D.E. Publicado em 16/08/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, reconhecer, de ofício, a coisa julgada e extinguir o processo sem resolução de mérito, julgar prejudicada a apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003304-71.2013.4.03.6130/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelações interpostas em face da r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a nulidade da cobrança de débito do INSS, referente ao benefício NB 506.719.318-9, no período de 1/3/2005 a 12/8/2011, antecipando os efeitos da tutela para determinar ao INSS que se abstenha de realizar a cobrança. Em relação ao pedido de restabelecimento de auxílio-doença ou concessão de aposentadoria por invalidez, extinguiu o feito sem resolução de mérito.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
A parte autora, em suas razões, alega ter preenchido os requisitos necessários à concessão de benefício por incapacidade.
Nas razões de apelação, a autarquia sustenta, em síntese, a legalidade da cobrança dos valores indevidamente recebidos.
Contrarrazões apresentadas.
O representante do MPF opina pela extinção do feito, sem resolução do mérito, quanto ao pedido de concessão de benefício por incapacidade, tendo em vista a coisa julgada, e pelo desprovimento das apelações das partes.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos recursos, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
No caso, salta patente a ocorrência de coisa julgada, porquanto a parte autora movera outra ação idêntica no Juizado Especial Federal Cível de Osasco (autos n. 0006354-33.2011.4.03.6306), julgada improcedente diante da ausência de incapacidade para as atividades habituais, sobrevindo o trânsito em julgado em 16/5/2012 (f. 19).
Porém, a parte autora, em vez de interpor apelação em face daquela sentença, preferiu mover outra ação em 26/7/2013, com os mesmos fatos, mesmo pedido e causa de pedir.
Em ambas as demandas pretende a parte autora a concessão de benefício por incapacidade, alegando o mesmíssimo fato gerador como causa petendi desta ação.
Na petição inicial, o autor alega ser portador de esquizofrenia desde 2005, que o impede de realizar atividades laborais. Aduz, ainda, que recebeu o auxílio-doença NB 506.719.318-9, cessado em 12/8/2011, pretendendo seu restabelecimento, com a conversão em aposentadoria por invalidez.
Ocorre que a doença apontada nesta ação é a mesma indicada na anterior, e os documentos médicos colacionados à petição inicial, que poderiam indicar eventual agravamento do quadro, são anteriores à data do trânsito em julgado da ação pretérita.
O autor ainda requer o reconhecimento da DII em 1/3/2005. Contudo, tal questão deveria ter sido invocada na demanda anterior, inclusive em sede de apelação.
Note-se que, como dito, o autor sequer recorreu daquela sentença de improcedência proferida na ação do Juizado.
Segundo o disposto no artigo 337, §1º do novo Código de Processo Civil, "verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada".
Conforme a doutrina: "Litispendência. Dá-se a litispendência quando se repete ação idêntica a uma que se encontra em curso, isto é, quando a ação proposta tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir (próxima e remota) e o mesmo pedido (mediato e imediato). A segunda ação tem de ser extinta sem conhecimento do mérito. V. coment. CPC 301." (Nelson Nery Jr, Rosa Maria Andrade Nery, Código de Processo Civil, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, notas ao art. 267, p. 728).
Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados:
Assim, esta ação não pode prosseguir, pois suscita lide já decidida em anterior demanda, com trânsito em julgado. Essa questão adquiriu o atributo de coisa julgada e, por esse motivo, é imutável, impondo-se a extinção deste feito em relação aos pedidos de concessão de benefício por incapacidade.
Passo à análise do pedido de cobrança dos valores indevidamente recebidos a título de auxílio-doença concedido administrativamente.
No caso, a parte autora percebeu benefício previdenciário de auxílio-doença, entre 1/3/2005 a 12/8/2011.
Todavia, em auditoria realizada no benefício (revisão administrativa), o INSS considerou ilegal a percepção do benefício porque redefiniu a Data do Início da Incapacidade - DII em 13/11/2001, ou seja, em período preexistente à filiação havida em 01/2004.
