Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5104151-19.2019.4.03.9999
Data do Julgamento
08/08/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 12/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. RENDA DO SEGURADO A SER
AFERIDA. TESE 896 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO REPETITIVO.
NASCIMENTO DO BENEFICIÁRIO APÓS A PRISÃO. BENEFÍCIO DEVIDO. ENTENDIMENTO
ATUAL DA NONA TURMA. TERMO INICIAL: DER. HABILITAÇÃO TARDIA. APELAÇÃO
PARCIALMENTE PROVIDA.
- Em decisão proferida nos Recursos Extraordinários (REs 587365 e 486413), o Supremo
Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, pacificou a matéria, entendendo que o âmbito de
aplicação do conceito de baixa renda, previsto no inciso IV, do art. 201, da CF/88, se restringe ao
segurado e não aos dependentes deste (RE 587365/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
25.3.2009).
- Noutro passo, alega a parte autora que a condição de desempregado afasta a necessidade de
limite de renda, a que estão submetidos todos os possíveis beneficiados do auxílio-reclusão.
Trata-se de questão submetida a decisão de afetação, para fins de representação da controvérsia
em julgamento submetido à sistemática de repetitivo, na forma do artigo 543-C do CPC/73
(AREsp 578044 e AREsp 578939, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Data da Publicação em
08/10/2014).
- Para além, o acórdão proferido no julgamento do Recurso Especial 1.485/417/MS, referente ao
tema 896 do STJ, foi publicado no Diário da Justiça eletrônico no dia 02/02/2018. No acórdão, foi
firmada a tese: “Para a concessão do auxílio-reclusão (art. 80 da Lei nº 8.213/91), o critério de
aferição de renda do segurado que não exerce atividade laborativa remunerada no momento do
recolhimento da prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição”.
- Benefício devido, consoante entendimento majoritário atual da Nona Turma, a despeito de a
parte autora haver nascido após a prisão do segurado.
- Em caso de habilitação tardia de dependente, a regra são os efeitos ex nunc, sob pena de
causar prejuízo à autarquia previdenciária, que representa a coletividade de hipossuficientes, já
que teria que pagar valores em duplicidade a quem não agiu com diligência na defesa de seus
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
direitos, ainda que por inércia de seus representantes.
- Nos termos do artigo 80 da LBPS, aplicam-se as regras da pensão por morte ao benefício de
auxílio-reclusão. Na espécie, incide a regra do artigo 76 da Lei nº 8.213/91, in verbis: “Art. 76.A
concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível
dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de
dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação.” Precedentes do
Superior Tribunal de Justiça (REsp 1479948 / RS, RECURSO ESPECIAL 2014/0229384-8,
Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento 22/09/2016,
Data da Publicação/Fonte, DJe 17/10/2016; AgInt no REsp 1590218 / SP, AGRAVO INTERNO
NO RECURSO ESPECIAL, 2016/0067858-0 Relator(a) Ministro HUMBERTO MARTINS,
SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento 02/06/2016, Data da Publicação/Fonte DJe 08/06/2016).
- Apelação parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5104151-19.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GABRIEL FELIPE DE ANDRADE DELFINO
REPRESENTANTE: PRISCILA CRISTINA ANDRADE MASSETTI
Advogado do(a) APELADO: NATALIA FERNANDES BOLZAN DE ANDRADE - SP299697-N,
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5104151-19.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GABRIEL FELIPE DE ANDRADE DELFINO
REPRESENTANTE: PRISCILA CRISTINA ANDRADE MASSETTI
Advogado do(a) APELADO: NATALIA FERNANDES BOLZAN DE ANDRADE - SP299697-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: RANIELLI IASMIN BIANCHI DELFINO
REPRESENTANTE do(a) INTERESSADO: TAIZE HELENA BIANCHI RIBEIRO
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta em face
da r. sentença que julgou procedente o pedido de concessão de auxílio-reclusão à parte autora,
discriminados os consectários.
Nas razões de apelação, o INSS requer a reforma integral da sentença, alegando precipuamente
que a renda do segurado era superior à permitida, devendo ser levado em conta o último salário-
de-contribuição. Subsidiariamente, requer a alteração da DIB para a data da sentença, uma vez
que o benefício já foi pago a outro filho do segurado.
