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PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. DONA DE CASA HÁ VINTE ANOS. DOENÇAS. MISERABILIDADE NÃO CO...

Data da publicação: 16/07/2020, 04:36:09

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. DONA DE CASA HÁ VINTE ANOS. DOENÇAS. MISERABILIDADE NÃO CONFIGURADA. 5 (CINCO) FILHOS. DEVER DE PRESTAR ALIMENTOS. SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. APELAÇÃO PROVIDA. TUTELA CASSADA. - Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011. - A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. - Quanto ao requisito subjetivo, consta do laudo médico pericial que a autora é portadora de hipertensão arterial, diabetes, hipotireoidismo, labirintite, escoliose, síndrome do túnel do carpo e osteoartrose, encontrando-se incapacitada para o trabalho, inclusive o doméstico. A autora nasceu 24/10/1057 e possui várias doenças, algumas típicas da idade, algumas que modem ser tratadas adequadamente com medicamentos. O perito inclusive refere que a incapacidade pode ser temporária, devendo ser submetida a nova perícia em alguns meses. Ela é dona de casa há 20 (vinte) anos, de modo que não aufere renda por igual período, de modo que não se encontra em situação de "pessoa com deficiência", mas pessoa com incapacidade laborativa, que inclusive não se submete a tratamento adequado. - Forçoso é concluir, a autora não sofre segregação típica da sofrida pelas pessoas portadoras de deficiência, tratando-se de caso a ser tutelado pelo seguro social (artigo 201 da CF) ou pela saúde (artigo 196 da CF), mesmo porque o BPC não é substituto de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. - A parte autora sofre de doenças, risco social a ser coberto pela previdência social, mediante pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal, que têm a seguinte dicção: "Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)" - Ademais, não está patenteada a miserabilidade para fins assistenciais. O estudo social (f. 41 e seguintes) demonstra que a autora vive com o marido, em casa própria, sobrevivendo ambos da do BPC - benefício assistencial de prestação continuada no valor de um salário mínimo. Além disso, recebe ajuda de uma filha. - Ocorre que a autora possui 5 (cinco) filhos, 4 (quatro) deles residentes na cidade de Birigui/SP, onde a autora mora. E no estudo social não consta qualificação, nem renda de quaisquer deles. Não consta do estudo social, ademais, porque os filhos não lhe fornece algum auxílio financeiro, como manda a lei e a constituição. - O dever de sustento dos filhos não pode ser substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício só será devido quando o sustento não puder ser provido pela família. - Logo, tanto o artigo 203, V quanto o artigo 229 do Texto Magno devem ser levadas em conta na apuração da miserabilidade, não podendo a regra da miserabilidade prevista no artigo 20, § 3º, da LOAS ser interpretado de forma isolada, como se não houvesse normas constitucionais regulando a questão. Assim, no caso, a técnica de proteção social prioritária no caso é a família, em cumprimento ao disposto no artigo 229 da Constituição Federal, in verbis: "Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade." - A parte autora, pobre embora, tem acesso aos mínimos sociais, não se encontrando em situação de total "desamparo" (casa própria, renda mensal do marido e existência de filhos). Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante. - A propósito, recentemente, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão realizada em 23/2/17, em Brasília. Quanto ao mérito, o relator afirmou em seu voto que a interpretação do art. 20, §1º, da Lei n. 8.742/93, conforme as normas veiculadas pelos arts. 203, V, 229 e 230, da Constituição da República de 1988, deve ser no sentido de que "a assistência social estatal não deve afastar a obrigação de prestar alimentos devidos pelos parentes da pessoa em condição de miserabilidade socioeconômica (arts. 1694 e 1697, do Código Civil), em obediência ao princípio da subsidiariedade". - Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita. - Apelação provida. Tutela provisória de urgência cassada. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2227906 - 0009212-06.2017.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 26/06/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/07/2017 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 11/07/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009212-06.2017.4.03.9999/SP
