
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5282524-38.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HELIO VECCHIATO
Advogado do(a) APELADO: TIAGO DE OLIVEIRA BUZZO - SP122090-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5282524-38.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HELIO VECCHIATO
Advogado do(a) APELADO: TIAGO DE OLIVEIRA BUZZO - SP122090-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de recurso de apelação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e recurso adesivo da parte autora, HELIO VECCHIATO, em face da sentença (Id 136281182), proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Itú, SP, que declarou inexigível a dívida de R$ 562.712,00, reconheceu a natureza especial das atividades desempenhadas pelo requerente nos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e de 1º.3.1982 a 1º.1.2004, condenou o réu a restabelecer o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora (NB 42/131.543.519-2), tornando definitiva a tutela antecipada deferida em agravo de instrumento (Id 136281160), bem como condenou o réu ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% das prestações vencidas até a data da prolação da sentença.
O INSS alega, preliminarmente, a obrigatoriedade de remessa oficial por se tratar de sentença ilíquida, a irregularidade praticada por seu ex-servidor na concessão administrativa do benefício do autor, do qual pretende o ressarcimento da dívida de R$ 562.712,00, independentemente do recebimento de boa-fé. No mérito, aduz que os pedidos do segurado de reconhecimento de exercício de atividades especiais nos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e de 14.10.1996 a 1º.1.2004 e o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição seja julgado improcedente, em razão da ausência de comprovação da exposição a agentes nocivos e da necessidade de observância das disposições transitórias da Emenda Constitucional n. 20/1998. Alega, ainda, ser vedada a concessão de benefício sem prévia fonte de custeio.
A parte autora apresentou contrarrazões (Id 136281193) e recurso adesivo (Id 136281194). Nas contrarrazões ao recurso de apelação, a parte autora alega, preliminarmente, decadência do direito de o INSS revisar administrativamente o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, uma vez que teve como data de início de vigência do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição o dia 2.1.2004, e que a parte autora somente foi notificada pelo INSS em 16.5.2017, a respeito do cancelamento do benefício por existência de indícios de irregularidade. Em razão do fato de ter se passado mais de dez anos de recebimento continuado do benefício e, "por evidente suposto erro administrativo da autarquia, ser abruptamente cancelado", tal ato já estava coberto pelo prazo decadencial de dez anos, previsto na Lei n. 8.213/1991, para eventual revisão e cancelamento do referido benefício. No mérito, em relação à restituição de valores recebidos indevidamente, a parte autora aduz que "tratando-se de recebimento de boa-fé, ocasionado por erro evidente da administração, descabe qualquer devolução, dado o seu caráter alimentar e consequente irrepetibilidade dos valores, consoante jurisprudência consolidada.".
No recurso de apelação adesivo (Id 136281194), a parte autora requer que, sendo mantida a condenação, conste expressamente o restabelecimento do benefício com data de início do pagamento fixado na data do requerimento administrativo (2.1.2004), ou, ao menos, a partir da cessação administrativa (1º.10.2017), bem como reconhecido o direito à opção pelo cálculo do benefício mais vantajoso, caso se reconheça o direito adquirido à concessão antes do advento da Emenda Constitucional n. 20/1998. Por fim, requer que, sendo mantida a condenação, seja observado o interesse econômico (R$ 562.712,02), fixando-se, então, a condenação de honorários advocatícios no percentual de 15% sobre o valor da causa, devidamente corrigido por índice oficial, já que o benefício foi cessado em 1º.10.2017 e restabelecido em 1º.12.2017.
Concedidos os benefícios da assistência judiciária gratuita para a parte autora (Id 136281150).
Vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5282524-38.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HELIO VECCHIATO
Advogado do(a) APELADO: TIAGO DE OLIVEIRA BUZZO - SP122090-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de recurso de apelação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e recurso adesivo da parte autora, HELIO VECCHIATO, em face da sentença (Id 136281182), proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Itú, SP, que declarou inexigível a dívida de R$ 562.712,00, reconheceu a natureza especial das atividades desempenhadas pelo requerente nos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e de 1º.3.1982 a 1º.1.2004, condenou o requerido a restabelecer o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora (NB 42/131.543.519-2), tornando definitiva a tutela antecipada deferida em agravo de instrumento (Id 136281160), bem como condenou o réu ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% das prestações vencidas até a data da prolação da sentença.
Da tempestividade do recurso
Não se vislumbra, no caso em tela, hipótese de intempestividade recursal.
Da não sujeição à remessa necessária
Salienta-se a prescindibilidade de sujeição da sentença de primeiro grau à remessa necessária, uma vez que a alteração legislativa decorrente da entrada em vigor do Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015) majorou substancialmente o valor de alçada, fixando a necessidade de proveito econômico superior a 1000 salários mínimos para ensejar o reexame pelo segundo grau de jurisdição, não atingido diante do limite do valor do benefício previdenciário.
Observo, ademais, que, “ainda que aparentemente ilíquida a sentença, o proveito econômico pretendido pela parte autora não excede o novo valor de alçada do CPC, consistente em 1.000 (mil) salários mínimos, e, além disso, a condenação de natureza previdenciária é mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos...” (TRF/3.ª Região, ApCiv / SP 5016859-32.2018.403.6183, Décima Turma, Relatora Desembargadora Federal LEILA PAIVA MORRISON, DJEN 11.12.2023).
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da promulgação da Emenda Constitucional n. 20, de 15.12.1998, a aposentadoria por tempo de contribuição, anteriormente denominada “aposentadoria por tempo de serviço”, admitia a forma proporcional e a integral.
Assim, antes de 16.12.1998 (data da vigência da Emenda Constitucional n. 20), bastava a comprovação de: 30 ou 35 anos de tempo de serviço, se mulher ou homem, respectivamente, para que o segurado tivesse direito à aposentadoria integral; ou 25 ou 30 anos de tempo de serviço, se mulher ou homem, respectivamente, para que o segurado tivesse direito à aposentadoria proporcional.
Após a vigência da Emenda Constitucional n. 20/1998, passou a ser necessária a comprovação de 30 ou 35 anos de tempo de contribuição, se mulher ou homem, respectivamente, além da carência correspondente a 180 contribuições mensais, nos termos do artigo 25, inciso II, c.c. o artigo 142, ambos da Lei n. 8.213/1991, para que o segurado tivesse direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
A aposentadoria proporcional por tempo de serviço deixou de existir. No entanto, os segurados que já estavam filiados ao Regime Geral de Previdência Social antes da promulgação da Emenda Constitucional n. 20/1998 e que, em 15.12.1998, não haviam preenchido o respectivo requisito temporal teriam direito ao benefício desde que atendessem às regras de transição: o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
A Emenda Constitucional n. 103/2019, vigente a partir de 13.11.2019, deu nova redação ao artigo 201 da Constituição da República e ao seu § 7º, estabelecendo novos requisitos para a concessão de aposentadoria: 65 anos de idade, se homem, e 62 anos, se mulher, observado o tempo mínimo de contribuição; ou 60 anos de idade, se homem, e 55 anos, se mulher, para os trabalhadores rurais e segurados especiais.
A mencionada Emenda Constitucional, em seu artigo 3º, garantiu o direito adquirido dos segurados e dependentes que, em data anterior à da sua vigência (13.11.2019), preencheram os requisitos legalmente exigidos para a concessão da aposentadoria ou pensão por morte, ainda que requeridas posteriormente (§§ 1º e 2º). Além disso, restaram estabelecidas regras de transição àqueles que já eram filiados ao Regime Geral de Previdência Social e, em 13.11.2019, ainda não tinham implementado os requisitos necessários à obtenção do benefício previdenciário:
“Art. 15. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, fica assegurado o direito à aposentadoria quando forem preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, equivalente a 86 (oitenta e seis) pontos, se mulher, e 96 (noventa e seis) pontos, se homem, observado o disposto nos §§ 1º e 2º.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a pontuação a que se refere o inciso II do caput será acrescida a cada ano de 1 (um) ponto, até atingir o limite de 100 (cem) pontos, se mulher, e de 105 (cento e cinco) pontos, se homem.
