
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5170619-91.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MANTOVANI BERNARDES
Advogado do(a) APELADO: SIMONE APARECIDA GOUVEIA - SP122469-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5170619-91.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MANTOVANI BERNARDES
Advogado do(a) APELADO: SIMONE APARECIDA GOUVEIA - SP122469-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na qual a parte autora pleiteia o enquadramento de atividade especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou procedente o pedido para: (i) reconhecer como especiais as atividades desempenhadas pelo autor nos períodos de 21/5/1991 a 30/11/1991, de 5/5/1993 a 20/11/1993, de 21/2/1994 a 17/12/1994, de 1º/2/1995 a 31/1/2002, de 1º/2/2002 a 27/2/2015 e de 28/7/2015 a 13/8/2019; (ii) determinar a concessão do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo (DER 13/8/2019), fixados os consectários legais.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual aduz, de forma preliminar, a nulidade da perícia judicial, a competência da Justiça do Trabalho para retificar as informações constantes dos formulários de atividades especiais e dos estudos ambientais e a necessidade da remessa oficial. No mérito, alega, em síntese, a impossibilidade dos enquadramentos efetuados e da concessão de benefício previdenciário. Requer a reforma da decisão a quo, com a improcedência dos pedidos. Subsidiariamente, insurge-se contra o termo inicial do benefício, aduz a ocorrência da prescrição quinquenal e impugna a forma de incidência dos consectários. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5170619-91.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MANTOVANI BERNARDES
Advogado do(a) APELADO: SIMONE APARECIDA GOUVEIA - SP122469-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
A remessa oficial não deve ser conhecida, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
No caso, à evidência, esse montante não é alcançado, devendo a certeza matemática prevalecer sobre o teor da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Outrossim, não há que se falar em incompetência da Justiça Federal, uma vez que o pedido formulado pela parte autora consiste no reconhecimento da especialidade de períodos não enquadrados administrativamente, para fins de revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, e não de retificação de informações contidas em formulário (Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP).
Nesse sentido (g.n.):
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE INSALUBRE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. INTERESSE DE AGIR. RUÍDO. CALOR. APOSENTADORIA ESPECIAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. - O caso em debate não discute a relação entre o segurado e o empregador, visando a desconstituir Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), o que seria da competência da Justiça do Trabalho, mas sim, da apreciação da nocividade da atividade exercida para configuração de direito previdenciário. (...). - Matéria preliminar rejeitada. No mérito, apelação improvida.” (Apelação Cível, ApCiv 5004968-57.2018.4.03.6104, Relator: Desembargador Federal Gilberto Rodrigues Jordan, TRF3 - 9ª Turma, DJEN Data: 24/06/2021).
Desse modo, rejeito essas matérias preliminares.
A preliminar de nulidade da perícia técnica confunde-se com o mérito e com ele será analisada.
Feitas essas considerações, passo à análise das questões de mérito trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em 28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 6/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n. 9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do tempo.
Neste caso, em relação aos intervalos de 21/5/1991 a 30/11/1991, de 5/5/1993 a 20/11/1993, de 21/2/1994 a 17/12/1994, de 1º/2/1995 a 28/4/1995, consta Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), o qual indica o exercício das funções de plantio, carpa e colheita de cana-de-açúcar), atividades que comportam o enquadramento perseguido, nos termos do entendimento firmando nesta Nona Turma, em razão da penosidade e exposição a hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, consoante artigo da Revista Brasileira de Medicina do Trabalho (De Abreu, Dirce et al. A produção da cana-de-açúcar no Brasil e a saúde do trabalhador rural. Revista Brasileira de Medicina do Trabalho, v. 9, n. 2, p. 49-61, 2011. Disponível em: <http://hdl.handle.net/11449/72967>.).
