
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002986-62.2020.4.03.6128
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: JOSE ANTONIO BRISQUI FIORANTI
Advogados do(a) APELANTE: ISRAEL FERMIANO NICOLAU - SP436072, MARCELO ORRU - SP201723-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002986-62.2020.4.03.6128
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: JOSE ANTONIO BRISQUI FIORANTI
Advogados do(a) APELANTE: ISRAEL FERMIANO NICOLAU - SP436072, MARCELO ORRU - SP201723-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta pelo autor em face de sentença (proferida em 16/10/2020) que julgou improcedente o pedido voltado ao reconhecimento de tempo de atividade especial e de concessão de aposentadoria especial ou, quando menos, de aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condenou-se o requerente ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, observada a gratuidade de justiça deferida.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002986-62.2020.4.03.6128
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: JOSE ANTONIO BRISQUI FIORANTI
Advogados do(a) APELANTE: ISRAEL FERMIANO NICOLAU - SP436072, MARCELO ORRU - SP201723-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade, daí por que dele se conhece.
Persegue-se o reconhecimento de tempo de serviço especial e a consequente concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de contribuição.
Os pedidos foram julgados improcedentes em primeiro grau, com o que não se conforma o demandante, que desfia as razões de recurso que a seguir serão examinadas.
De saída, aprecio a questão preliminar levantada no apelo do autor.
Do cerceamento de defesa
Cabe ao juiz, destinatário da prova, decidir sobre os elementos necessários à formação de seu convencimento (art. 370 do CPC). Testemunha não supre informação técnica, achados e medições sobre exposição a agentes nocivos, grau ou intensidade, frequência, período de exposição intrajornada e forma de manuseio dos produtos tidos por lesivos à saúde do obreiro; prova testemunhal, assim, não contribui para iluminar tempo especial. Este, de regra, prova-se por documento, nas linhas do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. Para demonstrar atividade especial, prova pericial é subsidiária. Somente se oferece no caso de o segurado demonstrar a impossibilidade de obtenção do documento pertinente, recusa da empresa ao seu fornecimento ou ainda apresentar elementos indicativos, de natureza técnica, de que o documento apropriado não informou corretamente os agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho. O ônus dessa prova incumbe ao autor, aqui apelante (art. 373, I, do CPC), que dele não se desincumbiu. Não ocorreu o cerceamento alegado no recurso.
Isso considerado, analisam-se as questões de mérito trazidas a julgamento.
Da aposentadoria especial
Aposentadoria especial é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, com redução do tempo necessário à inativação, concedida em razão do exercício de atividades que afetam o patrimônio corporal do trabalhador. Presta-se a não deixar sem distingo, no enfoque previdenciário, o trabalhador sujeito a condições de trabalho inadequadas (cf. “Manual de Direito Previdenciário”, Castro e Lazzari, 8ª ed., Florianópolis, Conceito Editorial, 2007, p. 499).
É benefício devido ao segurado que tiver trabalhado submetido a condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou sua integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos, dês que atendidas as exigências contidas na legislação de regência.
Para o segurado filiado à Previdência Social até 12/11/2019, a EC nº 103/2019, artigo 21,estabelece regra de transição, nos seguintes termos:
“Art. 21. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional cujas atividades tenham sido exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, desde que cumpridos, no caso do servidor, o tempo mínimo de 20 (vinte) anos de efetivo exercício no serviço público e de 5(cinco) anos no cargo efetivo em que for concedida a aposentadoria, na forma dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, poderão aposentar-se quando o total da soma resultante da sua idade e do tempo de contribuição e o tempo de efetiva exposição forem, respectivamente, de:
I - 66 (sessenta e seis) pontos e 15 (quinze) anos de efetiva exposição;
II - 76 (setenta e seis) pontos e 20 (vinte) anos de efetiva exposição; e
III -86 (oitenta e seis) pontos e 25 (vinte e cinco) anos de efetiva exposição.
§ 1º A idade e o tempo de contribuição serão apurados em dias para o cálculo do somatório de pontos a que se refere o caput.
§ 2º O valor da aposentadoria de que trata este artigo será apurado na forma da lei.
§ 3º Aplicam-se às aposentadorias dos servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, na forma do §4º-C do art. 40 da Constituição Federal, as normas constitucionais e infraconstitucionais anteriores à data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, enquanto não promovidas alterações na legislação interna relacionada ao respectivo regime próprio de previdência social.”
Se tempo não houver para a aposentadoria especial, é possível transformar tempo especial em comum para que o segurado consiga jubilar-se por tempo de contribuição (art. 70 do Decreto nº 3.048/99).