§ 2º A idade e o tempo de contribuição serão apurados em dias para o cálculo do somatório de pontos a que se referem o inciso II do caput e o § 1º.
§ 3º Para o professor que comprovar exclusivamente 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, se mulher, e 30 (trinta) anos de contribuição, se homem, em efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, será equivalente a 81 (oitenta e um) pontos, se mulher, e 91 (noventa e um) pontos, se homem, aos quais serão acrescidos, a partir de1º de janeiro de 2020, 1 (um) ponto a cada ano para o homem e para a mulher, até atingir o limite de 92 (noventa e dois) pontos, se mulher, e 100 (cem) pontos, se homem.
(...)
Art. 16. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - idade de 56 (cinquenta e seis) anos, se mulher, e 61 (sessenta e um) anos, se homem.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade a que se refere o inciso II do caput será acrescida de 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem.
§ 2º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o tempo de contribuição e a idade de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão reduzidos em 5 (cinco) anos, sendo, a partir de 1º de janeiro de 2020, acrescidos 6 (seis) meses, a cada ano, às idades previstas no inciso II do caput, até atingirem 57 (cinquenta e sete) anos, se mulher, e 60(sessenta) anos, se homem.
(...)
Art. 17. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional e que na referida data contar com mais de 28 (vinte e oito) anos de contribuição, se mulher, e33 (trinta e três) anos de contribuição, se homem, fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - cumprimento de período adicional correspondente a 50% (cinquenta por cento) do tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem.
(...)
Art. 20. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se voluntariamente quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem;
II - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem;
III - para os servidores públicos, 20 (vinte) anos de efetivo exercício no serviço público e 5 (cinco) anos no cargo efetivo em que se der a aposentadoria;
IV - período adicional de contribuição correspondente ao tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição referido no inciso II.
§ 1º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio serão reduzidos, para ambos os sexos, os requisitos de idade e de tempo de contribuição em 5 (cinco) anos”.
As regras de transição devem ser avaliadas em razão de casos concretos, uma vez que o fator determinante para escolha da regra de transição mais favorável é a situação específica de cada segurado.
Da comprovação da atividade especial
É importante observar que a dinâmica da legislação previdenciária impõe uma breve exposição sobre as sucessivas leis que disciplinaram o critério para reconhecimento do tempo de serviço em atividade especial, pois a delineação do tempo de serviço como especial deve absoluta observância à legislação da época do trabalho prestado.
Com efeito, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização da atividade especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807/1960. Nesse contexto, foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
A Lei n. 8.213/1991, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
O artigo 57 da Lei n. 8.213/1991, na redação da Lei n. 9.032/1995, dispõe que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida na Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos.
Até a publicação da Lei n. 9.032, de 28.4.1995, o reconhecimento do tempo de serviço em atividade especial dava-se pelo enquadramento da atividade ou grupo profissional do trabalhador aos termos dos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979.
Cabe ressaltar que os citados Decretos vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado. O colendo Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO COMUM. RUÍDO. LIMITE. 80 DB. CONVERSÃO ESPECIAL. POSSIBILIDADE.
1. As Turmas que compõem a Egrégia Terceira Seção firmaram sua jurisprudência no sentido de que é garantida a conversão do tempo de serviço prestado em atividade profissional elencada como perigosa, insalubre, ou penosa em rol expedido pelo Poder Executivo (Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79), antes da edição da Lei nº 9.032/95.
2. Quanto ao lapso temporal compreendido entre a publicação da Lei nº 9.032/95 (29/04/1995) e a expedição do Decreto nº 2.172/97 (05/03/1997), e deste até o dia 28/05/1998, há necessidade de que a atividade tenha sido exercida com efetiva exposição a agentes nocivos, sendo que a comprovação, no primeiro período, é feita com os formulários SB-40 e DSS-8030, e, no segundo, com a apresentação de laudo técnico.
3. O art. 292 do Decreto nº 611/92 classificou como especiais as atividades constantes dos anexos dos decretos acima mencionados. Havendo colisão entre preceitos constantes nos dois diplomas normativos, deve prevalecer aquele mais favorável ao trabalhador, em face do caráter social do direito previdenciário e da observância do princípio in dúbio pro misero.
4. Deve prevalecer, pois, o comando do Decreto nº 53.831/64, que fixou em 80 db o limite mínimo de exposição ao ruído, para estabelecer o caráter nocivo da atividade exercida.
5. A própria autarquia reconheceu o índice acima, em relação ao período anterior à edição do Decreto nº 2.172/97, consoante norma inserta no art. 173, inciso I, da Instrução Normativa INSS/DC nº 57, de 10 de outubro de 2001 (D.O.U. de 11/10/2001).
6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido”.
(STJ, Resp. n. 412351/RS, Quinta Turma, Relatora Ministra LAURITA VAZ, julgado em 21.10.2003, DJ 17.11.2003, p. 355).
Alterando critério anterior, a Lei n. 9.032/1995 impôs a necessidade de apresentação de formulário, inicialmente conhecido como SB-40 e depois chamado DSS-8030, que descrevia a atividade do segurado e dos agentes nocivos, aos quais ele era exposto em razão do exercício da atividade laboral.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto n. 2.172, de 5.3.1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por tratar de matéria reservada à lei, o mencionado Decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n. 9.528, de 10.12.1997, que deu nova redação ao artigo 58 da Lei n. 8.213/1991, reafirmando a necessidade de laudo técnico, estabelecendo que os agentes nocivos seriam definidos por ato do Poder Executivo, instituindo o perfil profissiográfico (§ 4.º).
Cabe anotar, nesta oportunidade, que a Medida Provisória n. 1.523, de 11.10.1996 foi convalidada pela MP n. 1.596-14, de 10.11.1997 e, posteriormente, convertida na Lei n. 9.528/1997.
Nesse sentido, esta Décima Turma entendeu que “... Até 29/04/95 a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/12/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física. Após 10/12/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho. Quanto aos agentes ruído e calor, o laudo pericial sempre foi exigido. (TRF/3ª Região, ApRemNec n. 5000491-95.2017.4.03.6113, Relator Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA,10ª Turma, DJEN DATA: 2.5.2024).
Com a edição do Decreto n. 3.048/1999, vigente a partir de 12 de maio de 1999, a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos passou a ser feita em formulário emitido pela empresa, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (§ 2.º do art. 68). O citado Decreto, no § 2.º de seu artigo 68 com a redação dada pelo Decreto n. 4.032/2001, estabeleceu que “a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário denominado perfil profissiográfico previdenciário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho”.
O Decreto n. 4.032, de 26.11.2001 alterou dispositivos do Decreto n. 3.048/1999, regulamentando o “Perfil Profissiográfico Previdenciário” (PPP), documento regulamentado em várias Instruções Normativas do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, até que o artigo 272 da Instrução Normativa 45/2010, dispunha que: "A partir de 1º de janeiro de 2004, conforme estabelecido pela Instrução Normativa nº 99, de 2003, a empresa ou equiparada à empresa deverá preencher o formulário PPP, conforme Anexo XV, de forma individualizada para seus empregados, trabalhadores avulsos e cooperados, que laborem expostos a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física...". Nesse sentido: TRF/3ª Região, AI 5011336-22.2022.4.03.0000, Décima Turma, Relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, DJEN 28.10.2022.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário, que retrata as características do trabalho do segurado e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é apto a comprovar o exercício de atividade sob aventadas condições especiais, passando a substituir o laudo técnico.
Além disso, o próprio INSS reconhece que o PPP é documento suficiente a comprovar o histórico laboral do segurado e as condições especiais de trabalho, bem como que o referido documento, que substituiu os formulários SB-40, DSS-8030, reúne as informações do Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho - LTCAT e é de entrega obrigatória aos trabalhadores, por ocasião do desligamento da empresa.