2017.03.99.009212-2/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):MARIA EURIDES DE SOUZA MATOS
ADVOGADO:SP337236 DANIELA MOROSO ANDRAUS DOMINGUES
No. ORIG.:10025635420168260077 2 Vr BIRIGUI/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA COM INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. DONA DE CASA HÁ VINTE ANOS. DOENÇAS. MISERABILIDADE NÃO CONFIGURADA. 5 (CINCO) FILHOS. DEVER DE PRESTAR ALIMENTOS. SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. APELAÇÃO PROVIDA. TUTELA CASSADA.
- Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.
- A LOAS deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
- Quanto ao requisito subjetivo, consta do laudo médico pericial que a autora é portadora de hipertensão arterial, diabetes, hipotireoidismo, labirintite, escoliose, síndrome do túnel do carpo e osteoartrose, encontrando-se incapacitada para o trabalho, inclusive o doméstico. A autora nasceu 24/10/1057 e possui várias doenças, algumas típicas da idade, algumas que modem ser tratadas adequadamente com medicamentos. O perito inclusive refere que a incapacidade pode ser temporária, devendo ser submetida a nova perícia em alguns meses. Ela é dona de casa há 20 (vinte) anos, de modo que não aufere renda por igual período, de modo que não se encontra em situação de "pessoa com deficiência", mas pessoa com incapacidade laborativa, que inclusive não se submete a tratamento adequado.
- Forçoso é concluir, a autora não sofre segregação típica da sofrida pelas pessoas portadoras de deficiência, tratando-se de caso a ser tutelado pelo seguro social (artigo 201 da CF) ou pela saúde (artigo 196 da CF), mesmo porque o BPC não é substituto de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
- A parte autora sofre de doenças, risco social a ser coberto pela previdência social, mediante pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal, que têm a seguinte dicção: "Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)"
- Ademais, não está patenteada a miserabilidade para fins assistenciais. O estudo social (f. 41 e seguintes) demonstra que a autora vive com o marido, em casa própria, sobrevivendo ambos da do BPC - benefício assistencial de prestação continuada no valor de um salário mínimo. Além disso, recebe ajuda de uma filha.
- Ocorre que a autora possui 5 (cinco) filhos, 4 (quatro) deles residentes na cidade de Birigui/SP, onde a autora mora. E no estudo social não consta qualificação, nem renda de quaisquer deles. Não consta do estudo social, ademais, porque os filhos não lhe fornece algum auxílio financeiro, como manda a lei e a constituição.
- O dever de sustento dos filhos não pode ser substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício só será devido quando o sustento não puder ser provido pela família.
- Logo, tanto o artigo 203, V quanto o artigo 229 do Texto Magno devem ser levadas em conta na apuração da miserabilidade, não podendo a regra da miserabilidade prevista no artigo 20, § 3º, da LOAS ser interpretado de forma isolada, como se não houvesse normas constitucionais regulando a questão. Assim, no caso, a técnica de proteção social prioritária no caso é a família, em cumprimento ao disposto no artigo 229 da Constituição Federal, in verbis: "Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade."
- A parte autora, pobre embora, tem acesso aos mínimos sociais, não se encontrando em situação de total "desamparo" (casa própria, renda mensal do marido e existência de filhos). Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.
- A propósito, recentemente, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão realizada em 23/2/17, em Brasília. Quanto ao mérito, o relator afirmou em seu voto que a interpretação do art. 20, §1º, da Lei n. 8.742/93, conforme as normas veiculadas pelos arts. 203, V, 229 e 230, da Constituição da República de 1988, deve ser no sentido de que "a assistência social estatal não deve afastar a obrigação de prestar alimentos devidos pelos parentes da pessoa em condição de miserabilidade socioeconômica (arts. 1694 e 1697, do Código Civil), em obediência ao princípio da subsidiariedade".
- Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida. Tutela provisória de urgência cassada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 26 de junho de 2017.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): RODRIGO ZACHARIAS:10173
Nº de Série do Certificado: 2DBCF936DB18581E
Data e Hora: 27/06/2017 16:36:21



