D.E. Publicado em 27/10/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação do réu e dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | Sergio do Nascimento:10045 |
Nº de Série do Certificado: | 21A6990315D5226FF0236A88720B6E2B |
Data e Hora: | 18/10/2016 16:57:46 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000705-95.2014.4.03.6140/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial e apelações interpostas pelas partes em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a reconhecer e averbar como tempo especial o intervalo de 01.01.2012 a 30.10.2012, por exposição nociva a ruído. Sem condenação em honorários advocatícios, face à sucumbência recíproca. Sem custas.
Em suas razões de inconformismo recursal, o autor pugna, em suma, pela concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, uma vez que esteve exposto a agente físico ruído nos períodos de 24.09.1986 a 05.04.1991 e 13.07.1999 a 06.2013.
Por outro lado, o réu, em sede de apelação, insurge-se contra o reconhecimento da especialidade do período de 01.01.2012 a 30.10.2012, aduzindo a necessidade de apresentação de Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho para comprovação de exposição a ruído. Defende, ainda, que a utilização de Equipamento de Proteção Individual protege o obreiro contra danos não-auditivos. Prequestiona a matéria para acesso às instâncias recursais superiores.
Com apresentação de contrarrazões apenas pela parte autora (fls. 210/214), vieram os autos esta Corte.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | Sergio do Nascimento:10045 |
Nº de Série do Certificado: | 21A6990315D5226FF0236A88720B6E2B |
Data e Hora: | 18/10/2016 16:57:39 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000705-95.2014.4.03.6140/SP
VOTO
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 24.12.1962 (fl. 16), o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas no período de 24.09.1986 a 05.04.1991 e 13.07.1999 a 06.2013, por exposição a agentes nocivos, bem como a conversão do tempo de atividade especial em comum com aplicação do respectivo fator de conversão. Consequentemente, pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com data inicial do benefício em 06.11.2012 (data do requerimento administrativo - fl. 45).
Inicialmente, importa anotar que o INSS reconheceu administrativamente o exercício de atividade especial no intervalo de 24.09.1986 a 05.04.1991, conforme memória de cálculo de fls. 72/74, restando, pois, incontroverso.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Ressalta-se que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
No caso em tela, consoante se verifica do Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 24/28, o requerente trabalhou na empresa Autoneum Brasil Têxteis Acústico Ltda. e esteve exposto as seguintes agentes: (i) 13.07.1999 a 31.05.2003, a calor de 23,6 IBUTG e a ruído de 89dB(A); (ii) de 01.06.2003 a 31.03.2005: ruído de 83dB(A) e a agentes químicos (chumbo, cádmio, graxas, óleos minerais, thinner e solventes); (iii) de 01.04.2005 a 31.01.2007: a ruído de 83dB(A) e 85 dB(A) e a agentes químicos (chumbo, cádmio, graxas, óleos minerais, thinner e solventes); e (iv) de 01.02.2007 a 30.10.2012: a ruído de 83,4dB(A) a 89,9 dB(A), a calor de 23.1 IBUTG e a agentes químicos (chumbo, cádmio, graxas, óleos minerais, thinner, solventes e desengraxantes).
Assim, deve ser mantido o reconhecimento, como tempo de serviço especial, do intervalo de 01.01.2012 a 30.10.2012, uma vez que o requerente esteve exposto a agente nocivo ruído acima do patamar de 85 decibéis, previsto no Decreto 3.048/99.
Ademais, com relação ao período de 13.07.1999 a 31.05.2003 em que o requerente esteve exposto a ruído de 89 decibéis, mesmo sendo inferior ao patamar mínimo de 90 decibéis previsto no Decreto 2.172/97, pode-se concluir que uma diferença de menor do que 01 (um) dB na medição há de ser admitida dentro da margem de erro decorrente de diversos fatores (tipo de aparelho, circunstâncias específicas na data da medição, etc.).
Outrossim, deve ser reconhecida a especialidade do período de 01.06.2003 a 31.10.2012, uma vez que o segurado esteve exposto a produtos químicos, tais como chumbo, cádmio, graxas, óleos minerais, thinner e solventes, agentes nocivos previstos nos códigos 1.0.6, 1.0.7, 1.0.8, Anexo IV, do Decreto 3.048/99.
Em relação ao agente nocivo calor, o Anexo IV do Decreto nº 3048/1999 estabelece que se considera atividade exercida em temperatura anormal aquela com exposição ao calor acima dos limites de tolerância estabelecidos na NR-15 da Portaria nº 3.214/1978, que, por sua vez, indica os cálculos para fins de verificação da submissão ao agente calor, com base em dados técnicos. Dada as informações constantes no PPP, verifica-se que o segurado não esteve exposto a calor em graduações acima dos limites legais.
De outro giro, destaque-se que o Perfil Profissiográfico Previdenciário, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, como também carimbo e assinatura do responsável legal da empresa, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo as vezes do laudo técnico.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de EPI, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
Quanto ao agente nocivo ruído, a discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto o autor esteve exposto ao referido agente nocivo em diversos períodos, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, tensão elétrica, etc.) pode-se dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Desta feita, somados apenas os períodos de atividade especial, o autor totaliza 17 anos, 09 meses e 30 dias de atividade exclusivamente especial até 30.10.2012, data do último período de atividade especial imediatamente anterior ao requerimento administrativo formulado em 06.11.2012, conforme primeira planilha anexa, parte integrante da presente decisão, insuficiente à concessão do benefício de aposentadoria especial previsto no artigo 57, caput, da Lei 8.213/1991.
Contudo, convertidos os períodos de atividade especial ora reconhecidos em tempo comum e somados aos demais, o autor totalizou 18 anos, 08 meses e 15 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 37 anos, 04 meses e 12 dias de tempo de contribuição até 30.10.2012, conforme segunda planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Insta ressaltar que o art. 201, §7º, inciso I, da Constituição da República de 1988, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98, garante o direito à aposentadoria integral, independentemente de idade mínima, àquele que completou 35 anos de tempo de serviço.
Dessa forma, o autor faz jus à aposentadoria integral por tempo de serviço, calculado nos termos do art. 29, I, da Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei 9.876/99, tendo em vista que cumpriu os requisitos necessários à jubilação após o advento da E.C. nº 20/98 e Lei 9.876/99.
Fixo o termo inicial da concessão de aposentadoria integral por tempo de contribuição na data do requerimento administrativo (06.11.2012), momento em que o autor já havia implementado todos os requisitos necessários à jubilação, conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido. Não há prestações atingidas pela prescrição quinquenal, tendo em vista que o ajuizamento da ação se deu em 07.03.2014 (fl. 02).
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, nego provimento à remessa oficial e à apelação do réu e dou provimento à apelação do autor para julgar procedente o pedido e reconhecer o exercício de atividade especial nos períodos de 13.07.1999 a 30.10.2012, totalizando 18 anos, 08 meses e 15 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 37 anos, 04 meses e 12 dias de tempo de contribuição até 30.10.2012. Consequentemente, condeno o réu a conceder ao autor o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (06.11.2012), a ser calculado nos termos do art. 29, I, da Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei 9.876/99. Honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença. As prestações em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, devidamente instruído com os documentos da parte autora JOSE LUIS FERREIRA, a fim de que sejam adotadas as providências cabíveis para que seja imediatamente implantado o benefício APOSENTADORIA INTEGRAL POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, DIB em 06.11.2012, com Renda Mensal Inicial a ser calculada pelo INSS, tendo em vista o "caput" do artigo 497 do Novo CPC.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | Sergio do Nascimento:10045 |
Nº de Série do Certificado: | 21A6990315D5226FF0236A88720B6E2B |
Data e Hora: | 18/10/2016 16:57:42 |