
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000219-90.2021.4.03.6136
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: LUIS WANDERLEY NICOLA DE SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: JOAO HENRIQUE FEITOSA BENATTI - SP242803-N, LUCIA FEITOSA BENATTI - SP83511-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000219-90.2021.4.03.6136
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: LUIS WANDERLEY NICOLA DE SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: JOAO HENRIQUE FEITOSA BENATTI - SP242803-N, LUCIA FEITOSA BENATTI - SP83511-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na qual a parte autora busca o reconhecimento de tempo de serviço comum urbano como professor, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição do professor.
A sentença extinguiu o processo, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil (CPC).
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual reafirma o interesse de agir e requer a anulação do julgado, com retorno dos autos à origem para o prosseguimento do feito.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000219-90.2021.4.03.6136
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: LUIS WANDERLEY NICOLA DE SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: JOAO HENRIQUE FEITOSA BENATTI - SP242803-N, LUCIA FEITOSA BENATTI - SP83511-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Insurge-se a parte autora com relação à extinção do feito, com fundamento na falta de interesse processual, diante da ausência de análise ou indeferimento do pedido na via administrativa.
Nessa esteira, a questão da necessidade de prévio requerimento administrativo como condição para o regular exercício do direito de ação foi definitivamente dirimida pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE n. 631.240, em 3/9/2014 (ementa publicada em 10/11/2014), sob o regime de repercussão geral:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir." (g.n.)
Sem margem a dúvidas, o Supremo Tribunal Federal (STF): (i) considerou constitucional a exigência de requerimento administrativo prévio como condição da ação; (ii) estabeleceu as exceções a essa exigência; (iii) fixou regras transitórias para as ações judiciais em trâmite até a data da conclusão do julgamento (3/9/2014), sem precedência de processo administrativo.
Ultrapassado o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias previsto no artigo 41-A, § 5º, da Lei n. 8.213/1991 para apreciação do pedido administrativo e mantendo-se omissa a autarquia previdenciária, não se exige o esgotamento dessa via para invocação da prestação jurisdicional.
No caso, restou demonstrado o prévio requerimento administrativo do benefício postulado neste feito.
Com efeito, os documentos coligidos aos autos demonstram que a parte autora requereu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do professor, conforme protocolo de requerimento (id 292650690, p. 3), e houve despacho administrativo indicando: “requerente solicita que seja analisado como B 57 Aposentadoria do Professor” (id 292650690, p. 22).
O que se exige para demonstrar a pretensão resistida e o estabelecimento da lide, é o pedido administrativo de concessão de benefício, o qual, in casu, foi formulado anteriormente ao ajuizamento da ação.
Dessa forma, não há que se falar em falta de interesse de agir da parte autora ao submeter a pretensão ao Poder Judiciário, pois demonstrada a existência do prévio requerimento administrativo.
Satisfeita essa condição da ação, assiste razão à parte autora quanto ao pedido de anulação da sentença.
No que toca à questão de fundo, não há óbice a que o julgador, ultrapassada a questão prejudicial, passe à análise do mérito propriamente dito. Esse entendimento decorre do artigo 1.013, § 3º, do CPC.
A questão posta nos autos está madura e já se acha em condições de ser julgada.
Assim, em homenagem ao princípio da economia processual, passo ao julgamento nos limites da exordial.
A aposentadoria por tempo de contribuição do professor está contida no artigo 56 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 56. O professor, após 30 (trinta) anos, e a professora, após 25 (vinte e cinco) anos de efetivo exercício em funções de magistério poderão aposentar-se por tempo de serviço, com renda mensal correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, observado o disposto na Seção III deste Capítulo".
Vale frisar, nessa esteira, que a aposentadoria do professor é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição que tem como requisito o exercício da função de magistério, e, desse modo, segue o regramento desse benefício, notadamente quanto à apuração do período básico de cálculo, segundo as disposições da Lei n. 9.876/1999 e à incidência do fator previdenciário no cálculo do salário-de-benefício.
Dessa maneira, a atividade de professor não é especial, em si, para fins de seu enquadramento na espécie "aposentadoria especial" a que alude o art. 57 da Lei n. 8.213/91 (STJ, REsp 1.423.286-RS, Min. Humberto Martins, j. 20.8.2015, DJe de 1.9.2015).
No caso, a parte autora pretende comprovar a atividade de professor, com vistas à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do professor.
No intento de demonstrar o efetivo exercício da função de magistério pelo tempo mínimo necessário à concessão do benefício, o requerente acostou aos autos os mesmos documentos juntados ao processo administrativo.
