Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5032944-86.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
16/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 22/04/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL E
PERMANENTE. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. DEVIDA A CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO. TERMO INICIAL DA BENESSE. DER. DCB. FIXAÇÃO. POSSIBILIDADE.
- Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
- É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015. Contudo, no caso em tela, não foram acostados aos autos elementos
com o condão de infirmar as conclusões do expert, razão pela qual há que se prestigiar a
conclusão da prova técnico-pericial quanto à incapacidade apresentada pela parte autora.
- Conquanto o INSS aponte a inexistência de incapacidade diante do retorno da parte autora, ora
apelante, ao exercício de atividade laborativa, desde 21/05/2019, tal circunstância, por si, não é
suficiente para infirmar sua incapacidade, sendo, na realidade, fruto da necessidade de
manutenção do próprio sustento e da família enquanto aguarda definição acerca do benefício
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
postulado.
- A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a
data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na data do requerimento administrativo, e
apenas na ausência deste, a partir da citação do INSS.
- Diante de expressa disposição legal, o ato concessório do benefício deverá fixar a data de
interrupção do benefício sempre que tal circunstância seja possível, aplicando-se, em caso de
omissão, o prazo de duração de 120 (cento e vinte dias), ressalvada a possibilidade de o
segurado requerer a sua prorrogação. Precedentes.
- Apelação da parte autora provida em parte e apelação autárquica não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5032944-86.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MARCIA HELENA DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MAURICIO CESAR NASCIMENTO TOLEDO - SP329102-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARCIA HELENA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: MAURICIO CESAR NASCIMENTO TOLEDO - SP329102-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5032944-86.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MARCIA HELENA DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MAURICIO CESAR NASCIMENTO TOLEDO - SP329102-N
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (relatora):
Trata-se de apelações interpostas pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e por Marcia
Helena da Silva em face da r. sentença que julgou procedente o pedido a fim de determinar a
implantação de auxílio-doença, “aser apurado segundo o artigo 29, inciso II, c.c. artigo 61, ambos
da Lei nº 8.213/91, respeitando-se o piso de um salário mínimo (na proporção de 91%), tudo
devido a partir da citação; e também a conceder, no momento oportuno, o abono anual”.
A parte autora sustenta, em suma, que o benefício seja concedido a partir do requerimento
administrativo, formulado em 05/04/2018, pugnando, ao fim, pela majoração dos honorários
advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre a liquidação final.
Por sua vez, o INSS aduz que a incapacidade parcial aferida em perícia não impediu a
recolocação no mercado de trabalho, já que, a partir de 21/05/2019, a parte autora passou a
ostentar vínculo empregatício.
Assim, diante da ausência de impedimento no desenvolvimento de sua atividade laborativa
habitual, não se afigura devido o benefício de auxílio-doença, a teor dos arts. 42, §1º, e 59,
ambos da Lei nº 8.213/91, sendo de rigor, ainda, a devolução dos valores pagos
concomitantemente aos proventos advindos do exercício laboral.
Apresentadas as contrarrazões.
É o relatório.
ms
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5032944-86.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MARCIA HELENA DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (relatora):
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
A cobertura da contingência invalidez/incapacidade permanente é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II - Da Seguridade Social, no artigo 201, inciso I, da Constituição da
República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade
avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
Com efeito, a Reforma da Previdência de 2019 (EC nº 103/2019) modificou a denominação da
invalidez para incapacidade permanente.
A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social
(PBPS), disciplina em seus artigos 42, caput, e 59, caput, as condições à concessão de
benefícios por incapacidade, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”
Aaposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 do PBPS, é o benefício destinado ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o seu
trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou em
razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Desse modo, o evento determinante para a concessão desses benefícios consiste na
incapacidade para o trabalho.
Na hipótese de incapacidade temporária, ainda que de forma total e permanente, será cabível a
concessão de auxílio-doença, o qual posteriormente será convertido em aposentadoria por
invalidez (caso sobrevenha incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se for extinta a
incapacidade temporária e o segurado permanecer com sequela permanente que enseje a
redução da sua capacidade laboral) ou cessado (quando ocorrer a cura do segurado).
