D.E. Publicado em 23/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido da parte autora e dar parcial provimento à sua apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002618-89.2011.4.03.6117/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de sentença pela qual julgou improcedente o pedido formulado em ação previdenciária, sob o fundamento de que o autor não logrou êxito em comprovar o exercício de atividade sob condições especiais. Pela sucumbência, o autor foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), ficando a exigibilidade suspensa em razão de ser beneficiário da justiça gratuita. Sem custas.
Em suas razões de inconformismo, pugna o autor pela reforma da r. sentença requerendo, preliminarmente, a apreciação do agravo retido para que seja declarada a nulidade do julgamento ante o cerceamento de defesa, uma vez que não lhe foi dada oportunidade para produzir prova pericial tendente a comprovar o exercício de atividade especial. No mérito, aduz que trabalhou em indústria calçadista nos períodos indicados na inicial, de modo que faz ao reconhecimento de atividade especial, ante a exposição a agentes nocivos à saúde, sobretudo agentes químicos como cola de sapateiro e solvente.
Sem a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002618-89.2011.4.03.6117/SP
VOTO
Do agravo retido
Há de ser rejeitado o argumento da parte autora no sentido de que a sentença merece ser anulada por cerceamento de defesa, uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de dispensar a produção de provas ao entender desnecessárias para a resolução da causa.
Ademais, pela decisão de fls. 239/240, foi declarada a nulidade da sentença de fls. 151/152, determinando-se o retorno dos autos para atender ao requerido pelo autor, não havendo que se falar, portanto, em cerceamento de defesa. Sendo assim, conheço do agravo retido de fls. 293/296, porém, nego-lhe provimento.
Do mérito
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 06.05.1950, o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 01.06.1973 a 19.10.1981, 01.06.1982 a 26.10.1982, 01.06.1983 a 24.02.1984, 25.10.1984 a 30.06.1992, 01.02.1993 a 21.12.1993, 04.04.1994 a 28.02.1996, 01.09.1996 a 29.05.1998, 01.02.1999 a 21.01.2000, 03.07.2000 a 28.01.2003, 02.01.2004 a 15.03.2007 e de 08.01.2008 a 24.02.2011. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (07.05.2012), ou, sucessivamente, a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
No caso dos autos, os contratos de trabalho anotados em carteira profissional cujas atividades eram correlatas à função de sapateiro (CTPS fls. 36/38 e 58) até 10.12.1997 são suficientes à comprovação da exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em empresas - fábrica de sapatos, localizada na cidade de Franca, conhecido polo industrial de calçados.
De outro turno, nos termos do código 1.2.11 do Decreto 53.831/64 havia presunção legal de que a presença de hidrocarboneto tóxico no processo produtivo era prejudicial ao trabalhador.
Assim, deve ser reconhecido o exercício de atividade especial nos períodos de 01.06.1973 a 19.10.1981 (CTPS; fl. 36), 01.06.1982 a 26.10.1982 (CTPS; fl. 36), 01.06.1983 a 24.02.1984 (CTPS; fl. 37), 25.10.1984 a 30.06.1992 (CTPS; fl. 37), 01.02.1993 a 21.12.1993 (CTPS; fl. 38), 04.04.1994 a 28.02.1996 (CTPS; fl. 38), 01.09.1996 a 10.12.1997 (CTPS; fl. 58), uma vez que o autor exerceu funções correlatas à atividade de sapateiro.
Esclareço, ainda, que o laudo técnico trazido pela parte autora, emitido pelo sindicato dos Trabalhadores de Franca, prova emprestada (fls. 69/131), cujo teor é meramente indicativo, não vincula o magistrado.
Nos termos do §2º do art.68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No caso dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
Por outro lado, não há possibilidade de reconhecer a especialidade dos períodos de 11.12.1997 a 29.05.1998 e de 08.01.2008 a 24.02.2011, ante a ausência de comprovação de exposição a agentes nocivos por meio de Perfil Profssiográfico ou laudo técnico emitido pelo empregador.