Do conjunto probatório, além da consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), restou demonstrada a atividade de professor nos períodos de: (i) 5/2/1998 a 3/1/2003 (“Município de Pindorama”), com anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) de “professor educação básica I”; (ii) 2/2/2004 a 21/12/2011 (“Sociedade Educacional Colégio N. S. do Calvário”), anotação em CTPS da profissão de “professor de geografia” e CBO n. 2313-20, correspondente ao “professor de geografia do ensino fundamental”; (iii) 18/9/2012 a 17/12/2019 (“Instituição Paulista Adventista de Educação e Assistência Social”), com indicação do CBO n. 3312-05 na CTPS, correspondente ao “professor de nível médio no ensino fundamental”.
Em relação aos interregnos de 22/2/2002 a 27/1/2003 (“Município de Catanduva”) e de 3/1/2003 em diante (“Estado de São Paulo/Secretaria da Educação”), verifica-se que a parte autora esteve vinculada ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) e não há, nos autos, as respectivas certidões de tempo de contribuição homologadas pelas unidades gestoras para fins de contagem recíproca no Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Por fim, quanto aos demais vínculos constantes do CNIS, a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar o desempenho das funções de professor.
A propósito, cabia à parte autora, nos termos do artigo 373, I, do Código de Processo (CPC), o ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos do direito invocado, por meio de prova suficiente e segura.
Nesse aspecto, cumpre registrar que o requerente foi intimado nos termos do despacho de id 292650783, acerca do interesse na produção de provas, e informou a ausência desse interesse, por entender que os documentos coligidos aos autos seriam suficientes à comprovação dos fatos declinados na peça inaugural.
Desse modo, prospera o pleito de reconhecimento somente dos períodos de 5/2/1998 a 3/1/2003, 2/2/2004 a 21/12/2011 e 18/9/2012 a 17/12/2019 como exercício efetivo em funções de magistério.
Nesse contexto a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição do professor, pois não se faz presente o requisito temporal (30 anos de efetivo exercício em funções de magistério) necessário para a concessão do benefício em contenda, consoante disposto no artigo 56 da Lei n. 8.213/1991.
Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (artigo 85, § 14, da Lei n. 13.105/2015), os honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, serão distribuídos entre os litigantes (art. 86 do CPC) na proporção de 30% (trinta por cento) em desfavor do INSS e 70% (setenta por cento) em desfavor da parte autora, ficando, porém, em relação a esta, suspensa a exigibilidade, por ser beneficiária da justiça gratuita (artigo 98, § 3º, do CPC).
Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para, nos termos da fundamentação, anular a sentença e, conforme artigo 1.013, § 3º, I, do CPC, julgo parcialmente procedente o pedido somente para reconhecer a atividade comum urbana de professor de educação básica nos períodos de 5/2/1998 a 3/1/2003, 2/2/2004 a 21/12/2011 e 18/9/2012 a 17/12/2019.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DO PROFESSOR. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. SENTENÇA ANULADA. CAUSA MADURA PARA JULGAMENTO. NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO TEMPORAL PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A questão da necessidade de prévio requerimento administrativo como condição para o regular exercício do direito de ação foi definitivamente dirimida pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE n. 631.240, em 3/9/2014 (ementa publicada em 10/11/2014), sob o regime de repercussão geral.
- O que se exige para demonstrar a pretensão resistida e o estabelecimento da lide é o pedido administrativo de concessão de benefício, o qual, in casu, foi formulado em anteriormente ao ajuizamento da ação. Configurado o interesse de agir.
- Não há óbice a que o julgador, ultrapassada a questão prejudicial, passe à análise do mérito propriamente dito. Esse entendimento decorre do artigo 1013, § 3º, do Código de Processo Civil (CPC).
- Demonstrado o trabalho efetivo no magistério, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição do professor, apenas de parte dos períodos controversos.
- Não preenchidos os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do professor.
- Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (artigo 85, § 14, da Lei n. 13.105/2015), os honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, serão distribuídos entre os litigantes (art. 86 do CPC) na proporção de 30% (trinta por cento) em desfavor do INSS e 70% (setenta por cento) em desfavor da parte autora, ficando, porém, em relação a esta, suspensa a exigibilidade, por ser beneficiária da justiça gratuita (artigo 98, § 3º, do CPC).
- Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Apelação da parte autora parcialmente provida para anular a sentença.
- Pedido parcialmente procedente.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
