Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000531-43.2018.4.03.6113
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
28/03/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 02/04/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. SAPATEIRO E OUTRAS
CORRELATAS. PROFISSÕES SEM PREVISÃO NOS DECRETOS. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DA ESPECIALIDADE. PEDIDO IMPROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E DESPROVIDA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria especial ou
aposentadoria por tempo de contribuição, após reconhecimento dos lapsos especiais vindicados.
- À parte autora interessada cabe a devida comprovação da veracidade dos fatos constitutivos de
seu direito, por meio de prova suficiente e segura, nos termos do artigo 373, I, do NCPC.
- A fim de demonstrar a natureza especial do labor desenvolvido, deveria ter carreado
documentos aptos certificadores das condições insalubres em que permaneceu exposta, com
habitualidade e permanência, como formulários padrão e laudos técnicos individualizados,
cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o deferimento de prova pericial para
confrontação do material reunido à exordial.
- Compete ao juiz a condução do processo, cabendo-lhe apreciar a questão de acordo com o que
está sendo debatido. Dessa forma, o juiz não está obrigado a decidir a lide conforme pleiteado
pelas partes, mas, sim, conforme seu livre convencimento fundado em fatos, provas,
jurisprudência, aspectos ligados ao tema e legislação que entender aplicável ao caso.
- Assim, por ser o Magistrado o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir a necessidade
de novas provas. Precedentes.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Desnecessária a produção de laudo pericial, pois o conjunto probatório é suficiente para o
deslinde das questões trazidas a julgamento. Matéria preliminar rejeitada.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- Em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo
28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e
conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
- Até a entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n.
9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de
laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário
preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições
prejudiciais. Contudo, para o agente agressivo o ruído, sempre houve necessidade da
apresentação de laudo técnico.
- Nesse particular, a posição que estava sendo adotada era de que o enquadramento pela
categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a
entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, diante da jurisprudência majoritária,
a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o
enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n.
9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997. Nesse sentido: Recurso
Especial n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, do C. STJ.
- Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
- Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
- Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- Sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou
não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de
preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à
real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
- No caso, contudo, em relação aos interstícios controversos, a pretensão é incabível. As
atividades de sapateiro e outras relacionadas às indústrias calçadistas, a despeito de ostentar
certa carga insalubre, em virtude da exposição a agentes nocivos inerentes à profissão, como
"cola de sapateiro" (hidrocarboneto tóxico), não encontram previsão nos Decretos n. 53.831, de
25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979.
- Em virtude das atividades exercidas em empresas de calçados não constarem da legislação
especial, sua natureza especial deve ser comprovada.
- Na hipótese, entretanto, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca
quando instruiu a peça inicial, qual seja: carrear prova documental descritiva das condições
insalubres às quais permaneceu exposta no ambiente laboral, como formulários padrão e laudo
técnico individualizado ou PPP.
- Quanto aos períodos de 16/5/1984 a 21/7/1987 e de 21/9/1987 a 31/10/2000, vale destacar que
os perfis profissiográficos apresentados não indicam "fator de risco" algum passível de
consideração como de natureza especial às atividades executadas, consoante denota a
célula'15.3' dos aludidos documentos.
- Da mesma forma não prospera a contagem diferenciada do intervalo de 2/10/2006 a
13/12/2012, justamente porque o perfil profissiográfico coligido aos autos, além de apontar a
exposição a ruído abaixo (80,6 decibéis) do limite estabelecido em lei à época (85 decibéis),
indica que não foi verificada a presença de agentes químicos (tolueno e xileno) e nem biológicos.
- Aplica-se a mesma circunstância ao lapso de 1º/6/2013 a 15/10/2014, tendo em vista que o PPP
apresentado informa a exposição a ruído inferior (79,1 decibéis) aos limites legais.