Outrossim, a jurisprudência desta Corte destaca a prescindibilidade de juntada de laudo técnico aos autos ou de realização de laudo pericial, nos casos em que o segurado apresenta PPP para comprovar o trabalho em condições especiais:
“PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA PRELIMINAR. INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE SEU EXERCÍCIO. CONVERSÃO PARA TEMPO DE SERVIÇO COMUM.
I. Apresentado, com a inicial, o PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, não cabe a produção de prova pericial, já que nele consubstanciada. Eventual perícia realizada por perito nomeado pelo juízo não espelharia a realidade da época do labor, já que o que se pretende demonstrar é o exercício de condições especiais de trabalho existentes na empresa num interregno muito anterior ao ajuizamento da ação. Desnecessidade de produção da prova testemunhal, já que a questão posta nos autos prescinde de provas outras que as já existentes nos autos, para análise.
(Omissis)
IV. A legislação aplicável ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado - se comum ou especial -, bem como à forma de sua demonstração, é aquela vigente à época da prestação do trabalho respectivo.
V. A atividade especial pode ser assim considerada mesmo que não conste expressamente em regulamento, bastando a comprovação da exposição a agentes agressivos por prova pericial. Súmula nº 198/TFR. Orientação do STJ.
(Omissis)”
(TRF/3.ª Região, AC 1117829/SP, Relatora Desembargadora Federal MARISA SANTOS, Nona Turma, DJU 20.5.2010, p. 930)
No mesmo sentido: TRF/3.ª Região, AC 2008.03.99.028390-0, Relator Desembargador Federal SÉRGIO NASCIMENTO, Décima Turma, DJU 24.2.2010, pág. 1406; e TRF/3.ª Região, AC 2008.03.99.032757-4, Relatora Desembargadora Federal Giselle França, Décima Turma, DJU 24.9.2008.
Feitas essas considerações sobre as regras de comprovação das condições especiais de trabalho, cabe destacar que, quanto aos agentes "poeira", “calor” e “ruído”, sempre se exigiu laudo para a comprovação da respectiva nocividade.
Destarte, o trabalho em atividades especiais, ressalvados os agentes poeira, calor e ruído, para os quais sempre se exigiu laudo, deve se dar da seguinte forma:
| Período | Forma de Comprovação |
| Até 28.4.1995 | Por mero enquadramento profissional ou pela presença dos agentes físicos, químicos ou biológicos previstos nos anexos I e II do Decreto n. 83.080/79, e anexo do Decreto n. 53.831/64 Sem necessidade de apresentação de laudo técnico (exceto exposição aos agentes nocivos poeira, calor e ruído) |
| De 29.4.1995 (data do início da vigência da Lei n. 9.032) a 10.12.1997 (dia que antecedeu o início da vigência da Lei n. 9.528) | Pelos formulários SB-40 ou DSS-8030 (ou laudo) |
| De 11.12.1997 (início da vigência da Lei n. 9.528) a 31.12.2003 | Por formulários SB-40 ou DSS-8030 ou PPP, fundamentados em laudo técnico |
| A partir de 1.º.1.2004 (artigo 272 da IN – INSS n. 45/2010) | Por meio de PPP, o qual deve conter a identificação do responsável técnico pela avaliação das condições do ambiente de trabalho |
Observo, ainda, que, consoante o que dispõe o artigo 58, § 2.º, da Lei n. 8.213/1991, na redação da Lei n. 9.732/1998, o laudo técnico deve conter informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua observância pelo estabelecimento.
Da exposição a hidrocarbonetos, seus derivados e outros tóxicos inorgânicos
No que tange ao enquadramento da atividade especial por trabalho em contato com agentes químicos da classe dos hidrocarbonetos, o Decreto n. 53.831/1964, revogado pelo Decreto n. 62.755/1968, que dispunha sobre a aposentadoria especial, previa como “serviços insalubres, perigosos ou penosos” aqueles que ensejavam contato com agentes nocivos elencados em seu anexo. A referida norma reconhecia o direito ao cômputo, como tempo especial de trabalho, dos períodos em que o segurado trabalhava exposto a derivados tóxicos do carbono.
O do Decreto n. 83.080/1979, revogado pelo Decreto n. 3.048/1999, nos itens 1.2.10 e 1.2.11 de seu Anexo I, estabelecia o enquadramento específico dos hidrocarbonetos e de outros compostos de carbono como agentes nocivos.
A partir da vigência do Decreto n. 2.172/1997, posteriormente revogado pelo Decreto n. 3.048/1999, o regulamento da Previdência Social deixou de conter previsão específica da concessão de aposentadoria especial em razão de trabalho que ocasione contato com hidrocarbonetos.
Quanto à prova da exposição do segurado aos mencionados agentes químicos, cabe destacar que não se desconhece o entendimento firmado por ocasião do julgamento do Tema TNU n. 298: “A partir da vigência do Decreto n. 2.172/97, a indicação genérica de exposição a ‘hidrocarbonetos’ ou 'óleos e graxas', ainda que de origem mineral, não é suficiente para caracterizar a atividade como especial, sendo indispensável a especificação do agente nocivo”.
Outrossim, não se desconhece o parecer da Fundacentro, que fundamentou a tese vencedora no julgamento do mencionado Tema e que contém explicação didática acerca da existência de alguns hidrocarbonetos que não nocivos quando presentes no ambiente de trabalho.
Todavia, considerando-se o caráter social e protetivo do Direito Previdenciário, entendo que a aplicação da tese relativa ao Tema TNU n. 298 não é adequada ao presente caso. Com efeito, ainda que haja omissão acerca da especificação do agente nocivo hidrocarboneto, deve-se ponderar que, ao registrar determinados agentes químicos, no PPP, como "fator de risco", a empresa empregadora indica essas substâncias como “prejudiciais à saúde”; e que o referido registro, que é subscrito por responsável técnico habilitado, enseja um impacto financeiro decorrente dos acréscimos incidentes nas contribuições previdenciárias a cargo da empresa (artigo 57, § 6º da Lei n. 8.213/1991).
Anoto, ainda, que o preenchimento de formulário ou elaboração de laudo técnico insuficiente, sem a especificação exata dos agentes químicos contidos no ambiente de trabalho, não pode prejudicar o trabalhador que esteve exposto a tais agentes, uma vez que compete ao Ministério do Trabalho e Emprego a fiscalização das empresas, inclusive quanto à correta avaliação das condições ambientais do trabalho prestado.
Por outro lado, não se pode ignorar que, por ser o julgador o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame, bem como formar sua convicção à luz do princípio do livre convencimento motivado, inclusive mediante a utilização das regras de experiência comum, consoante expressa disposição do artigo 375 do Código de Processo Civil.
Assim, ganha importância a análise das condições em que a atividade laboral é desempenhada e, caso haja a constatação de que a exposição a agente nocivo é inerente à profissão do segurado, é possível o reconhecimento da especialidade das condições de trabalho, mesmo sem a especificação exata do mencionado agente.
Nesse contexto, é razoável que se atribua ao INSS o ônus de comprovar que as condições ambientais de trabalho, por exposição a agente químico hidrocarboneto específico, não são prejudiciais à saúde do trabalhador.
Nesta oportunidade, importa destacar a tese firmada pelo colendo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do REsp 1.306.113, atinente ao Tema n. 534:
“As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).”.
Cabe anotar que a Norma Regulamentadora n. 15, aprovada pela Portaria MT n. 3.214/1978, em seu Anexo 13, relaciona, como “atividade insalubre”, a mera manipulação de óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, tóxicos inorgânicos e poeiras mineiras.
