D.E. Publicado em 15/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, e dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009475-65.2012.4.03.6102/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações de sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido de indenização por dano moral, e parcialmente procedente o pedido formulado em ação previdenciária para reconhecer e determinar a averbação da especialidade dos períodos laborados de 06.10.1986 a 14.05.1990, 01.02.1994 a 29.04.1996, 03.05.1996 a 05.03.1997, 19.11.2003 a 05.12.2003, 17.05.2004 a 16.08.2005, 07.06.2006 a 04.02.2009 e 04.01.2010 a 29.05.2012. Na qualidade de sucumbente em maior extensão, a parte autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), cuja execução encontra-se suspensa pelo deferimento da gratuidade de justiça.
Em razões de apelação, busca o autor a reforma do julgado, alegando, em síntese, que faz jus ao reconhecimento da especialidade também do período de 06.03.1997 a 18.22.2003, e, consequentemente, à concessão do benefício da aposentadoria especial desde 29.05.2012, data do requerimento administrativo.
O réu, por sua vez, pugna pela reforma da r. sentença, alegando a necessidade de contemporaneidade do laudo e a eficácia do EPI (Equipamento de Proteção Individual). Subsidiariamente, pleiteia que o benefício seja concedido a partir da data em que o autor se afastar da atividade.
Com apresentação de contrarrazões (fls. 283/297), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009475-65.2012.4.03.6102/SP
VOTO
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 28.11.1965 (fl. 32), o reconhecimento da especialidade dos períodos de 06.10.1986 a 14.05.1990, 01.02.1994 a 29.04.1996, 03.05.1996 a 05.12.2003, 17.05.2004 a 16.08.2005, 07.06.2006 a 04.02.2009 e 04.01.2010 a 29.05.2012, e a consequente concessão do benefício de aposentadoria especial desde 29.05.2012, data do requerimento administrativo.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Dessa forma, é de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruído s superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruído s de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruído s de 85 decibéis.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo as vezes do laudo técnico.
Ressalte-se que o fato de os PPP's terem sido elaborados posteriormente à prestação do serviço, não afasta a validade de suas conclusões, vez que tal requisito não está previsto em lei e, ademais, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No caso dos autos, o PPP de fls. 38/39 e 40/41 revelam que, nos períodos de 06.10.1986 a 14.05.1990 e 01.02.1994 a 29.04.1996, nos quais o autor laborou nas empresas Citrosuco Paulista S/A e Baterias Grande Prêmio Comércio LTDA EPP, esteve exposto a ruídos de 82 dB e 115 dB, respectivamente, além de substância composta por produtos químicos para lavar baterias e peças no segundo intervalo.
Quanto ao período de 03.05.1996 a 05.12.2003, o PPP de fls. 323/325 indica que o autor esteve exposto a hidrocarbonetos na empresa Raízen Energia S/A. No intervalo de 17.05.2004 a 16.08.2005, por sua vez, em que laborou na Empresa Marchesan Implementos e Máquinas Agrícolas "Tatu" S/A, o PPP de fls. 44/45 demonstra exposição do autor a ruídos de 86 dB.
Finalmente, com relação aos períodos de 07.06.2006 a 04.02.2009 e 04.01.2010 a 04.02.2011, em que o autor trabalhou nas empresas Antoniosi Tecnologia Agroindustrial LTDA e Lumasp & Luzipeças Equipamentos Hidráulicos LTDA, os PPP´s de fls. 46/47 e 48/49 evidenciam exposição a ruídos de 88 dB e 85,21 dB, respectivamente, além de óleos lubrificantes, graxa, thinner, e fumos metálicos, agentes nocivos previstos nos códigos 1.1.5 e 1.2.10 do Decreto 83.080/1979 (Anexo I).
Com relação ao último intervalo, entendo que pode ser estendido o reconhecimento do labor especial até a data de emissão do PPP (03.02.2012), sendo razoável crer que o autor permaneceu exercendo as mesmas funções por mais tempo, considerando que o Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (anexo) demonstra que o vínculo empregatício com a empresa Lumasp & Luzipeças Equipamentos Hidráulicos LTDA se manteve ativo pelo menos até maio de 2012.
Nos termos do § 2º do art. 68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No caso em apreço, o hidrocarboneto aromático é substância derivada do petróleo e relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da Portaria 3214/78 NR-15 do Ministério do Trabalho "Agentes Químicos, hidrocarbonetos e outros compostos de carbono...", onde descreve "Manipulação de óleos minerais ou outras substâncias cancerígenas afins". (g.n.)
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No presente caso, discussão quanto à utilização do EPI é despicienda, porquanto o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em diversos períodos, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Além disso, relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.), pode-se dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Somados os períodos de atividade especial ora reconhecidos com o já considerado especial pela esfera administrativa (intervalo de 07.12.1979 a 03.03.1986, conforme análise e decisão técnica de atividade especial de fl. 193), o autor totaliza 25 anos, 08 meses e 06 dias de atividade exclusivamente especial até 03.02.2012, data de emissão do PPP, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão, suficientes à concessão do benefício de aposentadoria especial.
Destarte, o autor faz jus à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, havendo requerimento administrativo (29.05.2012 - fl. 34), o termo inicial do benefício deve ser fixado a contar da data de tal requerimento.
Tendo em vista que a ação foi proposta em 03.12.2012 (fl. 02), não há parcelas alcançadas pela prescrição.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados pela lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% do valor das parcelas vencidas até a data da sentença, em observância ao disposto no Enunciado 7 das diretrizes para aplicação do Novo CPC aos processos em trâmite, elaboradas pelo STJ na sessão plenária de 09.03.2016.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou provimento à apelação do autor, para julgar procedente seu pedido, e declarar a especialidade do período de 06.03.1997 a 18.22.2003, totalizando 25 anos, 07 meses e 20 dias de atividade exclusivamente especial até 03.02.2012, data de emissão do PPP, e condenando o INSS a lhe conceder o benefício da aposentadoria especial desde 29.05.2012, data do requerimento administrativo. As verbas acessórias serão calculadas na forma acima explicitada. Honorários advocatícios fixados em 15% do valor das parcelas vencidas até a data da sentença. As parcelas em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora MÁRIO AUGUSTO CORREA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado o benefício de APOSENTADORIA ESPECIAL, com data de início - DIB em 29.05.2012, com renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, tendo em vista o artigo 497 do CPC/2015. As prestações em atraso serão resolvidas em liquidação de sentença.
É o voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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Data e Hora: | 06/09/2016 17:07:31 |