- O laudo pericial, encomendado pelo Sindicato dos Empregados nas Indústrias de Calçados de
Franca/SP, não se mostra apto a atestar as condições prejudiciais do obreiro nas funções
alegadas, com permanência e habitualidade, por reportar-se, de forma genérica, às indústrias de
calçados de Franca, sem enfrentar as especificidades do ambiente de trabalho de cada uma
delas. Em suma, trata-se de documento que não traduz, com fidelidade, as reais condições
vividas individualmente, à época, pela parte autora nos lapsos debatidos.
- Desse modo, a parte autora não faz jus aos benefícios de aposentadoria especial e de
aposentadoria por tempo de contribuição.
- Mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado,
arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da
fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça
gratuita.
- Pedido improcedente. Sentença mantida.
- Apelação da parte autora conhecida e desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000531-43.2018.4.03.6113
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARIA INES FELICIO
Advogado do(a) APELANTE: ALINE DE OLIVEIRA PINTO E AGUILAR - SP238574-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELAÇÃO (198) Nº 5000531-43.2018.4.03.6113
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARIA INES FELICIO
Advogado do(a) APELANTE: ALINE DE OLIVEIRA PINTO E AGUILAR - SP238574-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço
especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de
contribuição, além de indenização por dano moral.
A r. sentença julgou improcedente o pedido.
Inconformada, a parte autora interpôs apelação, na qual, preliminarmente, suscita a ocorrência de
cerceamento do direito de defesa, haja vista o indeferimento da realização de perícia técnica e
produção de prova testemunhal; na questão de fundo, exora a procedência integral dos pedidos
arrolados na inicial.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5000531-43.2018.4.03.6113
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARIA INES FELICIO
Advogado do(a) APELANTE: ALINE DE OLIVEIRA PINTO E AGUILAR - SP238574-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
Em resposta ao inconformismo da autora, não visualizo o alegado cerceamento de defesa.
À parte autora interessada cabe a devida comprovação da veracidade dos fatos constitutivos de
seu direito, por meio de prova suficiente e segura, nos termos do artigo 373, I, do NCPC.
Nesse passo, a fim de demonstrar a natureza especial do labor desenvolvido no lapso vindicado,
deveria a parte suplicante ter carreado documentos aptos certificadores das condições insalubres
em que permaneceu exposta, com habitualidade e permanência, como formulários padrão e
laudos técnicos individualizados, cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o
deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial.
Com efeito, compete ao juiz a condução do processo, cabendo-lhe apreciar a questão de acordo
com o que está sendo debatido. Dessa forma, o juiz não está obrigado a decidir a lide conforme
pleiteado pelas partes, mas, sim, conforme seu livre convencimento fundado em fatos, provas,
jurisprudência, aspectos ligados ao tema e legislação que entender aplicável ao caso.
Assim, por ser o Magistrado o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir a necessidade
de novas provas.
A respeito, os seguintes julgados:
"AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL NÃO ADMITIDO. CERCEAMENTO DE
DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO. O julgador não está obrigado a decidir de acordo com
as alegações das partes, mas sim, mediante a apreciação dos aspectos pertinentes ao
julgamento, de acordo com o seu livre convencimento, sendo certo que "não há que se falar em
cerceamento de defesa, por ausência de prova pericial, se o Acórdão recorrido demonstra que a
matéria dependia de interpretação do contrato" (Resp nº 184.539/SP, 3ª Turma, de minha
relatoria, DJ de 06/12/99). Ademais, "a necessidade de produção de determinadas provas
encontra-se submetida ao princípio do livre convencimento do juiz, em face das circunstâncias de
cada caso" (AgRgAg nº 80.445/SP, 3ª Turma, Relator o Senhor Ministro Claudio Santos, DJ de
05/02/96). Agravo regimental desprovido." (STJ - AGEDAG - agravo regimental nos Embargos de
Declaração no AG 441850 - Processo 200200276709/SP - Terceira Turma - Relator Min.
CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ de 28/10/2002, p. 315)
"PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE URBANA.
