão de descaracterizar a natureza especial da atividade laborativa, ante a ausência de qualquer prova técnica a certificar a sua real eficácia, conforme fundamentação supra.
Quanto à utilização de EPI, apenas poderá ser descartada a especialidade do trabalho se demonstrada a efetiva neutralização da nocividade pelo uso do equipamento, no caso concreto.
Por outro lado, em se tratando, especificamente, de ruído, o C. Supremo Tribunal Federal assentou que não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo referido agente agressivo, conforme o julgamento realizado na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo 664.335/SC, Ministro Luiz Fux, j. em 4/12/2014 pelo Plenário.
Nessa esteira, a informação registrada pelo empregador no PPP sobre uma pretensa eficácia do EPI também não se mostra suficiente, de per si, a descaracterizar o trabalho realizado em condições especiais, uma vez que reflete declaração unilateral do empregador, conforme, aliás, tratado na decisão proferida pelo C. STF supramencionada.
Nesse sentido é a jurisprudência desta 10ª Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO EM ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO EM TEMPO COMUM.
(...)
5. Os documentos constantes dos autos comprovam o trabalho em atividade especial nos períodos constantes do voto.
6. O uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido. (STF, ARE 664335/SC, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, j. 04/12/2014, DJe-029 DIVULG 11/02/2015 Public 12/02/2015). (...)
12. Remessa oficial, havida como submetida e apelação do réu desprovidas e apelação da parte autora provida em parte."
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5047122-06.2022.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 26/06/2024, DJEN DATA: 01/07/2024).
E quanto ao reconhecimento dos períodos de atividade em lavoura de cana-de-açúcar, assim restou consignado:
"Da atividade rural em lavoura de cana-de-açúcar
Quanto ao trabalho rural, em regra, não é considerado atividade especial, eis que a exposição a poeiras, sol e intempéries não justifica, por si só, a contagem especial para fins previdenciários. Apenas o trabalhador da agropecuária faz jus ao enquadramento da atividade especial, conforme previsão no código 2.2.1 do Decreto nº 53.831/1964, pela presunção de insalubridade até 10.12.1997, advento da Lei 9.528/1997.
No tocante ao enquadramento da atividade rural desenvolvida apenas na lavoura da cana-de-açúcar, como de natureza especial, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 08/05/2019, pelo voto de relatoria do Ministro HERMAN BENJAMIN, publicado no DJe de 14/06/2019, julgou procedente o PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI Nº 452/PE (2017/0260257-3), para deixar de equiparar na categoria profissional dos trabalhadores de agropecuária, a atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar, conforme a ementa a seguir transcrita:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. EMPREGADO RURAL. LAVOURA DA CANA-DE-AÇÚCAR. EQUIPARAÇÃO. CATEGORIA PROFISSIONAL. ATIVIDADE AGROPECUÁRIA. DECRETO 53.831/1964. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. Trata-se, na origem, de Ação de Concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição em que a parte requerida pleiteia a conversão de tempo especial em comum de período em que trabalhou na Usina Bom Jesus (18.8.1975 a 27.4.1995) na lavoura da cana-de-açúcar como empregado rural.
2. O ponto controvertido da presente análise é se o trabalhador rural da lavoura da cana-de-açúcar empregado rural poderia ou não ser enquadrado na categoria profissional de trabalhador da agropecuária constante no item 2.2.1 do Decreto 53.831/1964 vigente à época da prestação dos serviços.
3. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC (Tema 694 - REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 5/12/2014).