Dessa forma, os riscos ocupacionais gerados por esses agentes, não requerem, como regra, a análise quantitativa de sua concentração, ou a verificação da intensidade máxima e mínima presente no ambiente de trabalho, bastando o contato físico para caracterização da especialidade do trabalho, posto que, não há limites de tolerância estabelecidos na legislação previdenciária.
A Instrução Normativa MPS n. 77/2015, em seu artigo 278, estabelece:
“Art. 278. Para fins da análise de caracterização da atividade exercida em condições especiais por exposição à agente nocivo, consideram-se:
I - nocividade: situação combinada ou não de substâncias, energias e demais fatores de riscos reconhecidos, presentes no ambiente de trabalho, capazes de trazer ou ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador; e
(...)
§ 1º Para a apuração do disposto no inciso I do caput, há que se considerar se a avaliação de riscos e do agente nocivo é:
I - apenas qualitativo, sendo a nocividade presumida e independente de mensuração, constatada pela simples presença do agente no ambiente de trabalho, conforme constante nos Anexos 6, 13 e 14 da Norma Regulamentadora nº 15 - NR-15 do MTE, e no Anexo IV do RPS, para os agentes iodo e níquel, a qual será comprovada mediante descrição.
(...)”
Sobre a questão, cabe destacar os seguintes julgados:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE QUÍMICO TOLUENO. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. Aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
2. Até 29/04/95 a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/12/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física. Após 10/12/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho. Quanto aos agentes ruído e calor, o laudo pericial sempre foi exigido.
3.O tolueno é agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64. Nos termos do §4º do art. 68, do Decreto 3.048/99 com a nova redação dada pelo Decreto 8.123/2013, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas cancerígenas justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração. Sobretudo que os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 e da do Ministério do Trabalho e da Portaria Interministerial 9, de 7/10/2014 do Ministério do Trabalho e Emprego.
4. O uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido. (STF, ARE 664335/SC, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, j. 04/12/2014, DJe-029 DIVULG 11/02/2015 Public 12/02/2015).
5. O tempo de contribuição computado administrativamente, satisfaz a carência exigida pelo Art. 25, II, da Lei 8213/91.
6. Preenchidos os requisitos, a autora faz jus ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição.
(Omissis)
11. Apelação provida em parte.”
(TRF/3ª Região, AC 0043695-33.2015.4.03.9999, Décima Turma, Relator Desembargador Federal BAPTISTA PEREIRA, e-DJF3 9.8.2018)
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. ANÁLISE QUALITATIVA. AUSÊNCIA DE EPI EFICAZ. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA ANTECIPADA
(Omissis)
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
(Omissis)
- A intensidade dos referidos agentes químicos se dá por meio de análise qualitativa, nos termos do Anexo 13 da NR-15 do Ministério do Trabalho, ou seja, basta apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Precedentes.
(Omissis)
- Preliminar rejeitada. Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida.”
(TRF3, ApCiv n. 5001740-60.2022.4.03.6128, Relatora Desembargadora Federal LEILA PAIVA, Décima Turma, intimação via sistema 18.6.2024)
Importa salientar que, diversamente do que ocorria na vigência do Decreto n. 83.080/1979, não há mais a exigência de que, para a caracterização da especialidade das condições ambientais de trabalho, o contato do trabalhador com o agente químico se dê exclusivamente no seu processo de fabricação. Para a caracterização da referida especialidade, basta que, em outros processos produtivos ou serviços, haja contato do trabalhador com o agente nocivo, de forma habitual e permanente.
Ainda é importante destacar que os óleos minerais não tratados ou pouco tratados estão arrolados na Lista de Agentes Nocivos Reconhecidamente Cancerígenos em Humanos (LINACH), anexada à Portaria Interministerial MPS/MTE/MS n. 9/2014.
Observo que o fato de essas substâncias não possuírem registro no "Chemical Abstracts Service - CAS", conforme estabelecido no Memorando-Circular Conjunto n. 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS, não afasta a respectiva nocividade, uma vez que esse registro não está previsto no artigo 68, § 4º, do Decreto n. 3.048/1999.
Dessa forma, a presença no ambiente de trabalho de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador, de modo que a presença dos óleos minerais no ambiente de trabalho qualifica a atividade como insalubre.
O colendo Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento e que os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, independentemente de especificação sobre qual o tipo de óleo (STJ, AgInt no AREsp 1204070/MG, Segunda Turma, Relator Ministro FRANCISCO FALCÃO, j. 08.05.2018).
Aliás, já decidiu o STJ que os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, independente de especificação sobre qual o tipo de óleo (STJ, AgInt no AREsp 1204070/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 15. 5.2018).
Dessa forma, ainda que diante de menções genéricas à presença de hidrocarbonetos, tóxicos inorgânicos e outros agentes químicos constantes da documentação apresentada nos autos, há possibilidade de reconhecimento da especialidade das condições ambientais de trabalho, notadamente quando, em formulários e laudos assinados por responsável técnico, tiver o registro que indique a presença de agente como nocivo.
Do uso de equipamento de proteção individual
“A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído”. (TRF/3ª Região, TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000537-27.2022.4.03.6140, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 08/05/2024, DJEN DATA: 14/05/2024).
Nesse mesmo sentido, a Súmula n. 9 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, dispõe que "O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o serviço especial prestado".
Com efeito, o excelso Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Ademais, cabe destacar que o campo "EPI Eficaz (S/N)", constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), é preenchido pelo empregador, o qual apenas considera se houve ou não atenuação dos fatores de risco, em consonância com as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Nesse contexto, impõe-se reconhecer que essa informação não se refere à real eficácia do EPI, situação que não descaracteriza a nocividade do agente registrado no PPP.
Em relação a agentes químicos e biológicos, cabe destacar o seguinte julgado desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. EPI INEFICAZ. FONTE DE CUSTEIO. PREQUESTIONAMENTO.
(Omissis)
III - Relativamente à utilização de EPI, o acórdão embargado deixou certo que, no julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF assentou que caberá ao Judiciário verificar, no caso concreto, se a utilização do EPI descaracterizou (neutralizou) a nocividade da exposição ao alegado agente nocivo (químico, biológico, etc.), ressaltando, inclusive, que havendo divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a decisão deveria ser pelo reconhecimento do labor especial, caso dos autos.
IV - Ademais, na hipótese de exposição do trabalhador a outros agentes nocivos (químicos, biológicos, etc.), a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial, uma vez que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
V - Os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91, que regem a matéria relativa ao reconhecimento de atividade exercida sob condições prejudiciais, não vinculam o ato concessório do benefício previdenciário à eventual pagamento de encargo tributário.
(Omissis)
VII - Embargos de declaração opostos pelo INSS rejeitados.
(TRF3, Décima Turma,AC n. 5001542-73.2020.4.03.6134, Desembargador Federal Relator SÉRGIO NASCIMENTO, DJE 11.12.2023, Grifei)
Da exigência de prévia fonte de custeio da aposentadoria especial
No tocante à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de exercício de atividade em condições especiais ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, porquanto os artigos 57 e 58 da Lei n. 8.213/1991 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador (artigo 30, inciso I, Lei n. 8.212/1991), e, por consequência, ônus ao próprio INSS de fiscalização e cobrança do empregador pelo valor pago a menor, não podendo o segurado ser por isso prejudicado.
O excelso Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n. 664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, em sede de repercussão geral, assim se pronunciou acerca do modelo de financiamento de benefícios de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição decorrente da conversão de tempo especial em comum: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Da desnecessidade de ressarcimento ao INSS
No tocante à pretensão de ressarcimento de valores recebidos de forma indevida, o colendo Superior Tribunal de Justiça levou a seguinte questão em julgamento em sede de recurso repetitivo (Tema 979):
"Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social."
Em voto publicado em 23.4.2021, a referida Corte firmou a tese de que "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido". Outrossim, em modulação dos efeitos, a Corte definiu que a referida decisão somente atinge os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir de 23.4.2021.