PROVA. TERMO INICIAL. CUSTAS PROCESSUAIS. O acesso ao Poder Judiciário não está
condicionado ao prévio percurso das vias administrativas. É de se reconhecer como tempo de
serviço aquele comprovado mediante início razoável de prova material corroborada por robusta
prova testemunhal. III- Na apreciação da prova, prevalece o princípio do LIVRE
CONVENCIMENTO DO JUIZ, nos termos do disposto no artigo 130, do CPC. IV- O INSS, por se
tratar de Autarquia Federal, é isento de custas processuais e o autor foi beneficiário da justiça
gratuita. Recurso ex officio e apelação do INSS parcialmente providos". (TRF 3ª Região, AC
29069, j. em 17/10/2000, v.u., DJ de 28/03/2001, pág. 8, Rel. Des. Fed. ARICE AMARAL)
"PROCESSO CIVIL. PROVA. ART. 130 DO CPC-73. PERÍCIA. PRECLUSÃO. 1. Na direção do
processo, cabe ao juiz formular juízo de valor quanto à pertinência das provas necessárias à sua
instrução. Inteligência do art. 130 do CPC-73. 2. Inexiste cerceamento de defesa, se a própria
agravante não demonstra, de forma explícita, a finalidade da perícia." (TRF 4ª Região, AG
95.04518460, Juiz VLADIMIR FREITAS, DJ, 19/03/1997, p. 16030)
Outrossim, desnecessária a produção de laudo pericial, pois o conjunto probatório é suficiente
para o deslinde das questões trazidas a julgamento.
Ademais, a decisão judicial está suficientemente fundamentada e atende ao princípio do livre
convencimento do juiz, sem qualquer vício formal que justifique sua anulação.
Ressalte-se, a propósito, não se prestar à comprovação do alegado direito a prova testemunhal,
visto que a constatação da existência de agentes nocivos a caracterizar a natureza especial da
atividade laborativa opera-se por meio de prova eminentemente documental (técnica).
Dessa forma, rejeito a matéria preliminar.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento
e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
ESPECIAL EM COMUM. AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO AO PERÍODO TRABALHADO.
1. Com as modificações legislativas acerca da possibilidade de conversão do tempo exercido em
atividades insalubres, perigosas ou penosas, em atividade comum, infere-se que não há mais
qualquer tipo de limitação quanto ao período laborado, ou seja, as regras aplicam-se ao trabalho
prestado em qualquer período, inclusive após 28/05/1998. Precedente desta 5.ª Turma.
2. Recurso especial desprovido."
(STJ; REsp 1010028/RN; 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz; julgado em 28/2/2008; DJe
7/4/2008)
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, ressalto que vinha adotando a posição de que o enquadramento pela categoria
profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a entrada em
vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, verifico que a jurisprudência majoritária, a qual
passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o
enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n.
9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n.
83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento
da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu
nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Contudo, no caso em tela, em relação aos interstícios controversos, de 16/5/1984 a 21/7/1987
(auxiliar sapateira – “Calçados Terra S.A.”), de 21/9/1987 a 31/10/2000 (ajudante fabricaçãode
calçados, pespontadeira e auxiliar de escritório - “Calçados Terra S.A”, atual “Alpargatas S/A”), de
2/5/2001 a 5/6/2003 (auxiliar administrativo – “Francajel Calçados Ltda. – ME”), de 16/2/2004 a
22/12/2005 (auxiliar de escritório – “Gerson Eurípedes Rodrigues & Cia. Ltda. – ME”), de
2/10/2006 a 13/10/2012 (auxiliar de produção – “Aparecida Maria Rodrigues Pesponto – ME”) e
de 1º/6/2013 a 15/10/2014 (pespontadeira – “F1000 Indústria de Calçados Ltda- ME”), a
pretensão é incabível.