4. O STJ possui precedentes no sentido de que o trabalhador rural (seja empregado rural ou segurado especial) que não demonstre o exercício de seu labor na agropecuária, nos termos do enquadramento por categoria profissional vigente até a edição da Lei 9.032/1995, não possui o direito subjetivo à conversão ou contagem como tempo especial para fins de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição ou aposentadoria especial, respectivamente. A propósito: AgInt no AREsp 928.224/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 8/11/2016; AgInt no AREsp 860.631/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 16/6/2016; REsp 1.309.245/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/10/2015; AgRg no REsp 1.084.268/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 13/3/2013; AgRg no REsp 1.217.756/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/9/2012; AgRg nos EDcl no AREsp 8.138/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 9/11/2011; AgRg no REsp 1.208.587/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no REsp 909.036/SP, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJ 12/11/2007, p. 329; REsp 291. 404/SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJ 2/8/2004, p. 576.
5. Pedido de Uniformização de Jurisprudência de Lei procedente para não equiparar a categoria profissional de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar."
Contudo, a exposição do trabalhador rural na lavoura da cana-de-açúcar a agentes nocivos, como ruídos ou produtos tóxicos orgânicos (agentes químicos), configura a especialidade da atividade por enquadramento no item 1.1.6 e 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e no item 1.0.12 e item XII do Anexo II, ambos do Decreto nº 3.048/99."
No caso específico dos autos, restou comprovado pela anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS (Id. 83151222 - Pág. 4 e 5), bem como do registro no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, vínculo empregatício do segurado nos períodos de 27/09/1989 a 16/01/1991 e de 26/02/1992 a 07/06/2017, na atividade “ajudante de serviços agrícolas diversos”, junto à "LABOR – Serviços Agrícolas LTDA", sucedida por "RAÍZEN ENERGIA S/A".
Quanto aos períodos entre 27/09/1989 a 16/01/1991 e de 26/02/1992 a 28/02/2007, restou comprovado o labor agrícola na cultura da cana-de-açúcar, desenvolvendo o segurado atribuições de corte de cana, plantio, carpa, entre outras, restando comprovada a efetiva exposição a ruídos acima do limite de tolerância e a hidrocarbonetos, conforme registrado pelos Perfis Profissiográficos Previdenciários – PPPs (Id. 83151223 - Págs. 1-3 e Id. 83151223 - Pág. 6-10), corroborado pelos registros dos laudos técnicos periciais (Id. 83151224 - Pág. 1-13 e Id. 83151225 - Pág. 2 a Id. 83151227 - Pág. 9), elaborados por profissional legalmente habilitado em análise de tarefas análogas as do autor em idêntico ambiente de trabalho (lavouras de cana-de-açúcar).
Assim, diante do conjunto probatório apresentado há comprovação da efetiva exposição do segurado a agentes nocivos, enquanto trabalhador em lavouras de cana-de-açúcar, nos períodos supracitados.
Embora não conste dos formulários as substâncias às quais esteve exposto, o laudo pericial elaborado por engenheiro de segurança do trabalho descreve que no período laborado como trabalhador rural durante o corte da cana-de-açúcar queimada esteve exposto a fuligem da queima (hidrocarbonetos policíclicos aromáticos), agentes nocivos previstos nos códigos nos códigos 1.2.11 do Decreto nº 53.831/1964, e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/1979 (Anexo I).
Assim, embora afastado o enquadramento pela categoria profissional dos trabalhadores em agropecuária prevista no código 2.2.1 do Decreto nº 53.081/1964, a prova dos autos demonstra que o autor ficou exposto a agentes químicos nocivos, com enquadramento nos mencionados códigos dos decretos, observando-se, nos termos do §4º do artigo 68 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 8.123/2013, pela exposição habitual e permanente às substâncias químicas com potencial cancerígeno, o que justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No caso dos autos, o laudo pericial indicou a exposição a hidrocarbonetos aromáticos, contendo substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
O Anexo 13 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho relaciona diversas atividades e operações envolvendo agentes químicos que caracterizam condições de insalubridade, em maior ou menor grau. Comprovado o emprego de quaisquer dessas substâncias nas atividades do empregado, mesmo que essa atividade não esteja relacionada à fabricação da substância, está caracterizada a insalubridade, pois a norma exige análise meramente qualitativa, sem estabelecer limites de tolerância aos agentes considerados nocivos, ou qualquer especificidade quanto à sua composição. Fica descaracterizada a especialidade da atividade e o empregador dispensado do pagamento do adicional apenas se constatado o efetivo uso de EPI capaz de elidir o efeito nocivo do agente insalubre.