Ao utilizar o termo "sobretudo", a Corte entendeu que a exceção da desnecessidade de devolução não abrange apenas na hipótese em que não era possível ao segurado constatar o pagamento indevido, mas simplesmente toda e qualquer hipótese em que o segurado não tenha contribuído com o erro administrativo, ou seja, apenas a boa-fé.
Ademais, salienta-se que, diante do caráter alimentar dos benefícios previdenciários, a repetibilidade dos valores recebidos em boa-fé afronta indiscutivelmente o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e que, este mesmo princípio, na sua dimensão objetiva, visa garantir um contexto adequado à subsistência do indivíduo. Nesse ponto, o referido princípio da dignidade da pessoa, mormente a necessidade de os Estados garantirem meios de subsistência do indivíduo, pode ser extraído dos artigos 7º, 9º e 11 do “Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais”, do qual o Brasil é signatário e foi promulgado por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992, “in verbis”:
“ACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS
PREÂMBULO
Os Estados Partes do presente Pacto,
Considerando que, em conformidade com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,
Reconhecendo que esses direitos decorrem da dignidade inerente à pessoa humana,
Reconhecendo que, em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o ideal do ser humano livre, liberto do temor e da miséria, não pode ser realizado a menos que se criem condições que permitam a cada um gozar de seus direitos econômicos, sociais e culturais, assim como de seus direitos civis e políticos,
Considerando que a Carta das Nações Unidas impõe aos Estados a obrigação de promover o respeito universal e efetivo dos direitos e das liberdades do homem,
Compreendendo que o indivíduo, por ter deveres para com seus semelhantes e para com a coletividade a que pertence, tem a obrigação de lutar pela promoção e observância dos direitos reconhecidos no presente Pacto,
Acordam o seguinte:
(Omissis)
ARTIGO 7º
Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, que assegurem especialmente:
a) Uma remuneração que proporcione, no mínimo, a todos os trabalhadores:
i) Um salário eqüitativo e uma remuneração igual por um trabalho de igual valor, sem qualquer distinção; em particular, as mulheres deverão ter a garantia de condições de trabalho não inferiores às dos homens e perceber a mesma remuneração que eles por trabalho igual;
ii) Uma existência decente para eles e suas famílias, em conformidade com as disposições do presente Pacto;
b) À segurança e a higiene no trabalho;
c) Igual oportunidade para todos de serem promovidos, em seu trabalho, à categoria superior que lhes corresponda, sem outras considerações que as de tempo de trabalho e capacidade;
d) O descanso, o lazer, a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas, assim como a remuneração dos feridos.
(Omissis)
ARTIGO 9º
Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à previdência social, inclusive ao seguro social.”
(Omissis)
ARTIGO 11
1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como a uma melhoria contínua de suas condições de vida. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para assegurar a consecução desse direito, reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação internacional fundada no livre consentimento.”
(Grifei)
Assim, como o benefício previdenciário substitui, em regra, o rendimento do trabalho, ele visa garantir a subsistência do segurado, tratando-se, portanto, de garantia decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana.
A referida garantia decorre de norma prevista no “Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais”, do qual o Brasil é signatário, aprovado pelo Congresso Nacional com votação da maioria simples e promulgado por meio do Decreto n. 591, de 6 de julho de 1992.
Dessa forma, conforme entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 95.967 e RE 466.343, trata-se de norma supralegal, como segue:
“A esses diplomas internacionais sobre direitos humanos é reservado o lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da CF/1988, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação.” (Grifei)
“Tendo em vista o caráter supralegal desses diplomas normativos internacionais, a legislação infraconstitucional posterior que com eles seja conflitante também tem sua eficácia paralisada.” (Grifei)
De outro lado, a necessidade de devolução estaria amparada no artigo 115, inciso II, da Lei n. 8.213/1991.
Destarte, o caso revela um aparente conflito de normas, que pode ser resolvido por meio de controle de convencionalidade, pelo excelso Supremo Tribunal Federal.
Dessa forma, deixar momentaneamente de aplicar o Tema 979 do STJ não configura desrespeito ao artigo 927, inciso III, do CPC, uma vez que não houve a análise pelo prisma da hierarquia da norma supralegal sobre a norma ordinária.
Assim, até novo pronunciamento da Suprema Corte, deve prevalecer o posicionamento de não devolução dos valores recebidos pelo segurado de boa-fé, ou ainda sem comprovação efetiva de má-fé.
Nesse sentido:
"MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE CONSIDEROU ILEGAL APOSENTADORIA E DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DE VALORES. ACUMULAÇÃO ILEGAL DE CARGOS DE PROFESSOR. AUSÊNCIA DE COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. UTILIZAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA OBTENÇÃO DE VANTAGENS EM DUPLICIDADE (ARTS. 62 E 193 DA LEI N. 8.112/90). MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA. DESNECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS. INOCORRÊNCIA DE DESRESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E AO DIREITO ADQUIRIDO.
1. A compatibilidade de horários é requisito indispensável para o reconhecimento da licitude da acumulação de cargos públicos. É ilegal a acumulação dos cargos quando ambos estão submetidos ao regime de 40 horas semanais e um deles exige dedicação exclusiva.
2. O § 2ºdo art. 193 da Lei n. 8.112/1990 veda a utilização cumulativa do tempo de exercício de função ou cargo comissionado para assegurar a incorporação de quintos nos proventos do servidor (art. 62 da Lei n. 8.112/1990) e para viabilizar a percepção da gratificação de função em sua aposentadoria (art. 193, caput, da Lei n. 8.112/1990). É inadmissível a incorporação de vantagens sob o mesmo fundamento, ainda que em cargos públicos diversos.
3. O reconhecimento da ilegalidade da cumulação de vantagens não determina, automaticamente, a restituição ao erário dos valores recebidos, salvo se comprovada a má-fé do servidor, o que não foi demonstrado nos autos.
4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem-se firmado no sentido de que, no exercício da competência que lhe foi atribuída pelo art. 71, inc. III, da Constituição da República, o Tribunal de Contas da União cumpre os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal quando garante ao interessado - como se deu na espécie - os recursos inerentes à sua defesa plena.
5. Ato administrativo complexo, a aposentadoria do servidor, somente se torna ato perfeito e acabado após seu exame e registro pelo Tribunal de Contas da União.
6. Segurança parcialmente concedida.
(STF , MS 26085, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 07/04/2008, DJe-107 divulg 12-06-2008 public 13-06-2008 ement vol -02323-02 PP-00269 RTJ VOL-00204-03 PP-01165. Grifei)".
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO A MAIOR. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE PELO SEGURADO AO INSS. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSILIDADE. BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RESERVA DE PLENÁRIO. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL.
1. A violação constitucional dependente da análise do malferimento de dispositivo infraconstitucional encerra violação reflexa e oblíqua, tornando inadmissível o recurso extraordinário.
2. O princípio da reserva de plenário não resta violado, nas hipóteses em que a norma em comento (art. 115 da Lei 8.213/91) não foi declarada inconstitucional nem teve sua aplicação negada pelo Tribunal a quo, vale dizer: a controvérsia foi resolvida com a fundamento na interpretação conferida pelo Tribunal de origem a norma infraconstitucional que disciplina a espécie. Precedentes: AI 808.263-AgR, Primeira Turma Rel. Min. LUIZ FUX, DJe de 16.09.2011; Rcl. 6944, Pleno, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Dje de 13.08.2010; RE 597.467-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI Dje de 15.06.2011 AI 818.260-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Dje de 16.05.2011, entre outros.
3. In casu, o acórdão recorrido assentou: “PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. COBRANÇA DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. 1. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. 2. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores recebidos indevidamente pelo segurado, a título de aposentadoria por tempo de contribuição.
4. Agravo regimental desprovido."
(STF, Primeira Turma, AI 849529 AgR, Relator Ministro LUIZ FUX, julg.14.2.2012,DJe 15.3.2012. Grifei.)
“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes.
