Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0000423-91.2016.4.03.6106
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
30/06/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CÔMPUTO DOS NOVOS SALÁRIOS-DE-
CONTRIBUIÇÃO RECONHECIDOS EM SENTENÇA TRABALHISTA DE MÉRITO.
POSSIBILIDADE. EFEITOS FINANCEIROS DA DER. SUCUMBÊNCIA.
- A sentença proferida no Código de Processo Civil (CPC) vigente cuja condenação ou proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimosnão se submete ao duplo grau de jurisdição.
- - Não há que se falar em falta de interesse de agir, uma vez que comprovado o indeferimento do
pedido administrativo de revisão.
- Demanda trabalhista em desfavor do ex-empregador, na qual se obteve, por decisão de mérito,
o reconhecimento do direito ao pagamento de verbas trabalhistas e consequentes reflexos, com
repercussão nos salários-de-contribuição.
- Na controvérsia sobre o cômputo de serviço, a sentença da Justiça do Trabalho configura prova
emprestada, que, nas vias ordinárias, deve ser submetida a contraditório e complementada por
outras provas. Isto é, conquanto a sentença oriunda de reclamatória não faça coisa julgada
perante o INSS, pode ser utilizada como um dos elementos de prova a permitir a formação do
convencimento acerca da efetiva prestação laborativa.
- Reclamatória resolvida por sentença de mérito reconhecendo a relação de emprego e reflexos
trabalhistas, os quais repercutirão diretamente no cálculo da renda mensal inicial - RMI. Ademais,
constatam-se os recolhimentos previdenciários correspondentes. Precedentes.
- Sem ofensa à regra do artigo 55, §3º, da Lei n. 8.213/1991, tampouco violação da regra inscrita
no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, diante do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei n.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
8.212/1991), haja vista caber ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias,
inclusive as devidas pelo segurado.
- O teto do benefício revisado deve obedecer ao disposto nos artigos 29, § 2º, e 33, da Lei
8.213/1991, quando da liquidação do julgado.
- Os efeitos financeiros são fixados da DER, consoante compreensão sedimentada do STJ.
- Reexame necessário não conhecido.
- Preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS desprovida.
- Apelação da parte autora provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0000423-91.2016.4.03.6106
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELIZABET APARECIDA
ADRIANA VIEIRA
Advogados do(a) APELANTE: ANDREA REGINA GALVAO PRESOTTO - SP242536-A,
CRISTINA GIUSTI IMPARATO - SP114279-A
APELADO: ELIZABET APARECIDA ADRIANA VIEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELADO: ANDREA REGINA GALVAO PRESOTTO - SP242536-A,
CRISTINA GIUSTI IMPARATO - SP114279-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0000423-91.2016.4.03.6106
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
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ADRIANA VIEIRA
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS, na qual a parte autora pleiteia incorporação dos novos salários-de-contribuição, conforme
remuneração apurada em reclamação trabalhista, com vistas à revisão da renda mensal inicial
(RMI) da aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para determinar ao INSS a revisão da RMI
da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a citação, considerados os novos valores
reconhecidos pela Justiça do Trabalho nos autos da reclamação trabalhista n. 0204700-
25.1989.5.020039. Fixados os consectários. Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual requer que a revisão do
benefício de aposentadoria seja calculada sobre os valores do salário indicado na ação
trabalhista e impugna o termo inicial dos efeitos financeiros da revisão.
Não resignada, a autarquia também interpôs recurso de apelação, no qual sustenta,
preliminarmente, a ausência de interesse processual e, no mérito, impugna o reconhecimento
dos salários-de-contribuição com base em reclamatória trabalhista.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0000423-91.2016.4.03.6106
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELIZABET APARECIDA
ADRIANA VIEIRA
Advogados do(a) APELANTE: ANDREA REGINA GALVAO PRESOTTO - SP242536-A,
CRISTINA GIUSTI IMPARATO - SP114279-A
APELADO: ELIZABET APARECIDA ADRIANA VIEIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELADO: ANDREA REGINA GALVAO PRESOTTO - SP242536-A,
CRISTINA GIUSTI IMPARATO - SP114279-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
A remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual
Código de Processo Civil (CPC), cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários
mínimos.
