D.E. Publicado em 05/05/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do réu e à remessa oficial e dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0002142-92.2014.4.03.6134/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de remessa oficial e apelações de sentença pela qual foi julgado parcialmente procedente o pedido do autor para reconhecer e condenar o INSS a averbar como atividade especial os períodos de 16.09.1986 a 20.02.1992 e 19.11.1993 a 28.10.2013. Houve o reconhecimento da sucumbência recíproca. Sem custas.
Em sua apelação, busca o réu a reforma do julgado alegando, em síntese, que não houve comprovação de exposição habitual e permanente ao agente nocivo, por meio de laudo técnico específico, não havendo, portanto, a comprovação do exercício de atividade especial pelo autor nos períodos reconhecidos pela sentença; argumenta, ainda, que o uso de equipamento de proteção individual elide a ação dos agentes nocivos eventualmente existentes no ambiente de trabalho, bem como com a ausência de prévia fonte de custeio, visto que as empresas que comprovam o uso de EPI não são obrigadas a recolher a contribuição ao SAT. Suscita o prequestionamento da matéria ventilada.
Por sua vez, o autor, em seu apelo, alega, preliminarmente, cerceamento de defesa pela ausência da realização de prova pericial, requerida na petição inicial. No mérito, aduz que no período de 06.03.1997 a 18.11.2003 esteve submetido a ruído, em média, de 85 decibéis e laborou em contato com produtos químicos. Sustenta, ademais, que a utilização de EPI não afasta a especialidade do tempo laborado. Por fim, também, prequestiona a temática objeto do recurso.
Com a apresentação de contrarrazões (Autor: fls. 167/181; Réu: fls. 183/186), vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0002142-92.2014.4.03.6134/SP
VOTO
Da preliminar
Não há que se falar em cerceamento de defesa a ensejar a decretação de nulidade da sentença, uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de dispensar a produção de provas ao entender desnecessárias para a resolução da causa.
No caso em tela, observo que o conjunto probatório acostado aos autos é suficiente para o deslinde da questão.
Do mérito
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 07.05.1967, o reconhecimento de atividade especial nos períodos de 16.09.1986 a 20.02.1992 e 31.05.1993 a 28.10.2013, por exposição a ruído e agentes químicos, para fins de concessão da aposentadoria especial.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos 83.080/79 e 53.831/64, até 05.03.1997, e após pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95 como a seguir se verifica.
O artigo 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:
Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96 o dispositivo legal supra transcrito passou a ter a redação abaixo transcrita, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV).
Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido, confira-se a jurisprudência:
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Ressalto que os Decretos n. 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
O Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, que revogou os dois outros decretos anteriormente citados, passou a considerar o nível de ruídos superior 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 dB como agente nocivo à saúde.
Com o advento do Decreto n. 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso Especial Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, conforme ementa a seguir transcrita:
Conforme acima destacado, está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
Assim, deve ser mantido o reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 16.09.1986 a 20.02.1992 e 19.11.2003 a 28.10.2013, nos quais o autor trabalhou, no primeiro período, em exposição a um nível médio de ruído de 99 decibéis (consoante formulário de fl. 51 e o laudo técnico arquivado na agência do INSS) e, no segundo, a índices superiores a 85 decibéis (PPP; fls. 57/59), conforme códigos 2.5.8. e 1.1.5, do quadro anexo ao Decreto 83.080/79.
Por outro lado, o autor laborou na empresa Goodyear do Brasil Produtos de Borracha Ltda., no cargo de construtor de pneus, exposto a diversos hidrocarbonetos aromáticos, dentre eles hexano, tolueno e xileno, que possuem em sua composição o benzeno (PPP; fls. 57/59), agentes nocivos previstos nos códigos 1.2.10 do Decreto 83.080/1979 (Anexo I) e 1.0.19 do Decreto 3.048/1999 (Anexo IV). Da mesma forma, considerando que, no período de 06.03.1997 a 18.11.2003, o autor se ativou em idêntico cargo e desempenhou as mesmas funções e atividades (fl. 57) é possível concluir que esteve submetido, igualmente, aos agentes químicos descritos no PPP.
No caso dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
Ademais, nos termos do §2º do art.68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas:
Tese 1 - regra geral: O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial.
Tese 2 - agente nocivo ruído: Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
No entanto, relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.) pode-se dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Ademais, a discussão quanto à utilização do EPI, no caso em apreço, é despicienda, porquanto o autor esteve exposto ao agente nocivo ruído em diversos períodos, cujos efeitos agressivos não são neutralizados pelos tipos de equipamentos de proteção individual atualmente disponíveis.
Somados os períodos de atividade especial objeto da presente ação com aqueles incontroversos (fls. 66/67), o autor totaliza 25 anos, 10 meses e 04 dias de atividade especial até 07.01.2014, data do requerimento administrativo, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão.
Destarte, o autor faz jus à aposentadoria especial com renda mensal de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei º 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art.29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (07.01.2014; fl. 18), conforme pacífico entendimento jurisprudencial.
Ajuizada a presente ação em 15.09.2014 (fl. 02), não há que se cogitar de incidência de prescrição quinquenal.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados de acordo com a lei de regência.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Fixo os honorários advocatícios em 15% sobre as prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula 111 do E. STJ e entendimento da 10ª Turma desta Corte.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do réu e à remessa oficial e dou provimento à apelação da parte autora, para julgar procedente o pedido, a fim de determinar que seja computado, como atividade especial, o período de 06.03.1997 a 18.11.2003, laborado na empresa Goodyear do Brasil Produtos de Borracha Ltda., com a consequente concessão de benefício de aposentadoria especial, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, a contar de 07.01.2014, data do requerimento administrativo. Verbas acessórias na forma acima explicitada. Honorários advocatícios arbitrados em 15% das prestações vencidas até a data da sentença. Os valores em atraso serão resolvidos em liquidação de sentença.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora CLAUDIO MANOEL DA SILVA, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantada a APOSENTADORIA ESPECIAL, com data de início - DIB em 07.01.2014, com renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, tendo em vista o artigo 497 do novo CPC. Os valores em atraso serão resolvidos em liquidação de sentença.
É o voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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Data e Hora: | 26/04/2016 16:38:17 |