Em contrarrazões, a parte autora requer a inclusão de outra filha do recluso, nascida em
06/4/2017.
Subiram os autos a esta corte.
Manifestou-se o Ministério Público Federal pelo conhecimento e não provimento do apelo do
INSS.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5104151-19.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GABRIEL FELIPE DE ANDRADE DELFINO
REPRESENTANTE: PRISCILA CRISTINA ANDRADE MASSETTI
Advogado do(a) APELADO: NATALIA FERNANDES BOLZAN DE ANDRADE - SP299697-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: RANIELLI IASMIN BIANCHI DELFINO
REPRESENTANTE do(a) INTERESSADO: TAIZE HELENA BIANCHI RIBEIRO
V O T O
O Exmo.Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:Conheço da apelação porquanto
satisfeitos os requisitos de admissibilidade.
Preambularmente, indefiro a inclusão de outra parte no polo ativo deste processo, em razão de já
ter sido proferida sentença, sendo assegurado o acesso à justiça por meio de outro processo.
Visa a parte autora à concessão do benefício de auxílio-reclusão.
Fundado no artigo 201, inciso IV, da Constituição Federal, o artigo 80, da Lei 8.213/91, prevê que
o auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte aos dependentes do
segurado, de baixa renda (texto constitucional), recolhido à prisão, que não receber remuneração
da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou abono de permanência.
Está disciplinado no artigo 80 da Lei n. 8.213/91, nos seguintes termos:
"Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos
dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa, nem
estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo
recolhimento à prisão sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação da
declaração de permanência na condição de presidiário."
Também prevê o artigo 13 da Emenda Constitucional n. 20/98:
"Art. 13. Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores,
segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham
renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a
publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime
geral de previdência social."
À obtenção do auxílio-reclusão, portanto, são necessários os seguintes requisitos: condição de
dependente, recolhimento do segurado a estabelecimento prisional, qualidade de segurado do
recolhido à prisão e de sua renda bruta mensal não excedente ao limite. Segundo o art. 26, I, da
Lei n. 8.213/91, a concessão desse benefício independe do cumprimento do período de carência.
Com relação à condição de dependente, fixa o art. 16 da Lei n. 8.213/91, com a redação da Lei n.
9.032/95 (g. n.):
"Art. 16 - São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes
do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição,
menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
(...)
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais
deve ser comprovada."
O segurado encontra-se recluso desde 01/8/2010 (certidão de recolhimento prisional à f. 29 do
pdf).
No caso, pela cópia da certidão de nascimento anexa aos autos, a parte autora comprova a
condição de filha do encarcerado, nascida em 05/11/2012 (f. 22) e, em decorrência, a sua
dependência econômica (presunção legal).
O próximo debate que se trava a respeito circunscreve-se à renda geradora do direito ao auxílio-
reclusão.
Nesse ponto, o Supremo Tribunal Federal, intérprete máximo da Constituição Federal, pacificou o
entendimento de que a renda a ser considerada é a do segurado preso, e não a de seus
dependentes.
Com efeito, em decisão proferida nos Recursos Extraordinários (REs 587365 e 486413), o
Supremo Tribunal Federal, com repercussão geral, pacificou a matéria, entendendo que o âmbito
de aplicação do conceito de baixa renda, previsto no inciso IV, do art. 201, da CF/88, se restringe
ao segurado e não aos dependentes deste.
Neste sentido, trago à colação a notícia veiculada no informativo 540 do STF:
“A renda a ser considerada para a concessão do auxílio-reclusão de que trata o art. 201, IV, da
CF, com a redação que lhe conferiu a EC 20/98, é a do segurado preso e não a de seus
dependentes (CF: “Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de
caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio
financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: ... IV - salário-família e auxílio-reclusão para
os dependentes dos segurados de baixa renda;”). Com base nesse entendimento, o Tribunal, por
maioria, proveu dois recursos extraordinários interpostos pelo INSS para reformar acórdãos
proferidos por Turma Recursal da Seção Judiciária do Estado de Santa Catarina, que aplicara o
Enunciado da Súmula 5 da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais, segundo o
qual “para fins de concessão do auxílio-reclusão, o conceito de renda bruta mensal se refere à
renda auferida pelos dependentes e não à do segurado recluso”, e declarara a
inconstitucionalidade do art. 116 do Regulamento da Previdência Social [Decreto 3.048/99: “Art.