No caso, à evidência, esse montante não é alcançado, devendo a certeza matemática
prevalecer sobre o teor da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Não há que se falar em falta de interesse de agir da parte autora.
O Supremo Tribunal Federal (STF), concluindo o julgamento o RE n. 631.240, em 3/9/2014
(ementa publicada em 10/11/2014), sob o regime de repercussão geral, decidiu não haver
necessidade de formulação de pedido administrativo prévio para que o segurado ingresse
judicialmente com pedidos de revisão de benefício, a não ser nos casos em que seja necessária
a apreciação de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração, o que
não se verifica na hipótese em tela.
Com efeito, o caso dos autos refere-se à ressalva da possibilidade de formulação direta do
pedido perante o Poder Judiciário, uma vez que se trata controvérsia já resolvida na Justiça do
Trabalho na Reclamação Trabalhista (RT: 0204700-25.1989.5.02.0039), que reconheceu o
direito da parte autora e de outros às parcelas de natureza salarial, com sentença proferida em
15/11/1992, inclusive, com recolhimento das contribuições previdenciárias. Nesse sentido:
Apelação Cível: ApCiv 5001130-97.2017.4.03.6183. Relatora: Desembargador Federal Maria
Lucia Lencastre Ursaia, TRF3 - 10ª Turma, e - DJF3 Judicial 1, data: 21/12/2020.
Ademais, restou comprovado o pedido administrativo de revisão pela parte autora, o qual foi
indeferido pela autarquia previdenciária (Id. 138017107 - Pág. 75/79).
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Das verbas reconhecidas em sentença trabalhista
O cálculo da renda mensal inicial - RMI do benefício tem como fundamentos normas
constitucionais e legais.
O artigo 29, §3º, da Lei n. 8.213/1991, determina que serão "considerados para cálculo do
salário-de-benefício os ganhos habituais do segurado empregado, a qualquer título, sob forma
de moeda corrente ou de utilidades, sobre os quais tenha incidido contribuições previdenciárias,
exceto o décimo-terceiro salário (gratificação natalina)". (Redação dada pela Lei n. 8.870/1994)
Por força do art. 202 da Constituição Federal de 1988, na redação original, e do art. 29 da Lei n.
8.213/1991, também na redação primitiva, os últimos 36 maiores salários contributivos, dentro
dos últimos 48, deviam ser contabilizados para fins do cálculo da renda mensal do benefício de
aposentadoria.
Posteriormente, com o advento do artigo 3º da Lei n. 9.876, de 26/11/1999, para o segurado
filiado à Previdência Social até o dia anterior à data de publicação desta Lei, que viesse a
cumprir as condições exigidas para a concessão dos benefícios do Regime Geral de
Previdência Social, no cálculo do salário-de-benefício seria considerada a média aritmética
simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento
de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994, observado o
disposto nos incisos I e II do caput do art. 29 da Lei n. 8.213, de 1991, com a redação dada por
esta Lei, observado o fator previdenciário.
Na hipótese, a parte autora ajuizou demanda trabalhista em desfavor do ex-empregador
SERVIÇO FEDERAL DE PROCESSAMENTO DE DADOS (SERPRO), na qual obteve, por
decisão de mérito, o reconhecimento do direito ao pagamento de verbas trabalhistas e
consequentes reflexos, com repercussão nos salários-de-contribuição.
Observo que o INSS não figurou na lide obreira, incidindo, na espécie, o disposto no artigo 506,
do Código de Processo Civil, de modo que a coisa julgada material não atinge a autarquia
previdenciária.
Com efeito, a sentença faz coisa julgada entre as partes, não prejudicando, nem beneficiando
terceiros, só podendo ser imposta ao INSS quando houver início de prova material, sob pena de
manifesta ofensa à legislação processual e previdenciária.
Na controvérsia sobre o cômputo de serviço, a sentença da Justiça do Trabalho configura prova
emprestada, que, nas vias ordinárias, deve ser submetida a contraditório e complementada por
outras provas. Isto é, conquanto a sentença oriunda de reclamatória não faça coisa julgada
perante o INSS, pode ser utilizada como um dos elementos de prova a permitir a formação do
convencimento acerca da efetiva prestação laborativa.
