
| D.E. Publicado em 28/03/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041324-62.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de recurso interposto em face da r. sentença que julgou procedente o pedido de concessão de auxílio-doença rural, desde a data do requerimento administrativo (22/6/2015), discriminados os consectários legais, dispensado o reexame necessário. Antecipados os efeitos da tutela.
O INSS interpôs recurso de apelação, alegando, preliminarmente, a ocorrência de coisa julgada. No mérito, sustenta, em síntese, a não comprovação da qualidade de segurada especial da autora e ausência de prova de incapacidade para o trabalho. Prequestiona a matéria.
Contrarrazões apresentadas.
Às f.149/150, requer a parte autora prorrogação do benefício.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Rejeito a preliminar, uma vez que no processo nº 10.00.00077-6, que tramitou na 2º Vara Cível de Capão Bonito/SP, a autora requereu a concessão de benefício de aposentadoria por idade rural.
No presente feito, o pedido é de concessão de auxílio-doença.
Conforme disposto no Código de Processo Civil, só existe litispendência ou coisa julgada quando se verifica a perfeita identidade entre as demandas dos três elementos da ação: partes, causa de pedir e pedido:
Como não há identidade de pedidos, afasto a matéria preliminar.
Passo à análise do mérito.
Discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício por incapacidade à parte autora.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do art. 42 da Lei n. 8.213/91, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença, benefício pago se a incapacidade for temporária, é disciplinado pelo art. 59 da Lei n. 8.213/91, e a aposentadoria por invalidez tem seus requisitos previstos no art. 42 da Lei 8.213/91.
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho.
São exigidos à concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
Noutro passo, para os trabalhadores rurais segurados especiais, a legislação prevê o pagamento de alguns benefícios não contributivos, no valor de um salário mínimo (artigo 39, I, da Lei nº 8.213/91).
Segundo consta da inicial, a parte autora exerceu atividade rural como diarista boia-fria.
Depois da edição da Lei n. 8.213/91, a situação do rurícola modificou-se, pois passou a integrar sistema único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores urbanos, tornando-se segurado obrigatório da Previdência Social.
A partir do advento da Constituição da República de 1988 não mais há distinção entre trabalhadores urbanos e rurais (artigos 5º, caput, e 7º, da CF/88), cujos critérios de concessão e cálculo de benefícios previdenciários regem-se pelas mesmas regras.
Assim, a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença para os trabalhadores rurais, se atendidos os requisitos essenciais, encontra respaldo na jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça e nesta Corte: STJ/ 5ª Turma, Processo 200100465498, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 22/10/2001; STJ/5ª Turma, Processo 200200203194, rel. Min. Laurita Vaz, DJ 28/4/2003; TRF-3ª Região/ 9ª Turma, Processo 20050399001950-7, rel. juíza Marisa Santos, DJ 10/10/2005; TRF-3ª Região/ 8ª Turma, Processo 200403990027081, rel. juiz Newton de Lucca, DJ 11/7/2007; TRF-3ª Região/ 10ª Turma, Processo 200503990450310, rel. juíza Annamaria Pimentel, DJ 30/5/2007.
Entendo, pessoalmente, que somente os trabalhadores rurais, na qualidade de segurados especiais, não necessitam comprovar os recolhimentos das contribuições previdenciárias, devendo apenas provar o exercício da atividade laboral no campo, ainda que de forma descontínua, pelo prazo da carência estipulado pela lei, tal como exigido para o segurado especial. Assim dispõe o art. 11, VII, c/c art. 39, I, da Lei 8.213/91.
Consequentemente, uma vez ausente a comprovação de exercício de atividade rural na forma do inciso I do artigo 39 da Lei nº 8.213/91, não se lhe pode conceder aposentadoria por invalidez rural.
À míngua da previsão legal de concessão de benefício previdenciário não contributivo, não cabe ao Poder Judiciário estender a previsão legal a outros segurados que não sejam "segurados especiais", sob pena de afrontar o princípio da distributividade (artigo 194, § único, III, da Constituição Federal).
O artigo 143 da Lei nº 8.213/91, que permite a concessão de benefício sem o recolhimento de contribuições, referia-se somente à aposentadoria por idade. Ainda assim, trata-se de norma transitória com eficácia já exaurida.
Enfim, penso que, quanto aos boias-frias ou diaristas - enquadrados como trabalhadores eventuais, ou seja, contribuintes individuais na legislação previdenciária, na forma do artigo 11, V, "g", da LBPS - não há previsão legal de cobertura previdenciária no caso de benefícios por incapacidade, exatamente porque o artigo 39, I, da LBPS só oferta cobertura aos segurados especiais.