Isso porque, de início, as atividades de sapateiro e outras relacionadas às indústrias calçadistas,
a despeito de ostentar certa carga insalubre, em virtude da exposição a agentes nocivos
inerentes à profissão, como "cola de sapateiro" (hidrocarboneto tóxico), não encontram previsão
nos Decretos n. 53.831, de 25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979.
Desse modo, em virtude das atividades exercidas em empresas de calçados não constarem da
legislação especial, sua natureza especial deve ser comprovada.
Na hipótese, entretanto, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca
quando instruiu a peça inicial, qual seja: carrear prova documental descritiva das condições
insalubres às quais permaneceu exposta no ambiente laboral, como formulários padrão e laudo
técnico individualizado ou PPP.
Com efeito, quanto aos períodos de 16/5/1984 a 21/7/1987 e de 21/9/1987 a 31/10/2000, vale
destacar que os perfis profissiográficos apresentados (ID 7217553 – págs. 4/5) não indicam "fator
de risco" algum passível de consideração como de natureza especial às atividades executadas,
consoante denota a célula'15.3' dos aludidos documentos.
Da mesma forma não prospera a contagem diferenciada do intervalo de 2/10/2006 a 13/12/2012,
justamente porque o perfil profissiográfico coligido aos autos (ID 7217553 – págs. 9/10), além de
apontar a exposição a ruído abaixo (80,6 decibéis) do limite estabelecido em lei à época (85
decibéis), indica que não foi verificada a presença de agentes químicos (tolueno e xileno) e nem
biológicos.
Aplica-se a mesma circunstância ao lapso de 1º/6/2013 a 15/10/2014, tendo em vista que o PPP
apresentado (ID 7217577 – págs. 4/5) informa a exposição a ruído inferior (79,1 decibéis) aos
limites legais.
Ressalte-se que o laudo pericial, encomendado pelo Sindicato dos Empregados nas Indústrias de
Calçados de Franca/SP, não se mostra apto a atestar as condições prejudiciais do obreiro nas
funções alegadas, com permanência e habitualidade, por reportar-se, de forma genérica, às
indústrias de calçados de Franca, sem enfrentar as especificidades do ambiente de trabalho de
cada uma delas. Em suma, trata-se de documento que não traduz, com fidelidade, as reais
condições vividas individualmente, à época, pela parte autora nos lapsos debatidos.
Em síntese, não prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial de nenhuma das
atividades executadas nos interregnos pleiteados.
Nessas circunstâncias, a parte autora não conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade
especial e, desse modo, não faz jus ao benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo
57 e parágrafos da Lei n. 8.213/91.
Igualmente, a demandante não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição,
porquanto ausentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/91 e 201, § 7º, inciso I, da
Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/98.
Irretorquível é, pois, o julgado a quo.
Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica
suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da
justiça gratuita.
Diante do exposto conheço da apelação da parte autora, rejeito a matéria preliminar e, no mérito,
nego-lhe provimento.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. SAPATEIRO E OUTRAS
CORRELATAS. PROFISSÕES SEM PREVISÃO NOS DECRETOS. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DA ESPECIALIDADE. PEDIDO IMPROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E DESPROVIDA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria especial ou
aposentadoria por tempo de contribuição, após reconhecimento dos lapsos especiais vindicados.
- À parte autora interessada cabe a devida comprovação da veracidade dos fatos constitutivos de
seu direito, por meio de prova suficiente e segura, nos termos do artigo 373, I, do NCPC.
- A fim de demonstrar a natureza especial do labor desenvolvido, deveria ter carreado
documentos aptos certificadores das condições insalubres em que permaneceu exposta, com
habitualidade e permanência, como formulários padrão e laudos técnicos individualizados,
cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o deferimento de prova pericial para
confrontação do material reunido à exordial.
- Compete ao juiz a condução do processo, cabendo-lhe apreciar a questão de acordo com o que
está sendo debatido. Dessa forma, o juiz não está obrigado a decidir a lide conforme pleiteado
pelas partes, mas, sim, conforme seu livre convencimento fundado em fatos, provas,
jurisprudência, aspectos ligados ao tema e legislação que entender aplicável ao caso.