Neste caso, contudo, a reclamatória trabalhista n. 0204700-25.1989.5.020039, aforada na 39ª
Vara do Trabalho da Capital, foi resolvida por sentença de mérito, reconhecendo não a relação
de emprego em si, mas a incorporação de valores oriundos de desvio de função desempenhada
pela reclamante, os quais repercutirão diretamente no cálculo da RMI da segurada.
Constato, ademais, os recolhimentos previdenciários correspondentes.
No mais, não se identificou a presença de qualquer indício de fraude ou conluio na reclamação
trabalhista. Eventuais pormenores da lide trabalhista não mais interessam aqui, por força da
coisa julgada.
Assim, não há ofensa à regra do artigo 55, §3º, da Lei n. 8.213/1991, tampouco violação da
regra inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, diante do princípio da automaticidade (artigo
30, I, da Lei n. 8.212/1991), haja vista caber ao empregador o recolhimento das contribuições
previdenciárias, inclusive as devidas pelo segurado. Nesse sentido: "(...) E no que concerne ao
pagamento das respectivas contribuições, relativamente ao interregno do labor reconhecido, é
de se ressaltar que compete ao empregador a arrecadação e o recolhimento do produto aos
cofres públicos, a teor do artigo 30, inciso I, "a" e "b" da Lei 8.212/91 e ao Instituto Nacional da
Seguridade Social a arrecadação, fiscalização, lançamento e recolhimento de contribuições,
consoante dispõe o artigo 33 do aludido diploma legal, não podendo ser penalizado o
empregado pela ausência de registro em CTPS, quando deveria ter sido feito em época
oportuna, e muito menos pela ausência das contribuições respectivas, quando não deu causa.
3. E, no caso dos autos, houve a determinação de recolhimento das contribuições
previdenciárias devidas, conforme observado dos termos da cópia da reclamação trabalhista
apresentada pela parte autora, com a exordial". (TRF3, Ap 00204944120174039999, AC
2250162, Rel. DES. FED. TORU YAMAMOTO, 7T, Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA: 25/9/2017,
FONTE_REPUBL.).
Desnecessária, por isso, a produção de outras provas. Com efeito, reputo suficiente a prova
produzida à comprovação das contingências da relação de emprego da parte autora e,ipso
facto, para fins de revisão do período básico de cálculo utilizado na composição da RMI (DIB –
27/06/1994).
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REVISÃO DE BENEFÍCIO. REDUÇÃO INICIAL
NO VALOR DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO
LEGAL. INCLUSÃO DE PARCELAS SALARIAIS RECONHECIDAS EM RECLAMAÇÃO COM
RETIFICAÇÃO DA CTPS. POSSIBILIDADE: PROVA PLENA DE VERACIDADE (ENUNCIADO
12/TST). APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDAS.
(...)
A exigência de início de prova documental somente se aplica para o reconhecimento de tempo
de serviço, não se podendo aplicar, por analogia, a mesma regra na hipótese de
reconhecimento de direitos trabalhista s em ação judicial, uma vez que norma de restrição de
direitos não admite interpretação extensiva.
(...)
- Apelação e remessa oficial a que se nega provimento."
(TRF1, AMS 2001.38.00.003288-1, Rel. Des. Fed. Antônio Sávio de Oliveira Chaves, 1ªT,
julgamento em 25/7/2005, votação unânime, publicado no DJ de 26/9/2005, p. 54)
"PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE RMI DE BENEFÍCIO. ACRÉSCIMO DO SALÁRIO-DE-
CONTRIBUIÇÃO, EM RAZÃO DE SENTENÇA PROFERIDA EM RECLAMAÇÃO
TRABALHISTA. POSSIBILIDADE. CONTRIBUIÇÕES. FISCALIZAÇÃO A CARGO DO INSS.
- A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende ser a sentença transitada em julgado
na Justiça do Trabalho prova material em lides da previdência. Neste sentido estão os inúmeros
julgados que reconhecem o tempo de serviço comprovado através de sentença judicial
proferida em Juízo trabalhista, para fins de concessão do benefício previdenciário.
- O autor teve seu pedido de equiparação salarial acolhido em lide trabalhista, fato este que
resultou na majoração dos valores dos seus proventos salariais ao longo de sua vida laborativa.
Sendo assim, tais valores, revistos em reclamação trabalhista, devem ser utilizados no cálculo
da renda mensal inicial.