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0009212-06.2017.4.03.9999/SP
2017.03.99.009212-2/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A):MARIA EURIDES DE SOUZA MATOS
ADVOGADO:SP337236 DANIELA MOROSO ANDRAUS DOMINGUES
No. ORIG.:10025635420168260077 2 Vr BIRIGUI/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente o pedido da parte autora, para condenar o INSS a lhe conceder benefício assistencial, antecipando os efeitos da tutela jurisdicional, discriminados os consectários, dispensado o reexame necessário.

O INSS alega, em síntese, o descumprimento dos requisitos para a concessão do benefício, no tocante à hipossuficiência não preenchida. Subsidiariamente, exora sejam alterados os critérios de apuração dos consectários.

Contrarrazões apresentadas.

O DD. Órgão do Ministério Público Federal sugere o desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso em razão da satisfação de seus requisitos.

No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93, regulamentado, atualmente, pelos Decretos n. 6.214/2007 e 7.617/2011.

Essa lei deu eficácia ao inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ao estabelecer, em seu artigo 20, as condições para a concessão do benefício da assistência social, a saber: ser o postulante portador de deficiência ou idoso e, em ambas as hipóteses, comprovar a miserabilidade ou a hipossuficiência, ou seja, não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

DA HIPOSSUFICIÊNCIA OU MISERABILIDADE

O critério da miserabilidade do § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93 não impede o julgador de levar em conta outros dados, a fim de identificar a situação de vida do idoso ou do deficiente, principalmente quando estiverem presentes peculiaridades, a exemplo de necessidades especiais com medicamentos ou com educação. Deve-se verificar, na questão in concreto, a ocorrência de situação de pobreza - entendida como a de falta de recursos e de acesso ao mínimo existencial -, a fim de se concluir por devida a prestação pecuniária da assistência social constitucionalmente prevista.

Logo, a presunção objetiva absoluta de miserabilidade, da qual fala a Lei, não afasta a possibilidade de comprovação da condição de miserabilidade por outros meios de prova, conforme precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 435.871, 5ª Turma Rel. Min. Felix Fischer, j. 19/9/2002, DJ 21/10/2002, p. 61, REsp n. 222.764, STJ, 5ªT., Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13/2/2001, DJ 12/3/2001, p. 512; REsp n. 223.603/SP, STJ, 5ª T., Rel. Min. Edson Vidigal, DJU 21/2/2000, p. 163).

O próprio Supremo Tribunal Federal recentemente reviu seu posicionamento ao reconhecer que o requisito do artigo 20, §3º, da Lei n. 8.742/93 não pode ser considerado taxativo, acórdão produzido com repercussão geral (STF, RE n. 580963, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013).

A decisão concluiu que a mera interpretação gramatical do preceito, por si só, pode resultar no indeferimento da prestação assistencial em casos que, embora o limite legal de renda per capita seja ultrapassado, evidenciam um quadro de notória hipossuficiência econômica.

Essa insuficiência da regra decorre não só das modificações fáticas (políticas, econômicas e sociais), mas principalmente das alterações legislativas que ocorreram no País desde a edição da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993.

A legislação federal recente, por exemplo, reiterada pela adoção de vários programas assistenciais voltados a famílias carentes, considera pobres aqueles com renda mensal per capita de até meio salário-mínimo (nesse sentido, a Lei n. 9.533, de 10/12/97 - regulamentada pelos Decretos n. 2.609/98 e 2.728/99; as Portarias n. 458 e 879, de 3/12/2001, da Secretaria da Assistência Social; o Decreto n. 4.102/2002; a Lei n. 10.689/2003, criadora do Programa Nacional de Acesso à Alimentação).

Ressalte-se que o critério do meio salário mínimo foi estabelecido para outros benefícios diversos do amparo social. Assim, não há como considerar o critério previsto no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 como absoluto e único para a aferição da situação de miserabilidade, até porque o próprio Estado Brasileiro elegeu outros parâmetros, como os defluentes da legislação acima citada.

Vale dizer, não se pode tomar como "taxativo" o critério do artigo 20, § 3º, da LOAS, mesmo porque toda regra jurídica deve pautar-se na realidade fática. Entendo pessoalmente que, em todos os casos, outras circunstâncias devem ser levadas em conta, mormente se o patrimônio do requerente também se subsume à noção de hipossuficiência, devendo ser apurado se vive em casa própria, com ou sem ar condicionado, se possui veículo, telefones celulares, auxílio permanente de parentes ou terceiros etc.