Da aposentadoria por tempo de contribuição
No período anterior à Emenda Constitucional n. 20/98, para a obtenção de aposentadoria integral, exigia-se tempo mínimo de sujeição ao regime geral de previdência (35 anos para o homem e 30 anos para a mulher), levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem imposição de idade ou pedágio, nos termos do artigo 201, parágrafo 7o., I, da CF.
A seu turno, a modificação constitucional referida deixou manifesta, em seu artigo 3o., a possibilidade de deferir-se aposentadoria proporcional aos que tivessem cumprido os requisitos para essa modalidade de benefício até 16/12/1998. Para isso, impunha-se apenas o requisito temporal, ou seja, 30 anos de trabalho no caso do homem e 25 anos em se tratando de mulher, requisitos a adimplir até a data da publicação da referida emenda, independentemente de qualquer outra exigência.
É dizer, no regime anterior à transformação constitucional mencionada a aposentadoria por tempo de contribuição oferecia-se à/ao segurada/segurado que tivesse trabalhado por 25/30 anos (proporcional) ou 30/35 anos (integral), desde que cumprida a carência de 180 (cento e oitenta) contribuições (arts. 25, II, 52 e 53 da Lei n. 8.213/91 e 201, par. 7o., da CF), observada a regra de transição prevista no artigo 142 da Lei n. 8.213/91, para os filiados à Previdência Social até 25/07/1991.
A seguir, a Emenda Constitucional nº 20, publicada em 16 de dezembro de 1998, estabeleceu diretriz aplicável aos filiados à Previdência Social antes de sua publicação, mas que somente implementariam os requisitos legais para concessão do benefício após aquela data. A regra de transição contemplava dois novos requisitos: (i) idade mínima de 53 anos (homens) e de 48 anos (mulheres) e (ii) adicional de 20% (vinte por cento) do tempo de contribuição faltante quando da publicação da sobredita emenda, no caso de aposentadoria integral, e de 40% (quarenta por cento), em hipótese de aposentadoria proporcional.
Já a Emenda Constitucional nº 103/2019, no que respeita ao benefício que se tem em apreço, lança regras de transição, a abranger diferentes situações, nos seguintes termos:
“Art. 15. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, fica assegurado o direito à aposentadoria quando forem preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, equivalente a 86 (oitenta e seis) pontos, se mulher, e 96 (noventa e seis) pontos, se homem, observado o disposto nos §§ 1º e 2º.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a pontuação a que se refere o inciso II do caput será acrescida a cada ano de 1 (um) ponto, até atingir o limite de 100 (cem) pontos, se mulher, e de 105 (cento e cinco) pontos, se homem.
§ 2º A idade e o tempo de contribuição serão apurados em dias para o cálculo do somatório de pontos a que se referem o inciso II do caput e o § 1º.
§ 3º Para o professor que comprovar exclusivamente 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, se mulher, e 30 (trinta) anos de contribuição, se homem, em efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o somatório da idade e do tempo de contribuição, incluídas as frações, será equivalente a 81 (oitenta e um) pontos, se mulher, e 91 (noventa e um) pontos, se homem, aos quais serão acrescidos, a partir de 1º de janeiro de 2020, 1 (um) ponto a cada ano para o homem e para a mulher, até atingir o limite de 92 (noventa e dois) pontos, se mulher, e 100 (cem) pontos, se homem.
§ 4º O valor da aposentadoria concedida nos termos do disposto neste artigo será apurado na forma da lei.”
“Art. 16. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - idade de 56 (cinquenta e seis) anos, se mulher, e 61 (sessenta e um) anos, se homem.
§ 1º A partir de 1º de janeiro de 2020, a idade a que se refere o inciso II do caput será acrescida de 6 (seis) meses a cada ano, até atingir 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem.
§ 2º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio, o tempo de contribuição e a idade de que tratam os incisos I e II do caput deste artigo serão reduzidos em 5 (cinco) anos, sendo, a partir de 1º de janeiro de 2020, acrescidos 6 (seis) meses, a cada ano, às idades previstas no inciso II do caput, até atingirem 57 (cinquenta e sete) anos, se mulher, e 60 (sessenta) anos, se homem.
§ 3º O valor da aposentadoria concedida nos termos do disposto neste artigo será apurado na forma da lei.”
“Art. 17. Ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional e que na referida data contar com mais de 28 (vinte e oito) anos de contribuição, se mulher, e 33 (trinta e três) anos de contribuição, se homem, fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - cumprimento de período adicional correspondente a 50% (cinquenta por cento) do tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem.
