Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5014742-68.2018.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
12/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/06/2019
Ementa
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINAR.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A
AGENTE NOCIVO. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. COMPROVAÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI
VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DA ATIVIDADE. EPI INEFICAZ. TERMO INICIAL.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VERBAS ACESSÓRIAS.IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO
BENEFÍCIO.
I - Não há que se falar em cerceamento de defesa a ensejar a decretação de nulidade da
sentença, uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de
dispensar a produção de provas que entender desnecessárias para o deslinde da causa. As
provas coligidas aos autos são suficientes para formar o livre convencimento deste Juízo.
II - No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação
aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi
efetivamente exercida.
III - Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a
partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas
a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp
436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
IV - Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997,
mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a
apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
V - Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente
o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição
a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso
especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 543-C do CPC/1973,
atualmente previsto no artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso especial
Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto
4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
VI - Está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o
tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o
limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
VII - A exposição a gás GPL (Gás Liquefeito de Petróleo), garante a contagem diferenciada para
fins previdenciários por trazer risco à saúde/integridade física do segurado, em razão do potencial
inflamável e de explosão dos botijões de gás.
VIII - Nos termos do §4º do art. 68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto
3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial
cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração. No caso
dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância
relacionada como cancerígena no anexo nº 13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
IX - Declarado o cômputo especial do intervalo de 06.03.1997 a 05.12.2005, por exposição a
hidrocarbonetos aromáticos (GLP), nos termos previstos nos códigos 1.2.10 do Decreto n.
83.080/1979 e 1.0.19 do Decreto n. 3.048/1999.
X – Reconhecida a especialidade do lapso de 03.11.2008 a 26.02.2015, em razão da sujeição a
hidrocarbonetos aromáticos e ruído em nível superior ao limite de tolerância de 85 decibéis
(Decreto n. 3.048/1999 – códigos 1.0.19 e 2.0.1).
XI - No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com
repercussão geral reconhecida, o E. STF afirmou que, na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do PPP, no
sentido da eficácia do EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial, tendo em vista que
no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído,
pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
XII - Relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.) pode-se dizer que a
multiplicidade de tarefas desenvolvidas pela parte autora demonstra a impossibilidade de atestar
a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do
autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a
jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
XIII - Termo inicial do benefício fixado na data da citação (26.02.2015), vez que o interessado não
havia cumprido os requisitos necessários à jubilação na data do requerimento administrativo
(02.04.2014).
XIV - A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E. STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009.
XV - Honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinze por cento) do valor das prestações
vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula n. 111 do E. STJ e de acordo com o
entendimento firmado por esta 10ª Turma.
XVI - Nos termos do artigo 497 do NCPC, determinada a implantação imediata do benefício de
aposentadoria especial.
XVII – Preliminar do autor prejudicada. Apelação do autor parcialmente provida. Apelo do réu
improvido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014742-68.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: JERONIMO CASTELA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
Advogados do(a) APELANTE: FERNANDO GONCALVES DIAS - SP286841-S, HUGO
GONCALVES DIAS - SP194212-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, JERONIMO CASTELA
Advogados do(a) APELADO: FERNANDO GONCALVES DIAS - SP286841-S, HUGO
GONCALVES DIAS - SP194212-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014742-68.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações em
face de sentença pela qual o feito foi extinto, sem resolução do mérito, em relação ao pedido de
reconhecimento da especialidade do período de 01.06.1987 a 28.04.1995. No mais, julgou
parcialmente procedente o pleito, para reconhecer a especialidade do intervalo de 29.04.1995 a
05.03.1997. Sem custas. Honorários advocatícios fixados em l0% sobre o valor da causa, nos
termos do art. 86, § único do novo CPC, observados os benefícios da gratuidade da justiça.
Em suas razões de inconformismo recursal, a parte autora, preliminarmente, requer a anulação
da sentença por cerceamento de defesa, vez que foi indeferido o pedido de realização de prova
técnica, necessária à comprovação da insalubridade do labor desempenhado no interregno de
06.03.1997 a 05.12.2005. Sustenta que a sentença violou princípios constitucionais processuais
do contraditório, ampla defesa e devido processo legal. Argumenta que a empregadora Liquigás
Distribuidora S/A omitiu informações acerca da exposição do obreiro a GLP (Gás Liquefeito de
Petróleo). No mérito, pugna pelo reconhecimento da especialidade dos intervalos de 06.03.1997 a
05.12.2005, por exposição a hidrocarbonetos aromáticos. Pleiteia pelo cômputo prejudicial do
lapso de 03.11.2008 a 30.05.2014, por sujeição à pressão sonora de 96,2 decibéis e GLP,
agentes indicados no PPP emitido pela empresa empregadora. Consequentemente, pugna pela
concessão de aposentadoria especial, desde a DER ou da data em que preenchidos os requisitos
necessários à jubilação ou, subsidiariamente, na data da citação ou, ainda, no momento da
prolação da sentença. Subsidiariamente, requer a concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição. Por fim, pleiteia pela condenação do réu ao pagamento de honorários advocatícios
de 15% sobre o valor das prestações vencidas até a sentença.
