
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5255898-79.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DALCINA DIMITROL
Advogados do(a) APELADO: ALINE PERRUD QUISSARA - SP348541-N, ANTONIO AUGUSTO DE MELLO - SP128971-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5255898-79.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DALCINA DIMITROL
Advogados do(a) APELADO: ALINE PERRUD QUISSARA - SP348541-N, ANTONIO AUGUSTO DE MELLO - SP128971-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER (RELATORA):
Trata-se de agravo interno interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS – em face de decisão monocrática que negou provimento à apelação interposta em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por incapacidade permanente e condenou a autarquia previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o débito existente por ocasião da sentença (id. 289091909).
A decisão monocrática rejeitou a preliminar de coisa julgada e manteve a sentença que reconheceu a qualidade de segurada especial e o cumprimento da carência exigida, bem como ser devida a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente. Em razão de nova sucumbência da autarquia, majorou os honorários advocatícios em 2% (dois pontos percentuais).
A autarquia previdenciária alega, em síntese, que a decisão afastou a coisa julgada no que se refere a ausência de prova material para o reconhecimento da atividade rural como segurada especial. Ainda, sustenta que a parte autora não possuía a qualidade de segurada na data de início da incapacidade fixada pela perícia judicial (id. 289091909).
Requer a reforma da r. decisão monocrática para que seja extinto o processo sem análise do mérito, nos termos do artigo 485, inciso V, do Código de Processo Civil, ou a improcedência do pedido da parte autora.
Intimada, a parte agravada apresentou contrarrazões (id. 290915081).
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5255898-79.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DALCINA DIMITROL
Advogados do(a) APELADO: ALINE PERRUD QUISSARA - SP348541-N, ANTONIO AUGUSTO DE MELLO - SP128971-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA ANA LÚCIA IUCKER (RELATORA):
Trata-se de agravo interno interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS – em face de decisão monocrática que negou provimento à apelação interposta em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por incapacidade permanente.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Em que pese a argumentação da agravante, verifica-se que não trouxe tese jurídica capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado na decisão monocrática recorrida, sendo incabível a retratação.
Por outro lado, a manutenção da decisão agravada se impõe pelos fundamentos a seguir delineados.
A decisão do e. Relator afastou o instituto da coisa julgada uma vez que no processo 0004191-66.2012.8.26.0326 a parte autora pleiteava a concessão de aposentadoria por idade, benefício diverso do requerido na presente demanda, na qual se requer a concessão de benefício por incapacidade. Logo, ausente a tríplice identidade prevista no artigo 337, §2º, do Código de Processo Civil – partes, causa de pedir e pedido.
Quanto aos limites objetivos da coisa julgada, o artigo 504 do Código de Processo Civil refere-se ao que não fica sujeito ao instituto:
Art. 504. Não fazem coisa julgada:
I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;
II - a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença.
Desta forma, fica claro que o não reconhecimento da qualidade de segurada especial no processo 0004191-66.2012.8.26.0326, que indeferiu a concessão da aposentadoria por idade rural, constitui um dos motivos para a negativa do pedido, não sendo abarcada, portanto, pela coisa julgada.
Ainda, a decisão ora agravada manteve a aposentadoria por incapacidade permanente em razão da parte autora ter comprovado a qualidade de segurada especial e a carência exigida para o benefício pleiteado ao apresentar cópia dos seguintes documentos:
. Certidão de nascimento, em 07/10/1956, constando a profissão de lavrador de seu pai (id. 132650287, fl. 1);
. Certidão de casamento dos seus pais, celebrado em 28/07/1955, constando a profissão de lavrador do pai (id. 132650287, fl. 2);
. Certidão de óbito do seu pai, em 17/01/2005, constando a qualificação de lavrador aposentado (id. 132650287, fl. 3);
. Certidões de nascimento dos seus irmãos, em 1961, 1966 e 1968, constando a profissão de lavrador do genitor (id. 132650296, fls. 1/3);
. Declaração de proprietária rural para a qual a autora trabalhou na qualidade de bóia-fria, entre 1996 e 2017, e que foi uma das testemunhas arroladas no processo (id. 132650311, fl. 1);
. Certidão de transcrição de transmissão, pela qual a sua avó adquiriu a propriedade rural da família em 10/06/1952 (id. 132650346, fl. 1).
Como bem ressaltado, há consolidada jurisprudência no sentido de que o segurado pode utilizar documentos em nome de terceiros do grupo familiar para comprovar a sua atividade rurícola, desde que corroborada por prova testemunhal.
Importante destacar os Temas 554 e 638 do Superior Tribunal de Justiça a respeito do assunto:
Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.
Além dos documentos acima citados, o depoimento das três testemunhas ouvidas no processo corroboram a afirmação da parte autora de que trabalhou como rurícola até o momento em que sobrevieram as moléstias incapacitantes, em 2017.
Desta forma, a alegação do INSS de que a parte autora não possuía qualidade de segurada na data de início da incapacidade, fixada pela perícia judicial em 06/03/2018 (id. 132650374), não persiste.