- Assim, por ser o Magistrado o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir a necessidade
de novas provas. Precedentes.
- Desnecessária a produção de laudo pericial, pois o conjunto probatório é suficiente para o
deslinde das questões trazidas a julgamento. Matéria preliminar rejeitada.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- Em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo
28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e
conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
- Até a entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n.
9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de
laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário
preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições
prejudiciais. Contudo, para o agente agressivo o ruído, sempre houve necessidade da
apresentação de laudo técnico.
- Nesse particular, a posição que estava sendo adotada era de que o enquadramento pela
categoria profissional no rol dos Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 também era possível até a
entrada em vigor do referido Decreto n. 2.172/97. Entretanto, diante da jurisprudência majoritária,
a qual passo a adotar, tanto nesta Corte quanto no e. STJ, assentou-se no sentido de que o
enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n.
9.032/95). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997. Nesse sentido: Recurso
Especial n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, do C. STJ.
- Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
- Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
- Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em
regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a
nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- Sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou
não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de
preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à
real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
- No caso, contudo, em relação aos interstícios controversos, a pretensão é incabível. As
atividades de sapateiro e outras relacionadas às indústrias calçadistas, a despeito de ostentar
certa carga insalubre, em virtude da exposição a agentes nocivos inerentes à profissão, como
"cola de sapateiro" (hidrocarboneto tóxico), não encontram previsão nos Decretos n. 53.831, de
25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979.
- Em virtude das atividades exercidas em empresas de calçados não constarem da legislação
especial, sua natureza especial deve ser comprovada.
- Na hipótese, entretanto, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca
quando instruiu a peça inicial, qual seja: carrear prova documental descritiva das condições
insalubres às quais permaneceu exposta no ambiente laboral, como formulários padrão e laudo
técnico individualizado ou PPP.
- Quanto aos períodos de 16/5/1984 a 21/7/1987 e de 21/9/1987 a 31/10/2000, vale destacar que
os perfis profissiográficos apresentados não indicam "fator de risco" algum passível de
consideração como de natureza especial às atividades executadas, consoante denota a
célula'15.3' dos aludidos documentos.
- Da mesma forma não prospera a contagem diferenciada do intervalo de 2/10/2006 a
13/12/2012, justamente porque o perfil profissiográfico coligido aos autos, além de apontar a
exposição a ruído abaixo (80,6 decibéis) do limite estabelecido em lei à época (85 decibéis),
indica que não foi verificada a presença de agentes químicos (tolueno e xileno) e nem biológicos.
- Aplica-se a mesma circunstância ao lapso de 1º/6/2013 a 15/10/2014, tendo em vista que o PPP
apresentado informa a exposição a ruído inferior (79,1 decibéis) aos limites legais.
- O laudo pericial, encomendado pelo Sindicato dos Empregados nas Indústrias de Calçados de
Franca/SP, não se mostra apto a atestar as condições prejudiciais do obreiro nas funções
alegadas, com permanência e habitualidade, por reportar-se, de forma genérica, às indústrias de
calçados de Franca, sem enfrentar as especificidades do ambiente de trabalho de cada uma
delas. Em suma, trata-se de documento que não traduz, com fidelidade, as reais condições
vividas individualmente, à época, pela parte autora nos lapsos debatidos.
- Desse modo, a parte autora não faz jus aos benefícios de aposentadoria especial e de
aposentadoria por tempo de contribuição.
- Mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado,
arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da
fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça
gratuita.
- Pedido improcedente. Sentença mantida.
- Apelação da parte autora conhecida e desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação da parte autora, rejeitar a matéria preliminar e, no
mérito, negar-lhe provimento. A Juíza Federal Convocada Vanessa Mello acompanhou o Relator
com ressalva de entendimento pessoal
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