São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de
segurado, a carência e a incapacidade laborativa.
1. O primeiro, consiste na qualidade de segurado, consoante o art. 15 da LBPS. É cediço que
mantém a qualidade de segurado aquele que, ainda que esteja sem recolher as contribuições,
preserve todos os seus direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, ao
qual a doutrina denominou "período de graça", de acordo com o tipo de segurado e a sua
situação, conforme dispõe o art. 15 da Lei de Benefícios, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação
dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Releva observar que o § 1º do art. 15 da Lei nº 8.213/1991 prorroga o período de graça por 24
meses àqueles que contribuíram por mais de 120 meses, sem interrupção que acarrete a perda
da qualidade de segurado.
Ademais, restando comprovado o desemprego do segurado, mediante registro perante o órgão
próprio do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos do inciso II ou do § 1º do
art. 15 da Lei de Benefícios serão acrescidos de mais 12 meses (art. 15, § 2°, da Lei n.
8.213/1991).
É evidente que a situação de desemprego deve ser comprovada, pela inscrição perante o
Ministério do Trabalho (artigo 15, § 2º, da Lei n.8.213/1991), ou por qualquer outro meio
probatório (v.g., prova documental, testemunhal, indiciária etc.).
Importa esclarecer que, consoante o disposto no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 14
do Decreto nº 3.048/99 (que aprova o Regulamento da Previdência Social – RPS), com a redação
dada pelo Decreto nº 4.032/2001, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do
segundo mês seguinte ao término do prazo estabelecido no art. 30, inciso II, da Lei nº 8.212/1991
para recolhimento da contribuição, ensejando, por conseguinte, a caducidade do direito
pretendido, exceto na hipótese do § 1º do art. 102 da Lei nº 8.213/91, isto é, quando restar
comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir foi decorrente da
incapacidade laborativa.
Frise-se que com o decurso do período de graça, as contribuições anteriores à perda da
qualidade de segurado apenas serão computadas para efeitos de carência após o recolhimento
pelo segurado, a partir da nova filiação ao RGPS, conforme o caso, de, ao menos, 1/3 (um terço)
do número de contribuições necessárias para o cumprimento da carência exigida para benefícios
por incapacidade, ou seja, quatro contribuições (durante a vigência do art. 24, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91) ou metade deste número de contribuições (de acordo com o art. 27-A da Lei de
Benefícios, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
2. O segundo requisito diz respeito à carência de 12 (doze) contribuições mensais, consoante o
disposto no art. 25 da Lei nº 8.213/1991, a saber:
“Art.25.A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
No entanto, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após
filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas no art. 151 da Lei de Benefícios, que
dispõe:
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada.(Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)”
3. O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho de modo permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e na incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos
(auxílio-doença).
Anote-se que para a concessão de benefícios por incapacidade é preciso a demonstração de
que, ao tempo da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto se a
incapacidade sobrevier em decorrência de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
Estabelecem os artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
“Art. 42. (...)
§ 2ºA doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
“Art. 59. (...)
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Logo, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura
óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou
agravamento da moléstia, ex vi do art. 42, § 2º, da Lei de Benefícios.
Na hipótese de ser reconhecida a incapacidade somenteparcialpara o trabalho, o magistrado
deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Ademais, pode conceder auxílio-acidente, nos
moldes do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, se a incapacidade parcial decorre de acidente de
trabalho ou de qualquer natureza, ou ainda, de doença profissional ou do trabalho (art. 20, incisos
I e II, da Lei de Benefícios).
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o
magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros
elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais,
sociais e profissionais.
Confira-se alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que dizem respeito a
esse tema:
Súmula 47 da TNU: "Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez".
Súmula 53 da TNU:"Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social".
Súmula 77 da TNU:"O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual".
O art. 43, §1º, da Lei nº 8.213/1991 preceitua que a concessão da aposentadoria por invalidez
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame
médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial
consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o
segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido
entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da
Seguridade Social.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência
permanente de outra pessoa (grande invalidez), é possível, com supedâneo no art. 45 da Lei de
Benefícios, o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto
No caso vertente, consta do laudo médico pericial que a parte autora, com 47 (quarenta e sete)
anos de idade na data da perícia, realizada em 28/04/2020, é portadora de Atrose de joelhos,
Espondiloartrose de coluna vertebral e obesidade mórbida, estando parcial e temporariamente
incapacitada para o trabalho.
