
| D.E. Publicado em 18/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do réu e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000406-39.2013.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial e apelação interposta pelo réu em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado em ação previdenciária para reconhecer que a parte autora, nos períodos de 06.07.1981 a 13.01.1987, 17.06.1987 a 16.07.1987, 04.12.1987 a 30.11.1990, 01.10.1992 a 28.02.1994, 01.04.1994 a 31.01.1996, 01.03.1996 a 31.10.1999, 01.11.1999 a 30.04.2002, 01.05.2002 a 31.05.2002 e 01.06.2002 a 14.09.2012, exerceu atividades sob condições especiais. Condenou o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial, com o coeficiente da renda mensal de 100% do salário-de-benefício. Condenação com efeitos financeiros a partir da data de entrada do requerimento administrativo (14.09.2012), cujo valor deverá ser calculado nos termos da Lei, compensando-se eventuais parcelas pagas a título de outro benefício. Honorários advocatícios, em favor da autora, em percentual a ser fixado quando da liquidação do julgado. Condenou o INSS ao ressarcimento dos honorários periciais arbitrados em R$ 300,00. Os valores em atraso deverão ser pagos de uma só vez, com correção monetária e juros incidentes nos termos do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal vigente ao tempo do cumprimento da sentença.
Em suas razões recursais, o réu pugna pela concessão de efeito suspensivo ao recurso, diante do risco de prejuízos irreparáveis aos cofres públicos. Insurge-se contra o reconhecimento da especialidade nos períodos delimitados na sentença. Alega que o enquadramento por categoria profissional nos códigos 1.2.11 (Decreto de 1964) e 1.2.10 (Decreto de 1979) é possível apenas para aqueles que trabalham na fabricação de benzeno, tolueno e xileno, situação que não se amolda ao caso dos autos. Destaca que não foi discriminada a concentração a exposição a tais elementos químicos. Aduz que o autônomo (atual contribuinte individual) não pode mais ter sua atividade enquadrada como especial, se não se tratar de cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou produção. Isto porque, os segurados autônomos não contribuem para custeio do benefício, bem como prestam serviços em caráter eventual, o que afasta o requisito da habitualidade e permanência à exposição a agentes nocivos.
Com apresentação de contrarrazões (fls. 633/635), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000406-39.2013.4.03.6113/SP
VOTO
Nos termos do art. 1011 do CPC/2015, recebo a apelação da parte ré (fls. 621/630).
Na petição inicial, busca a autora, nascida em 18.02.1962 (fl. 31), o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais nos períodos de 06.07.1981 a 13.01.1987, 17.06.1987 a 16.07.1987, 04.12.1987 a 30.11.1990 e dos interregnos laborados como autônoma relativos aos recolhimentos vertidos à Previdência Social nas competências de 10/1992 a 10/1997 e 12/1997 a 04/2010. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data do requerimento administrativo (14.09.2012 - fls. 32/33), bem como pugna pela condenação do réu no pagamento de danos morais.
Cumpre assinalar que o entendimento de que não é possível a concessão de tutela de urgência em face da Fazenda Pública, equiparada no presente feito ao órgão previdenciário, não merece prosperar. Nesse contexto, destaco que a antecipação do provimento, com a implantação provisória ou definitiva do benefício, tanto previdenciário como assistencial, não importa em pagamento de parcelas vencidas, o que estaria sujeito ao regime de precatórios, disciplinado no artigo 100 da Constituição da República.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
A fim de comprovar a especialidade dos períodos laborados em estabelecimentos de calçados, foram apresentados, dentre outros, os seguintes documentos em relação aos respectivos lapsos: (i) de 06.07.1981 a 13.01.1987 e 04.12.1987 a 30.11.1990: CTPS de fls. 39/39vº e PPP´s de fls. 71/76, que retratam o labor na Calçados Paragon Ltda., nas funções de pespontadeira; e (ii) de 17.06.1987 a 16.07.1987: CTPS de fls. 39 e 49vº, que aponta o trabalho, como pespontadeira na Jerônimo Augusto de Souza & Cia. Ltda.
No caso dos autos, os contratos de trabalho anotados em carteira profissional cujas atividades eram correlatas à função de sapateiro (CTPS de fls. 39, 39vº e 49vº) são suficientes à comprovação da exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em empresas - fábrica de sapatos, localizada na cidade de Franca, conhecido polo industrial de calçados.
De outro turno, nos termos do código 1.2.11 do Decreto 53.831/64 havia presunção legal de que a presença de hidrocarboneto tóxico no processo produtivo era prejudicial ao trabalhador.
Com efeito, a perícia por similaridade realizada por perito particular (fls. 62/70) atesta que a parte autora, durante o exercício de suas atividades na empresa de Calçados Paragon S/A, esteve em contato, habitual e permanente, a cola de sapateiro, hidrocarbonetos aromáticos, benzeno e tolueno.
Assim, deve ser mantido o reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 06.07.1981 a 13.01.1987, 17.06.1987 a 16.07.1987 e 04.12.1987 a 30.11.1990, uma vez que a autora exerceu funções correlatas à atividade de sapateiro e, portanto, com exposição a agentes químicos previstos no código 1.2.11 do Decreto 53.831/64.
No que diz respeito à atividade de autônomo, esclareço que não há óbice à concessão de aposentadoria especial, desde que reste comprovado o exercício de atividade que exponha o trabalhador de forma habitual e permanente, não eventual nem intermitente, aos agentes nocivos, conforme se verifica do § 3º do art. 57 da Lei 8.213/91, na redação dada pela Lei 9.032/95. O disposto no artigo 64 do Decreto 3.048/99, que impede o reconhecimento de atividade especial ao trabalhador autônomo, fere o princípio da legalidade, extrapolando o poder regulamentar, ao impor limitação não prevista na Lei 8.213/91.