Deve ser enfatizado desde logo que a Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista.
Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie.
A Administração pode rever seus atos. Ao final das contas, a teor da Súmula 473 do E. STF "A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial".
Por um lado, quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91.
Trata-se de norma cogente, que obriga o administrador a agir, sob pena de responsabilidade.
A lei normatizou a hipótese fática controvertida nestes autos e já trouxe as consequências para tanto, de modo que não cabe ao juiz fazer tabula rasa do direito positivo.
Há que se levar em conta o princípio geral do direito, positivado no atual Código Civil, consistente na proibição do enriquecimento ilícito.
E as regras acima citadas, previstas na lei e regulamentadas no Decreto nº 3.048/99, não afrontam a Constituição Federal. Logo, são válidas e eficazes.
Noutro passo, não há lei no direito positivo brasileiro determinando que, por se tratar de verba alimentar, o benefício é irrepetível.
A construção jurisprudencial, que resultou no entendimento da irrepetibilidade das rendas recebidas a título de benefício previdenciário, por constituírem verba alimentar, pode incorrer em negativa de vigência à norma do artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91.
E as regras acima citadas, previstas na lei e regulamentadas no Decreto nº 3.048/99, não afrontam a Constituição Federal. Logo, são válidas e eficazes.
Há inúmeros precedentes no sentido da necessidade de devolução dos valores indevidamente recebidos da seguridade social, inclusive oriundos do Superior Tribunal de Justiça.
Em vários casos de pagamento indevido, há precedentes de tribunais federais no sentido da necessidade de devolução.
Nesse diapasão, mutatis mutandis:
A Justiça, ademais, avançou na análise das questões relativas à repetibilidade de prestações previdenciárias. Sim, quanto aos casos de revogação da tutela antecipada, há inúmeros precedentes na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que abordaram a questão.
Cite-se o REsp 1.384.418/SC, de relatoria do ministro Herman Benjamin. "Não é suficiente, pois, que a verba seja alimentar, mas que o titular do direito o tenha recebido com boa-fé objetiva, que consiste na presunção da definitividade do pagamento", ponderou o relator.
Em outro julgamento do Superior Tribunal de Justiça (REsp 988.171), o ministro Napoleão Nunes Maia Filho elucidou a questão da seguinte forma: "embora possibilite a fruição imediata do direito material, a tutela não perde a sua característica de provimento provisório e precário, daí porque a sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos em decorrência dela".
Posteriormente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, uniformizou o entendimento quanto à necessidade de devolução, consoante se observa da análise da seguinte ementa:
Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, em recurso repetitivo, consolidou o entendimento de que, em casos de cassação de tutela antecipada, a lei determina a devolução dos valores recebidos, ainda que se trate de verba alimentar e ainda que o beneficiário aja de boa-fé:
Conquanto a presente controvérsia não trate de revogação de tutela específica - mas sim de benefício concedido ilegalmente, na via administrativa - o atual momento da jurisprudência indica uma atenção maior ao princípio da moralidade administrativa.
Nada obstante o quanto foi dito acima, observo que o INSS praticou erro administrativo que beneficiou a parte autora, situação tratada de forma diversa pelo próprio Superior Tribunal de Justiça.
Com efeito, esse tribunal possui posição firme no sentido de que, nos casos de erro administrativo na concessão de benefício previdenciário percebido de boa-fé pelo segurado, é indevida a devolução, muito embora deva ser realizada a revisão administrativa para corrigir o erro.
Nesse diapasão:
Curvo-me, assim, à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a fim de evitar insegurança jurídica e proliferação de outras demandas.
Consequentemente, a parte autora ficará desobrigada de devolver os valores pagos indevidamente, devendo a r. sentença ser mantida neste aspecto.
Considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º e 11, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Diante do exposto, reconheço, de ofício, a existência de coisa julgada e, por consequência, extingo o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, inciso V e § 3º, do CPC. Prejudicada a apelação da parte autora e negado provimento à apelação do INSS.
Dê-se vista ao MPF.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 01/08/2017 17:19:00 |