Sendo assim, pode-se estabelecer alguns parâmetros norteadores da análise individual de cada caso, como por exemplo:

a) todos os que recebem renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo são miseráveis;

b) nem todos que percebem renda familiar per capita superior a ¼ e inferior a ½ salário mínimo são miseráveis;

c) nem todos que percebem renda familiar per capita superior a ½ salário mínimo deixam de ser miseráveis;

d) todos que perceberem renda mensal familiar superior a um salário mínimo (artigo 7º, IV, da Constituição Federal) não são miseráveis.

Vamos adiante.

Para se apurar se a renda per capita do requerente atinge, ou não, o âmbito da hipossuficiência, faz-se mister abordar o conceito de família.

O artigo 20 da Lei n. 8.742/93 estabelecia, ainda, para efeitos da concessão do benefício, os conceitos de família (conjunto de pessoas do art. 16 da Lei n. 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto - § 1º), de pessoa portadora de deficiência (aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho - § 2º) e de família incapacitada de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa (aquela com renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - § 3º).

A Lei n. 12.435, vigente desde 7/7/2011, alterou os §§ 1º e 2º do artigo 20 da Lei n. 8.742/93, estabelecendo que a família, para fins de concessão do benefício assistencial, deve ser aquela composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

IDOSOS E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

Na hipótese de postulante idoso, a idade mínima de 70 (setenta) anos foi reduzida para 67 (sessenta e sete) anos pela Lei n. 9.720/98, a partir de 1º de janeiro de 1998, e, mais recentemente, para 65 (sessenta e cinco) anos, com a entrada em vigor do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03).

No que se refere ao conceito de pessoa portadora de deficiência - previsto no § 2º da Lei n. 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 13.146/2015 -, passou a ser considerada aquela com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Assim, ratificou-se o entendimento consolidado nesta Corte de que o rol previsto no artigo 4º do Decreto n. 3.298/99 (regulamentar da Lei n. 7.853/89, que dispõe sobre a Política Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo; portanto, constatado que os males sofridos pelo postulante impedem sua inserção social, restará preenchido um dos requisitos exigidos para a percepção do benefício.

Menciona-se também o conceito apresentado pela ONU, elaborado por meio da Resolução n.° XXX/3.447, que conforma a Declaração, em 09/12/1975, in verbis:"1. O termo 'pessoa deficiente' refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar a si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais".

Esse conceito dá maior ênfase à necessidade, inclusive da vida individual, ao passo que o conceito proposto por Luiz Alberto David Araujo prioriza a questão da integração social, como se verá.

Nair Lemos Gonçalves apresentou os principais requisitos para sua definição: "desvio acentuado dos mencionados padrões médios e sua relação com o desenvolvimento físico, mental, sensorial ou emocional, considerados esses aspectos do desenvolvimento separada, combinada ou globalmente" (Verbete Excepcionais. In: Enciclopédia Saraiva de Direito, n. XXXIV. São Paulo: Saraiva, 1999).

Luiz Alberto David Araujo, por sua vez, compilou muitos significados da palavra deficiente, extraídos dos dicionários de Língua Portuguesa. Observa ele que, geralmente, os dicionários trazem a idéia de que a pessoa deficiente sofre de falta, de carência ou de falha.

Esse autor critica essas noções porque a idéia de deficiência não se apresenta tão simples, à medida que as noções de falta, de carência ou de falha não abrangem todas as situações de deficiência, como, por exemplo, o caso dos superdotados, ou de um portador do vírus HIV que consiga levar a vida normal, sem manifestação da doença, ou ainda de um trabalhador intelectual que tenha um dedo amputado.

Por ser a noção de falta, carência ou falha insuficiente à caracterização da deficiência, Luiz Alberto David Araujo propõe um norte mais seguro para se identificar a pessoa protegida, cujo fator determinante do enquadramento, ou não, no conceito de pessoa portadora de deficiência, seja o meio social:

"O indivíduo portador de deficiência, quer por falta, quer por excesso sensorial ou motor, deve apresentar dificuldades para seu relacionamento social. O que define a pessoa portadora de deficiência não é falta de um membro nem a visão ou audição reduzidas. O que caracteriza a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade para a sua integração social é o que definirá quem é ou não portador de deficiência". (A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: Ministério da Justiça, 1997, p. 18-22).

E quanto mais complexo o meio social, maior rigor se exigirá da pessoa portadora de deficiência para sua adaptação social. De outra parte, na vida em comunidades mais simples, como nos meios agrícolas, a pessoa portadora de deficiência poderá integrar-se com mais facilidade.

Desse modo, o conceito de Luiz Alberto David Araujo é adequado e de acordo com a norma constitucional, motivo pelo qual é possível seu acolhimento para a caracterização desse grupo de pessoas protegidas nas várias situações reguladas na Constituição Federal, nos arts. 7o, XXXI, 23, II, 24, XIV, 37, VIII, 203, V e 208, III.

Mas é preciso delimitar a proteção constitucional apenas àquelas pessoas que realmente dela necessitam, porquanto existem graus de deficiência que apresentam menores dificuldades de adaptação à pessoa. E tal verificação somente poderá ser feita diante de um caso concreto.

Luiz Alberto David Araujo salienta que os casos-limite podem, desde logo, ser excluídos, como o exemplo do bibliotecário que perde um dedo ou do operário que perde um artelho; em ambos os casos, ambos continuam integrados socialmente. Ou ainda pequenas manifestações de retardo mental (deficiência mental leve) podem passar despercebidas em comunidades simples, pois tal pessoa poderá "não encontrar problemas de adaptação a sua realidade social (escola, trabalho, família)", de maneira que não se pode afirmar que tal pessoa deverá receber proteção, "tal como aquele que sofre restrições sérias em seu meio social" (obra citada, páginas 42/43).

"A questão, assim, não se resolve sob o ângulo da deficiência, mas, sim sob o prisma da integração social. Há pessoas portadoras de deficiência que não encontram qualquer problema de adaptação no meio social. Dentro de uma comunidade de doentes, isolados por qualquer motivo, a pessoa portadora de deficiência não encontra qualquer outro problema de integração, pois todos têm o mesmo tipo de dificuldade" (obra citada, p. 43).

Enfim, a constatação da existência de graus de deficiência é de fundamental importância para identificar aqueles que receberão a proteção social prevista no art. 203, V, da Constituição Federal.

Feitas essas considerações, torna-se possível inferir que não será qualquer pessoa portadora de deficiência que se subsumirá no molde jurídico protetor da Assistência Social.

Noutro passo, o conceito de pessoa portadora de deficiência, para fins do benefício de amparo social, foi tipificado no artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, que em sua redação original assim dispunha:

"§ 2º - Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho."

Como se vê, pressupunha-se que o deficiente era aquele que: a) tinha necessidade de trabalhar, mas não podia, por conta da deficiência; b) estava também incapacitado para a vida independente. Ou seja, o benefício era devido a quem deveria trabalhar, mas não poderia e, além disso, não tinha capacidade para uma vida independente sem a ajuda de terceiros.

Lícito é concluir que, tais quais os benefícios previdenciários, o benefício de amparo social, enquanto em vigor a redação original do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, era substitutivo do salário. Isto é, era reservado aos que tinham a possibilidade jurídica de trabalhar, mas não tinham a possibilidade física ou mental para tanto.

Mas a redação original do artigo 20, § 2º, da LOAS foi alterada pelo Congresso Nacional, exatamente porque sua dicção gerava um sem número de controvérsias interpretativas na jurisprudência.

A Lei n º 12.435/2011 deu nova redação ao § 2º do artigo 20 da LOAS, que esculpe o perfil da pessoa com deficiência para fins assistenciais, da seguinte forma:

"§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se: (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas;

II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos."

Com a novel legislação, o benefício continuou sendo destinado àqueles deficientes que: a) tinha necessidade de trabalhar, mas não podia, por conta de limitações físicas ou mentais; b) estava também incapacitado para a vida independente.

Todavia, o legislador, não satisfeito, novamente alterou a redação do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, e o conceito de pessoa com deficiência foi uma vez mais alterado, pela Lei nº 12.470/2011, passando a ter a seguinte dicção:

"§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."

Nota-se que, com o advento desta novel lei, dispensou-se a menção à incapacidade para o trabalho ou à incapacidade para a vida independente, como requisito à concessão do benefício assistencial.

Destarte, tal circunstância (a entrada em vigor de nova lei) deve ser levada em conta neste julgamento, ex vi o artigo 462 do CPC/73 e 493 do NCPC.

Finalmente, a Lei nº 13.146/2015, que "institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência", com início de vigência em 02/01/2016, novamente alterou a redação do artigo 20, § 2º, da LOAS, in verbis:

"§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."

Reafirma-se, assim, que o foco, doravante, para fins de identificação da pessoa com deficiência, passa a ser a existência de impedimentos de longo prazo, apenas e tão somente, tornando-se despicienda a referência à necessidade de trabalho.

SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

Resta consignar que a Assistência Social, tal como regulada na Constituição Federal e na Lei nº 8.742/93, tem caráter subsidiário em relação às demais técnicas de proteção social (previdência social, previdência privada, caridade, família, poupança etc), dada a gratuidade de suas prestações.

Com efeito, levando-se em conta o alto custo do pretendido "Estado de bem-estar social", forjado no Brasil pela Constituição Federal de 1988 quando a grande maioria dos países europeus já haviam reconhecido sua inviabilidade financeira, lícito é inferir que só deve ser prestada em casos de real necessidade, dentro das estritas regras do direito material, sob pena de comprometer a mesma proteção social não apenas das futuras gerações, mas também da atual.

De fato, o benefício previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal tem o valor de 1 (um) salário mínimo, ou seja, a mesma quantia paga a milhões de brasileiros que se aposentaram no Regime Geral de Previdência Social mediante o pagamento de contribuições, durante vários anos.

De modo que a assistência social deve ser fornecida com critério, pois do contrário se gerarão privilégios e desigualdades, em oposição à própria natureza dos direitos sociais que é a de propiciar igualdade, isonomia de condições a todos.

Diga-se de passagem que a concessão indiscriminada do benefício assistencial geraria não apenas injustiça aos contribuintes da previdência social, mas incentivo para que estes parem de contribuir, ou mesmo não se filiem ou não contribuam, o que constitui situação anômala e gravíssima do ponto de vista atuarial.

No mais, não deve o Estado substituir a sociedade em situações onde esta consegue, ela própria, mediante esforço, resolver suas pendências, sob pena de se construir uma sociedade de freeloaders, cada vez mais dependente das prestações do Estado e incapaz de construir um futuro social e economicamente viável para si própria.

Nesse diapasão, a proteção social baseada na solidariedade legal não tem como finalidade cobrir contingências encontradas somente na letra da lei (dever-ser) e não no mundo dos fatos (ser). Cabe, em casos que tais, à sociedade (solidariedade social) prestar na medida do possível assistência aos próximos.

Pertinente, in casu, o ensinamento do professor de direito previdenciário Wagner Balera, quando pondera a respeito da dimensão do princípio da subsidiariedade: "O Estado é, sobretudo, o guardião dos direitos e garantias dos indivíduos. Cumpre-lhe, assinala Leão XIII, agir em favor dos fracos e dos indigentes exigindo que sejam, por todos respeitados os direitos dos pequenos. Mas, segundo o princípio da subsidiariedade - que é noção fundamental para a compreensão do conteúdo da doutrina social cristã - o Estado não deve sobrepor-se aos indivíduos e aos grupos sociais na condução do interesse coletivo. Há de se configurar uma permanente simbiose entre o Estado e a sociedade, de tal sorte que ao primeiro não cabe destruir, nem muito menos exaurir a dinâmica da vida social I (é o magistério de Pio XI, na Encíclica comemorativa dos quarenta anos da 'Rerum Novarum', a 'Quadragésimo Anno', pontos 79-80)." (Centenárias Situações e Novidade da 'Rerum Novarum', p. 545).

CASO CONCRETO

Primeiramente, analiso o requisito (subjetivo) da deficiência.

Quanto ao requisito subjetivo, consta do laudo médico pericial que a autora é portadora de hipertensão arterial, diabetes, hipotireoidismo, labirintite, escoliose, síndrome do túnel do carpo e osteoartrose, encontrando-se incapacitada para o trabalho, inclusive o doméstico.