Parágrafo único. O benefício concedido nos termos deste artigo terá seu valor apurado de acordo com a média aritmética simples dos salários de contribuição e das remunerações calculada na forma da lei, multiplicada pelo fator previdenciário, calculado na forma do disposto nos §§ 7º a 9º do art. 29 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.”
“Art. 20. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se voluntariamente quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 57 (cinquenta e sete) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem;
II - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem;
III - para os servidores públicos, 20 (vinte) anos de efetivo exercício no serviço público e 5 (cinco) anos no cargo efetivo em que se der a aposentadoria;
IV - período adicional de contribuição correspondente ao tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir o tempo mínimo de contribuição referido no inciso II.
§ 1º Para o professor que comprovar exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio serão reduzidos, para ambos os sexos, os requisitos de idade e de tempo de contribuição em 5 (cinco) anos.
(...)”
Do tempo de serviço especial
No tocante ao pedido de reconhecimento de tempo de serviço especial, condições especiais de trabalho são aquelas às quais o segurado se acha sujeito, ao ficar exposto, no exercício do trabalho, a agentes químicos, físicos e biológicos, sós ou combinados, capazes de prejudicar a saúde ou a integridade física do obreiro.
Lado outro, agentes nocivos são aqueles, existentes no ambiente de trabalho, que podem provocar dano à saúde ou à integridade física do segurado, tendo em vista sua natureza, concentração, intensidade ou fator de exposição.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida em condições especiais – e sobre isso não há mais questionamento –, interessa a lei vigente à época em que prestada, em respeito ao direito adquirido do segurado.
Sob tal moldura, ressalte-se que, para o tempo de labor efetuado até 28/04/95, quando vigente a Lei nº 3.807/60 e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91, em sua redação original, a simples prova, por qualquer meio em Direito admitido, de que a atividade profissional enquadra-se no rol dos Decretos nos 53.831/64 ou 83.080/79 (seja por agente nocivo, seja por categoria profissional) é suficiente para a caracterização da atividade como especial, exceto para ruído, frio e calor, sempre exigentes de aferição técnica.
Com a vigência da Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, passou a ser necessária a comprovação da real exposição de forma habitual (não ocasional) e permanente (não intermitente) aos agentes nocivos à saúde ou integridade física do segurado, independentemente da profissão exercida. Exige-se, para tanto, a apresentação de formulário para todo e qualquer agente nocivo, o qual não precisa estar embasado, porém, em laudo técnico, ressalvadas as hipóteses de exposição a ruído, frio e calor (PET 9.194 – STJ; AREsp 2070641, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe de 13/09/2023).
Desde 06/03/97, com a entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei nº 8.213/91 pela MP nº 1596-14 (convertida na Lei nº 9.528/97), a comprovação da exposição às condições especiais passou a ser realizada mediante a apresentação de laudo técnico (AREsp nº 1.963.281, Ministro Francisco Falcão, DJe de 22/06/2023).
A partir de 01/01/2004, o único documento exigido para comprovação da exposição a agentes nocivos é o PPP, documento que substituiu o formulário anterior e o laudo técnico pericial (artigo 256, inciso IV, e artigo 272, § 1º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010).
Por outra via, não tem lugar limitação à conversão de tempo especial em comum, mesmo que posterior a 28/05/98, segundo o decidido no REsp nº 956.110/SP.
Mas com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/2019 ficou vedada a conversão em tempo de serviço comum do tempo especial, para fim de concessão de aposentadoria. É o que se extrai de seu artigo 25, §2°, a seguir copiado:
“Art. 25. Será assegurada a contagem de tempo de contribuição fictício no Regime Geral de Previdência Social decorrente de hipóteses descritas na legislação vigente até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional para fins de concessão de aposentadoria, observando-se, a partir da sua entrada em vigor, o disposto no § 14 do art. 201 da Constituição Federal.
(...)
§ 2º Será reconhecida a conversão de tempo especial em comum, na forma prevista na Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, ao segurado do Regime Geral de Previdência Social que comprovar tempo de efetivo exercício de atividade sujeita a condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, cumprido até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, vedada a conversão para o tempo cumprido após esta data.
(...)”
Sobre ruído, cabe considerar especial a atividade exposta permanentemente a ruído acima de 80 dB, consoante o anexo do Decreto nº 53.831/64 (item 1.1.6), para os períodos laborados até 05/03/1997, véspera da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997. Este último diploma passou a exigir a exposição a nível superior a 90 dB, nos termos do seu anexo IV. E a partir de 19/11/2003, com a vigência do Decreto nº 4882/03, que alterou o anexo IV do Decreto nº 3.048/1999, o limite de exposição ao agente ruído foi diminuído para 85 dB.