116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos
dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem
estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde
que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta
reais).”], que teve como objetivo regulamentar o art. 80 da Lei 8.213/91. RE 587365/SC, rel. Min.
Ricardo Lewandowski, 25.3.2009. (RE-587365)” Grifei.
Por outro lado, discute-se se no caso de desemprego, para fins de apuração da “baixa renda”,
deve-se considerar o último salário-de-contribuição ou a ausência de renda por ocasião do
desemprego.
Entendo, pessoalmente, que deveria ser levada em conta o último salário-de-contribuição, nos
termos estabelecidos na lei.
O auxílio-reclusão – medida de proteção social assaz controvertida, porque concedida à família
de preso tendo como fato gerador a prisão causada por ato criminoso – só deve ser concedido
enquanto satisfeitos os requisitos legais, afigurando-se descabida interpretação que estende a
concessão do benefício a situações não abrangidas pela legislação estrita.
Porém, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é outro, à medida que tem decidido que a
renda do segurado a ser considerada é a da data da prisão.
Trata-se de questão submetida a decisão de afetação, para fins de representação da controvérsia
em julgamento submetido à sistemática de repetitivo, na forma do artigo 543-C do CPC/73
(AREsp 578044 e AREsp 578939, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Data da Publicação em
08/10/2014).
O acórdão proferido no julgamento do Recurso Especial 1.485/417/MS, referente ao tema 896 do
STJ, foi publicado no Diário da Justiça eletrônico no dia 02/02/2018. Aplicar-se-ia ao caso o
disposto no artigo 543-C do CPC/1973, atual 1.036 do CPC/2015).
No acórdão, foi firmada a tese:“Para a concessão do auxílio-reclusão (art. 80 da Lei nº 8.213/91),
o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laborativa remunerada no
momento do recolhimento da prisão é a ausência de renda, e não o último salário de
contribuição”. ENTENDIMENTO PESSOAL DO RELATOR
ENTENDIMENTO PESSOAL DO RELATOR
No presente caso, não se pode ignorar que a autora nasceu durante o período em que o
segurado já se encontrava preso.
Ocorre que a previdência social serve para a cobertura de eventos, contingências ou riscos
sociais imprevistos, a ocorrerem posteriormente no tempo.
"O termo risco social", ensinam Machado da Rocha e Baltazar Júnior, "é empregado para
designar os eventos, isto é, os fatos ou acontecimentos que ocorrem na vida de todos os homens,
com certeza ou probabilidade significativa, provocando um desajuste nas condições normais de
vida, em especial a obtenção dos rendimentos decorrentes do trabalho, gerando necessidades a
serem atendidas, pois nestes momentos críticos, normalmente não podem ser satisfeitas pelo
indivíduo. Na terminologia do seguro, chamam-se tais eventos de 'riscos' e por dizerem respeito
ao próprio funcionamento da sociedade, denominam-se 'riscos sociais'. Os regimes
previdenciários são instituídos com a finalidade de garantir aos seus beneficiários a cobertura de
determinadas contingências sociais. Em sua essência, as normas buscam amparar os
trabalhadores e seus dependentes quando vitimados por eventos, reais ou presumidos, que
venham a produzir perda integral ou parcial dos rendimentos familiares ou despertem outra
necessidade considerada socialmente relevante. Os riscos sociais cuja cobertura é suportada
pelo regime geral são elencados no art. 1º desta Lei, excetuado expressamente no § 1º do art. 9º,
o desemprego involuntário, que é objeto de lei específica (Lei 7.998/90, alterada pela Lei
8.900/94), para os trabalhadores em geral." (g.n., MACHADO DA ROCHA, Daniel; BALTAZAR
JUNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 9ª ed., Porto
Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 27-32) (g. n.)
