Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5254141-50.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
04/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/09/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR
AFASTADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE.
REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. DEVIDA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
1. Não resta configurada a coisa julgada ante a ausência da tríplice identidade entre esta ação e a
demanda anterior transitada em julgado.
2. Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
3. Na falta de elementos com o condão de infirmar as conclusões do expert, há que se prestigiar
a conclusão da prova técnico-pericial.
4. Uma vez constatada pela perícia médica a incapacidade laborativa do segurado, preenchidos
os demais requisitos legais, afigura-se devida a concessão do benefício.
5. Reconhecimento da procedência da pretensão.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6. A questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à
correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral. No que diz respeito à correção monetária,
deverá ser observado o Manual de Cálculo da Justiça Federal, segundo os termos do julgamento
pelo C. STF da Repercussão Geral do RE 870.947 (Tema 810), e pelo C. STJ no Recurso
Especial Repetitivo n. 1.492.221 (Tema 905).
7. Quanto aos juros moratórios devem incidir a partir da citação, à razão de 0,5% (meio por cento)
ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/01/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um
por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à
remuneração da caderneta de poupança, na forma da Repercussão Geral no RE 870.947.
8. Mantidos os honorários advocatícios nos moldes fixados na r. sentença, eis que de acordo com
a moderada complexidade das questões e consenso deste Colegiado.
9. Preliminar rejeitada. Apelação autárquica desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5254141-50.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAIR PIRASOL DE SIQUEIRA
Advogado do(a) APELADO: PRYSCILA PORELLI FIGUEIREDO MARTINS - SP226619-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5254141-50.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAIR PIRASOL DE SIQUEIRA
Advogado do(a) APELADO: PRYSCILA PORELLI FIGUEIREDO MARTINS - SP226619-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelação autárquica interposta contra a r. sentençaque julgou procedente a ação, a
fim de, “confirmando a tutela antecipada, determinar que o INSS conceda a requerente à
aposentadoria por invalidez previdenciária (NB- 626.068.319-0), com data de início desde a DER
(17.12.2018, p. 22). Condena-se o INSS, ainda, a pagar à autora as diferenças devidas e não
pagas, corrigidas monetariamente pelo IPCA-E e acrescidas de juros moratórios de acordo com
os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (Lei
9.494/97, art. 1º-F, com a redação dada pela Lei 11.960/2009), incidentes desde a data em que
deveriam ter sido pagas, até a data da inscrição do crédito em precatório. Sucumbente, arcará o
requerido com os honorários advocatícios do patrono da autora, ora fixado em 15% do total
devido até a data desta sentença. As partes são isentas do pagamento de custas.” (ID 132488142
- Pág. 2, grifos no original).
Decisão não submetida à remessa necessária.
Em suas razões recursais (ID 132488148), o INSS sustenta, preliminarmente, a existência de
coisa julgada em ação anterior, que versou sobre o mesmo benefício por incapacidade, poucos
meses antes do novo requerimento em 17/12/2018, discutido na presente ação. No mérito,
sustentaa ausência de preenchimento dos requisitos legais à concessão do benefício para a
apelada, que contribuía como segurada facultativa, e não exercia atividade como empregada
desde 1975, não estando comprovada sua incapacidade para a vida habitual. Subsidiariamente,
pugna pela reforma da sentença quanto à correção monetária e pela redução dos honorários
sucumbenciais fixados. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões (ID 132488159), subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5254141-50.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CLAIR PIRASOL DE SIQUEIRA
Advogado do(a) APELADO: PRYSCILA PORELLI FIGUEIREDO MARTINS - SP226619-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Prefacialmente, rejeito a preliminar de coisa julgada.
Com efeito, alega o INSS a formação de coisa julgada em 07/08/18 em processo anterior de nº
0000399-11.2018.4.03.6327, cujo trâmite deu-se perante o JEF Cível de São José dos Campos,
em que teria sido requerido mesmo benefício em razão da mesma situação incapacitante, com o
reconhecimento da incapacidade apenas entre 13/11/2017 e 13/03/2018, em consonância com o
laudo e sentença de 10/07/18.