Neste sentido, elucidativa a conclusão pericial (ID 151976323 - Pág. 4):
“Ante o exposto, conclui-se que a autora apresenta um quadro patológico degenerativo da coluna
vertebral e joelhos, tendo como causa agravante a obesidade, provocando limitações para
realização de atividades que tenha de fazer maiores esforços físicos e que tenha de permanecer
longos períodos de pé. Pode ter recuperação com tratamento especializado como perda de peso
e fisioterapia, considerando que suas patologias são de media gravidade. A incapacidade
avaliada por este perito é parcial e permanente para o trabalho”
Ainda, em resposta aos quesitos formulados pela parte ré, esclarece o expert (ID 151976323 -
Págs. 5/6):
“c) Se existe incapacidade, é total ou parcial, permanente ou temporária?
Resposta: Incapacidade parcial e temporária.
d) Caso a incapacidade seja temporária, em quanto tempo o Sr. Perito Judicial estima que ocorra
a recuperação?
Resposta: Com tratamento médico especializado, pode ter recuperação em período aproximado
de um ano.
e) A doença que acomete o autor pode ser considerada acidente de trabalho ou doença
ocupacional? Há nexo de causalidade com a atividade que o autor desempenhava?
Fundamentar.
Resposta: Não. Não.
(...)
h) Se constatada, qual a data do início da doença e da incapacidade do autor? Fundamentar com
documentos médicos.
Resposta: De acordo com documentos médicos analisados em setembro de 2017, a autora
estava apresentando problemas nos joelhos.
i) Qual a atividade que a parte autora vem exercendo ou qual foi a última exercida?
Resposta: Exercia atividades de auxiliar de limpeza, e a última atividade que vem exercendo é de
cuidadora de deficientes desde 21/05/2019, de acordo com anotações em carteira profissional.
j) Há possibilidade de a parte autora desempenhar uma atividade diversa daquela que vinha
exercendo? Justificar.
Resposta: Sim.
k) Caso seja constatada incapacidade laborativa, há possibilidade de reabilitação profissional?
Resposta: Sim.
l) A(s) mazela(s) está(ão) consolidada(s) e é(são) irreversível(is)? Resposta: Não. Podem ser
reversíveis
É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015. Contudo, no caso em tela, não foram acostados aos autos elementos
com o condão de infirmar as conclusões do expert, razão pela qual há que se prestigiar a
conclusão da prova técnico-pericial quanto à incapacidade apresentada pela parte autora.
Ainda, conquanto o INSS aponte a inexistência de incapacidade diante do retorno da parte
autora, ora apelante, ao exercício de atividade laborativa, desde 21/05/2019, tal circunstância, por
si, não é suficiente para infirmar sua incapacidade, sendo, na realidade, fruto da necessidade de
manutenção do próprio sustento e da família enquanto aguarda definição acerca do benefício
postulado.
Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE
INCAPACIDADE NA DATA DA PERÍCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO. CONDIÇÕES PESSOAIS.
1. O benefício de auxílio doença é devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize
temporariamente o exercício de sua profissão. Já a aposentadoria por invalidez exige que o
segurado seja considerado incapaz e insusceptível de convalescença para o exercício de ofício
que lhe garanta a subsistência. (...) 6.Acolhendo o entendimento anteriormente por mim
defendido, no sentido de entender desarrazoado negar o benefício por incapacidade, nos casos
em que a segurada, apesar das limitações sofridas em virtude dos problemas de saúde, retoma
sua atividade laborativa, por necessidade de manutenção do próprio sustento e da família, e que
seria temerário exigir que se mantivesse privada dos meios de subsistência enquanto aguarda a
definição sobre a concessão do benefício pleiteado, a c. Primeira Seção do e. Superior Tribunal
de Justiça (STJ), em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 1.013), fixou a tese de
que, no período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio doença ou
de aposentadoria por invalidez mediante decisão judicial, o segurado do Regime Geral de
Previdência Social (RGPS) tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido -
ainda que incompatível com a sua incapacidade laboral - e do benefício previdenciário pago
retroativamente. (...) 11. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos
termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art.