“A palavra previdência é derivada do verbo prever, sinônima de antever. Prever ou antever, como
o nome está a exprimir, tem significado de ver antecipadamente fato ou situação que poderá
ocorrer no futuro. Amauri Mascaro Nascimento lembra que “a palavra previdência significa a
faculdade de prever, acautelar-se, providenciar hoje para que não falte amanhã. E, citando lição
de Nair Lemos Gonçalves, acrescenta: “O evidente propósito de, antecipadamente, reunir
recursos dos interessados e organizar mecanismos que pudessem e possam atender a
contingências sociais prováveis e futuras. É isto a previdência social” (g.n., URBANO
GONÇALVES, Odonel. Manual de Direito Previdenciário, 12ª edição, São Paulo, Atlas, 2007).
Ou seja, primeiramente o interessado paga uma contribuição social para que, no caso de ocorrer
no futuro um risco social, obter um benefício previdenciário.
Essa a essência da relação jurídica previdenciária.
Na presente hipótese, o risco social (reclusão) deu-se previamente ao nascimento da parte
autora, o que inverte toda a lógica do sistema de seguro social.
Tal situação equivale à do requerimento de pensão por morte no caso de nascimento de filho por
inseminação artificial, utilizando-se o sêmen congelado do de cujus anos após o falecimento
deste último. Situação que extravasa flagrantemente o intuito protetivo da previdência social.
Mais que isso, tal contexto corresponderia a contratar um seguro privado após a ocorrência do
evento danoso, o que aberra do senso lógico e jurídico. A previdência social tem natureza de
seguro social, de modo que, mutatis mutandis, tal pensamento se aplica.
Em casos que tais, pretende-se que seja concedido um benefício com o propósito de custear – à
custa dos contribuintes – as necessidades do beneficiário com base em evento pretérito, a
reclusão do pai, situação que que não está abrangida pelo sistema de previdência social.
Por isso, não se afigura possível juridicamente a concessão de auxílio-reclusão nesses casos.
Por fim, registro a existência de julgamento recente desta Egrégia Nona Turma nesse sentido, por
maioria de votos:
“PREVIDENCIARÍO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. RENDA DO SEGURADO A SER
AFERIDA. TESE 896 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO REPETITIVO.
NASCIMENTO DO BENEFICIÁRIO APÓS A PRISÃO. AUSÊNCIA DE RISCO SOCIAL FUTURO.
CONTINGÊNCIA PRÉVIA. INVERSÃO DA NATUREZA JURÍDICA DO SEGURO SOCIAL.
IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO. BENEFÍCIO INDEVIDO. ACÓRDÃO MANTIDO.
- Em decisão proferida nos Recursos Extraordinários (REs 587365 e 486413), o Supremo
Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, pacificou a matéria, entendendo que o âmbito de
aplicação do conceito de baixa renda, previsto no inciso IV, do art. 201, da CF/88, se restringe ao
segurado e não aos dependentes deste (RE 587365/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
25.3.2009).
- Noutro passo, alega a parte autora que a condição de desempregado afasta a necessidade de
limite de renda, a que estão submetidos todos os possíveis beneficiados do auxílio-reclusão.
Trata-se de questão submetida a decisão de afetação, para fins de representação da controvérsia
em julgamento submetido à sistemática de repetitivo, na forma do artigo 543-C do CPC/73
(AREsp 578044 e AREsp 578939, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Data da Publicação em
08/10/2014).
- Para além, o acórdão proferido no julgamento do Recurso Especial 1.485/417/MS, referente ao
tema 896 do STJ, foi publicado no Diário da Justiça eletrônico no dia 02/02/2018. No acórdão, foi
firmada a tese: "Para a concessão do auxílio-reclusão (art. 80 da Lei nº 8.213/91), o critério de
aferição de renda do segurado que não exerce atividade laborativa remunerada no momento do
recolhimento da prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição".
- Porém, no presente caso, não se pode ignorar que a autora nasceu em 2005, após segurado já
se encontrar recluso havia vários anos (desde 2000). Ocorre que a previdência social serve para
a cobertura de eventos, contingências ou riscos sociais imprevistos, a ocorrerem posteriormente
no tempo.
