Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2020091 / SP
0001553-28.2012.4.03.6116
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
12/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/08/2019
Ementa
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SAQUE
REALIZADO APÓS O ÓBITO DO TITULAR. MÁ-FÉ CONFIGURADA. DEVOLUÇÃO DOS
VALORES. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM
CAUSA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DA SEGURIDADE
SOCIAL. SALDO RESIDUAL DO BENEFÍCIO. COMPENSAÇÃO COM CRÉDITO VINDICADO
PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE ALVARÁ JUDICIAL. INCIDÊNCIA DO
ART. 112 DA LEI 8.213/91. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. SENTENÇA
MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na eqüidade, constitui
alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente
disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002. Desse modo, todo acréscimo patrimonial
obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve
possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores
serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão,
o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados
ações in rem verso, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação
de repetição de indébito.
2 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a
Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por
ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no
Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
3 - Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos
valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo
115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
4 - Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
5 - Deve-se ponderar que a Seguridade Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio
financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais
segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
6 - In casu, o Sr. VICENTE ROSA recebeu proventos de aposentadoria por invalidez (NB
1340736486 - fl. 44), desde 14/06/2004 até o seu falecimento, em 21/3/2012, quando a parte
autora, sua curadora e irmã, efetuou saque, em seu nome, dos valores advindos do benefício
previdenciário referentes à competência de março de 2012 (fls. 35).
7 - Em auditoria interna realizada em 12/7/2012, o INSS identificou irregularidades no
recebimento da aposentadoria por invalidez e, consequentemente, enviou comunicado à parte
autora, solicitando o ressarcimento ao erário dos valores por ela indevidamente recebidos, no
valor de R$ 1.262,28 (mil, duzentos e sessenta e dois reais e vinte e oito centavos) (fls. 11).
8 - A parte autora propôs essa demanda em 13/09/2012, visando extinguir o crédito
supramencionado (fls. 02/06), todavia a sentença julgou improcedente a ação. Inconformada, a
demandante sustenta que as verbas de caráter alimentar, desde que recebidas de boa-fé, são
irrepetíveis. Subsidiariamente, pede a compensação do saldo residual do benefício a que faz
jus com o crédito vindicado pela Autarquia Previdenciária.
9 - Ora, constitui pressuposto para a configuração da boa-fé no recebimento de benefício
previdenciário a presunção de legalidade do pagamento, o que não ocorreu na hipótese.
10 - Até o mais leigo dos cidadãos compreende a irregularidade na percepção de valores
destinados a pessoa já falecida, de modo que não constitui erro escusável o recebimento de
prestação previdenciária sabidamente indevida, razão pela qual deve ser afastada a alegação
de boa-fé na conduta da parte autora. Precedentes.
11 - É sabido que os sucessores possuem direito ao saldo residual dos proventos de benefício
pago pelo INSS. Entretanto, a cobrança destes valores devem se submeter ao procedimento
disciplinado pela lei adjetiva civil, conforme expressamente ressaltado no artigo 112 da Lei n.
8.213/91.
12 - Desse modo, cabe à parte autora requerer a expedição de alvará judicial para este fim, nos
termos do artigo 1103 do Código de Processo Civil de 1973 (atual artigo 719 do NCPC). Tal
procedimento visa assegurar não só a legitimidade do postulante ao resíduo do benefício, bem
como a exatidão de seu valor. Desse modo, deve ser afastada a compensação ora pretendida
pela demandante.
13 - Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