3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93. 12. Remessa oficial e apelação providas
em parte.
(TRF3 - ApelRemNec 5562762-94.2019.4.03.9999. RELATOR: Desembargador Federal PAULO
OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, 10ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/10/2020)
Desta feita, afigura-se devido o benefício de auxílio-doença.
Data de início do benefício (DIB)
É cediço que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no
sentido de que a data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na data do requerimento
administrativo, e apenas na ausência deste, a partir da citação do INSS.
Com efeito, consoante estabelecido pelo C. Superior Tribunal de Justiça por ocasião do
julgamento do Recurso Especial nº 1.369.165/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos
(Tema 626), “a citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal
e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez
concedida na via judicial quando ausente a prévia postulação administrativa”.
Posteriormente, houve a edição da Súmula 576 do STJ, com a seguinte redação: “ausente
requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por
invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida”.
Por sua vez, à luz do entendimento expendido pela referida Corte Superior, nas hipóteses em que
a controvérsia paira sobre a concessão de aposentadoria por invalidez, ou o restabelecimento de
auxílio-doença, a correspondente concessão judicial não constitui novo benefício, mas a
restauração de uma benesse indevidamente interrompida.
Assim, o termo inicial, em tais circunstâncias, deve corresponder ao dia imediatamente posterior à
data da cessação indevida do auxílio-doença.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
TERMO INICIAL. DATA DA CESSAÇÃO INDEVIDA DO AUXÍLIO-DOENÇA. AGRAVO INTERNO
NÃO PROVIDO.
1. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que "o termo inicial da concessão do benefício
previdenciário de aposentadoria por invalidez é o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença,
no caso de ausência de prévia postulação administrativa. Incidência da Súmula 83/STJ." (AgRg
no AgRg no AREsp 813.589/MS, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 22/3/2016) 2.
Agravo interno não provido.”
(AgInt no AREsp 915.208/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 19/12/2016) (grifei)
“RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. RESTABELECIMENTO DE
BENEFÍCIO. TERMO INICIAL NA DATA DA CESSAÇÃO INDEVIDA.
O benefício de auxílio-doença cessado indevidamente tem como termo inicial a data da cessação
indevida, pois não constitui novo benefício, mas o restabelecimento de uma relação
erroneamente interrompida.
Recurso especial a que se nega provimento.”
(REsp 704.004/SC, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 06/10/2005, DJ
17/09/2007, p. 365)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LEI Nº
8.213/1991. CONCESSÃO DO BENEPLÁCITO NA VIA ADMINISTRATIVA. INTERESSE DE
AGIR DA PARTE AUTORA NO ÁTRIO JUDICIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO
CONCEDIDO. (...) - Presentes os requisitos legais, é devido o benefício de aposentadoria por
invalidez, desde a data seguinte à cessação do auxílio-doença concedido entre 07/10/2006 a
31/12/2007, uma vez que o conjunto probatório dos autos permite concluir que a incapacidade
total e permanente do autor advém desde então, estabelecendo-se o termo final do benefício, na
data de início da aposentação concedida na senda administrativa. (...) - Pedido julgado
procedente, com fulcro no artigo 1.013, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
(TRF3 - ApCiv 5002682-32.2016.4.03.9999. RELATOR: Juiz Federal Convocado VANESSA
VIEIRA DE MELLO, 9ª Turma, Intimação via sistema DATA: 22/11/2019)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, CAPUT E § 2º DA LEI
8.213/91. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 e 62 DA LEI N.º 8.213/91. ATIVIDADE URBANA.
QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE.
REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - Comprovada a incapacidade parcial e permanente
para o trabalho, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º
8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença. - O termo inicial do benefício
deve ser fixado no dia imediatamente posterior à cessação indevida da aposentadoria por
invalidez anteriormente concedida à parte autora, uma vez que o conjunto probatório existente
nos autos revela que o mal de que ela é portadora não cessou desde então, não tendo sido
recuperada a capacidade laborativa, devendo ser descontados eventuais valores pagos
administrativamente. (...) Apelação da parte autora parcialmente provida.