- "O termo risco social", ensinam Machado da Rocha e Baltazar Júnior, "é empregado para
designar os eventos, isto é, os fatos ou acontecimentos que ocorrem na vida de todos os homens,
com certeza ou probabilidade significativa, provocando um desajuste nas condições normais de
vida, em especial a obtenção dos rendimentos decorrentes do trabalho, gerando necessidades a
serem atendidas, pois nestes momentos críticos, normalmente não podem ser satisfeitas pelo
indivíduo. Na terminologia do seguro, chamam-se tais eventos de 'riscos' e por dizerem respeito
ao próprio funcionamento da sociedade, denominam-se 'riscos sociais'. Os regimes
previdenciários são instituídos com a finalidade de garantir aos seus beneficiários a cobertura de
determinadas contingências sociais. Em sua essência, as normas buscam amparar os
trabalhadores e seus dependentes quando vitimados por eventos, reais ou presumidos, que
venham a produzir perda integral ou parcial dos rendimentos familiares ou despertem outra
necessidade considerada socialmente relevante. Os riscos sociais cuja cobertura é suportada
pelo regime geral são elencados no art. 1º desta Lei, excetuado expressamente no § 1º do art. 9º,
o desemprego involuntário, que é objeto de lei específica (Lei 7.998/90, alterada pela Lei
8.900/94), para os trabalhadores em geral." (g.n., MACHADO DA ROCHA, Daniel; BALTAZAR
JUNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 9ª ed., Porto
Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 27-32) (g. n.)
- Segundo Odonel Urbano Gonçalves, "A palavra previdência é derivada do verbo prever,
sinônima de antever. Prever ou antever, como o nome está a exprimir, tem significado de ver
antecipadamente fato ou situação que poderá ocorrer no futuro. Amauri Mascaro Nascimento
lembra que "a palavra previdência significa a faculdade de prever, acautelar-se, providenciar hoje
para que não falte amanhã. E, citando lição de Nair Lemos Gonçalves, acrescenta: "O evidente
propósito de, antecipadamente, reunir recursos dos interessados e organizar mecanismos que
pudessem e possam atender a contingências sociais prováveis e futuras. É isto a previdência
social" (g.n., URBANO GONÇALVES, Odonel. Manual de Direito Previdenciário, 12ª edição, São
Paulo, Atlas, 2007).
- Na relação jurídica previdenciária, primeiramente o interessado paga uma contribuição social
para que, no caso de ocorrer no futuro um risco social, obter um benefício previdenciário. Na
presente hipótese, o risco social (reclusão) deu-se previamente ao nascimento da parte autora, o
que inverte toda a lógica do sistema de seguro social.
- A concessão do benefício em tal caso corresponderia a contratar um seguro após a ocorrência
do evento danoso, o que aberra do senso lógico e jurídico. A previdência social tem natureza de
seguro social, de modo que, mutatis mutandis, tal pensamento se aplica. Por isso, não se afigura
possível juridicamente a concessão de auxílio-reclusão nesses casos.
- Benefício indevido. Acórdão mantido, por fundamento diverso” (Ap - APELAÇÃO CÍVEL -
1460203 / SP 0035213-09.2009.4.03.9999, Relator JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS,
NONA TURMA, Data do Julgamento 20/02/2019, Data da Publicação/Fonte, e-DJF3 Judicial 1
DATA:11/03/2019).
ENTENDIMENTO MAJORITÁRIO DA TURMA
Por tais razões, o entendimento pessoal deste relator é o de que resta ausente a condição de
segurado, inviável a concessão do benefício.
Não obstante, em análise prévia dos autos levada a efeito pelos quatro membros desta Nona
Turma, o voto deste relator seria solitário, de modo que a visão da maioria qualificada (sobretudo
no tocante ao reexame das questões de fato), neste momento, no sentido do direito ao benefício
pela parte autora.
Em razão disso, levando em linha de conta que a análise colegiada conduz a um exame conjunto,
menos propenso a erro, ressalvarei meu entendimento pessoal, em tributo à colegialidade,
princípio que prestigia, em última análise, a segurança jurídica sobre a visão individual do
magistrado.