- Ao INSS cabe exercer a fiscalização sobre os empregadores no sentido de cobrar-lhes as
contribuições devidas, não podendo o autor ser apenado pela inércia da autarquia
previdenciária.
- Agravo interno improvido."
(TRF2, AGTAC 379073, Proc. 2003.51.02.002633-9, Rel. Des. Fed. Aluísio Gonçalves de
Castro Mendes, 1ªT Espec, julgamento em 27/11/2007, votação unânime, DJ de 22/1/2008, p.
411)
Acerca do cálculo do salário-de-benefício, o art. 29, §§ 3º e 4º, da Lei n. 8.213/1991, dispõe:
"Art. 29. O salário-de-benefício consiste (redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 3º Serão considerados para o cálculo do salário-de-benefício os ganhos habituais do
segurado empregado, a qualquer título, sob forma de moeda corrente ou de utilidades, sobre os
quais tenha incidido contribuição previdenciária. (redação original)
§ 3º Serão considerados para cálculo do salário-de-benefício os ganhos habituais do segurado
empregado, a qualquer título, sob forma de moeda corrente ou de utilidades, sobre os quais
tenha incidido contribuições previdenciárias, exceto o décimo-terceiro salário (gratificação
natalina). (Redação dada pela Lei nº 8.870, de 1994)
§ 4º Não será considerado, para o cálculo do salário-de-benefício, o aumento dos salários-de-
contribuição que exceder o limite legal, inclusive o voluntariamente concedido nos 36 (trinta e
seis) meses imediatamente anteriores ao início do benefício, salvo se homologado pela Justiça
do Trabalho, resultante de promoção regulada por normas gerais da empresa, admitida pela
legislação do trabalho, de sentença normativa ou de reajustamento salarial obtido pela
categoria respectiva".
O teto do benefício revisando deve obedecer ao disposto nos artigos 29, § 2º, e 33, do próprio
Plano de Benefícios, quando da liquidação do julgado.
Do termo inicial
Sobre o termo inicial do benefício, algumas considerações devem ser feitas.
De plano, como a comprovação da atividade debatida ocorreu apenas nestes autos, por meio
de prova não submetida à prévia apreciação administrativa, penso ser adequada a fixação do
termo inicial dos efeitos financeiros na data da citação, momento em que a autarquia teve
ciência da pretensão, em sua plenitude, e a ela pôde resistir.
Quanto a esse aspecto, destaca-se o fato de o Poder Judiciário exercer suas atribuições em
substituição à Administração que deve praticar os atos que lhe são inerentes como atividade
primária.
Vale dizer: preponderantemente, apenas os atos que a Administração deveria, por lei, praticar
podem ser passíveis de controle judicial, sob o enfoque de possível lesão ou ameaça a direito.
Nessa esteira, a concessão de benefício fundada em prova produzida exclusivamente na esfera
judicial, por impedir a Administração de exercer o pleno exercício das atribuições que lhe são
inerentes, afasta a configuração de mora da autarquia e a possibilidade de fixação do termo
inicial na data do requerimento administrativo.
Afinal, a insuficiência ou inaptidão de elementos probatórios do direito invocado configura
situação que, de forma indireta, inviabiliza o exercício de atividade própria da Administração.
A propósito, esses mesmos fundamentos foram evocados pelo Ministro Roberto Barroso ao
apreciar, sob o regime da repercussão geral, o RE n. 631.240 e fixar tese sobre a necessidade
de prévio requerimento administrativo nas ações de conhecimentos de cunho previdenciário.
Confira-se o seguinte trecho do voto:
“17. Esta é a interpretação mais adequada ao princípio da separação de Poderes. Permitir que
o Judiciário conheça originariamente de pedidos cujo acolhimento, por lei, depende de
requerimento à Administração significa transformar o juiz em administrador, ou a Justiça em
guichê de atendimento do INSS, expressão que já se tornou corrente na matéria. O Judiciário
não tem, e nem deve ter, a estrutura necessária para atender às pretensões que, de ordinário,
devem ser primeiramente formuladas junto à Administração. O juiz deve estar pronto, isto sim,
para responder a alegações de lesão ou ameaça a direito. Mas, se o reconhecimento do direito
depende de requerimento, não há lesão ou ameaça possível antes da formulação do pedido
administrativo. Assim, não há necessidade de acionar o Judiciário antes desta medida....”