(TRF3 - ApCiv 5670251-93.2019.4.03.9999. RELATOR: Desembargador Federal MARIA LUCIA
LENCASTRE URSAIA, 10ª Turma, Intimação via sistema DATA: 22/11/2019)
Com efeito, depreende-se que a parte autora estava parcial e temporariamente incapacitada
desde setembro de 2017, razão por que de rigor a concessão do benefício a partir da DER, em
05/04/2018 (ID 151976286 - Pág. 1).
Data de cessação do benefício (DCB)
O benefício de auxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para
o seu trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou
em razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Sob tal perspectiva, estabelece o art. 60, §§8º e 9º, da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela
Medida Provisória nº 767/17, posteriormente convertida na Lei nº 13.457/17, que, sempre que
possível, o ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença, seja na seara judicial ou
administrativa, deverá estipular o prazo estimado para a correspondente duração.
Com efeito, caso tal interregno não seja fixado, o benefício cessará após o transcurso do prazo
de 120 (cento e vinte dias), contados da data da respectiva concessão ou reativação, salvo nas
hipóteses em que o segurado requer a sua prorrogação perante o INSS, in verbis:
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do
afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da
incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.
(...)
§ 8oSempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou
administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.
§ 9oNa ausência de fixação do prazo de que trata o § 8odeste artigo, o benefício cessará após o
prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença,
exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento,
observado o disposto no art. 62 desta Lei.
Evidencia-se, portanto, que, diante de expressa disposição legal, o ato concessório do benefício
deverá fixar a data de interrupção do benefício sempre que tal circunstância seja possível,
aplicando-se, em caso de omissão, o prazo de duração de 120 (cento e vinte dias), ressalvada a
possibilidade de o segurado requerer a sua prorrogação.
Neste sentido:
PREVIDÊNCIA SOCIAL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
APELAÇÕES DAS PARTES. INCAPACIDADE PARCIAL E TEMPORÁRIA QUE IMPEDE O
TRABALHO HABITUAL. AUXÍLIO-DOENÇA MANTIDO. TERMO FINAL. ART. 45, DA Lei
8.213/91. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. I -
Considerando que o valor da condenação ou proveito econômico não ultrapassa 1.000 (mil)
salários mínimos na data da sentença, conforme art. 496, § 3º, I do CPC/2015, não é caso de
remessa oficial. II - Para a concessão da aposentadoria por invalidez é necessário comprovar a
condição de segurado(a), o cumprimento da carência, salvo quando dispensada, e a
incapacidade total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem os mesmos requisitos,
ressalvando-se a incapacidade, que deve ser total e temporária para a atividade habitualmente
exercida. III - Comprovada a incapacidade parcial e temporária que impede o trabalho habitual.
Mantido o auxílio-doença. IV - Nos benefícios por incapacidade (aposentadoria por invalidez e
auxílio-doença), sempre que possível, deve ser fixada a data de cessação do benefício prevista
nas Medidas Provisórias n. 739, de 07/07/2016, e n. 767, de 06/01/2017 (convertida na Lei n.
13.457/2017), em vigor enquanto não houver decisão dos Tribunais Superiores pela sua
inconstitucionalidade. V - Data da cessação do benefício fixada em 06 (seis) meses a contar do
laudo pericial, pois de acordo com o perito judicial necessária reavaliação para verificação da
recuperação da capacidade e efetividade do tratamento a ser implementado. VI - O(A) autor(a)
sucumbiu em parte mínima do pedido, não sendo aplicável a sucumbência recíproca. Tratando-se
de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária será fixado somente na liquidação do
julgado, na forma do disposto no art. 85, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, ambos do CPC/2015, e
incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111 do STJ). VII - O pedido
de concessão do percentual previsto no art. 45, da Lei 8.213/91 restou prejudicado VIII -
Apelações das partes parcialmente providas.