Todavia, com a ressalva de meu entendimento pessoal, curvo-me ao entendimento da jurisprudência francamente dominante nos Tribunais Federais, nos sentido de que também o trabalhador boia-fria, diarista ou volante faz jus aos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença não contributivos.
Nesse sentido:
Pois bem.
No caso dos autos, a perícia judicial - realizada 20/1/2016 - constatou que a autora, lavradora, nascida em 1955, estava parcial e temporariamente incapacitada para seu trabalho habitual, por ser portadora de varizes (tratamento desde 2011) e asma desde a adolescência (f. 75/79).
Segundo o perito, "há sinais de incapacidade parcial e temporária para funções que exijam esforço físico moderado a intenso, devido às crises de falta de ar, exacerbadas pela não utilização dos medicamentos. Não há sinais de dependência de terceiros para manter as atividades da vida diária" (CONCLUSÃO - f. 78).
Resta averiguar, entretanto, o exercício de atividades rurais quando deflagrada a incapacidade laboral da autora.
Como início de prova material do alegado trabalho rural, em regime de economia familiar, consta dos autos declarações de entrega da declaração de ITR desde o ano 2002 (f. 16/28), notas fiscais de produtor em nome da filha "Bruna Aparecida e Outro" emitidas entre 2007 e 2015 (31/39).
Em nome próprio, apenas inscrição no Cadastro de Contribuintes de ICMS - Cadesp, na qual se apresenta como produtora rural (f. 11/13) e contribuição sindical - Agricultor familiar (exercício 2006) -, em nome da autora (f. 14).
Cabe assinalar, todavia, que esta contribuição ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Guapiara restringe-se ao ano 2006, quando a autora já possuía 51 (cinquenta e um) anos de idade.
Ademais, essa prova não é meio seguro de que a promovente exerça de fato a agricultura, eis que não há fiscalização efetiva da atividade, sendo fato comum pessoas filiarem-se ao sindicato sem exercerem realmente a atividade, na busca por benefícios previdenciários.
Por sua vez, os testemunhos colhidos foram insuficientes para comprovar todo mourejo asseverado.
Alice Cruz da Silva Correa disse que conhece a autora há uns 20 anos, por morarem no mesmo bairro. Afirmou que a requerente "planta milho e feijão no terreno dela" com ajuda de sua filha até o ano de 2012, devido a problemas de saúde.
José Roberto Branger, por sua vez, disse conhecer a autora há pelo menos 15 anos no Bairro Pinheiro dos Nunes. Informa que a autora "trabalhou firme" na roça até 2001, sendo que, aproximadamente, um ano e meio antes da audiência, ela deu uma parada, em razão de problemas respiratório e varizes.
No caso, a prova da atividade rural da autora, em regime de economia familiar, não está comprovada a contento, porque fincada exclusivamente em prova vaga e contraditória, sendo que o início de prova material é precário.
Destaco a v. decisão monocrática de 27/9/2013, proferida pelo Juiz Federal Convocado Leonardo Safi, que deu provimento à apelação autárquica para julgar improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural à autora, já que a autora não demonstrou o efetivo exercício de atividade rural (f. 103/118).
Além disso, o marido da autora foi trabalhador urbano desde 1975 (CNIS de f. 59), e percebe aposentadoria por tempo de contribuição, com DIB em 16/12/1996.
Nos termos do artigo 11, § 9º, da Lei nº 8.213/91, com a redação da Lei nº 11.718/2008, não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento. No caso, o grupo familiar possui outra fonte de rendimento há décadas, consistindo inicialmente no trabalho do marido como urbano, posteriormente na aposentadoria do mesmo.
Evidente que, num regime de previdência social em que os urbanos e rurais possuem regime único desde 1991 (artigo 194, § único, da Constituição da República, que conforma o princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais), não é razoável que se conceda benefícios não contributivos para quem possui plena capacidade econômica de contribuição.
Nesse passo, concluo pelo não preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado, sendo impositiva a reforma da r. sentença e, por consequência, resta prejudicada a análise da petição de f. 149/150.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido.
Comunique-se, via e-mail, para fins de revogação da tutela antecipatória de urgência concedida, observado o disposto no Resp 1.401.560/MT, submetido à sistemática de recurso repetitivo, bem assim o disposto no artigo 302, I, do CPC de 2015.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 14/03/2017 17:39:41 |