A coisa julgada configura garantia fundamental prevista na Constituição da República Federativa
do Brasil, em seu artigo 5º, inciso XXXVI, e foi instituída com o propósito de conferir proteção à
segurança jurídica.
Leciona a doutrina que: “A coisa julgada é a imutabilidade que qualifica a sentença de mérito não
mais sujeita a recurso e que impede sua discussão posterior.” (MARINONI, Luiz Guilherme;
ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Manual do Processo Civil. 5. ed. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 659).
De acordo com o artigo 337, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015: "Verifica-se a
litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada." Estatui o § 4º
do mesmo dispositivo legal que: "Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por
decisão transitada em julgado."
No entanto, as ações em que se pleiteia os benefícios por incapacidade têm como objeto
relações continuativas e, desse modo, as sentenças nelas proferidas vinculam-se aos
pressupostos existentes ao tempo em que foram ajuizadas, sem, todavia, extinguir a relação
jurídica, cujos elementos continuam sujeitos à variação.
Isso porque estas sentenças têm implicitamente a cláusula rebus sic stantibus, de maneira que,
uma vez modificadas as condições de fato ou de direito sobre as quais se formou a coisa julgada
material, resta configurada nova causa de pedir próxima ou remota.
Cumpre ressaltar que o próprio legislador estabeleceu a necessidade de realização de perícias
periódicas considerando-se que a incapacidade laboral pode ser modificada com o decurso do
tempo.
Na hipótese dos autos, após o trânsito em julgado da ação anterior em 07/08/2018 (ID
132488151), a parte autora propôs esta ação em março/2019 (ID 132488089 - Pág. 13),
afirmando que faz jus ao benefício por incapacidade requerido em 17/12/2018, indeferido
administrativamente (ID 132488089 - Pág. 12), juntando aos autos documentação médica
contemporânea, atestando as enfermidades que a acometem.
Sobre o tema, cito precedentes desta E. Corte Regional:
“PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR AFASTADA. AUXÍLIO-
DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E
PERMANENTE.REQUISITOSPREENCHIDOS. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL.
- Não se constata a ocorrência de coisa julgada porque ausente a tríplice identidade entre esta
ação e a ação anterior transitada em julgado.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência- doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovada a incapacidade laboral da parte autora para as atividades laborais habituaispor
meio da perícia médica judicial e preenchidos os demais requisitos para a concessão do benefício
– qualidade de segurado e carência –, é devido auxílio-doença.
- Osegurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual,
deverá ser submetido a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade,
a teor do artigo 62da Lei n. 8.213/1991.
- Apelações não providas.”
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 6172572-44.2019.4.03.9999, Rel.
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 24/04/2020, e -
DJF3 Judicial 1 DATA: 29/04/2020) (grifei)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL.PREVIDENCIÁRIO.
RESTABELECIMENTO.AUXÍLIO DOENÇA. COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA.
CONHECIMENTO DA CAUSA PELO JUÍZO ESTADUAL. COMPETÊNCIA FEDERAL
DELEGADA. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. REQUISITOS PREENCHIDOS.
1.Ausente a tríplice identidade entre as demandas, em decorrência da alteração da causa
petendi, não há que se falar no pressuposto processual negativo da coisa julgada.
2. Afastada a alegação deincompetência do Juízo estadual, tendo em vista a competência federal
delegada prevista no Art. 109, § 3º, da Constituição Federal.
3. A prova documental indica que, à época da cessação do benefício, aseguradaencontrava-se
em tratamento e sem condições para retornar ao trabalho.
4. Preenchidos os requisitos, é de se conceder a tutela provisória de urgência.
5.Agravo desprovido.”
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5001420-66.2019.4.03.0000,
Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 04/03/2020,
Intimação via sistema DATA: 06/03/2020) (grifei)
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. ALTERAÇÃO DO QUADRO FÁTICO. ENFERMIDADES NÃO COINCIDENTES.