(TRF3 - ApCiv 5000066-19.2018.4.03.6118. RELATOR: Desembargador Federal MARISA
FERREIRA DOS SANTOS, 9ª Turma, Intimação via sistema DATA: 31/01/2020)
No caso dos autos, foi estimado o prazo aproximado de 1 (um) ano para fins de recuperação, a
partir da data da realização da perícia, 28/04/2020, o qual, à míngua de outros elementos que
conduzam a conclusão diversa, háde ser acolhido (ID 151976323 - Pág. 5).
Contudo, diante da proximidade do termo final estipulado com a data do presente julgamentoea
fim de evitar a cessação imediata do benefíciosem possibilitar à parte autora a sua prorrogação
na eventualidade demanutenção dos males aqui observados, fixo o termo final do benefício em
60 (sessenta) dias após a publicação deste acórdão, caso não tenho sido deferida a
continuaçãodo benefício no âmbito administrativo.
Por fim, quanto à possibilidade de percepção simultânea entre o benefício por incapacidade ora
concedido e os proventos advindos do exercício de atividade laborativa, devem ser observados
os ditames estabelecidos pelo C. Superior Tribunal de Justiça no âmbito dos Recursos Especiais
nº 1.786.590/SP e nº 1.788.700/SP, alçados ao regime de julgamento de recursos repetitivos
(Tema 1.013):
“No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de
aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente”
Em razão da sucumbência recursal, a despeito do pedido de condenação sob o patamar de 15%
(quinze por cento), consoante formulado pela parte autora, majoro os honorários advocatícios em
2% (dois por cento), em favor da parte autora, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 5º e 11,
do CPC/2015.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora e nego provimento à apelação
do INSS.
É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana:
Cuida-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente o pedido de auxílio-
doença, desde a citação, com os consectários legais.
A e. Relatora negou provimento à apelação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e deu
provimento à apelação da parte autora para fixar o termo inicial do benefício na data do
requerimento administrativo (DER: 5/4/2018).
Em que pesem os fundamentos expostos no r. voto, ouso divergir e, a seguir, fundamento:
Conheço dos recursos, em razão da satisfação de seus requisitos.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade laboral, desde o
requerimento administrativo apresentado em 5/4/2018.
A cobertura do evento incapacidade para o trabalho é garantia constitucional prevista no Título
VIII, Capítulo II, da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal
(CF/1988), cuja redação atual é dada pela Emenda Constitucional n. 103, publicada em
13/11/2019 (EC n. 103/2019):
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de
incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade
permanente (EC n. 103/2019), é devida ao segurado que for considerado permanentemente
incapaz para o exercício de quaisquer atividades laborativas, não sendo possível a reabilitação
em outra profissão.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, o benefício será devido ao segurado que, estando
ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de
reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e será pago enquanto
perdurar esta condição.
Por sua vez, o auxílio-doença, atualmente denominado auxílio por incapacidade temporária (EC
n. 103/2019), é devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o trabalho e, à
luz do disposto no artigo 59 da Lei n. 8.213/1991, "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para (...) sua atividade habitual" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro
Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128).
São requisitos para a concessão desses benefícios, além da incapacidade laboral: a qualidade de
segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida, bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de benefício por incapacidade
permanente ou temporária. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei
n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer
natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade laboral, total ou parcial, depende da realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo,
o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos
pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos
autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema.
Súmula 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez”.
Súmula 53 da TNU: “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social”.
Súmula 77 da TNU: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais
quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
No caso dos autos, a perícia médica judicial, realizada em 28/4/2020, constatou incapacidade
laboral parcial e temporária da autora (nascida em 1972, auxiliar de limpeza/cuidadora), por ser
portadora de artrose de joelhos, espondiloartrose de coluna vertebral e obesidade mórbida.
O perito esclareceu:
“(...) Ante o exposto, conclui-se que a autora apresenta um quadro patológico degenerativo da
coluna vertebral e joelhos, tendo como causa agravante a obesidade, provocando limitações para
realização de atividades que tenha de fazer maiores esforços físicos e que tenha de permanecer
longos períodos de pé. Pode ter recuperação com tratamento especializado como perda de peso
e fisioterapia, considerando que suas patologias são de média gravidade(...)”.