Não obstante o entendimento acima consignado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em
incidente de uniformização de jurisprudência, previsto no artigo 14, § 4º, da Lei n. 10.259/2001,
ao tratar especificamente da matéria, deliberou pela prevalência da seguinte orientação (g. n.):
“A comprovação extemporânea da situação jurídica consolidada em momento anterior não tem
o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do direito ao
benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando preenchidos os
requisitos para a concessão da aposentadoria”. (Pet 9.582/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 16/09/2015)
No mesmo sentido são os recentes julgados da Corte Superior: REsp 1.859.330/CE, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 31/8/2020;
AgInt no REsp 1.609.332/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado
em 19/03/2019, DJe 26/3/2019.
Dessa forma, curvo-me ao entendimento do STJ para fixar o termo inicial da revisão do
benefício na data do requerimento administrativo (DER), observada a prescrição quinquenal
(Súmula 85, do STJ).
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Os consectários não foram objeto de questionamento nas razões recursais, de modo que se
mantêm à luz do julgado a quo.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, rejeito a matéria preliminar suscitada pelo
INSS e, no mérito, negoprovimento à sua apelação e douprovimento à apelação da parte autora
para, nos termos da fundamentação: (i) estabelecer a revisão da aposentadoria por tempo de
contribuição, mediante o cômputo dos novos salários-de-contribuição obtidos em processo
trabalhista, observado o teto previdenciário, à luz dos artigos 29, § 2º, e 33, da Lei n.
8.213/1991; e (ii) fixar o termo inicial da revisão do benefício na data do requerimento
administrativo (DER), observada a prescrição quinquenal (Súmula 85, do STJ). Mantidos, no
mais, os demais termos da decisão recorrida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CÔMPUTO DOS NOVOS SALÁRIOS-DE-
CONTRIBUIÇÃO RECONHECIDOS EM SENTENÇA TRABALHISTA DE MÉRITO.
POSSIBILIDADE. EFEITOS FINANCEIROS DA DER. SUCUMBÊNCIA.
- A sentença proferida no Código de Processo Civil (CPC) vigente cuja condenação ou proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimosnão se submete ao duplo grau de
jurisdição.
- - Não há que se falar em falta de interesse de agir, uma vez que comprovado o indeferimento
do pedido administrativo de revisão.
- Demanda trabalhista em desfavor do ex-empregador, na qual se obteve, por decisão de
mérito, o reconhecimento do direito ao pagamento de verbas trabalhistas e consequentes
reflexos, com repercussão nos salários-de-contribuição.
- Na controvérsia sobre o cômputo de serviço, a sentença da Justiça do Trabalho configura
prova emprestada, que, nas vias ordinárias, deve ser submetida a contraditório e
complementada por outras provas. Isto é, conquanto a sentença oriunda de reclamatória não
faça coisa julgada perante o INSS, pode ser utilizada como um dos elementos de prova a
permitir a formação do convencimento acerca da efetiva prestação laborativa.
- Reclamatória resolvida por sentença de mérito reconhecendo a relação de emprego e reflexos
trabalhistas, os quais repercutirão diretamente no cálculo da renda mensal inicial - RMI.
Ademais, constatam-se os recolhimentos previdenciários correspondentes. Precedentes.
- Sem ofensa à regra do artigo 55, §3º, da Lei n. 8.213/1991, tampouco violação da regra
inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, diante do princípio da automaticidade (artigo 30, I,
da Lei n. 8.212/1991), haja vista caber ao empregador o recolhimento das contribuições
previdenciárias, inclusive as devidas pelo segurado.
- O teto do benefício revisado deve obedecer ao disposto nos artigos 29, § 2º, e 33, da Lei
8.213/1991, quando da liquidação do julgado.
- Os efeitos financeiros são fixados da DER, consoante compreensão sedimentada do STJ.
- Reexame necessário não conhecido.
- Preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS desprovida.
- Apelação da parte autora provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial, rejeitar a matéria preliminar suscitada
pelo INSS e, no mérito, negar provimento à sua apelação e dar provimento à apelação da parte
autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