CAUSA DE PEDIR DISTINTA. AÇÕES NÃO IDÊNTICAS. FUNÇÃO POSITIVA DA COISA
JULGADA. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO NO PRESENTE FEITO. OFENSA À COISA
JULGADA NÃO CARACTERIZADA. DOLO PROCESSUAL NÃO CONFIGURADO.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - O fenômeno da coisa julgada se caracteriza pela existência, entre duas causas, da tríplice
identidade de partes, pedido e causa de pedir, sendo que uma das causas encontra-se
definitivamente julgada, em face do esgotamento dos recursos possíveis.
II - Em que pese a similitude das narrativas no tocante aos elementos da ação, o exame dos
autos revela fato diverso exposto na ação subjacente, consistente em estado de saúde da então
autora distinto daquele apresentado na ação ajuizada perante o Juízo Federal de Presidente
Prudente/SP, de modo a afastar a coincidência da causa de pedir, e, por consequência, a
ocorrência de coisa julgada.
III - Além do acréscimo de enfermidades constante da inicial em relação à demanda
paradigmática, conforme destacado pela própria Relatora, anoto que foram colacionados
documentos médicos posteriores ao trânsito em julgado do primeiro feito, tais como o atestado
emitido por profissional especialista em ortopedia – traumatologia em 06.06.2014 (id 591356 –
pág. 27), bem como ressonância magnética da coluna lombo sacra e radiografia dos joelhos,
ambos de 17.08.2015, mencionados no laudo pericial (id 591356 – pág. 55).
IV - Pelas regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente
acontece, é razoável presumir que o segurado acometido de enfermidades crônicas, como é o
caso do autos (artrose com hérnia discal de coluna cervical e lombar, artrose e meniscopatia de
joelho direito, síndrome do túnel do carpo severa bilateral e hipertensão arterial sistêmica), alterne
o seu quadro de saúde durante o tempo, ora melhor, ora pior, com tendência, contudo, de
agravamento com a continuidade dos esforços exigidos para o cumprimento de sua atividade
habitual (empregada doméstica) e com o avanço da idade, repercutindo, de forma importante, no
substrato fático da causa.
V - Embora as ações não sejam idênticas, conforme acima explanado, não se olvide da função
positiva da coisa julgada relativamente ao feito que tramitou perante o Juízo Federal de
Presidente Prudente/SP, no sentido de que deve ser respeitado o que lá foi decidido.
VI - No caso vertente, como o termo inicial do benefício de aposentadoria por invalidez foi fixado
na data da citação do feito subjacente (03.09.2014), inexistem parcelas devidas anteriores ao
trânsito em julgado do primeiro feito (05.05.2014), razão pela qual, também neste aspecto, não se
vislumbra ofensa à coisa julgada.
VII - Não se configura dolo processual, dado que não é razoável imputar à autora, empregada
doméstica, conduta desleal com o propósito de dificultar a atuação da autarquia previdenciária.
VIII - Honorários advocatícios a serem suportados pelo INSS, no importe de R$ 2.000,00 (dois mil
reais).
IX - Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente.”
(TRF 3ª Região, 3ª Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5005726-49.2017.4.03.0000, Rel.
Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, julgado em 30/10/2019, e - DJF3
Judicial 1 DATA: 05/11/2019) (grifei)
Destarte, constata-se que se trata de pedidos e causa de pedir distintos, não se configurando a
coisa julgada material na espécie.
Passo ao exame do mérito.
Discute-se nos autos o direito da parte autora à concessão de benefício por incapacidade.
Da aposentadoria por invalidez e do auxílio-doença
A cobertura da contingência invalidez/incapacidade permanente é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II - Da Seguridade Social, no artigo 201, inciso I, da Constituição da
República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade
avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
Com efeito, a Reforma da Previdência de 2019 (EC nº 103/2019) modificou a denominação da
invalidez para incapacidade permanente.
A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social
(PBPS), disciplina em seus artigos 42, caput, e 59, caput, as condições à concessão de
benefícios por incapacidade, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”
Aaposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 da LBPS, é o benefício destinado ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o seu
trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou em
razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Desse modo, o evento determinante para a concessão desses benefícios consiste na
incapacidade para o trabalho.