Em resposta aos quesitos formulados, ele fixou o início da incapacidade em 2017 e sugeriu
reavaliação médica em um ano.
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.
Muito embora o perito afirme haver incapacidade laboral desde 2017, é possível concluir que as
doenças da autora não a impedem de exercer suas atividades laborais.
Os dados do cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) revelam que a autora manteve
vínculos trabalhistas de 9/8/2018 a 15/5/2019 e, desde 21/5/2019, mantém vínculo em aberto, o
que demonstra sua aptidão para o trabalho.
Nesse passo, entendo que não está patenteada a contingência necessária à concessão dos
benefícios pleiteados, pois ausente a incapacidade totalpara quaisquer atividades laborais.
Atestados e exames particulares juntados não possuem o condão de alterar a convicção formada
pelas conclusões do laudo, esse produzido sob o pálio do contraditório.
Apesar de preocupar-se com os fins sociais do direito, o juiz não pode julgar com base em
critérios subjetivos, quando não estiver patenteada no laudo aincapacidade total para o trabalho.
Com efeito, embora as doenças enfrentadas estejam estampadas nos exames e atestados
médicos apresentados, há que se demonstrar a incapacidade laborativa total, seja permanente ou
temporária, requisito inarredável para caracterização do direito à concessão de benefício por
incapacidade.
Dessa forma, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão dos
benefícios pretendidos.
É o que expressa a orientação jurisprudencial predominante:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ. ARTIGO 42 DA LEI Nº 8.213/91. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE TOTAL
PARA O TRABALHO RECONHECIDA PELO TRIBUNAL A QUO. IMPOSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. Para a concessão da aposentadoria por invalidez, é de mister
que o segurado comprove a incapacidade total e definitiva para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência. 2. Tal incapacidade deve ser observada do ponto de vista físico-funcional,
sendo irrelevante, assim, na concessão do benefício, os aspectos sócio-econômicos do segurado
e de seu meio, à ausência de previsão legal e porque o benefício previdenciário tem natureza
diversa daqueloutros de natureza assistencial. Precedentes. 3. Agravo regimental improvido.”
(AgRg no REsp 501859 / SP AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2003/0025879-
0 Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO (1112) Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA Data
do Julgamento 24/02/2005 Data da Publicação/Fonte DJ 09/05/2005 p. 485)
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO
PERICIAL CONCLUSIVO. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. CUSTAS. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. A incapacidade permanente ou temporária da parte autora não ficou
comprovada pela perícia médica. Não preenchidos, de forma indubitável, os requisitos
necessários à obtenção de qualquer um dos benefícios previdenciários pretendidos (artigos 42 e
59 da Lei nº 8.213/91), não há de ser concedido nenhum deles. (...) Apelação parcialmente
provida." (TRF/3ª Região, AC 1171863, Proc. 2007.03.99.003507-8, 8ª Turma, Rel. Des. Fed.
Newton de Lucca, DJ 27/06/2007)
“PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ – AUXÍLIO-
DOENÇA - INCAPACIDADE TOTAL - INOCORRÊNCIA - LAUDO PERICIAL - CONDIÇÕES
PESSOAIS - LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO I. Para concessão de aposentadoria por
invalidez é necessário comprovar a condição de segurado, o cumprimento da carência, salvo
quando dispensada, e a incapacidade total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem
os mesmos requisitos, ressalvando-se a incapacidade, que deve ser total e temporária. II. O
autor, apesar das queixas relatadas, não se mostrou com incapacidade em grau suficiente para
fazer jus ao recebimento do benefício III. Quanto às condições pessoais do segurado, é
prestigiando o entendimento de que a avaliação das provas deve ser realizada de forma global,
aplicando o princípio do livre convencimento motivado. IV. Agravo legal improvido.” (AC -
APELAÇÃO CÍVEL - 1672154 Processo: 0033670-97.2011.4.03.9999 UF:SP Órgão Julgador:
NONA TURMA Data do Julgamento:16/04/2012 Fonte: e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/04/2012
Relator: JUIZ CONVOCADO LEONARDO SAFI)
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS.