Devido, por tais razões, o benefício.
Noutro passo, em caso de habilitação tardia de dependente, a regra é a fixação da DIB na data
da DER, sob pena de causar prejuízo à autarquia previdenciária, que representa a coletividade de
hipossuficientes, já que teria que pagar valores em duplicidade a quem não agiu com diligência
na defesa de seus direitos, ainda que por inércia de seus representantes.
Nos termos do artigo 80 da LBPS, aplicam-se as regras da pensão por morte ao benefício de
auxílio-reclusão.
Na espécie, incide a regra do artigo 76 da Lei nº 8.213/91, in verbis: “Art. 76.A concessão da
pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível dependente, e
qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de dependente
só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação.”
Nesse diapasão, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. PENSÃO POR MORTE.
HABILITAÇÃO TARDIA DE DEPENDENTE. ART. 76 DA LEI 8.213/1991. EFEITOS
FINANCEIROS. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. REGIME
PRESCRICIONAL. ART. 198, I, DO CC. INAPLICABILIDADE. 1. Trata-se, na origem, de Ação
Ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando o direito à percepção
de pensão por morte em período anterior à habilitação tardia da dependente incapaz,
independentemente de o pai desta já receber a integralidade desde o óbito da instituidora do
benefício (13.3.1994). 2. Comprovada a absoluta incapacidade do requerente, faz ele jus ao
pagamento das parcelas vencidas desde a data do óbito do instituidor da pensão, ainda que não
postulado administrativamente no prazo de trinta dias. Precedentes: REsp 1.405.909/AL, Rel.
Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ Acórdão Ministro Ari Pargendler, Primeira Turma, julgado em
22.5.2014, DJe 9.9.2014; AgRg no AREsp 269.887/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho,
Primeira Turma, julgado em 11.3.2014, DJe 21.3.2014; REsp 1.354.689/PB, Rel. Ministro Mauro
Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 25.2.2014, DJe 11.3.2014. 3. Tratando-se de
benefício previdenciário, a expressão "pensionista menor" identifica situação que só desaparece
com a maioridade, nos termos do art. 5º do Código Civil. 4. De acordo com o art. 76 da Lei
8.213/91, a habilitação posterior do dependente somente deverá produzir efeitos a contar desse
episódio, de modo que não há falar em repercussão financeira para momento anterior à inclusão
do dependente. 5. A concessão do benefício para momento anterior à habilitação do autor
acarretaria, além da inobservância dos arts. 74 e 76 da Lei 8.213/91, inevitável prejuízo à
autarquia previdenciária, que seria condenada a pagar duplamente o valor da pensão. 6. A
propósito: AgRg no REsp 1.523.326/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma,
DJe 18.12.2015; AgInt no AREsp 850.129/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma,
DJe 27.5.2016; Resp 1.377.720/SC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em
25.6.2013, DJe 5.8.2013; e REsp 1.513.977/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma,
DJe 5.8.2015. 7. Recurso Especial parcialmente provido (REsp 1479948 / RS, RECURSO
ESPECIAL 2014/0229384-8, Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, Data
do Julgamento 22/09/2016, Data da Publicação/Fonte, DJe 17/10/2016).
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO TARDIA. MENOR. EXISTÊNCIA DE
BENEFICIÁRIO HABILITADO. EFEITOS FINANCEIROS. DATA DO REQUERIMENTO.
PRECEDENTES. 1. Discute-se nos autos a percepção de parcelas atrasadas referentes à pensão
por morte compreendida no período entre a data do óbito do instituidor e a efetiva implementação
do benefício, no caso de habilitação tardia de menor. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça possuía entendimento segundo o qual o termo inicial da pensão por morte, tratando-se de
dependente absolutamente incapaz, deve ser fixado na data do óbito do segurado, mesmo em
caso de habilitação tardia, não incidindo, portanto, o disposto no art. 76 da Lei 8.213/91. 3.