Especificamente a todos os períodos enquadrados como especiais de, 21/5/1991 a 30/11/1991, de 5/5/1993 a 20/11/1993, de 21/2/1994 a 17/12/1994, de 1º/2/1995 a 31/1/2002, de 1º/2/2002 a 27/2/2015 e de 28/7/2015 a 13/8/2019, há PPP e laudo técnico, os quais indicam a exposição habitual e permanente ao agente nocivo “ruído” em níveis superiores aos limites previstos nas normas em comento, bem como a agentes químicos deletérios (agrotóxicos), o que possibilita o reconhecimento da atividade insalutífera em conformidade com os códigos 1.1.6 e 1.2.6 do anexo do Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5, 1.2.1, 1.2.6 e 1.2.10 do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 1.0.1 e 1.0.12 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Nesse sentido: TRF3, APELREEX 00019264020134036111, Desembargador Federal Sergio Nascimento – 10ª Turma, e-DJF3: 5/8/2015; APELREEX 00035154020124036002, Desembargadora Federal Tania Marangoni – 8ª Turma, e-DJF3: 29/4/2015.
Cumpre acrescentar que as informações do perito merecem total credibilidade, ou seja, gozam de fé pública (presunção de veracidade), vale dizer, são aceitas como verdadeiras até que se prove o contrário, o que não ocorreu na hipótese.
Assim, deve ser reconhecida como correta a perícia, por ser o perito imparcial e equidistante dos interesses das partes litigantes e merecer, sua análise técnica dos ambientes de trabalho do segurado, fé de ofício.
Ressalta-se: eventual utilização de metodologia diversa não desnatura a especialidade do período, uma vez constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e comprovado por meio de PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte (Ap – Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia – 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 3652270007103-66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 19/7/2017).
Ademais, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, em especial os hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativo (TRF-4 - APELREEX: 50611258620114047100 RS 5061125-86.2011.404.7100, Relator: (Auxílio Vânia) PAULO PAIM DA SILVA, Data de Julgamento: 09/07/2014, SEXTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 10/07/2014); (TRF-1- AC: 00435736820104013300 0043573-68.2010.4.01.3300, Relator: JUIZ FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Data de Julgamento: 14/12/2015, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, Data de Publicação: 22/01/2016 e-DJF1 P. 281).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Cabe acrescentar que o reconhecimento da especialidade em relação a somente um agente nocivo já é suficiente para a sua caracterização.
No mais, questões afetas ao recolhimento de contribuições previdenciárias ou divergências na GFIP não devem, em tese, influir no cômputo da atividade especial exercida pelo segurado, à vista do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei n. 8.212/1991), aplicável neste enfoque.
Com efeito, inexiste violação da regra inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, haja vista caber ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias, inclusive as devidas pelo segurado. Nesse sentido: TRF3, Ap 00204944120174039999, AC 2250162, Rel. DES. FED. TORU YAMAMOTO, 7ª Turma, Fonte e-DJF3 Judicial 1, DATA: 25/9/2017.
Em síntese, deve ser reconhecido o caráter especial das atividades executadas nos interregnos supracitados, a serem devidamente averbados pela autarquia.
Nessas circunstâncias, considerando os períodos especiais reconhecidos judicialmente, a parte autora conta mais de 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial até a data do requerimento administrativo (DER 13/8/2019) e, desse modo, faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Quanto ao termo inicial dos efeitos financeiros da condenação, a questão foi submetida ao rito dos recursos repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) para resolução da seguinte controvérsia, cadastrada como Tema Repetitivo n. 1.124 (Recursos Especiais n. 1.905.830/SP, 1.912.784/SP e 1.913.152/SP – data da afetação: 17/12/2021):
“Definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS: se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária.”
Há determinação de suspensão do trâmite de todos os processos em grau recursal (art. 1.037, II, do CPC).
Não obstante, esta Nona Turma tem entendido não haver óbice ao prosseguimento da marcha processual, por ser possível a identificação da parte incontroversa e da parte controvertida da questão afetada, sendo o alcance dos efeitos financeiros uma das consequências da apreciação de mérito, passível de ser tratada na fase de cumprimento do julgado.
