
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004406-96.2019.4.03.6109
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO CARLOS NEGRI
Advogado do(a) APELADO: LUIS FERNANDO SEVERINO - SP164217-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004406-96.2019.4.03.6109
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO CARLOS NEGRI
Advogado do(a) APELADO: LUIS FERNANDO SEVERINO - SP164217-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, mediante o cômputo dos períodos especiais já reconhecidos pelo INSS na esfera administrativa e o decidido na ação judicial n.º 0012636-67.2009.4.03.6109.
O juízo a quo julgou procedente o pedido para condenar o INSS a converter a aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, mediante o cômputo das atividades especiais reconhecidas administrativamente (1.º/7/1983 a 18/1/1988 e 10/1/1994 a 28/4/1995) e judicialmente (2/05/1978 a 30/4/1980, 1.º/6/1980 a 5/2/1982, 1.º/2/1988 a 12/4/1989, 14/11/1989 a 31/7/1992, 27/4/1993 a 13/10/1993, 29/4/1995 a 5/3/1997 e 2/5/1998 a 24/4/2009). Determinou o pagamento das parcelas vencidas a partir da DER (24/4/2009), observada a prescrição quinquenal e acrescidas de correção monetária e juros nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal em vigor à época da execução. Os honorários advocatícios foram fixados no percentual mínimo sobre o valor da condenação até a data da sentença (Súmula 111/STJ). Tutela antecipada deferida.
O INSS apela, requerendo o conhecimento da remessa oficial e a concessão de efeito suspensivo ao recurso. Pleiteia, outrossim, o reconhecimento da ocorrência dos efeitos preclusivos da coisa julgada, sendo indevida, portanto, a aposentadoria especial, sob pena de desaposentação. Alega, ainda, não ser possível o cômputo de período de auxílio-doença como atividade especial. Se vencido, requer que os efeitos financeiros tenham início a partir da citação, bem como a observância do art. 57, § 8.º, da Lei n.º 8.213/91 e da prescrição quinquenal. Por fim, requer a fixação dos honorários advocatícios no percentual mínimo sobre o valor das parcelas vencidas nos termos da Súmula 111 do STJ.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004406-96.2019.4.03.6109
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANTONIO CARLOS NEGRI
Advogado do(a) APELADO: LUIS FERNANDO SEVERINO - SP164217-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, deixa-se de conhecer da apelação com relação à alegação de impossibilidade de cômputo de período de auxílio-doença como atividade especial, tendo em vista que o autor não recebeu o referido benefício por incapacidade (Id. 154153610, pp. 17/20), encontrando-se as razões recursais dissociadas do caso concreto. Não se conhece do recurso, outrossim, no tocante aos pedidos de observância da prescrição quinquenal e fixação dos honorários advocatícios no percentual mínimo e nos termos da Súmula 111 do STJ, por falta de interesse recursal, uma vez que a sentença foi proferida nos exatos termos do inconformismo do recorrente.
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Frise-se não ser caso de se ter submetida a decisão de 1.º grau ao reexame necessário, considerando o disposto no art. 496, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 salários mínimos.
Outrossim, observa-se que o INSS requer, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado.
Não lhe assiste razão.
A alegação veiculada concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito não se coloca na hipótese dos autos.
A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória”.
Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido diverso, "se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso" (CPC, art. 995, parágrafo único).
Neste caso, em que o recurso é interposto pelo INSS, não há nem urgência nem evidência para que se conceda o efeito suspensivo. Pelo contrário, a urgência serve à parte autora, já que o benefício previdenciário é considerado verba alimentar.
Com relação à alegada ocorrência dos efeitos preclusivos da coisa julgada, cabe tecer algumas considerações.
Segundo os §§ 1.º, 2.º e 3.º do art. 337 do Código de Processo Civil, uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. Ocorre a litispendência quando se repete ação que está em curso.
Há coisa julgada, por sua vez, quando se repete ação que já foi decidida por sentença de que não caiba recurso.
José Joaquim Calmon de Passos, em “Comentários ao Código de Processo Civil”, Volume III, 6ª edição, Editora Forense, afirma que a coisa julgada configura pressuposto processual de desenvolvimento negativo, o que implica em dizer que a validade da relação processual depende de sua inexistência.
Sobrevindo a coisa julgada material, qualidade que torna imutável e indiscutível o comando que emerge da sentença (ou acórdão) de mérito, a norma concreta contida na sentença recebe o selo da imutabilidade e da incontestabilidade.
A propósito, cite-se nota do artigo 467 do CPC, Theotonio Negrão, 28ª edição, verbis:
“A coisa julgada é formal quando não mais se pode discutir no processo o que se decidiu. A coisa julgada material é a que impede discutir-se, noutro processo, o que se decidiu (Pontes de Miranda) (RT 123/569)”.
Para reconhecimento do instituto da coisa julgada, deve-se verificar a tríplice identidade dos sujeitos, pedido e causa de pedir.
No presente caso, análise pormenorizada dos autos indicam que não assiste razão ao recorrente, na medida em que diversos os pedidos.