2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº8.213/1991. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STF, ARE 734242 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015, Grifei)
Por fim, frise-se que esta Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região fixou o entendimento de que, ainda que comprovada a falsidade no processo administrativo de concessão ou revisão do benefício previdenciário, nas hipóteses de não comprovada a má-fé ou participação do segurado beneficiado, a jurisprudência está pacificada quanto à desnecessidade de devolução das parcelas recebidas indevidamente:
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS INDEVIDAMENTE AO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. TEMA 979/STJ. APELAÇÃO DA PARTE RÉ PROVIDA.
1. Cuida-se de ação de ressarcimento ao erário proposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a devolução dos valores recebidos a título de benefício de auxílio-doença, durante o período de 30/05/2008 e 31/12/2009.
2. O assunto foi pacificado no julgamento do REsp 1.381.734/RN, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, no bojo do qual foi cristalizado o Tema 979/STJ "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido".
3. No caso em exame, o INSS deu início a procedimento administrativo de análise da regularidade do benefício de auxílio-doença recebido pelo segurado, em razão de ter sido incluído dentre aqueles enumerados no Anexo do Relatório emanado da Operação Providência, desencadeada pela Polícia Federal, em 11/09/2008, que apurou conluio de médicos peritos com segurados e escritórios de advocacia, para fins de isentar da carência os segurados que pleiteavam os benefícios de incapacidade.
4. Em que pesem os argumentos expendidos pela Autarquia Previdenciária, e muito embora a r. sentença tenha apontado a existência de má-fé do segurado no recebimento do benefício de auxílio-doença, não há provas suficientes nos autos a amparar essa conclusão.
5. Impende considerar que não é possível presumir, automaticamente, que o segurado estivesse atuando por má-fé ao receber o benefício previdenciário, nem tampouco definir um marco temporal a partir do qual teria sido cessada a boa-fé. Da mesma forma, não há como sustentar que a má-fé possa emanar de mera suposição, consignada no sentido de que não seria “crível que o segurado desconhecesse todo o procedimento levado a cabo pela organização criminosa”.
6. No caso, muito embora tenham extraviado o processo de concessão, veio aos autos a cópia do Laudo Médico Pericial, datado de 18/02/2008 que atesta a presença da incapacidade, à época da concessão do auxílio-doença, a qual não foi cabalmente rebatida pelas considerações da Junta Médica Revisional, provavelmente pela ausência de elementos probatórios suficientes, eis que realizou a revisão do benefício somente em 02/07/2012, sem, contudo, localizar os autos do procedimento concessivo.
7. Com efeito, à míngua de prova da ocorrência de má-fé, o C. STJ definiu no precedente obrigatório contido no Tema 979 que é de rigor a aplicação do princípio da irrepetibilidade do benefício, em função da presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração.
8. Além disso, observada a modulação dos efeitos do REsp 1.381.734/RN, mesmo que a boa-fé não tivesse sido demonstrada, a exigência da restituição dos valores não encontraria supedâneo jurídico válido, posto que o C. STJ definiu que a ratio decidendi do Tema 979/STJ deve alcançar tão somente os processos distribuídos após a publicação do acórdão, ocorrida em 23/04/2021.
9. Apelação da parte ré provida.
(TRF/3.ª Região, ApCiv n. 50000021-95.2016.4.03.6114, Relatora Desembargadora Federal LEILA PAIVA, 10.ª Turma, Intimação via sistema 13.5.2022, Grifei)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. INSS. TEMA 979 STJ. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. DEVOLUÇÃO. NÃO CABIMENTO NA ESPÉCIE. VERBA ALIMENTAR. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO.
O E. STJ concluiu o julgamento do REsp. 1.381.734/RN (Tema 979), acerca da "devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social". Houve modulação dos efeitos da decisão, que será aplicada aos processos distribuídos na primeira instância a partir da publicação do acórdão (23/04/2021).
Consoante entendimento do C. Supremo Tribunal Federal, em razão da natureza alimentar dos benefícios previdenciários é inadmissível a pretensão de restituição dos valores pagos aos segurados, em razão do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos.
O recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado ou beneficiário, não é passível de devolução posto que se destinam à sua própria sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
Ressalte-se, por oportuno, que não há indícios de que o segurado tenha agido com o intuito de se locupletar em detrimento do erário público, justificando assim, a inexigibilidade de restituição dos valores recebidos a esse título. Neste ponto, vale dizer que, tendo o próprio réu admitido a falsidade do registro em CTPS, entendo pela presunção de boa-fé do segurado, diante das suas condições socioeconômicas, tratando-se de pessoa que à época do julgamento contava com 76 (setenta e seis) anos de idade.
Além disso, em declarações prestadas junto à Delegacia de Polícia Federal de Bauru/SP, o segurado alegou tais anotações não constavam da CTPS original entregue ao advogado "Ézio Mellilo", e que não havia nenhuma rasura no citado documento.
Assim, de acordo com os elementos dos autos, conclui-se que o ora réu não teve participação na falsificação de sua CTPS, razão pela qual não se pode dizer que agir com má fé.
Vale dizer que a boa-fé se presume, enquanto a má-fé deve ser provada, motivo pelo qual, não demonstrada a ausência de boa-fé do segurado, não prosperam as alegações da Autarquia.
E, ainda que assim não fosse, ressalto que a modulação dos efeitos de que trata o Tema 979, precedente de observância obrigatória, aproveita ao segurado in casu, considerando-se que o presente feito fora distribuído antes do julgamento do acórdão de que trata o tema ora em assunto.
Juízo de retratação negativo. Acórdão mantido (id 250795772 - Pág. 277/278).
(TRF/3.ª Região, ApCiv. n. 0024108-69.2008.4.03.9999, Relator Desembargador Fed. TORU YAMAMOTO, 7.ª Turma, DJe 5.5.2022, Grifei)
Da decadência do direito de o INSS anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários
Com a publicação da Medida Provisória n. 1.523-9, de 27.06.1997, posteriormente convertida na Lei n. 9.528/1997, foi alterada a redação do artigo 103, caput, da Lei n. 8.213/1991, que passou a disciplinar a questão relativa à decadência do direito de o segurado pedir a revisão da renda mensal inicial de seu benefício, já que a legislação que a antecedeu somente tratava da prescrição.
No que tange ao direito da Previdência Social proceder à revisão do valor de benefícios previdenciários, a matéria passou a ser disciplinada pela regra geral estabelecida pela Lei n. 9.784/1999, que regulamenta o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal:
"Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato".
Com a edição da Lei n. 10.839/2004, foi incluído o artigo 103-A na Lei n. 8.213/1991, que disciplinou essa matéria:
"Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato".
Por ocasião do julgamento do Recurso Especial n. 1.114.938, afetado ao rito dos recursos repetitivos (Tema 214), o colendo Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que: os atos administrativos praticados antes da vigência da Lei n. 9.784/1999 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo; após a vigência da mencionada Lei deve ser observado o prazo decadencial de 5 anos; e de que, a partir de 19.11.2003, é de 10 anos o prazo para a revisão dos atos, dos quais decorram efeitos favoráveis aos beneficiários do INSS. Nesse sentido:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.787/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784 /99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei 9.784 /99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784 /99 incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência (01.02.99). Ressalva do ponto de vista do Relator.
2. Antes de decorridos 5 anos da Lei 9.784 /99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários.
3. Tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato.
4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5a. Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor".
(STJ, REsp 1.114.938, Terceira Seção, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 2.8.2010)
Dos honorários advocatícios em sentença ilíquida
A verba honorária de sucumbência deve incidir sobre o valor da condenação. Nos termos do julgamento do Tema Repetitivo n. 1105, deverá ser observada a Súmula n. 111 do colendo Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidirão sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença ou, na hipótese de a pretensão do segurado somente ser deferida em sede recursal, não incidirão sobre as parcelas vencidas após a prolação da decisão ou acórdão.