Esse entendimento favorece a execução e a expedição de ofício requisitório ou precatório da parte incontroversa do julgado, nos termos do artigo 535, § 4º, do CPC e do Tema n. 28 da Repercussão Geral (RE n. 1.205.530).
Assim, fixo o termo inicial dos efeitos financeiros da condenação (parte incontroversa da questão afetada) na data da citação, observado, na fase de cumprimento de sentença, o que vier a ser estabelecido pelo STJ no julgamento do Tema Repetitivo n. 1.124 do STJ.
Todavia, na hipótese de recebimento de aposentadoria especial, deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de cessação do benefício, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
No mais, afasto a alegação do instituto-réu de observância da prescrição quinquenal porque entre a formulação administrativa e o ajuizamento da ação não decorreu lapso superior a cinco anos.
Sobre atualização do débito e compensação da mora, até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, há de ser adotado o seguinte:
(i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal;
(ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
Contudo, desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
No tocante aos honorários advocatícios, diante da impossibilidade de ser estabelecida a extensão da sucumbência nesta fase processual, em razão do quanto deliberado nestes autos sobre o termo inicial dos efeitos financeiros da condenação à luz do que vier a ser definido no Tema Repetitivo n. 1.124 do STJ, remeto à fase de cumprimento do julgado a fixação dessa verba, a qual deverá observar, em qualquer hipótese, o disposto na Súmula n. 111 do STJ.
Com relação às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, rejeito as matérias preliminares e dou parcial provimento à apelação do INSS para, nos termos da fundamentação: (i) fixar os efeitos financeiros da condenação desde a data da citação (parte incontroversa da questão afetada), observado, na fase de cumprimento de sentença, o que vier a ser estabelecido pelo STJ no julgamento do Tema Repetitivo n. 1.124 do STJ; (ii) estabelecer critérios de incidência dos consectários legais.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. TRABALHO RURAL. CULTIVO E CORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. ENQUADRAMENTO. REQUISITO TEMPORAL PREENCHIDO À APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- Não há que se falar em incompetência da Justiça Federal, uma vez que o pedido formulado pela parte autora consiste no reconhecimento da especialidade de períodos não enquadrados administrativamente, para fins de revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, e não de retificação de informações contidas em formulário (Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP). Precedente.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC).
- Demonstrada a especialidade em razão do exercício de atividades rurais ligadas ao cultivo e corte de corte de cana-de-açúcar, da exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância previstos nas normas regulamentares e a agentes químicos deletérios (agrotóxicos), situações que autorizam o enquadramento requerido.
- Não há que se falar em inviabilidade do reconhecimento da especialidade com fundamento na utilização de metodologia diversa da determinada pela legislação. Precedentes.
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, em especial os hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- A parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria especial, nos termos dos artigos 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Termo inicial dos efeitos financeiros da condenação (parte incontroversa da questão afetada) na data da citação, observado, na fase de cumprimento de sentença, o que vier a ser estabelecido pelo STJ no julgamento do Tema Repetitivo n. 1.124 do STJ.
- Deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de cessação do benefício, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
- Afastada a alegação do instituto-réu de observância da prescrição quinquenal porque entre a formulação administrativa e o ajuizamento da ação não decorreu lapso superior a cinco anos.
- Sobre atualização do débito e compensação da mora, até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, há de ser adotado o seguinte: (i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal; (ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na fase de cumprimento do julgado (consoante a Súmula n. 111 do STJ), diante da impossibilidade de ser estabelecida a extensão da sucumbência nesta fase processual, em razão do quanto deliberado nestes autos sobre o termo inicial dos efeitos financeiros da condenação à luz do que vier a ser definido no Tema Repetitivo n. 1.124 do STJ.
- A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo. Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
- Remessa oficial não conhecida.
- Matérias preliminares rejeitadas.
- Apelação autárquica parcialmente provida.