Recapitulando: acima de 80 decibéis até 05/03/1997, superior a 90 decibéis de 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003, encontrando-se a questão pacificada no âmbito do E. STJ (Tema 694 daquela Corte).
No que se refere à utilização de EPI – equipamento de proteção individual –, há que se observar o decidido pelo E. STF no julgamento do ARE – Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, com repercussão geral reconhecida, à luz do qual o Plenário negou provimento ao recurso extraordinário, fixando duas relevantes teses, a saber:
“(...) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial” e;
“(...) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria” (vide itens 10 e 14 da ementa do acórdão).
Ainda no mesmo julgado, assentou a Suprema Corte que, havendo dúvida em relação à efetiva neutralização da nocividade, "a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
Ressalte-se que a informação indicada no campo “EPI Eficaz (S/N)”, constante do PPP, não basta para caracterizar ou afastar a nocividade do agente, uma vez que preenchida pelo empregador em atendimento às normas regulamentares da Previdência Social. É preciso que o documento descreva, analiticamente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco para ser levado em conta (ApCiv 5000084-63.2020.4.03.6120, TRF3, 8ª Turma, Rel. Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA, DJEN DATA: 20/07/2022).
Vale acrescer que, ao teor da Súmula nº 87 da TNU, “a eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida antes de 03/12/1998, data de início da vigência da MP 1.729/98, convertida na Lei nº 9732/98”.
Não custa deixar remarcado, ainda neste capítulo, a desnecessidade de prévia fonte de custeio (para reconhecimento de tempo de trabalho especial) quando se tratar de benefício diretamente criado pela Constituição Federal, como no caso se dá (STF - ADI 352-6, Plenário, Rel. o Min. Sepúlveda Pertence, j, de 30/10/1997).
Do caso concreto
Na hipótese vertente, analisada a prova carreada aos autos, sobre os períodos controversos, durante os quais a parte autora teria exercido atividades especiais, tem-se o seguinte:
Período: de 1º/2/1980 a 1º/12/1987
Empresa: SIFCO S/A
Enquadramento por categoria profissional (até 28/4/1995): Aprendiz de ferramenteiro
Prova: CTPS (id. 154142698, p. 10) e Ficha de registro de empregado (id. 154142697, ps. 24/28)
CONCLUSÃO: ESPECIALIDADE COMPROVADA
Os documentos trazidos à guisa de prova revelam o desempenho de ofício que permite o enquadramento, em razão da atividade (até 28/4/1995), conforme os Decretos n. 53.831/1964 e n. 83.080/1979.
No mesmo sentido, a Circular n. 15 do INSS, de 8/9/1994, determina o enquadramento das funções de ferramenteiro, torneiro mecânico, fresador e retificador de ferramentas, no âmbito das indústrias metalúrgicas, no código 2.5.3 do anexo II do Decreto n. 83.080/1979.
Esse entendimento também se encontra arrimada nos seguintes precedentes: TRF3 - AC 00052912020094039999, Desembargado Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, e-DJF3 25/8/2010, p. 348; APELREEX 01125399419994039999, Desembargadora Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJU 5/9/2007.
Período: de 18/8/1988 a 28/4/1995
Empresa: KRUPP METALURGIA CAMPO LIMPO LTDA
Enquadramento por categoria profissional (até 28/4/1995): Torneiro ferramenteiro
Prova: CTPS (id. 154142698, p. 11)
CONCLUSÃO: ESPECIALIDADE COMPROVADA
Repetem-se aqui as considerações feitas no item anterior para as funções de "aprendiz de ferramenteiro".
Período: de 29/4/1995 a 28/9/1995
Empresa: KRUPP METALURGIA CAMPO LIMPO LTDA
Função/atividade: Torneiro ferramenteiro
Prova: CTPS (id. 154142698, p. 11)
CONCLUSÃO: ESPECIALIDADE NÃO COMPROVADA
O enquadramento por categoria profissional só se fez possível até 28/4/1995, conforme acima explanado. Após esta data, o autor deveria demonstrar ter havido - com habitualidade e permanência - exposição a agentes nocivos, por meio de formulários ou laudos técnicos certificadores das condições insalutíferas do labor, ônus do qual não se desincumbiu (art. 373, I, do CPC). Formulários padrão, laudo técnico individualizado ou PPP, nenhum desses documentos veio à baila.