Contudo, a Segunda Turma do STJ iniciou um realinhamento da jurisprudência do STJ no sentido
de que o dependente incapaz que não pleiteia a pensão por morte no prazo de trinta dias a contar
da data do óbito do segurado (art. 74 da Lei 8.213/91) não tem direito ao recebimento do referido
benefício a partir da data do falecimento do instituidor, considerando que outros dependentes,
integrantes do mesmo núcleo familiar, já recebiam o benefício, evitando-se a dupla condenação
da autarquia previdenciária. 4. Precedentes: AgRg no REsp 1.523.326/SC, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 18/12/2015; REsp
1.513.977/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/6/2015,
DJe 5/8/2015. Agravo interno improvido (AgInt no REsp 1590218 / SP, AGRAVO INTERNO NO
RECURSO ESPECIAL, 2016/0067858-0 Relator(a) Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA
TURMA, Data do Julgamento 02/06/2016, Data da Publicação/Fonte DJe 08/06/2016).
Para além, a regra evocada pela parte autora, prevista no artigo 79 da LBPS, foi expressamente
revogada pela Lei nº 13.846/2019.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo, para fixar a DIB na DER.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. RENDA DO SEGURADO A SER
AFERIDA. TESE 896 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO REPETITIVO.
NASCIMENTO DO BENEFICIÁRIO APÓS A PRISÃO. BENEFÍCIO DEVIDO. ENTENDIMENTO
ATUAL DA NONA TURMA. TERMO INICIAL: DER. HABILITAÇÃO TARDIA. APELAÇÃO
PARCIALMENTE PROVIDA.
- Em decisão proferida nos Recursos Extraordinários (REs 587365 e 486413), o Supremo
Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, pacificou a matéria, entendendo que o âmbito de
aplicação do conceito de baixa renda, previsto no inciso IV, do art. 201, da CF/88, se restringe ao
segurado e não aos dependentes deste (RE 587365/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski,
25.3.2009).
- Noutro passo, alega a parte autora que a condição de desempregado afasta a necessidade de
limite de renda, a que estão submetidos todos os possíveis beneficiados do auxílio-reclusão.
Trata-se de questão submetida a decisão de afetação, para fins de representação da controvérsia
em julgamento submetido à sistemática de repetitivo, na forma do artigo 543-C do CPC/73
(AREsp 578044 e AREsp 578939, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Data da Publicação em
08/10/2014).
- Para além, o acórdão proferido no julgamento do Recurso Especial 1.485/417/MS, referente ao
tema 896 do STJ, foi publicado no Diário da Justiça eletrônico no dia 02/02/2018. No acórdão, foi
firmada a tese: “Para a concessão do auxílio-reclusão (art. 80 da Lei nº 8.213/91), o critério de
aferição de renda do segurado que não exerce atividade laborativa remunerada no momento do
recolhimento da prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição”.
- Benefício devido, consoante entendimento majoritário atual da Nona Turma, a despeito de a
parte autora haver nascido após a prisão do segurado.
- Em caso de habilitação tardia de dependente, a regra são os efeitos ex nunc, sob pena de
causar prejuízo à autarquia previdenciária, que representa a coletividade de hipossuficientes, já
que teria que pagar valores em duplicidade a quem não agiu com diligência na defesa de seus
direitos, ainda que por inércia de seus representantes.
- Nos termos do artigo 80 da LBPS, aplicam-se as regras da pensão por morte ao benefício de
auxílio-reclusão. Na espécie, incide a regra do artigo 76 da Lei nº 8.213/91, in verbis: “Art. 76.A
concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível
dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de
dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação.” Precedentes do
Superior Tribunal de Justiça (REsp 1479948 / RS, RECURSO ESPECIAL 2014/0229384-8,
Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento 22/09/2016,
Data da Publicação/Fonte, DJe 17/10/2016; AgInt no REsp 1590218 / SP, AGRAVO INTERNO
NO RECURSO ESPECIAL, 2016/0067858-0 Relator(a) Ministro HUMBERTO MARTINS,
SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento 02/06/2016, Data da Publicação/Fonte DJe 08/06/2016).
- Apelação parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação do INSS e dar-lhe parcial provimento, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