Na hipótese de incapacidade temporária, ainda que de forma total e permanente, será cabível a
concessão de auxílio-doença, o qual posteriormente será convertido em aposentadoria por
invalidez (caso sobrevenha incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se for extinta a
incapacidade temporária e o segurado permanecer com sequela permanente que enseje a
redução da sua capacidade laboral) ou cessado (quando ocorrer a cura do segurado).
São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de
segurado, a carência e a incapacidade laborativa.
1. O primeiro consiste na qualidade de segurado, consoante o art. 15 da LBPS. É cediço que
mantém a qualidade de segurado aquele que, ainda que esteja sem recolher as contribuições,
preserve todos os seus direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, ao
qual a doutrina denominou "período de graça", de acordo com o tipo de segurado e a sua
situação, conforme dispõe o art. 15 da Lei de Benefícios, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação
dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Releva observar que o § 1º do art. 15 da Lei nº 8.213/1991 prorroga o período de graça por 24
meses àqueles que contribuíram por mais de 120 meses, sem interrupção que acarrete a perda
da qualidade de segurado.
Ademais, restando comprovado o desemprego do segurado, mediante registro perante o órgão
próprio do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos do inciso II ou do § 1º do
art. 15 da Lei de Benefícios serão acrescidos de mais 12 meses (art. 15, § 2°, da Lei n.
8.213/1991).
É evidente que a situação de desemprego deve ser comprovada, pela inscrição perante o
Ministério do Trabalho (artigo 15, § 2º, da Lei n.8.213/1991), ou por qualquer outro meio
probatório (v.g., prova documental, testemunhal, indiciária etc.).
Importa esclarecer que, consoante o disposto no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 14
do Decreto nº 3.048/99 (que aprova o Regulamento da Previdência Social – RPS), com a redação
dada pelo Decreto nº 4.032/2001, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do
segundo mês seguinte ao término do prazo estabelecido no art. 30, inciso II, da Lei nº 8.212/1991
para recolhimento da contribuição, ensejando, por conseguinte, a caducidade do direito
pretendido, exceto na hipótese do § 1º do art. 102 da Lei nº 8.213/91, isto é, quando restar
comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir foi decorrente da
incapacidade laborativa.
Frise-se que com o decurso do período de graça, as contribuições anteriores à perda da
qualidade de segurado apenas serão computadas para efeitos de carência após o recolhimento
pelo segurado, a partir da nova filiação ao RGPS, conforme o caso, de, ao menos, 1/3 (um terço)
do número de contribuições necessárias para o cumprimento da carência exigida para benefícios
por incapacidade, ou seja, quatro contribuições (durante a vigência do art. 24, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91) ou metade deste número de contribuições (de acordo com o art. 27-A da Lei de
Benefícios, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
2. O segundo requisito diz respeito à carência de 12 (doze) contribuições mensais, consoante o
disposto no art. 25 da Lei nº 8.213/1991, a saber:
“Art.25.A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
No entanto, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após
filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas no art. 151 da Lei de Benefícios, que
dispõe:
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada.(Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)”
3. O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho de modo permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e na incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos
(auxílio-doença).
Anote-se que para a concessão de benefícios por incapacidade é preciso a demonstração de
que, ao tempo da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto se a
incapacidade sobrevier em decorrência de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
Estabelecem os artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
“Art. 42. (...)
§ 2ºA doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
“Art. 59. (...)
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Logo, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura
óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou
agravamento da moléstia, ex vi do art. 42, § 2º, da Lei de Benefícios.
Na hipótese de ser reconhecida a incapacidade somenteparcialpara o trabalho, o magistrado
deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Ademais, pode conceder auxílio-acidente, nos
moldes do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, se a incapacidade parcial decorre de acidente de
trabalho ou de qualquer natureza, ou ainda, de doença profissional ou do trabalho (art. 20, incisos
I e II, da Lei de Benefícios).
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o
magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros
elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais,
sociais e profissionais.
Confira-se alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que dizem respeito a
esse tema:
Súmula 47 da TNU: "Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez".
Súmula 53 da TNU:"Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social".
Súmula 77 da TNU:"O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual".
O art. 43, §1º, da Lei nº 8.213/1991 preceitua que a concessão da aposentadoria por invalidez
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame
médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial
consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o
segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido
entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da
Seguridade Social.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência
permanente de outra pessoa (grande invalidez), é possível, com supedâneo no art. 45 da Lei de
Benefícios, o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto
Trata-se de ação de conhecimento pelo rito comum, em que a parte autora pretende a
implantação do auxílio-doença, com pedido de antecipação de tutela, ou sua conversão em
aposentadoria por invalidez.
Por ocasião do laudo pericial (ID 132488112), restou constatado que a parte autora é portadora
de artrodese lombar para hérnia discal e síndrome do impacto operado no ombro direito.
Concluiu o expert que existe incapacidade total permanente (ID 132488112 - Pág. 7).
É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015. Contudo, no caso em tela, não foram acostados aos autos elementos
com o condão de infirmar as conclusões do expert, razão pela qual há que se prestigiar a
conclusão da prova técnico-pericial.
Verifica-se que os demais requisitos para a concessão do benefício – qualidade de segurado e
período de carência - também restam cumpridos (conforme dados doCadastro Nacional de
Informações Sociais - CNIS) e não foram impugnados pelo INSS em suas razões recursais.
Por conseguinte, é devida a aposentadoria por invalidez.
Consectários legais
Aplica-se aos débitos previdenciários a súmula 148 do C.STJ:"Os débitos relativos a benefício
previdenciário, vencidos e cobrados em juízo após a vigência da Lei nº 6.899/81, devem ser
corrigidos monetariamente na forma prevista nesse diploma legal”. (Terceira Seção, j.
07/12/1995)
Da mesma forma, incide a súmula 8 deste E. Tribunal: “Em se tratando de matéria previdenciária,
incide a correção monetária a partir do vencimento de cada prestação do benefício, procedendo-
se à atualização em consonância com os índices legalmente estabelecidos, tendo em vista o
período compreendido entre o mês em que deveria ter sido pago, e o mês do referido
pagamento".
a) Juros de mora
A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015,
correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão
de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009
(art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança,
conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e
no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
b) Correção monetária
Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação
superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante os
precedentes do C. STF no julgamento do RE nº870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ no
julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
c) Honorários advocatícios
Mantenho os honorários advocatícios nos moldes fixados na r. sentença, eis que de acordo com a
moderada complexidade das questões e consenso deste Colegiado.
Por fim, no que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo que não houve qualquer
infringência a dispositivo constitucional ou legal.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR
AFASTADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE.
REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. DEVIDA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
1. Não resta configurada a coisa julgada ante a ausência da tríplice identidade entre esta ação e a
demanda anterior transitada em julgado.
2. Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
3. Na falta de elementos com o condão de infirmar as conclusões do expert, há que se prestigiar
a conclusão da prova técnico-pericial.
4. Uma vez constatada pela perícia médica a incapacidade laborativa do segurado, preenchidos
os demais requisitos legais, afigura-se devida a concessão do benefício.
5. Reconhecimento da procedência da pretensão.
6. A questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à
correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão
exarada pelo STF em sede de repercussão geral. No que diz respeito à correção monetária,
deverá ser observado o Manual de Cálculo da Justiça Federal, segundo os termos do julgamento
pelo C. STF da Repercussão Geral do RE 870.947 (Tema 810), e pelo C. STJ no Recurso
Especial Repetitivo n. 1.492.221 (Tema 905).
7. Quanto aos juros moratórios devem incidir a partir da citação, à razão de 0,5% (meio por cento)
ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/01/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um
por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à
remuneração da caderneta de poupança, na forma da Repercussão Geral no RE 870.947.
8. Mantidos os honorários advocatícios nos moldes fixados na r. sentença, eis que de acordo com
a moderada complexidade das questões e consenso deste Colegiado.
9. Preliminar rejeitada. Apelação autárquica desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação do INSS, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
