Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5033129-32.2018.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 30/07/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO
SUFICIENTE PARA PARTE DOS PERÍODOS PLEITEADOS. APELAÇÃO AUTÁRQUICA
CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, após reconhecimento de trabalho rural.
- Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, por ter sido proferida a
sentença na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1000 (mil) salários-
mínimos. No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.
- Adstrito ao princípio que norteia o recurso de apelação (tantum devolutum quantum appellatum),
procede-se ao julgamento apenas da questão ventilada na peça recursal.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula 149 do STJ).
- No julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, submetido
ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a matéria
concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
- Não obstante entendimento pessoal deste relator, prevalece a tese de que deve ser computado
o tempo de serviço desde os 12 (doze) anos de idade, desde que amparado em conjunto
probatório suficiente. Questão já decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos
Juizados Especiais Federais, que editou a Súmula n. 5.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural, no período de 11/1/1978 (quando o
autor completou 12 anos de idade) a 15/8/1985 (data imediatamente anterior ao primeiro vínculo
rural anotado em CTPS), independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins
de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n.
8.213/91).
- Apelação do INSS conhecida e parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5033129-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO APARECIDO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5033129-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO APARECIDO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento do tempo de serviço
rural sem registro em carteira de trabalho (de 1976 a agosto de 1985, de outubro de 1999 a
fevereiro de 2003, de junho de 2008 a 2010, de abril de 2013 a julho de 2015 e nos intervalos dos
vínculos anotados em CTPS de 1995 a 2013), com vistas à concessão de aposentadoria por
tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente o pedido para reconhecer o labor exercido na lavoura, no
intervalo compreendido entre 1976 e a data da celebração do casamento do autor (18/2/1989),
com a ressalva que o período anterior ao início de vigência da Lei n. 8.213/91 é isento de
contribuições, mas não é considerado para efeito de carência; ademais, fixou a sucumbência
recíproca.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação na qual alega, em síntese, a impossibilidade do
reconhecimento efetuado.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5033129-32.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO APARECIDO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: TAKESHI SASAKI - SP48810-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso de apelação,
porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, por ter sido proferida a sentença
na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1000 (mil) salários-mínimos.
No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.
Ademais, tendo em vista que a sentença monocrática reconheceu o labor rural no período de
1976 a 1989 (data da celebração do casamento) e não houve apelo da parte autora, respeitando-
se, assim, o princípio da devolutividade dos recursos ou tantum devolutum quantum apellatum,
passo à análise apenas da questão trazida a julgamento (reconhecimento de trabalho
campesino).
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/91:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural , anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art.
12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16
de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural ;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural ."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves
Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a
matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso vertente, há início de prova material em nome da parte autora presente na certidão de
casamento, a qual anota a profissão de tratorista em 18/2/1989.
No mesmo sentido, foram trazidos aos autos os seguintes documentos: (i) certidão de casamento
dos genitores do autor, em que a profissão de seu pai (Sr. Petronilho Antunes de Souza) consta
como lavrador (1961); (ii) cópia de anotação escolar do autor, em que informa que seu pai atuava
como lavrador e que sua família residia na “Fazenda Nova Buenópolis” (1976); (iii) carteira do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Município de Lavínia em nome do genitor do autor com
data de 1971; (iv) recibo de quitação geral relativo ao trabalho exercido pelo requerente para a
“Fazenda Safira” (2010); (v) cópia de sua CTPS, com a maioria de vínculos rurais, a partir de
16/8/1985.
Ademais, os testemunhos colhidos sob o crivo do contraditório corroboraram o labor asseverado,
sobretudo ao afirmarem o trabalho rural do autor desde tenra idade.
A esse respeito, entende-se na jurisprudência ser possível o reconhecimento de tempo de serviço
em períodos anteriores à Constituição Federal de 1988, nas situações em que o trabalhador rural
tenha iniciado suas atividades antes dos 14 anos.