Com relação ao fornecimento de equipamento de proteção individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente e retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários. E, no caso dos autos o uso de equipamento de proteção individual, por si só, não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que não restou comprovada a eliminação da insalubridade do ambiente de trabalho do segurado.
No caso dos autos, não há prova de efetivo fornecimento do Equipamento de Proteção Individual ao trabalhador, ou seja Ficha de Controle de Entrega do EPI, com o respectivo certificado de aprovação do equipamento, restando insuficiente as informações sobre a eficácia do referido equipamento contidas nos PPP.
Assim, restou devidamente comprovado o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos indicados, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição aos agentes nocivos supra.
Nesse sentido, destaca-se a jurisprudência desta E. Décima Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR. ATIVIDADE ESPECIAL. TÓXICOS ORGÂNICOS. RUÍDO. HIDROCARBONETOS.
1. Para a aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
2. Até 29/04/95 a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/12/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física. Após 10/12/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho. Quanto aos agentes ruído e calor, o laudo pericial sempre foi exigido.
3. A exposição do trabalhador rural na lavoura da cana-de-açúcar a tóxicos orgânicos permite o enquadramento no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64 e no item 1.0.12 e item XII do Anexo II, ambos do Decreto 3.048/99. Precedentes do STJ.
4. Admite-se como especial a atividade exposta a ruídos superiores a 80 decibéis até 05/03/1997, a 90 decibéis no período entre 06/03/1997 e 18/11/2003 e, a partir de então, até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis. (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
5. A exposição a gasolina, álcool e diesel, se enquadra nos itens 1.2.11 do Decreto 53.831/64 e 1.0.3, 1.0.7 e 1.0.19, do anexo IV, dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
6. O uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido. (STF, ARE 664335/SC, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, j. 04/12/2014, DJe-029 DIVULG 11/02/2015 Public 12/02/2015).
7. Possibilidade de conversão de atividade especial em comum, mesmo após 28/05/1998.
8. Preenchidos os requisitos, faz jus a parte autora ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição.
9. Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora.
10. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
11. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
12. Remessa oficial, havida como submetida, e apelações providas em parte."
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005233-11.2018.4.03.6120, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 08/11/2023, Intimação via sistema DATA: 14/11/2023);
"PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. CANA-DE-AÇÚCAR. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. FULIGEM. DEFENSIVOS AGRÍCOLAS. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. FÓSFORO. LAUDO PERICIAL. PROVA EMPRESTADA.
- O art. 55, caput, da Lei nº 8.213/91, dispõe que o tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, sendo que, de acordo com o parágrafo 3º desse dispositivo, essa comprovação só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito.
- Cumpre ressaltar que as anotações em CTPS gozam de presunção legal de veracidade juris tantum, destacando-se que, em se tratando de labor urbano, não responde o empregado por eventual falta do empregador em efetuar os respectivos recolhimentos.
- Destaca-se que o INSS não se desincumbiu do ônus de provar que as anotações efetuadas nos documentos carreados pelo autor são inverídicas, de forma que não podem ser desconsideradas.
- O fato de a anotação se caracterizar como extemporânea não tem o condão de afastar a presunção de veracidade do efetivo exercício da atividade. Jurisprudências desta E. Corte.
- Portanto, deve ser reconhecido à parte autora o direito à averbação do tempo de contribuição dos períodos de 5.4.1970 a 15.7.1972, 1.1.1985 a 9.6.1985 e 1.1.1986 a 5.4.1986, impondo-se a manutenção da sentença.
- Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
- Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, é inexigível laudo técnico das condições ambientais de trabalho para a comprovação de atividade especial até o advento da Lei nº 9.528/97, ou seja, até 10/12/97. Precedentes do STJ.
- Comprovada a atividade insalubre, demonstrada por meio de laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, é aplicável o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
- Em regra, o trabalho rural não é considerado atividade especial, eis que a exposição a poeiras, sol e intempéries não justifica, por si só, a contagem especial para fins previdenciários. Apenas o trabalhador da agropecuária faz jus ao enquadramento da atividade especial, conforme previsão no código 2.2.1 do Decreto 53.831/1964, pela presunção de insalubridade até 10.12.1997, advento da Lei 9.528/1997.
- No tocante ao enquadramento da atividade rural desenvolvida apenas na lavoura da cana-de-açúcar, como de natureza especial, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 08/05/2019, pelo voto de relatoria do Ministro HERMAN BENJAMIN, publicado no DJe de 14/06/2019, julgou procedente o PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI Nº 452/PE (2017/0260257-3), para não equiparar na categoria profissional dos trabalhadores de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-açúcar.
- Contudo, no caso específico dos autos, o autor juntou Formulários DIRBEN – 8030 e DSS 8030 (Id. 61284847 - Pág. 2-6), emitidos pelas empregadoras, descrevendo que o segurado executava serviços gerais da lavoura, em exposição a intempéries climáticas (vento, chuva, frio, sol, calor), bem como a “fuligem de cana”, poeiras, e “venenos” na sua atividade de trabalhador rural, que consistia em executar plantio, carpa, queima e corte de cana, exterminar formigas, erradicar capins, conservar pontes e cercas entre outras. Embora não conste dos formulários as substâncias aos quais esteve exposto, a parte autora juntou aos autos prova complementar consistente em laudos periciais, extraídos de outras ações judiciais movidas naquela comarca, elaborado por engenheiro de segurança do trabalho, em relação a empregadoras do mesmo ramo de atividades. A prova emprestada foi juntada com a petição inicial e possibilitou o contraditório e a ampla defesa da autarquia. Referido laudo descreve que no período laborado como “trabalhador rural”, mesma função exercida pelo autor da demanda, lidando com o corte da cana-de-açúcar queimada e aplicação de agrotóxicos nas lavouras, estando exposto a fuligem da queima (hidrocarbonetos policíclicos aromáticos) e a defensivos agrícolas (agrotóxicos composto de fósforo), agentes nocivos previstos nos códigos nos códigos 1.2.11 do Decreto 53.831/1964, 1.2.6 e 1.2.10 do Decreto 83.080/1979 (Anexo I).
- Não se pode afirmar que a referida prova pericial é imprestável, porquanto produzida fora dos autos. Ainda que tenha havido prova emprestada, não há como lhe negar validade e eficácia, uma vez que embora ela tenha sido realizada "res inter alios", foi garantido ao INSS o contraditório.
- Portanto, não há dúvida de que a parte autora tem direito ao reconhecimento do mencionado período de atividade de natureza especial, bem como à revisão de sua aposentadoria.
- No caso dos autos, os efeitos financeiros da revisão do benefício, observada a prescrição quinquenal, devem ser a partir da data do requerimento administrativo, momento em que o segurado já preenchia os requisitos para o reconhecimento da atividade especial.
- Por sua vez, há de se ressaltar que a prescrição quinquenal alcança as prestações não pagas e nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito. Dessa forma, estão prescritas as parcelas devidas e não reclamadas no período anterior aos 5 (cinco) anos que precedem ao ajuizamento da ação.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 11, do Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ, observando-se que o inciso II do § 4º, do artigo 85, estabelece que, em qualquer das hipóteses do §3º, não sendo líquida a sentença, a definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.
- Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora provida."
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5640834-95.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA, julgado em 24/06/2021, Intimação via sistema DATA: 02/07/2021).