Desta forma, não há argumentos válidos para dar ensejo à retratação da r. decisão monocrática.
Diante do exposto, voto por negar provimento ao agravo interno do INSS.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: cuida-se de agravo interno em face da decisão monocrática, que rejeitou a preliminar de coisa julgada e negou provimento à apelação do INSS.
Nas razões recursais, a autarquia previdenciária alega coisa julgada em relação à qualidade de segurada rural da autora e requer a improcedência do feito em razão da ausência de prova material do trabalho rural. Prequestiona a matéria para fins recursais.
A nobre Relatora negou provimento ao agravo interno.
Não obstante os judiciosos fundamentos expostos no voto de Sua Excelência, deles ouso divergir, pelas seguintes razões.
No caso dos autos, a perícia médica judicial (fls. 111/121 – pdf) constatou a incapacidade laboral total e permanente da autora (nascida em 1956), conquanto portadora de fratura de vértebra lombar e osteoporose, desde 6/3/2018.
Resta averiguar, entretanto, o exercício de atividades rurais quando deflagrada a incapacidade laboral.
Como início de prova material do alegado labor rural, apresentou documentos comprovando a qualificação de lavrador de seu pai: (i) certidão de nascimento da autora, em 07/10/1956 (ii) certidão de casamento dos pais da autora, celebrado em 28/07/1955; (iii) certidão de óbito do pai, em 17/01/2005, constando a qualificação de lavrador aposentado; (iv) certidões de nascimento dos irmãos da autora, em 1961, 1966 e 1968.
Juntou, ainda, certidão de transcrição de transmissão de imóvel, pela qual a avó da autora adquire a propriedade rural da família em 10/06/1952.
Ocorre que tais documentos são assaz antigos e não há outros elementos de prova aptos a corroborar o labor rural até o início da incapacidade.
Nessa esteira, a declaração de terceiro (ID 132650311), datada de 23/10/2018, afirmando trabalho rural da autora como boia fria entre 1996 e 2017, além de ser extemporânea aos fatos em contenda, equipara-se a simples testemunho, com a deficiência de não ter sido colhido sob o crivo do contraditório.
Observa-se, ainda, a existência de ação de aposentadoria por idade rural em nome da autora (fls. 78/81 - pdf), julgada improcedente em razão da ausência de qualidade de segurado rural, nos seguintes termos (destaquei):
“Embora acostada documentação dos genitores da autora e admitida a extensão da qualificação profissional, em se tratando de trabalho realizado em regime de economia familiar, impossível aproveitar-lhe o documento a ele inerente, ante a inexistência de prova consistente de que o labor se desenvolvia com essa característica. Com efeito, os documentos acostados em nome dos pais da postulante não se prestam a comprovar o exercício de atividade agrícola pela autora, visto que atestam tão somente que eles eram lavradores, nada informando acerca do período em que a autora supostamente teria se dedicado a tal mister.
Em que pese tenham os testemunhos colhidos afirmado a atividade rurícola da autora, não são suficientes para, por si só, comprovar o labor em todo o período exigido.
(...)
A ausência de prova documental, que sirva pelo menos como indício do exercício de atividade rural pela autora pelo prazo necessário, enseja a denegação do benefício pleiteado.”
Enfim, a parte autora não logrou carrear indícios razoáveis de prova material capazes de demonstrar a faina agrária aventada, restando isolada a prova testemunhal, a qual, por sua vez, mostrou-se genérica e mal circunstanciada.
Nesse passo, a prova da atividade rural da própria autora até o advento da incapacidade laboral apontada na prova técnica não está comprovada a contento, porque fincada exclusivamente em prova vaga.
Nessas circunstâncias, ainda que constatada a incapacidade da autora, os demais requisitos legais para a concessão do benefício não foram preenchidos.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou provimento ao agravo interno do INSS para julgar improcedente o pedido.
É o voto.
Desembargadora Federal DALDICE SANTANA
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. COISA JULGADA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. QUALIDADE DE SEGURADO.
- A decisão do e. Relator afastou o instituto da coisa julgada uma vez que no processo 0004191-66.2012.8.26.0326 a parte autora pleiteava a concessão de aposentadoria por idade, benefício diverso do requerido na presente demanda, na qual se requer a concessão de benefício por incapacidade.
- O artigo 504, inciso I, do Código de Processo Civil dispõe que os motivos da decisão não fazem coisa julgada.
- A decisão do e. Relator também manteve a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente, ante a comprovação da qualidade de segurada especial, do cumprimento do período de carência exigido e da incapacidade total e permanente.
- A parte autora comprovou sua atividade rurícola por documentos de terceiros do seu grupo familiar, corroborados por depoimentos de testemunhas.
- As testemunhas afirmaram que a parte autora trabalhou até 2017, sendo que a perícia médica judicial fixou a data da incapacidade em 06/03/2018.
- Ainda que a parte autora tivesse parado de exercer suas atividades laborativas em 01/2017, sua qualidade de segurada permaneceria até o dia 15/03/2018, em razão do período de graça e nos termos do art. 15, inc. II, da Lei 8.213/91.
- Agravo interno do INSS não provido.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL
