D.E. Publicado em 14/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0031661-26.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face da r. sentença que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, na forma do artigo 267, V, do CPC/1973, revogando a tutela específica anteriormente concedida.
A parte autora requer a reforma do julgado, para que seja concedido o benefício de aposentadoria por idade rural desde a idade de cinquenta e cinco anos, ou observado o prazo prescricional de cinco anos, ou ainda desde a decisão administrativa negativa. Alega que faz jus ao benefício, mesmo tendo havido demanda anterior, julgada improcedente, com base no artigo 462 do CPC/1973. Frisa que foi concedida aposentadoria por idade rural ao marido, o que reforçaria o quadro probatório.
Sem as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
Subiram os autos a esta egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação da parte autora, porque presentes os requisitos de admissibilidade.
De outra parte, não conheço da apelação do INSS (f. 145/147), interposta em face de decisum revogado pelo próprio Juízo a quo, em razão da perda do objeto.
No caso, salta patente a ocorrência de coisa julgada, pois outra ação foi movida pela autora, com os mesmos fundamentos e mesmo pedido.
Com efeito, na ação nº 2005.03.99.011953-8, o acórdão da egrégia Sétima Turma julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria rural da parte autora (f. 152), tendo havido o trânsito em julgado.
Assim, torna-se ilegal a pretensão da parte autora, porque esbarra em regra expressamente prevista no ordenamento jurídica, necessária à manutenção da segurança jurídica, consoante mandamento constitucional (artigo 5º, XXXVI, da CF).
O fato de ter atingido idade superior não altera o panorama fático, mesmo porque a legislação previdenciária exige a idade de cinquenta e cinco anos para a aposentadoria por idade rural (artigo 48, § 1º, da LBPS).
De qualquer forma, não se aplica a regra do artigo 462 do CPC/1973 ao presente caso, já que o direito ao benefício previdenciário deve ser apurado quando do atingimento da idade de cinquenta e cinco anos, não havendo nos autos elementos para a comprovação de trabalho rural posteriormente à ação judicial pretérita.
Pelo contrário, as testemunhas disseram que ela não trabalha há alguns anos, por estar idosa e cansada.
Ademais, a parte autora não informou na petição inicial a respeito da outra ação anteriormente proposta, muito menos comprovou alteração da causa petendi, incorrendo em violação do princípio da lealdade processual.
O fato de o marido ter obtido o benefício de aposentadoria rural não implica, só por só, acolher a pretensão da autora, a toda evidência.
Conforme disposto no Código de Processo Civil de 1973, existe litispendência ou coisa julgada quando se verifica a perfeita identidade entre as demandas dos três elementos da ação: partes, causa de pedir e pedido:
"Art. 301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar: (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) |
(...) |
§ 1o Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) |
§ 2o Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) |
§ 3o Há litispendência , quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) |
§ 4o Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste artigo. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973) |
Necessária, assim, a extinção do processo sem julgamento do mérito, na forma da lei processual.
Registro que este relator tem entendimento assaz diverso dos manifestados em decisões que se pautam pela solução pro misero aos trabalhadores rurais, pois tal princípio não encontra abrigo na Constituição ou nas leis do direito positivo, e por isso gera graves distorções no sistema de proteção social.
De fato, com relação ao princípio in dubio pro misero, hodiernamente denominado "solução pro misero", não deve ser usado em previdência social, porquanto "o uso indiscriminado deste princípio afeta a base de sustentação do sistema, afetando sua fonte de custeio ou de receita, com prejuízos incalculáveis para os segurados, pois o que se proporciona a mais a um, é exatamente o que se tira dos outros" (Rui Alvim, Interpretação e Aplicação da Legislação Previdenciária, in Revista de Direito do Trabalho n° 34).
Ademais, "A previdência em si já é um instrumento social, por isso não vinga o pretexto de aplicar a lei com vista no interesse social. Este raciocínio é falso. O interesse social maior é que o seguro funcione bem, conferindo as prestações a que se obrigou. Se lhe é transmitida uma carga acima do previsto, compromete-se a sua liquidez financeira: ponto nevrálgico da eficiência de qualquer seguro. O prius que se outorga sairá do próprio conjunto de segurados, em virtude da pulverização do risco entre eles. Nesta circunstância o seguro se torna custoso e socialmente desinteressante, indo refletir no preço dos bens produzidos, influindo de maneira maléfica sobre os demais contribuintes, os quais têm de suportar o que se outorga alargando as obrigações do órgão segurador em favor de pretensões lamuriosas" (Elcir Castello Branco, Segurança Social e Seguro Social, 1º volume, Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda, 1975, São Paulo, páginas 127/128).
Noutro passo, necessário abordar a responsabilidade processual civil das partes envolvidas no processo, tão pouco desenvolvida na doutrina e jurisprudência pátrias, mas assente em ordenamentos jurídicos estrangeiros, como o Direito Português.
A responsabilidade por dano processual é objetiva, o que dispensa a observância de quaisquer outros ritos e procedimentos, à míngua de previsão legal.
A responsabilidade processual regula-se da mesma maneira do que a responsabilidade civil: presença do dano, nexo causal e resultado.
Nota-se que o dever de lealdade processual refere-se às partes e aos advogados e membros do Ministério Público.
Quanto à pena de litigância de má-fé à parte, quando motivas ações em duplicidade, não há dúvidas de que é devida.
Nesse diapasão:
PROCESSUAL CIVIL - DUPLICIDADE DE MANDADOS DE SEGURANÇA SIMULTÂNEOS E IDÊNTICOS - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - ARTS. 17 E 18 DO CPC. 1. Aplica-se o teor da Súmula 282/STF em relação às teses trazidas no recurso especial sobre as quais não houve pronunciamento expresso do Tribunal de origem. 2. Dissídio jurisprudencial não configurado, à míngua do necessário cotejo analítico com a demonstração inequívoca da similitude das circunstâncias fáticas e do direito aplicado, nos termos do art. 251, § 2º do Regimento Interno do STJ. 3. Deve ser reprimida com a penalidade prevista nos arts. 17 e 18 do CPC a conduta do impetrante que ajuíza, simultaneamente e em duplicidade, mandados de segurança de idêntico teor, distribuídos a juízos diferentes, com a intenção de burlar o princípio do juiz natural e de garantir a obtenção de provimento liminar. Caracterização da litigância de má-fé. 4. Inexiste bis in idem se para cada um dos processos administrativos fiscais foram ajuizados dois mandados de segurança e aplicada a multa por litigância de má-fé na segunda ação respectiva. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, no mérito, improvido (REsp 685678 / PA RECURSO ESPECIAL 2004/0121076-0 Relator(a) Ministra ELIANA CALMON (1114) Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 06/10/2005 Data da Publicação/Fonte DJ 24/10/2005 p. 271 RDDT vol. 124 p. 235). |
PROCESSO CIVIL - TRANSFORMAÇÃO DE MOTORISTAS AUXILIARES EM PERMISSIONÁRIOS AUTÔNOMOS DE SERVIÇO DE VEÍCULOS DE ALUGUEL A TAXÍMETRO - DECRETO MUNICIPAL "N" 18.693/2000 E LEI 3.123/2000 - MANDADO DE SEGURANÇA - CABIMENTO - LITISPENDÊNCIA - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - MANUTENÇÃO DA MULTA. 1. Evidenciada a litispendência, mantém-se a multa por litigância de má-fé, sendo desinfluente que os mandados de segurança pretéritos tenham sido subscritos por outro advogado. 2. O mandado de segurança visa proteger direito líquido e certo violado por ato ilegal ou abusivo. 3. Cabimento do mandamus para discutir direito à exploração de serviço de transporte de veículos de aluguel a taxímetro, cuja permissão foi concedida pelo Decreto "N" 18.693/2000, revogado posteriormente pelo Decreto "N" 19.443/2001. Configuração, em tese, de ato ilegal, com lesão a direito individual. 4. A Lei 3.123/2000, por sua vez, criou direito subjetivo à permissão para aqueles que preenchem os requisitos legais. Assim, sendo auto-aplicável e independendo de regulamentação, cabível a ação de segurança objetivando o cumprimento da norma. 5. Inaplicabilidade da Súmula 266/STF. 6. Recurso provido em parte, para que o Tribunal examine o mérito da impetração das partes em relação às quais não se reconheceu a litispendência (RMS 18239 / RJ RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2004/0068980-4 Relator(a) Ministra ELIANA CALMON (1114) Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 19/10/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 13/12/2004 p. 267). |
In casu, a parte autora, ao mover duas ações com o mesmo propósito, infringiu as normas previstas nos artigos 14, II e 17, III, do CPC/1973 e merece, à nitidez, ser condenada em litigância de má-fé, a pagar multa.
Há precedentes nesse sentido, conquanto não majoritários:
AGRAVO LEGAL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. AÇÕES AJUIZADAS EM DUPLICIDADE NA JUSTIÇA ESTADUAL E NO JEF. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER INEXISTENTES. I - No agravo do art. 557 do CPC, a controvérsia limita-se ao exame da ocorrência, ou não, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, a gerar dano irreparável ou de difícil reparação para a parte, vícios inexistentes na decisão. II - Razões recursais que não contrapõem tal fundamento a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele decidida. III - Agravo legal não provido (AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1628043 Processo: 0016744-41.2011.4.03.9999 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:30/07/2012 Fonte: e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/08/2012 Relator: JUIZ CONVOCADO LEONARDO SAFI). |
Não se pode ignorar os prejuízos causados à atividade jurisdicional, aos contribuintes e aos próprios jurisdicionados, pois gasto tempo e trabalho na análise de ações movidas em duplicidade.
Não é admissível, assim, que se movam tantas ações com os mesmos elementos, patenteada ilegalidade intencional por parte dos advogados, ainda que na busca de proteção social para seu cliente.
A propósito, não se pode chamar de "boa-fé" (nem subjetiva nem objetiva) a conduta da parte autora, devendo ser levado em conta o disposto no artigo 422 do Código Civil.
Pessoalmente penso que o advogado deveria ser condenado por litigância de má-fé, não o hipossuficiente, mas tal pensamento não encontra eco na jurisprudência majoritária.
Oportuno registrar que cabe ao advogado, antes de ingressar com ação previdenciária, verificar se o cliente já o fez preteritamente.
Em derradeiro, importa ressaltar que o artigo 1º, § 4º, da Lei nº 1.060/50 assegurava a gratuidade aos necessitados. Para tanto basta simples declaração nesse sentido, acrescentando-se que a autora tem profissão humilde, mal remunerada, compatível com a alegação de hipossuficiência.
Não obstante, o artigo 3º da Lei n° 1.060/50, vigente à época, não isenta a parte de responder por multa ou indenização em caso de litigância de má-fé. Nem poderia ser diferente, sob pena de a concessão da gratuidade judiciária descambar para blindagem geradora de impunidade.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO e condeno a parte autora em multa de 1% (um) por cento sobre o valor atualizado da causa, em razão da litigância de má-fé.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | RODRIGO ZACHARIAS:10173 |
Nº de Série do Certificado: | 2DBCF936DB18581E |
Data e Hora: | 01/06/2016 18:25:29 |