Conforme o Código de Processo Civil de 2015, sendo parte a Fazenda Pública e ilíquida a sentença, deve-se adotar o previsto no seu artigo 85, § 4º, inciso II, que determina a fixação dos honorários por ocasião da liquidação do julgado, ou seja, no cumprimento de sentença:
"Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(Omissis)
§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:
(Omissis)
§ 4º Em qualquer das hipóteses do § 3.º:
(Omissis)
II -Não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando liquidado o julgado;"
Frise-se que, ao julgar o REsp 1.865.553/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema n. 1059), o colendo Superior Tribunal de Justiça firmou a seguinte tese jurídica:
“A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação”.
Dessa forma, na hipótese de recurso da parte vencida em primeiro grau e o recurso não ser provido ou não ser conhecido neste Tribunal (segundo grau), restará configurada hipótese que autoriza a majoração dos honorários de sucumbência, cabendo ao Juízo de origem, no momento da liquidação, levá-la em consideração na sua fixação.
Outrossim, cumpre destacar a orientação jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de Justiça, conforme decidido nos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial EAREsp n. 1.847.842/PR, no sentido “de que são incabíveis honorários recursais no recurso interposto pela parte vencedora para ampliar a condenação, pela própria redação do art. 85, § 11, do CPC/2015”. No mesmo julgado, também elucida “O descabimento da fixação de honorários advocatícios recursais em recurso da parte vencedora para ampliar a condenação, rejeitado, não provido ou não conhecido decorre do teor do art. 85, § 11, do CPC/2015” e o “descabimento de majoração de honorários quando inexistente prévia fixação de verba honorária em desfavor da parte recorrente na origem”.
De outro lado, é importante salientar que, na hipótese de provimento do recurso de apelação da parte vencida no primeiro grau de jurisdição, caberá apenas a inversão dos honorários advocatícios, sem majoração do percentual.
Ademais, quando o recurso interposto pela própria parte vencedora no primeiro grau, não há que se cogitar em majoração dos honorários advocatícios, pois ela, já vencedora, é quem está provocando a instância superior.
Segundo esta Décima Turma, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado por ocasião da liquidação do julgado, observando-se o disposto no artigo 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no artigo 86, todos do Código de Processo Civil. Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. AUTORAS ABSOLUTAMENTE INCAPAZES. TERMO INICIAL MANTIDO NA DATA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. CONSECTÁRIOS LEGAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS DE OFÍCIO.
(Omissis)
4. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do Código de Processo Civil, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
5. Deve aplicar-se, também, a majoração dos honorários advocatícios, prevista no artigo 85, §11, do Código de Processo Civil, observados os critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
6. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os consectários legais e os honorários advocatícios."
(TRF 3ª Região, ApCiv 0001190-50.2016.4.03.6003, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, DJEN 20/8/2024)
Do caso dos autos
Conforme mencionado, o INSS alega, preliminarmente, a obrigatoriedade de remessa oficial por tratar-se de sentença ilíquida, a irregularidade praticada por seu ex-servidor na concessão administrativa do benefício do autor, do qual pretende o ressarcimento da dívida de R$ 562.712,00, independentemente do recebimento de boa-fé. No mérito, aduz que os pedidos do segurado de reconhecimento de exercício de atividades especiais, nos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e de 14.10.1996 a 1º.1.2004, e o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição seja julgado totalmente improcedente, em razão da ausência de comprovação da exposição a agentes nocivos e da necessidade de observância das disposições transitórias da Emenda Constitucional n. 20/1998. Alega, ainda, ser vedada a concessão de benefício sem prévia fonte de custeio.
No recurso de apelação adesivo (Id 136281194), a parte autora requer que, sendo mantida a condenação, conste expressamente o restabelecimento do benefício com data de início do pagamento fixado na data do requerimento administrativo (2.1.2004), ou, ao menos, a partir da cessação administrativa (1º.10.2017), bem como reconhecido o direito à opção pelo cálculo do benefício mais vantajoso, caso se reconheça o direito adquirido à concessão antes do advento da Emenda Constitucional n. 20/1998. Por fim, requer que, sendo mantida a condenação, seja observado o interesse econômico (R$ 562.712,02), fixando-se, então, a condenação de honorários advocatícios no percentual de 15% sobre o valor da causa, devidamente corrigido por índice oficial, já que o benefício foi cessado em 1º.10.2017 e restabelecido em 1º.12.2017.
Inicialmente, observo que não há que se falar em decadência do direito de o INSS rever administrativamente a concessão do benefício, uma vez que o benefício da parte autora, apesar de concedido em 2.1.2004, foi objeto de revisão administrativa pelo INSS, iniciada em 24.11.2006, em razão de suspeita de irregularidade cometida na concessão, oriunda da apreensão que deu origem ao IPL 14-0604/05. Contudo, conforme o próprio INSS alega em seu recurso, a irregularidade foi praticada por seu ex-servidor, sem comprovar indícios da participação do segurado, de modo que, sem prova em contrário, o segurado recebeu os valores de boa-fé, razão pela qual, conforme exposto, não há necessidade de devolução dos valores recebidos.
Ademais, cabe destacar que o Tema 979, precedente de observância obrigatória, em sua modulação de efeitos, esclarece que a decisão só será aplicada aos processos distribuídos na primeira instância a partir da publicação do acórdão (23.4.2021). Assim, aproveita-se ao segurado o fato de que o presente feito foi distribuído antes do julgamento do acórdão de que trata o referido Tema, devendo ser declarada inexigível a restituição da quantia de R$ 562.712,02.
Da análise dos autos, constata-se que já houve reconhecimento administrativo do exercício da atividade especial no período de 1º.3.1982 a 13.10.1996, desempenhado junto ao "Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Itú - SAAE/ITÚ" (Id 136281141 p. 142 e 153-167). Apesar disso, houve também o reconhecimento do mesmo período na sentença do juízo de primeiro grau (Id 136281182), restando ele incontroverso.
Quanto aos períodos controvertidos, acerca dos quais se discute a respeito do reconhecimento da atividade exercida em condições especiais, passo à análise:
Período: 1º.5.1976 a 30.11.1981.
Empregador: Irmãos Servezão & Cia LTDA.
Função: Serviços Gerais - Setor de Pintura (Id 136281141, p. 114).
Provas: Registro no CTPS (Id 136281138, p. 1-18) e Perfil Profissiográfico Previdenciário emitido em 6.6.2017 e o Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (Id 136281141, p. 120-121 e p. 123-134).
Agentes nocivos: Hidrocarbonetos aromáticos; agentes químicos - tintas e solventes (Id 136281141, p. 120-134)
Enquadramento/Norma: código 1.2.10 do anexo III do Decreto 83.080/1979.
Assim, como a atividade é exercida pelo segurado dentro do setor de pinturas, há a exposição dele aos "odores" e "vapores" de solventes, vernizes e tintas, razão pela qual a atividade exercida em condições especiais no período pode se dar por enquadramento no código 1.2.10 do anexo III do Decreto n. 83.080/1979, que dispõe: "Fabricação de solventes para tintas, lacas e vernizes, contendo benzol, toluol e xilol".
Outrossim, o PPP e o LTCAT, referente ao período trabalhado na empresa "Irmãos Servezão & Cia Ltda.", demonstram que a parte autora, apesar de registrada na função de serviços gerais, trabalhou por todo o período no setor de pintura, tendo como principais atividades as de auxiliar na pintura de ônibus, realizar solda oxiacetileno e elétrica, de forma habitual e permanente e, ainda, auxiliar na manutenção mecânica.
Comprovado, assim, que a parte autora trabalhou, por todo o referido período, exposta aos agentes nocivos hidrocarbonetos aromáticos e agentes químicos (tintas e solventes), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades.
Período: 14.10.1996 a 1º.1.2004.
Empregador: Serviço Autônomo de Água e Esgoto - SAAE/ITÚ.