No caso do trabalhador autônomo, a comprovação da atividade especial se faz por meio de apresentação de documentos (início de prova) que comprovem o efetivo exercício profissional, tais como: (i) licença dos órgãos competentes - Prefeitura, para instalação de escritórios; (ii) notas fiscais, contemporâneas ao fato probando, que, sem ferir o sigilo, permitam identificar a prestação de serviço pela parte autora; e (iii) bem como eventual aquisição de insumos utilizados e de equipamentos profissionais, ou seja, documentos que permitam comprovar a efetiva prática profissional.
Primeiramente, importa anotar que os recolhimentos vertidos à Previdência Social pela autora, na qualidade autônoma/contribuinte individual, nos períodos de 01.10.1992 a 28.02.1994, 01.04.1994 a 31.01.1996, 01.03.1996 a 31.10.1999, 01.11.1999 a 30.04.2002, 01.05.2002 a 31.05.2002 e 01.06.2002 a 14.09.2012, constam no CNIS (extrato anexo), presumindo-se, portanto, incontroversos.
In casu, para comprovação da atividade como autônoma foram acostados aos autos, dentre outros, os seguintes documentos: (i) Inscrição na Prefeitura Municipal de Franca como autônoma (costureira, alfaiates, bordadeiras, costuma manual) de 01.10.1992 a 15.05.2015 (fl. 588); (ii) Documentos de Cadastramento e Recadastramento de Contribuinte Individual junto ao INSS, como costureira (fls. 589/590); (iii) Alvará de Licença emitido em 21.10.1992 pela Prefeitura Municipal de Franca para exercício da atividade de costureira autônoma (fl. 593); (iv) Comprovantes de recolhimento de ISS nos exercícios de 1992 a 1995, 1998, 1999, 2000, 2001 (fls. 594/597); (v) Carta emitida pela Secretaria Municipal de Controle e Assuntos Jurídicos que informa a dispensa do pagamento de ISS referente à inscrição como prestador de serviço autônomo, em razão da edição da Lei Complementar 48/2002 (fl. 598). Outrossim, as testemunhas ouvidas em Juízo (mídia de fl.169) afirmaram que a interessada exercia trabalhos continuamente, com utilização de produtos químicos (cola, solvente etc), tendo prestado serviços às testemunhas, na realização de pesponto de sapatos.
Assim, tenho que tais provas são suficientes para comprovar que a requerente exerceu a atividade autônoma de forma contínua, habitual e permanente.
Adicionalmente, foi realizada perícia técnica judicial (fls. 188/202), tendo o Sr. Expert concluído que a interessada, nos intervalos controversos de 01.10.1992 a 28.02.1994, 01.04.1994 a 31.01.1996, 01.03.1996 a 31.10.1999, 01.11.1999 a 30.04.2002, 01.05.2002 a 31.05.2002 e 01.06.2002 a 14.09.2012, esteve exposta a gases e vapores de cola de sapateiro e thinner (a base de solvente e hidrocarbonetos aromáticos, que possuem em sua composição o benzeno e tolueno), de modo habitual e permanente, sem a utilização de qualquer equipamento de proteção individual. Ao encontro dessas conclusões, foi apresentado laudo elaborado por perito particular (fls. 77/88).
Destarte, mantenho a declaração da especialidade das atividades exercidas nos períodos de 01.10.1992 a 28.02.1994, 01.04.1994 a 31.01.1996, 01.03.1996 a 31.10.1999, 01.11.1999 a 30.04.2002, 01.05.2002 a 31.05.2002 e 01.06.2002 a 14.09.2012, por exposição a hidrocarbonetos aromáticos, agentes nocivos previstos no código 1.0.19 do Decreto 3.048/1999.
Nos termos do §4º do art. 68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No caso em apreço, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº 13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF expressamente se manifestou no sentido de que, relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.) pode-se dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pela parte autora demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Ademais, deve ser desconsiderada a informação de utilização do EPI quanto ao reconhecimento de atividade especial dos períodos até a véspera da publicação da Lei 9.732/98 (13.12.1998), conforme o Enunciado nº 21, da Resolução nº 01 de 11.11.1999 e Instrução Normativa do INSS n.07/2000.
Portanto, somados os períodos de atividade especial, a autora totaliza 28 anos, 04 meses e 20 dias de atividade exclusivamente especial até 14.09.2012, data do requerimento administrativo, suficiente à concessão de aposentadoria especial nos termos do art. 57 da Lei 8.213/91, conforme planilha anexa, parte integrante desta decisão.
Destarte, a parte autora faz jus ao beneficio de aposentadoria especial, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Mantido o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (14.09.2012 - fl. 32/33), momento em que a autora já havia implementado todos os requisitos necessários à jubilação, conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido. Não há parcelas atingidas pela prescrição quinquenal, tendo em vista que o ajuizamento da ação se deu em 14.02.2013 (fl. 02).
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
Mantidos os honorários advocatícios na forma fixada em sentença. Todavia, tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora, fixo a base de cálculo no valor das parcelas atrasadas até a data do presente julgamento, a teor do art. 85, §11, do CPC/2015.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, nego provimento à apelação do réu e à remessa oficial. Tendo em vista o trabalho adicional do patrono da parte autora, a base de cálculo dos honorários advocatícios deve corresponder ao valor das parcelas atrasadas até a data do presente julgamento, a teor do art. 85, §11, do CPC/2015. As parcelas em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença, compensando-se os valores recebidos administrativamente.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
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