Por sua vez, o réu, em sede de apelação, insurge-se contra o reconhecimento da especialidade
noperíododelimitadoem sentença, vez que o autor não exerceu atividade passível de
enquadramento especial por categoria profissional. Alega que não foi trazido aos autos laudo
técnico que comprove a efetiva exposição a agentes nocivos, de modo habitual e permanente.
Subsidiariamente, requer a aplicação da Lei n. 11.960/2009 no que se refere ao cálculo de juros
de mora e de correção monetária.
Com apresentação de contrarrazões pelo autor, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014742-68.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: JERONIMO CASTELA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, JERONIMO CASTELA
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Nos termos do artigo 1.011 do Novo CPC/2015, recebo as apelações interpostas pela parte
autora e pelo réu.
Da preliminar de cerceamento de defesa
Não há que se falar em cerceamento de defesa a ensejar a decretação de nulidade da sentença,
uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de dispensar
a produção de provas que entender desnecessárias para o deslinde da causa.
Outrossim, o Juízo de origem oportunizou a produção de prova documental ao deferir a
expedição de ofício à Liquigás Distribuidora S/A, determinando que a empresa apresentasse
formulários, laudos técnicos e outros documentos que demonstrassem a exposição a agentes
insalubres, penosos ou perigosos (id 7360296 - Pág. 22).
Destarte, as provas coligidas aos autos são suficientes para formar o livre convencimento deste
Juízo.
Do mérito
Na petição inicial, busca o autor, nascido em 03.08.1967, o reconhecimento de atividade especial
dos períodos de 29.04.1995 a 05.12.2005 e 03.11.2008 a 02.04.2014, bem como a conversão
inversa do tempo de serviço comum em especial relativa aos interregnos de 18.11.1983 a
01.02.1987 e 03.02.1986 a 27.02.1987. Consequentemente, requer a concessão do benefício de
aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo (02.04.2014) ou da data em
que implementados os requisitos necessários à jubilação. Subsidiariamente, pugna pela
implantação de aposentadoria por tempo de contribuição.
Inicialmente, como bem asseverado pelo Juízo de origem, importa anotar que o INSS reconheceu
administrativamente o exercício de atividade especial no intervalo de 01.06.1987 a 28.04.1995,
conforme contagem administrativa (id 7360294 - Págs. 37/38), restando, pois, incontroverso.
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação
aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi
efetivamente exercida.
Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a partir da
edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir
de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp 436661/SC; 5ª
Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo
sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada
até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação
dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o
disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a
ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso
especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 543-C do CPC/1973,
atualmente previsto no artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso especial
Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto
4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o tempo
de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o limite de
90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
No caso em apreço, a fim de comprovar a prejudicialidade do labor desempenhado na Liquigás
Distribuidora S/A, foram apresentados, dentre outros documentos, PPP (id 7360293 - pág. 27)
que retrata o exercício do cargo de ajudante de caminhão (CBO 783225), com exposição, de
modo intermitente, a ruído de 84 decibéis, no período de 29.04.1995 a 05.12.2005. Consta que o
interessado laborou no setor de entrega automática, sendo responsável por efetuar a venda de
botijões de gás aos consumidores, carregando e descarregando os referidos produtos do
caminhão, bem como prestavacontas das vendas e arrumava os botijões, separando os cheios
dos vazios. No PPRA de 2005 (id 7360296 - Págs. 33/40),a empresa informa a adoção de
medidas preventivas relativas à exposição de tolueno e Gás Liquifeito de Petróleo.
O interessado também acostou formulário previdenciário relativo a outro segurado que exerceu a
mesma função (ajudante de caminhão – CBO 783225) e atividade (venda de botijões de gás a
consumidores), junto à mesma empresa e em período concomitante. No campo observações (id
7360297 - Pág. 16), há indicação de manuseio, de modo habitual e permanente, a GLP (Gás
Liquefeito de Petróleo).
