D.E. Publicado em 01/12/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial, negar provimento à apelação do réu e dar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000210-87.2014.4.03.6128/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial e apelações interpostas pelas partes em face de sentença que julgou procedente o pedido formulado em ação previdenciária para reconhecer como especiais as atividades exercidas pelo autor no período de 03.12.1998 a 29.08.2013. Consequentemente, concedeu-se ao autor a aposentadoria especial, com DIB em 03.09.2013 (data do requerimento administrativo). Os valores atrasados serão corrigidos monetariamente de acordo o Manual de Cálculos da Justiça Federal e com juros de mora nos termos do 1º-F da lei 9.494/97, observada a prescrição quinquenal. Honorários advocatícios fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais). Custas na forma da lei.
Em suas razões de inconformismo recursal, a parte autora pugna pela majoração dos honorários advocatícios em percentual não inferior a 10% sobre o valor da condenação. Ademais, peticiona requerendo a antecipação da tutela para imediata implantação do benefício previdenciário especial.
Por sua vez, o reu, em sua apelação, sustenta que não houve comprovação de exposição habitual e permanente ao agente nocivo, por meio de laudo pericial, não havendo, portanto, a comprovação do exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos reconhecidos pela sentença. Outrossim, defende a impossibilidade de conversão de tempo especial para comum após 28.05.1998, quando da promulgação da Medida Provisória 1.663-10/98, convertida na Lei 9.711/98.
Sem apresentação de contrarrazões pelas partes, vieram os autos esta Corte.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000210-87.2014.4.03.6128/SP
VOTO
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 07.05.1967 (fl. 19), o reconhecimento de atividade especial dos períodos de 03.12.1998 a 29.08.2013. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria especial, com termo inicial na data do requerimento administrativo (03.09.2013 - fl. 25).
Inicialmente, importa anotar que o INSS reconheceu administrativamente o exercício de atividade especial nos intervalos de 24.12.1984 a 11.09.1986 e 22.09.1986 a 02.12.1998, conforme memória de cálculo de fls. 79/81, restando, pois, incontroversos.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Ressalta-se que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
Com o objetivo de comprovar o exercício de atividade especial no período pleiteado, o autor apresentou, dentre outros documentos, Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 29/30, do qual se constata que ele laborou na empresa Thyssenkrupp Metalúrgica Campo Limpo Ltda. e esteve exposto a ruído nos seguintes patamares: (i) de 01.03.1997 a 28.02.2003: 91,05 decibéis; e (ii) de 01.03.2003 a 29.08.2013: 90,7 decibéis.
Dessa forma, mantenho o reconhecimento da especialidade do período de 03.12.1998 a 29.08.2013, eis que o autor esteve exposto ao agente físico ruído em níveis acimas dos previstos pela legislação previdenciária, de 90 decibéis entre 06.03.1997 a 18.11.2003 e de 85 decibéis a partir de 19.11.2003, consoante Decreto 3.048/99 (código 2.0.1), com alteração introduzida pelo Decreto n. 4.882/03.
Ademais, verifico que no período de 01.03.1997 a 28.02.2003, o requerente também esteve exposto à substância química Metil Etil Cetona (Hidrocarboneto), agente nocivo previsto no Decreto 53.831/64 (código 1.2.11), Decreto 83.080/79 (código 1.2.10) e Decreto 3.048/1999 (código 1.0.19). Com efeito, nos termos do § 2º do art. 68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição habitual às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração. No caso em apreço, o hidrocarboneto é substância derivada do petróleo e relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da Portaria 3214.78 NR-15 do Ministério do Trabalho.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de EPI, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No entanto, a discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto a parte autora esteve exposta ao agente nocivo ruído em diversos períodos, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
De outro giro, destaque-se que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro de segurança responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo as vezes do laudo técnico.
Portanto, com o reconhecimento do período cravado neste acórdão, como de atividade especial, a parte interessada alcança o total de 28 anos, 07 meses e 26 dias de atividade exclusivamente especial até 29.08.2013, data do último período de atividade especial imediatamente anterior ao requerimento administrativo formulado em 03.09.2013, suficiente à concessão de aposentadoria especial nos termos do art. 57 da Lei 8.213/91, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão. Nesse ponto, procedo à correção, em razão da remessa necessária, de erro de cálculo inserto na sentença, eis que, conforme planilha de fl. 136vº, o Juízo a quo considerou como especial o período compreendido entre 01.08.1984 a 23.12.1984, todavia tal período não foi reconhecido, administrativamente como especial, tampouco foi objeto da presente demanda, devendo, por essa razão, ser excluído do cálculo para fins de aposentadoria especial.
Destarte, o autor faz jus à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Mantenho o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (03.09.2013 - fl. 29), momento em que a parte autora já havia implementado todos os requisitos necessários à jubilação, conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido. Não há parcelas atingidas pela prescrição quinquenal, tendo em vista que o ajuizamento da ação se deu em 17.01.2014 (fl. 02).
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, eis que em conformidade com a Súmula 111 do STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Por fim, conforme CNIS anexo, verifico que houve a concessão administrativa do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor (NB: 42/177.057.682-4 - DIB: 25.04.2016). Nesse contexto, constato, ainda, que o interessado, em maio de 2016, requereu a antecipação da tutela para fins de obter a implantação imediata do benefício de aposentadoria especial, objeto da presente ação. Desse modo, presume-se que sua opção recaiu sobre o benefício judicial, em prol do benefício concedido administrativamente, motivo pelo qual concedo os efeitos da tutela para que seja imediatamente implantada a aposentadoria especial, em substituição ao benefício administrativo.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do réu. Dou parcial provimento à remessa oficial para proceder a correção de erro de cálculo contido na sentença, a fim de fixar que a parte interessada alcança o total de 28 anos, 07 meses e 26 dias de atividade exclusivamente especial até 29.08.2013 e dou provimento à apelação da parte autora para fixar os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença. As diferenças em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensando-se os valores recebidos administrativamente.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, devidamente instruído com os documentos da parte autora SÉRGIO LUCIANO CREMONESI, a fim de que sejam adotadas as providências cabíveis para que seja implantado o benefício de APOSENTADORIA ESPECIAL, DIB em 03.09.2013, em substituição ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição concedido administrativamente (NB: 42/177.057.682-4), com Renda Mensal Inicial a ser calculada pelo INSS, tendo em vista o "caput" do artigo 497 do Novo CPC.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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