Da mesma forma, devem ser tidos como comuns os períodos de 01.02.1999 a 21.01.2000, 03.07.2000 a 28.01.2003 e de 02.01.2004 a 15.03.2007, laborados na empresa Maria de Lourdes R. Maldonado - Me., tendo em vista que as atividades desempenhadas pelo autor no setor de montagem consistiam em "tirar grampo do calçado; abastecer esteira de calçados", não havendo qualquer contato com agente nocivo, conforme PPP's de fls. 379/384.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
Contudo, deve ser desconsiderada a informação de utilização do EPI quanto ao reconhecimento de atividade especial dos períodos até a véspera da publicação da Lei 9.732/98 (13.12.1998), conforme o Enunciado nº 21, da Resolução nº 01 de 11.11.1999 e Instrução Normativa do INSS n.07/2000.
Somados apenas os períodos de atividade especial, o autor totaliza 21 anos, 03 meses e 11 dias de atividade exclusivamente especial, conforme primeira planilha anexa, parte integrante da presente decisão, insuficiente à concessão do benefício de aposentadoria especial previsto no artigo 57, caput, da Lei 8.213/1991.
Entretanto, convertendo-os em comuns e somados aos demais, o autor totaliza 30 anos, 03 meses e 04 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 40 anos, 01 mês e 15 dias de tempo de serviço até 24.02.2011, data do requerimento administrativo, conforme segunda planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Destarte, o autor faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, com renda mensal de 70% do salário-de-benefício, considerando-se o tempo de serviço computado até 15.12.1998, nos termos do art. 53, inc. II e do art.29, caput, em sua redação original, ambos da Lei nº 8.213/91.
Insta ressaltar que o art. 201, §7º, inciso I, da Constituição da República de 1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, garante o direito à aposentadoria integral, independentemente de idade mínima, àquele que completou 35 anos de tempo de serviço.
Assim, caso seja mais favorável ao autor, fica ressalvada a possibilidade de computar o tempo de serviço, e os correspondentes salários-de-contribuição, até 24.02.2011, data do requerimento administrativo, mas com valor do beneficio calculado na forma do art. 29, inciso I, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.876/99, opção sistematizada no art. 187 e art. 188, A e B, ambos do Decreto 3.048/99, recebendo as diferenças daí decorrentes.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Fixo o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (24.02.2011 - fl. 390), conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido. Não há prestações atingidas pela prescrição quinquenal, tendo em vista que o ajuizamento da ação se deu em 19.12.2011 (fl. 02).
Ante a sucumbência mínima da parte autora, fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, uma vez que o Juízo a quo julgou improcedente o pedido, em observância ao disposto no Enunciado 6 das diretrizes para aplicação do Novo CPC aos processos em trâmite, elaboradas pelo STJ na sessão plenária de 09.03.2016.
Diante do exposto, nego provimento ao agravo retido interposto pela parte autora e dou parcial provimento à sua apelação para julgar parcialmente procedente o pedido para reconhecer a especialidade dos períodos de 01.06.1973 a 19.10.1981, 01.06.1982 a 26.10.1982, 01.06.1983 a 24.02.1984, 25.10.1984 a 30.06.1992, 01.02.1993 a 21.12.1993, 04.04.1994 a 28.02.1996, 01.09.1996 a 10.12.1997, totalizando 30 anos, 03 meses e 04 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 40 anos, 01 mês e 15 dias de tempo de serviço até 24.02.2011. Consequentemente, condeno o réu a conceder ao autor o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data requerimento administrativo (24.02.2011), devendo ser observado o cálculo previsto nos artigos 187 e 188, A e B, ambos do Decreto 3.048/1999. Honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data do presente julgamento. As prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, devidamente instruído com os documentos da parte autora MARIO SÉRGIO RIBEIRO, para que sejam adotadas as medidas cabíveis para que seja imediatamente implantado o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, com DIB em 24.02.2011, a ser calculado pelo INSS, tendo em vista o disposto no caput do artigo 497 do Novo CPC.
É o voto.
SERGIO NASCIMENTO
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