Na ação judicial n.º 0012636-67.2009.4.03.6109, a pretensão era de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, enquanto na presente, busca a conversão do referido benefício em aposentadoria especial.
Registre-se inexistir qualquer óbice ao pleito de revisão de benefício previdenciário, desde que observado o prazo decadencial.
A própria autarquia previdenciária adota essa diretriz ao estabelecer na Instrução Normativa INSS-PRES nº 77, de 21 de janeiro de 2015, em seu art. 687, que "o INSS deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientar nesse sentido".
A possibilidade de concessão de benefício mais vantajoso nas condições apresentadas quando da concessão de outro é o objeto de análise nos presentes autos, operando-se os efeitos da coisa julgada em relação aos períodos reconhecidos como especiais, que fundamentaram a presente revisão.
Dessa forma, rejeita-se a alegação de ocorrência dos efeitos preclusivos da coisa julgada.
Quanto à desaposentação, consiste no cômputo de novas contribuições e renúncia à aposentadoria atual de modo a usufruir aposentadoria mais favorável. Tal possibilidade foi vedada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 661.256, referente ao tema 503.
Não se trata, contudo, da situação dos autos, que reconheceu o direito do autor à percepção de benefício mais vantajoso, na DIB originalmente fixada.
Com relação à concessão da aposentadoria especial, observa-se que o juízo a quo reconheceu 26 anos, 9 meses e 8 dias de atividade especial, computando o labor especial reconhecido judicialmente (processo n.º 0012636-67.2009.4.03.6109) e administrativamente.
À míngua de impugnação do INSS com relação aos interstícios considerados na sentença, deixa-se de analisar tais períodos.
O termo inicial dos efeitos financeiros deve ser fixado a partir da data da citação na presente ação, tendo em vista que o pedido de conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial foi formulado tão somente nos presentes autos, ressaltando que na anterior ação n.º 0012636-67.2009.4.03.6109 o pedido do autor restringiu-se ao reconhecimento da atividade especial para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, tendo a autarquia promovido a implantação do referido benefício previdenciário em estrito cumprimento à determinação judicial.
Somente nos presentes autos o INSS teve ciência do pleito de revisão referente à conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, motivo pelo qual as parcelas são devidas a partir da data da citação efetuada nesta ação.
Com relação à necessidade de afastamento das atividades, cabe tecer as seguintes considerações.
O Supremo Tribunal Federal pacificou a questão ao analisar o Tema 709 da Repercussão Geral (RE 791.961), em sessão realizada em 5/6/2020 (DJE 16/6/2020). Prevaleceu o entendimento do Excelentíssimo Senhor Relator, Ministro Dias Toffoli, no sentido de acolher em parte o recurso do INSS e reconhecer a constitucionalidade do § 8.º do art. 57 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.
Como se depreende do item II, indevida a fixação da data de afastamento da atividade como marco para o início da aposentadoria especial.
Dessa forma, nas hipóteses em que o trabalhador solicitar a aposentadoria e a sua implantação não for efetivada nem administrativamente, nem judicialmente, continuando a exercer atividade especial, a data de início do benefício será a da citação, inclusive para efeitos de pagamento retroativo, mesmo que concomitante com o labor nocivo. Isso porque não é razoável exigir o afastamento do trabalho logo quando da postulação, pois entre essa e o eventual deferimento decorre um tempo durante o qual o indivíduo evidentemente necessita continuar a obter renda para seu sustento, sendo incerto, ademais, nesse primeiro momento, inclusive, o deferimento da aposentação (RE n.º 791.961), de modo que apenas a efetiva percepção do benefício, contemporânea ao trabalho, implica a necessidade de afastamento do labor especial.
Posto isso, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe parcial provimento para determinar a observância do art. 57, §8º, da Lei n.º 8.213/91 (Tema 709/STF) e fixar o termo inicial dos efeitos financeiros a partir da data da citação, nos termos da fundamentação supra.
É o voto.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. DESAPOSENTAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. REVISÃO DE BENEFÍCIO. CONVERSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMA 709 DO STF. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS.
- Ante a diversidade dos pedidos formulados na ação anterior e no presente feito, não configurada a coisa julgada.
- A percepção de aposentadoria especial constitui óbice à continuidade do desempenho de atividade nociva ou ao retorno a ela, ainda que diversa da que ensejou a concessão do benefício, nos termos do art. 57, § 8.º, da Lei n.º 8.213/91.
- O Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do dispositivo ao analisar o Tema 709 da Repercussão Geral (RE 791.961, DJE 16/6/2020).
- O termo inicial dos efeitos financeiros deve ser fixado a partir da data da citação na presente ação, tendo em vista que o pedido de conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial foi formulado tão somente nos presentes autos, ressaltando que na anterior ação n.º 0012636-67.2009.4.03.6109 o pedido do autor restringiu-se ao reconhecimento da atividade especial para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, tendo a autarquia promovido a implantação do referido benefício previdenciário em estrito cumprimento à determinação judicial. Somente nos presentes autos o INSS teve ciência do pleito de revisão referente à conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, motivo pelo qual as parcelas são devidas a partir da data da citação efetuada nesta ação.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL CONVOCADA