A autora nasceu 24/10/1057 e possui várias doenças, algumas típicas da idade, algumas que modem ser tratadas adequadamente com medicamentos. O perito inclusive refere que a incapacidade pode ser temporária, devendo ser submetida a nova perícia em alguns meses.

A autora é dona de casa há 20 (vinte) anos, de modo que não aufere renda por igual período, de modo que não se encontra em situação de "pessoa com deficiência", mas pessoa com incapacidade laborativa, que inclusive não se submete a tratamento adequado.

Forçoso é concluir, a autora não sofre segregação típica da sofrida pelas pessoas portadoras de deficiência, tratando-se de caso a ser tutelado pelo seguro social (artigo 201 da CF) ou pela saúde (artigo 196 da CF), mesmo porque o BPC não é substituto de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.

Isto é, a parte autora sofre de doenças, risco social a ser coberto pela previdência social, mediante pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal, que têm a seguinte dicção: "Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)"

Ademais, não está patenteada a miserabilidade para fins assistenciais.

O estudo social (f. 41 e seguintes) demonstra que a autora vive com o marido, em casa própria, sobrevivendo ambos da do BPC - benefício assistencial de prestação continuada no valor de um salário mínimo. Além disso, recebe ajuda de uma filha.

Ocorre que a autora possui 5 (cinco) filhos, 4 (quatro) deles residentes na cidade de Birigui/SP, onde a autora mora. E no estudo social não consta qualificação, nem renda de quaisquer deles.

Percebe-se, assim, que a autora, pobre embora, tem acesso aos mínimos sociais, não se encontrando em situação de total "desamparo" (casa própria, renda mensal do marido e existência de filhos).

Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer os desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.

Não consta do estudo social, ademais, porque os filhos não lhe fornece algum auxílio financeiro, como manda a lei e a constituição.

Ora, o dever de sustento dos filhos não pode ser substituído pela intervenção Estatal, pois o próprio artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício só será devido quando o sustento não puder ser provido pela família.

Logo, tanto o artigo 203, V quanto o artigo 229 do Texto Magno devem ser levadas em conta na apuração da miserabilidade, não podendo a regra da miserabilidade prevista no artigo 20, § 3º, da LOAS ser interpretado de forma isolada, como se não houvesse normas constitucionais regulando a questão.

Assim, no caso, a técnica de proteção social prioritária no caso é a família, em cumprimento ao disposto no artigo 229 da Constituição Federal, in verbis: "Art. 229 - Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade."

Vide, no mais, o capítulo anterior deste julgado, sob a rubrica "SUBSIDIARIEDADE DA ASSISTÊNCIA SOCIAL".

A propósito, recentemente, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), ao analisar um pedido de uniformização do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), fixou a tese que "o benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção". A decisão aconteceu durante sessão realizada em 23/2/17, em Brasília. Quanto ao mérito, o relator afirmou em seu voto que a interpretação do art. 20, §1º, da Lei n. 8.742/93, conforme as normas veiculadas pelos arts. 203, V, 229 e 230, da Constituição da República de 1988, deve ser no sentido de que "a assistência social estatal não deve afastar a obrigação de prestar alimentos devidos pelos parentes da pessoa em condição de miserabilidade socioeconômica (arts. 1694 e 1697, do Código Civil), em obediência ao princípio da subsidiariedade".

A concessão indiscriminada de benefícios assistências gera graves distorções no sistema de seguridade social. São tantos os pobres que "dão duro" e trabalham nas adversidades. E são estes, exatamente estes, que pagam seus impostos em proporção muito maior que os ricos, e abastecem os cofres da seguridade social (artigo 195 da CF).

O benefício assistencial - que tem o mesmo valor da maior parte das aposentadorias pagas no Brasil, de 1 (um) salário mínimo, aposentadorias concedidas mediante contribuições exigidas dos segurados durante vários anos - não pode ser concedido com base em lamúrias ou sentimentalismos, pois ao final das contas esse proceder voltar-se-á contra os mesmos pobres que a Assistência Social visa a proteger.

Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO, para julgar improcedente o pedido.

Comunique-se, via e-mail, para fins de revogação da tutela provisória de urgência concedida.

É o voto.

Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado


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