DECISÃO FUNDAMENTADA. I - Não procede a insurgência da parte agravante porque não
preenchidos os requisitos legais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença. II - Perícia médica judicial informa que, à época, a autora era portadora de
espondilartrose, doença que surgiu quando a pericianda tinha, aproximadamente, 40 anos, idade
em que têm início os processos degenerativos. Acrescenta que a falecida autora, no momento da
perícia, dedicava-se somente aos afazeres domésticos. Concluiu pela existência de incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, não estando incapaz para os atos da vida diária, nem
necessitando de assistência permanente de terceiros para estas atividades (...) IX - Vigora no
processo civil brasileiro o princípio do livre convencimento motivado: de acordo com o artigo 131
do CPC, o magistrado apreciará livremente a prova, indicando na sentença os motivos que lhe
formaram o convencimento. X - Consolidando este entendimento, o artigo 436 do CPC estabelece
que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com outros
elementos ou fatos provados nos autos. XI - O início de doença não se confunde com início de
incapacidade laborativa, para fins de obtenção de benefício por incapacidade. XII - Decisão
monocrática com fundamento no art. 557, caput e § 1º-A, do C.P.C., que confere poderes ao
relator para decidir recurso manifestamente improcedente, prejudicado, deserto, intempestivo ou
contrário a jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de
Tribunal Superior, sem submetê-lo ao órgão colegiado, não importa em infringência ao C.P.C. ou
aos princípios do direito. XIII - É pacífico o entendimento nesta E. Corte, segundo o qual não cabe
alterar decisões proferidas pelo relator, desde que bem fundamentadas e quando não se verificar
qualquer ilegalidade ou abuso de poder que possa gerar dano irreparável ou de difícil reparação à
parte. XIV - Não merece reparos a decisão recorrida, que deve ser mantida, porque calcada em
precedentes desta E. Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. XV - Agravo improvido.” (AC -
APELAÇÃO CÍVEL - 1471967 Processo: 0000282-73.2006.4.03.6122 UF: SP Órgão Julgador:
OITAVA TURMA Data do Julgamento: 05/12/2011 Fonte: e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/12/2011
Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARIANINA GALANTE)
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC,
suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por
tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedentes os pedidos.
Em decorrência, julgo prejudicada a apelação da parte autora.
É o voto.
DALDICE SANTANA
Desembargadora Federal
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL E
PERMANENTE. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. DEVIDA A CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO. TERMO INICIAL DA BENESSE. DER. DCB. FIXAÇÃO. POSSIBILIDADE.
- Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
- É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015. Contudo, no caso em tela, não foram acostados aos autos elementos
com o condão de infirmar as conclusões do expert, razão pela qual há que se prestigiar a
conclusão da prova técnico-pericial quanto à incapacidade apresentada pela parte autora.
- Conquanto o INSS aponte a inexistência de incapacidade diante do retorno da parte autora, ora
apelante, ao exercício de atividade laborativa, desde 21/05/2019, tal circunstância, por si, não é
suficiente para infirmar sua incapacidade, sendo, na realidade, fruto da necessidade de
manutenção do próprio sustento e da família enquanto aguarda definição acerca do benefício
postulado.
- A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento no sentido de que a
data de início do benefício (DIB) deve ser fixada na data do requerimento administrativo, e
apenas na ausência deste, a partir da citação do INSS.
- Diante de expressa disposição legal, o ato concessório do benefício deverá fixar a data de
interrupção do benefício sempre que tal circunstância seja possível, aplicando-se, em caso de
omissão, o prazo de duração de 120 (cento e vinte dias), ressalvada a possibilidade de o
segurado requerer a sua prorrogação. Precedentes.
- Apelação da parte autora provida em parte e apelação autárquica não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por maioria,
decidiu dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelação do
INSS, nos termos do voto da Relatora, que foi acompanhada pelo Desembargador Federal
Gilberto Jordan e pelo Desembargador Federal Batista Gonçalves (4º voto). Vencida a
Desembargadora Federal Daldice Santana, que dava provimento à apelação do INSS e julgava
prejudicada a apelação da parte autora. Julgamento nos termos do disposto no art. 942, caput e §
1º, do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