Assim, restou comprovado o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos indicados, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição aos agentes nocivos descritos, com enquadramento dos ruídos acima do limite de tolerância, no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, e código 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, bem como no código 2.0.1, do Decreto nº 3.048, com a redação dada pelo Decreto nº 4.882/2003, e a agentes químicos nocivos provenientes do processo de plantio, carpa e corte no cultivo da cana-de-açúcar, como organofosforados e organoclorados previstos nos itens 1.2.6 e 1.2.11, do Quadro do Decreto nº 53.831/1964, 1.2.6 e 1.2.10, do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, bem como a hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HPA), decorrentes da fuligem da cana-de-açúcar, nos ítens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/1964 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979.
Nessas condições, em 07/06/2017 (data do requerimento administrativo - DER), o segurado contava com 54 anos de idade, e computava 37 anos, 7 meses e 23 dias de tempo de contribuição e, portanto, tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, nos temros do artigo 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 20/98. O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei nº 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada (92.05 pontos) é inferior a 95 pontos (Lei nº 8.213/91, artigo 29-C, inciso I, incluído pela Lei nº 13.183/2015).
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, nos termos do artigo 54, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, quando preenchidos os requisitos para a concessão da aposentadoria.
Observo, contudo, que em relação ao termo inicial dos efeitos financeiros da condenação, quando a comprovação do fato, ainda que em parte, tenha sido realizada somente em juízo, sem prévia análise administrativa, tal questão encontra-se pendente de julgamento, submetida ao rito dos recursos repetitivos junto ao Superior Tribunal de Justiça, para dirimir a controvérsia cadastrada como Tema Repetitivo nº 1.124 (Recursos Especiais nºs1.905.830/SP, 1.912.784/SP e 1.913.152/SP – data da afetação: 17/12/2021), inclusive com determinação de suspensão do trâmite de todos os processos relacionados com a questão.
Tal controvérsia destacada na Corte Superior, no entanto, não impede o julgamento do presente recurso, devendo a suspensão do processamento incidir apenas sobre a fase de cumprimento da sentença, quando deverá ser observado o que restar estabelecido por aquele Tribunal Superior, no julgamento do Tema Repetitivo nº 1.124, para que não haja prejuízo ao prosseguimento da marcha processual.
Assim, a decisão singular, proferida com fundamento nos artigos 927 e 932, incisos IV e V, todos do Código de Processo Civil, encontra-se em absoluta conformidade com o entendimento firmado pelas cortes superiores, pelo que deve ser mantida.
Por fim, verifica-se a existência de erro material na decisão, que passo a corrigir, de ofício, para excluir do dispositivo a referência ao período “de 01/05/2014 a 30/04/2014”, sem qualquer alteração quanto ao resultado do julgamento.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO e, de ofício, corrijo o erro material, nos termos da fundamentação.
É o voto.
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CORTADOR DE CANA DE AÇÚCAR. AGENTES NOCIVOS. LAUDO TÉCNICO. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. A matéria trazida à análise comporta julgamento monocrático, conforme o disposto no art. 932, incisos IV e V, do Código de Processo Civil, pois as questões discutidas neste feito encontram-se pacificadas na jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.
2. Restou comprovado pela anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, bem como do registro no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, vínculo empregatício do segurado nos períodos de 27/09/1989 a 16/01/1991 e de 26/02/1992 a 07/06/2017, na atividade “ajudante de serviços agrícolas diversos”, junto à "LABOR – Serviços Agrícolas LTDA", sucedida por "RAÍZEN ENERGIA S/A".