Função: Operador de Estação de Tratamento de Água.
Provas: Registro no CTPS (Id 136281139, p. 1-16) e Perfil Profissiográfico Previdenciário e Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (Id 136281141, p. 19-50).
Agentes nocivos: agentes químicos como sulfato de alumínio, hipoclorito de sódio, ácido fluossilícico, ácidos fortes, bases fortes e sais tais como: ortotoluidina, arsenito de sódio, cloreto de potássio, azul de bromotimol vermelho fenol, ácido zircônio, alizarina, ácido sulfúrico, fenolfitaleína metil orange, permanganato de potássio, acetona e ácido clorídrico (Id 136281141, p. 19-50).
Enquadramento/Norma: código 1.0.19 do Decreto n. 2.172/1997, código 1.0.19 do anexo IV do Decreto n. 3.048/1999, Decreto n. 4.882/2003.
O PPP e o LTCAT, referentes ao período trabalhado na empresa SAAE de Itú, demonstram que a parte autora trabalhou, por todo o referido período, de forma habitual e permanente, exposta aos agentes químicos nocivos acima citados, devendo também ser reconhecida a natureza especial das atividades.
Ressalto que, conforme exposto e pacificado na jurisprudência, a utilização de EPI, no caso, não é capaz de anular ou neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo.
Ademais, os próprios laudos ambientais, constantes da p. 37 do Id 136281141, afirmam que não utilizam o EPI com a frequência necessária e na p. 124 do referido Id, afirmam que, apesar do fornecimento do EPI, ele não é utilizado.
Cabe frisar que, em se tratando de agentes químicos, biológicos, entre outros, pode-se dizer que a variedade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária, uma vez que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, a utilização é intermitente. Nesse sentido, o precedente desta Corte: TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5223978-87.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, julgado em 09/03/2022, Intimação via sistema DATA: 11/03/2022.
Salienta-se que esta Corte considera perfeitamente válido para reconhecer tempo de trabalho sob condições especiais documentos extemporâneos, desde que hábeis a comprovar a exposição a agentes nocivos.
Destarte, como descrito anteriormente, também não prospera a alegação do INSS de necessidade fonte de custeio para o reconhecimento de exercício da atividade em condições especiais, razão pela qual o recurso de apelação do INSS não merece ser provido.
Em razão do acima exposto, considerando-se os períodos de trabalho reconhecidos como especiais, convertendo-os em tempo comum, tem-se que, na mesma data, 2.1.2004, data da DER (Id 136281141, p. 14), o autor contabilizava 38 anos, 7 meses e 19 dias de tempo de contribuição, sendo o suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, conforme planilha que segue:
Assim, conforme fundamentado acima, resta devidamente comprovado que a parte autora, nos períodos controversos, laborava exposta a agentes nocivos, de forma habitual e permanente, sendo de rigor o reconhecimento como atividade especial dos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e de 14.10.1996 a 1.º.1.2004. Em consequência, constata-se que a parte autora já tinha direito à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional (30 anos - coeficiente 76%) antes do advento da Emenda Constitucional n. 20/1998 e, na data do requerimento administrativo (2.1.2004), a parte autora fazia jus à aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Por fim, quanto ao recurso adesivo da parte autora, a matéria devolvida refere-se à data do início do pagamento (data do requerimento administrativo ou data da cessação administrativa), direito à opção pelo benefício mais vantajoso (aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, com renda mensal inicial obtida pelos critérios anteriores à EC n. 20/1998, ou aposentadoria por tempo de contribuição integral em 2.1.2004) e base de cálculos dos honorários advocatícios.
No tocante à data do início do pagamento, é necessário verificar se os documentos que serviram de base para o reconhecimento da especialidade (PPPs) foram apresentados pela parte por ocasião do requerimento administrativo do benefício. Os documentos analisados, que permitiram o reconhecimento da especialidade, encontram-se no Id 136281141, ou seja, foram apresentados pelo segurado por ocasião do pedido da concessão do benefício.
Dessa forma, a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral pode retroagir à data do requerimento administrativo (DER), em 2.1.2004, ficando assegurada a opção pela aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, com renda mensal inicial obtida pelos critérios anteriores à EC n. 20/1998, caso lhe seja mais vantajosa. Eventuais diferenças deverão ser apuradas, deduzindo-se os valores já recebidos, observando-se a prescrição quinquenal quanto aos efeitos financeiros, acrescidas de juros de mora e correção monetária de acordo com as disposições do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
No tocante à base de cálculo dos honorários advocatícios, verifico que a não devolução da quantia pretendida pelo INSS (R$ 562.712,00) deu-se também em razão do reconhecimento judicial da especialidade do labor de períodos analisados nesta ação, a ser liquidada. Assim, entendo adequados os parâmetros fixados na sentença, também por um juízo de equidade para o caso concreto.
Tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no artigo 85, § 3º, § 4º, II do CPC e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
Ante o exposto, nos termos da fundamentação, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação adesiva da parte autora, para:
a) reconhecer a especialidade das condições de trabalho nos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e 14.10.1996 a 1º.1.2004;
b) confirmando a tutela concedida em sede do agravo de instrumento n. 5022089-14.2017.4.03.0000 para manter o restabelecimento do benefício (NB 42/131.543.519-2) e, por consequência, declarar inexigível a restituição almejada pela autarquia;
c) efetuar o recálculo do benefício NB 42/131.543.519-2, na espécie aposentadoria por tempo de contribuição integral, considerando os períodos especiais reconhecidos, com data de início do benefício na DER (2.1.2004);
d) efetuar o recálculo do benefício NB 42/131.543.519-2, na espécie aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, considerando os períodos especiais reconhecidos, com data de início do benefício no dia anterior à vigência da EC n. 20/1998;
e) conferir ao segurado o direito de opção pelo benefício mais vantajoso, pagando-se as eventuais diferenças, acrescidas de juros de mora e correção monetária de acordo com as disposições do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, com a dedução dos valores já recebidos e observância da prescrição quinquenal; e
f) o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no artigo 85, § 3º, § 4º, II do CPC e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ)
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. IRREGULARIDADE NA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. INOCORRÊNCIA. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. AGENTES QUÍMICOS. COMPROVADA. INEXIGIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DE VALORES AO INSS. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, levar-se em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos n. 53.831/64 e n. 83.080/79, até 5.3.1997 e, após, pelos Decretos n. 2.172/97 e n. 3.048/99. O agente nocivo deve, em regra ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade. Em se tratando de agentes químicos, biológicos, entre outros, a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, geralmente a utilização é intermitente. Precedentes.
2. A questão em discussão consiste em verificar (i) se houve irregularidade na concessão administrativa do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição; (ii) se deve ser reconhecida a especialidade das condições de trabalho nos períodos de 1.5.1976 a 30.11.1981 e 14.10.1996 a 1.º.1.2004; (iii) se o benefício deve ser restabelecido; e (iv) se deve ser declarada a inexigibilidade da dívida alegada pela autarquia.
3. Reconhecimento de atividade especial nos períodos de 1º.5.1976 a 30.11.1981 e 14.10.1996 a 1.º.1.2004 e confirmação do restabelecimento do benefício (NB 42/131.543.519-2), determinado no agravo de instrumento n. 5022089-14.2017.4.03.0000 e, por consequência, declarar inexigível a restituição almejada pela autarquia.
4. Preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição proporcional em data anterior à vigência da Emenda Constitucional n. 20/1998, bem como concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, na data da DER. Direito de opção do segurado pelo benefício mais vantajoso.
5. Eventuais diferenças, acrescidas de juros de mora e correção monetária de acordo com as disposições do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, com a dedução dos valores já recebidos e observância da prescrição quinquenal.
6. Em sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no artigo 85, § 3º, § 4º, II e § 11 e no artigo 86, todos do CPC e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
7. Apelação do INSS não provida. Apelação adesiva da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