Nesse sentido, como não há elementos seguros que apontem o início da atividade, pessoalmente
entendo ser razoável sua fixação na idade de 16 (dezesseis) anos.
Isso porque o próprio Código Civil de 1916, então vigente, em seu artigo 384, VII, autorizava a
realização de serviços pelos filhos menores, desde que adequados a sua idade e condição, sem
que isso configurasse relação de emprego para fins trabalhistas ou previdenciários.
Eis o conteúdo de tal norma:
"Art. 384. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
(...)
V. Representa-los, até aos dezeseis annos, nos actos da vida civil, e assisti-los, após essa idade,
nos actos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento. (Redação dada pelo Decreto do
Poder Legislativo nº 3.725, de 1919).
(...)
VII. Exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição."
A mim me parece, dessarte, que as atividades realizadas no campo, ao lado dos pais, pelo menor
de 16 (dezesseis) anos, não poderiam ser computadas para fins previdenciários, ou mesmo
trabalhistas, porquanto não atendidos os requisitos do artigo 3º, caput, da CLT, in verbis:
"Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não
eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário."
Por outro lado, se o menor de 16 (dezesseis) anos realizar atividades rurais para reais
empregadores - isto é, sem assistência dos pais -, nesse caso se deve, juridicamente, reconhecer
a relação de emprego para todos os fins de direito.
Não obstante, o entendimento desta Egrégia Nona Turma é no sentido de que, não havendo
elementos seguros que apontem o início da atividade, deve ser computado o tempo de serviço
desde os12 (doze) anos de idade.
Tal se dá porque, conquanto histórica a vedação constitucional do trabalho infantil, na década
1960 a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que nossos constituintes
viam, àquela época, como realidade incontestável, que o menor efetivamente desempenhava
atividade no campo ao lado dos pais.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados
Especiais Federais, que editou a Súmula n. 5: "A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14
anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser
reconhecida para fins previdenciários." (DJ 25.09.2003)
Assim, deve ser ressalvado o entendimento pessoal deste relator convocado, a fim de
acompanhar a tese já consolidada na Nona Turma.
Posto isto, in casu, entendo demonstrado o labor rural, sem registro em carteira de trabalho,
apenas no interstício de 11/1/1978 (quando o autor completou 12 anos de idade) a 15/8/1985
(data imediatamente anterior ao primeiro vínculo rural anotado em CTPS), independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º,
e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/91).
Diante do exposto, conheço da apelação do INSS e lhe dou parcial provimento, para, nos termos
da fundamentação, apenas restringir o reconhecimento do trabalho rural, sem registro em CTPS,
ao interstício de 11/1/1978 a 15/8/1985, independentemente do recolhimento de contribuições,
exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos
da Lei n. 8.213/91).
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO
SUFICIENTE PARA PARTE DOS PERÍODOS PLEITEADOS. APELAÇÃO AUTÁRQUICA
CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.
- Discute-se o atendimento das exigências à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição, após reconhecimento de trabalho rural.
- Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, por ter sido proferida a
sentença na vigência do Novo CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1000 (mil) salários-
mínimos. No presente caso, a toda evidência não se excede esse montante.
- Adstrito ao princípio que norteia o recurso de apelação (tantum devolutum quantum appellatum),
procede-se ao julgamento apenas da questão ventilada na peça recursal.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural se encontra pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula 149 do STJ).
- No julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, submetido
ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a matéria
concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
- Não obstante entendimento pessoal deste relator, prevalece a tese de que deve ser computado
o tempo de serviço desde os 12 (doze) anos de idade, desde que amparado em conjunto
probatório suficiente. Questão já decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos
Juizados Especiais Federais, que editou a Súmula n. 5.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural, no período de 11/1/1978 (quando o
autor completou 12 anos de idade) a 15/8/1985 (data imediatamente anterior ao primeiro vínculo
rural anotado em CTPS), independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins
de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n.
8.213/91).
- Apelação do INSS conhecida e parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação do INSS e lhe dar parcial provimento, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