3. Quanto aos períodos entre 27/09/1989 a 16/01/1991 e de 26/02/1992 a 28/02/2007, restou comprovado o labor agrícola na cultura da cana-de-açúcar, desenvolvendo o segurado atribuições de corte de cana, plantio, carpa, entre outras, restando comprovada a efetiva exposição a ruídos acima do limite de tolerância e a hidrocarbonetos, conforme registrado pelos Perfis Profissiográficos Previdenciários – PPPs, corroborado pelos registros dos laudos técnicos periciais, elaborados por profissional legalmente habilitado em análise de tarefas análogas as do autor em idêntico ambiente de trabalho (lavouras de cana-de-açúcar).
4. Embora não conste dos formulários as substâncias às quais esteve exposto, o laudo pericial elaborado por engenheiro de segurança do trabalho descreve que no período laborado como trabalhador rural durante o corte da cana-de-açúcar queimada esteve exposto a fuligem da queima (hidrocarbonetos policíclicos aromáticos), agentes nocivos previstos nos códigos nos códigos 1.2.11 do Decreto nº 53.831/1964, e 1.2.10 do Decreto nº 83.080/1979 (Anexo I).
5. Embora afastado o enquadramento pela categoria profissional dos trabalhadores em agropecuária prevista no código 2.2.1 do Decreto nº 53.081/1964, a prova dos autos demonstra que o autor ficou exposto a agentes químicos nocivos, com enquadramento nos mencionados códigos dos decretos, observando-se, nos termos do §4º do artigo 68 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 8.123/2013, pela exposição habitual e permanente às substâncias químicas com potencial cancerígeno, o que justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
6. O laudo pericial indicou a exposição a hidrocarbonetos aromáticos, contendo substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
7. O Anexo 13 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho relaciona diversas atividades e operações envolvendo agentes químicos que caracterizam condições de insalubridade, em maior ou menor grau. Comprovado o emprego de quaisquer dessas substâncias nas atividades do empregado, mesmo que essa atividade não esteja relacionada à fabricação da substância, está caracterizada a insalubridade, pois a norma exige análise meramente qualitativa, sem estabelecer limites de tolerância aos agentes considerados nocivos, ou qualquer especificidade quanto à sua composição. Fica descaracterizada a especialidade da atividade e o empregador dispensado do pagamento do adicional apenas se constatado o efetivo uso de EPI capaz de elidir o efeito nocivo do agente insalubre.
8. No caso dos autos, não há prova de efetivo fornecimento do Equipamento de Proteção Individual ao trabalhador, ou seja Ficha de Controle de Entrega do EPI, com o respectivo certificado de aprovação do equipamento, restando insuficiente as informações sobre a eficácia do referido equipamento contidas nos PPP.
9. Restou devidamente comprovado o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos indicados, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição aos agentes nocivos descritos, com enquadramento dos ruídos acima do limite de tolerância, no código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, e código 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, bem como no código 2.0.1, do Decreto nº 3.048, com a redação dada pelo Decreto nº 4.882/2003, e a agentes químicos nocivos provenientes do processo de plantio, carpa e corte no cultivo da cana-de-açúcar, como organofosforados e organoclorados previstos nos itens 1.2.6 e 1.2.11, do Quadro do Decreto nº 53.831/1964, 1.2.6 e 1.2.10, do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, bem como a hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HPA), decorrentes da fuligem da cana-de-açúcar, nos ítens 1.2.11 do Decreto nº 53.831/1964 e 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979.
10. Portanto, não há dúvida de que faz jus a parte autora ao enquadramento do labor desempenhado nos períodos supracitados como atividade especial para fins de conversão para tempo comum, nos termos do artigo 57, §5º, da Lei nº 8.213/91.
11. Em 07/06/2017, data do requerimento administrativo - DER, o segurado contava com 54 anos de idade, e computava 37 anos, 7 meses e 23 dias de tempo de contribuição e, portanto, tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, conforme consignado na decisão recorrida.
12. Não apresenta o recorrente em suas razões qualquer distinção da causa aos entendimentos consolidados, tão somente demonstrando seu inconformismo com os fundamentados adotados.
13. Agravo interno não provido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