Destarte, diante das provas acima referidas, entendo que restou comprovadaa exposição a
hidrocarbonetos aromáticos (GLP) durante o labor desempenhado na Liquigás Distribuidora S/A,
razão pela qual mantenho o reconhecimento da especialidade do interregno de 29.04.1995 a
05.03.1997, bem como reconheço o cômputo especial do intervalo de 06.03.1997 a 05.12.2005,
nos termos previstos nos códigos 1.2.10 do Decreto n. 83.080/1979 e 1.0.19 do Decreto n.
3.048/1999.
Com efeito, a exposição a gás GPL (Gás Liquefeito de Petróleo), garante a contagem
diferenciada para fins previdenciários por trazer risco à saúde/integridade física do segurado, em
razão do potencial inflamável e de explosão dos botijões de gás.
Nos termos do §4º do art. 68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto 3.048/99,
a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica
a contagem especial, independentemente de sua concentração. No caso dos autos, os
hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada
como cancerígena no anexo nº 13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
No que tange ao labor desempenhado na SHV Gás Brasil Ltda., extrai-se do PPP (7360293 -
Págs. 29/30) que o interessado, no exercício dos cargos de ajudante de motorista (CBO 7832-25)
e motorista (CBO 7825-10), esteve exposto a GLP e ruído de 96,2 decibéis, durante o intervalo de
03.11.2008 a 10.02.2014.
Portanto, declaro o cômputo prejudicial do lapso de 03.11.2008 a 02.04.2014 (DER), em razão da
sujeição a hidrocarbonetos aromáticos e ruído em nível superior ao limite de tolerância de 85
decibéis (Decreto n. 3.048/1999 – códigos 1.0.19 e 2.0.1).
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com
repercussão geral reconhecida, o E. STF afirmou que, na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do PPP, no
sentido da eficácia do EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial, tendo em vista que
no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído,
pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
Ademais, relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.) pode-se dizer que a
multiplicidade de tarefas desenvolvidas pela parte autora demonstra a impossibilidade de atestar
a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do
autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a
jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
De outro giro, destaque-se que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art.
58, §4º, da Lei 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e
traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de
trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividade sob condições especiais, fazendo
as vezes do laudo técnico.
Portanto, somados os períodos especiais reconhecidos na presente demanda aos demais
incontroversos, a parte interessada alcança o total de 23 anos, 11 meses e 05 dias de atividade
exclusivamente especial até 02.04.2014, data do requerimento administrativo, insuficiente à
concessão de aposentadoria especial.
Não obstante, à vista da continuidade do vínculo empregatício na empresa SHV Gás Brasil Ltda.,
conforme extratoCNIS acostado aos autos (id 7360298; Pág. 28), há de se aplicar o disposto no
art. 493 do Novo CPC, para fins de verificação do cumprimento dos requisitos à jubilação,
mormente considerando o pedido expresso formulado pelo autor, em sua petição inicial e razões
recursais. Com efeito, verifica-se do referido cadastro, que o autor permaneceu vinculado à
mencionada empresa, permanecendo no exercício da mesma ocupação de motorista (CBO 7825-
10), motivo pelo qual entendo possível a extensão das aferições exaradas no PPP (7360293 -
Págs. 29/30)para o período posterior de 03.04.2014 a 26.02.2015 (data da citação), razão pela
qual citado intervalo também deve ser declarado como especial,por exposição a GLP
(hidrocarboneto aromático) e ruído (96,2 dB).
Nesse diapasão, o interessado totaliza 24 anos, 07 meses e 21 dias de atividade especial até
18.12.2014 (data do ajuizamento da demanda) e 25 anos, 07 meses e 29 dias de exercício de
atividade exclusivamente prejudicial até 26.02.2015 (momento da citação), suficiente à concessão
de aposentadoria especial, nos termos do art. 57 da Lei 8.213/91.
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria especial com renda mensal inicial de 100% do
salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela
média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por
cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação
dada pela Lei nº 9.876/99.
Fixo o termo inicial do benefício na data da citação (26.02.2015; id 7360294; pg. 52), vez que o
interessado não havia cumprido os requisitos necessários à jubilação na data do requerimento
administrativo (02.04.2014).
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E. STF no julgamento do RE 870.947, realizado em
20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de
poupança a partir de 30.06.2009.
Diante da inversão do ônus sucumbencial, fixo os honorários advocatícios em 15% (quinze por
cento) do valor das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula n. 111 do
E. STJ e de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), porém
devem reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º,
parágrafo único).
Diante do exposto, julgo prejudicada a preliminar arguida pelo autor e, no mérito,dou parcial
provimento à sua apelação para julgar parcialmente procedente o pedido e reconhecer o
exercício de atividade especial nos períodos de 29.04.1995 a 05.12.2005 e 03.11.2008 a
26.02.2015, totalizando 25 anos, 07 meses e 29 dias de exercício de atividade exclusivamente
prejudicial até 26.02.2015 (data da citação). Consequentemente, condeno o réu a conceder-lhe o
benefício de aposentadoria especial, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício,
nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, desde a data da citação (26.02.2015). Nego provimento
à apelação do réu. As parcelas em atraso serão resolvidas em fase de liquidação de sentença.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se "e-mail" ao INSS, instruído
com os devidos documentos da parte autora JERONIMO CASTELA, a fim de serem adotadas as
providências cabíveis para que seja implantado o benefício de APOSENTADORIA ESPECIAL,
com DIB em 26.02.2015, com renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, tendo em
vista o artigo 497 do CPC/2015.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINAR.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A
AGENTE NOCIVO. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. COMPROVAÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI
VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DA ATIVIDADE. EPI INEFICAZ. TERMO INICIAL.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VERBAS ACESSÓRIAS.IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO
BENEFÍCIO.
I - Não há que se falar em cerceamento de defesa a ensejar a decretação de nulidade da
sentença, uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de
dispensar a produção de provas que entender desnecessárias para o deslinde da causa. As
provas coligidas aos autos são suficientes para formar o livre convencimento deste Juízo.
II - No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação
aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi
efetivamente exercida.
III - Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a
partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas
a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp
436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
IV - Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997,
mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser
considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a
apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
V - Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente
o disposto no Decreto 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição
a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao Colendo STJ que, no julgamento do Recurso
especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do artigo 543-C do CPC/1973,
atualmente previsto no artigo 1.036 do Novo Código de Processo Civil de 2015, Recurso especial
Repetitivo, fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto
4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
VI - Está pacificado no E. STJ (Resp 1398260/PR) o entendimento de que a norma que rege o
tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação, devendo, assim, ser observado o
limite de 90 decibéis no período de 06.03.1997 a 18.11.2003.
VII - A exposição a gás GPL (Gás Liquefeito de Petróleo), garante a contagem diferenciada para
fins previdenciários por trazer risco à saúde/integridade física do segurado, em razão do potencial
inflamável e de explosão dos botijões de gás.
VIII - Nos termos do §4º do art. 68 do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação do Decreto
3.048/99, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial
cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração. No caso
dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância
relacionada como cancerígena no anexo nº 13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
IX - Declarado o cômputo especial do intervalo de 06.03.1997 a 05.12.2005, por exposição a
hidrocarbonetos aromáticos (GLP), nos termos previstos nos códigos 1.2.10 do Decreto n.
83.080/1979 e 1.0.19 do Decreto n. 3.048/1999.
X – Reconhecida a especialidade do lapso de 03.11.2008 a 26.02.2015, em razão da sujeição a
hidrocarbonetos aromáticos e ruído em nível superior ao limite de tolerância de 85 decibéis
(Decreto n. 3.048/1999 – códigos 1.0.19 e 2.0.1).
XI - No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com
repercussão geral reconhecida, o E. STF afirmou que, na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do PPP, no
sentido da eficácia do EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial, tendo em vista que
no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído,
pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
XII - Relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.) pode-se dizer que a
multiplicidade de tarefas desenvolvidas pela parte autora demonstra a impossibilidade de atestar
a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do
autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a
jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
XIII - Termo inicial do benefício fixado na data da citação (26.02.2015), vez que o interessado não
havia cumprido os requisitos necessários à jubilação na data do requerimento administrativo
(02.04.2014).
XIV - A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E. STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009.
XV - Honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinze por cento) do valor das prestações
vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula n. 111 do E. STJ e de acordo com o
entendimento firmado por esta 10ª Turma.
XVI - Nos termos do artigo 497 do NCPC, determinada a implantação imediata do benefício de
aposentadoria especial.
XVII – Preliminar do autor prejudicada. Apelação do autor parcialmente provida. Apelo do réu
improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar prejudicada a
preliminar arguida pelo autor e, no mérito, dar parcial provimento à sua apelação, bem como
negar provimento ao apelo do réu, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