Período: de 29/8/2002 a 8/9/2016 (data do requerimento administrativo)
Empresa: JOSÉ ANTÔNIO BRISQUI FIORANTI - EPP
Função/atividade: Sócio Administrador
Agentes nocivos: Ruído (90 db)
Prova: PPP (id. 154142697, ps. 21/22)
CONCLUSÃO: ESPECIALIDADE COMPROVADA
O formulário trazido a título de prova registra as seguintes atividades pelo autor como sócio-administrador de empresa de pequeno porte (EPP), no intervalo que se analisa, das 07:00 às 17:00 horas: "interpreta desenhos técnicos, soluciona problemas operacionais envolvendo os processos de usinagem. Acompanha todos os processos de usinagem. Faz a programação da produção. Controla e confere as horas de máquinas trabalhadas. Faz inspeção nas máquinas operatrizes. Recebe e confere matérias-primas. Confere materiais a serem expedidos. Responsável por auditorias internas visando organização e limpeza de todos os setores produtivos da empresa".
Seja pontuado que é possível o reconhecimento de trabalho especial em favor de segurado contribuinte individual (cooperado ou não), desde que devidamente comprovado nos termos da lei vigente à época da prestação do serviço, segundo a jurisprudência do STJ e da TNU (AgInt no REsp nº 1.617.096, Rel. o Min. Napoleão Nunes Maia Filho; EREsp nº 1697600, Rel. o Min. Mauro Campbell Marques e Súmula 62/TNU).
Durante o interregno assinalado e ao longo da jornada empreendida, o autor expôs-se a ruído de 90 db, aferido por medição pontual, decibelímetro, na forma do Anexo I da NR-15, superior aos limites de tolerância estabelecidos pela legislação previdenciária de regência.
Fundamento legal do enquadramento: código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64; código 1.1.5. do Decreto nº 83.080/79; código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
O não reconhecimento do intervalo de 29/4/1995 a 28/9/1995 não faz coisa julgada material. Ausência de prova útil implica a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo (STJ - REsp 135271/SP, Rel. o Min. Napoleão Nunes Maia Filho - Tema 629).
Em suma, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades desempenhadas pelo autor nos interregnos que se alongam de 1º/2/1980 a 1º/12/1987, de 18/8/1988 a 28/4/1995 e de 29/8/2002 a 8/9/2016.
Nessa conformidade, exsurge patente o cumprimento do requisito temporal, uma vez que o autor conta mais de 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial até a data do requerimento administrativo (DER: 8/9/2016).
De deferir, com base nisso, a aposentadoria especial requerida, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Todavia, deve ser observada a incompatibilidade do exercício da atividade especial com o gozo do benefício deferido, sob pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
O termo inicial da concessão do benefício deve recair na data do requerimento administrativo, porquanto os elementos apresentados naquele momento já permitiam o cômputo dos períodos reconhecidos nestes autos.
Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações (diferenças) vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Juros de mora correm da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
A contar do mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Invertida a sucumbência, condeno o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data da deste acórdão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Indene de custas a autarquia previdenciária, na forma do artigo 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento ao apelo da parte autora, na forma da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. FERRAMENTEIRO. CATEGORIA PROFISSIONAL ATÉ 28/4/1995. RUÍDO. ENQUADRAMENTO PARCIAL. REQUISITOS TEMPORAL PREENCHIDO À APOSENTADORIA ESPECIAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO DESDE A DER. CONSECTÁRIOS.
- Não ocorreu o cerceamento alegado no recurso.
- Aposentadoria especial é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, com redução do tempo necessário à inativação, concedida em razão do exercício de atividades que afetam o patrimônio corporal do trabalhador. Para o segurado filiado à Previdência Social até 12/11/2019, a EC nº 103/2019, em seu artigo 21,estabelece regra de transição.
- No trato da aposentadoria por tempo de contribuição, a Emenda Constitucional nº 20/98 estabeleceu regra de transição, traçando os seguintes requisitos: (i) idade mínima de 53 anos (homens) e de 48 anos (mulheres) e (ii) adicional de 20% (vinte por cento) do tempo de contribuição faltante quando da publicação da emenda, no caso de aposentadoria integral, e de 40% (quarenta por cento), em hipótese de aposentadoria proporcional.
- Regulando a matéria, o Decreto nº 3.048/99, em seu artigo188, estabeleceu que ao o segurado homem bastava completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição e à segurada mulher, 30 (trinta) anos de contribuição, bem como preencher, um e outro, a carência de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, na forma do artigo 25, II, da Lei nº 8.213/1991.
- A Emenda Constitucional nº 103/2019, em seus artigos 15, 16, 17 e 20 lançou regras de transição, a abranger diferentes situações.
- Com relação ao reconhecimento da atividade exercida em condições especiais, interessa a lei vigente à época em que prestada.
- Para o tempo de labor efetuado até 28/04/95, a simples prova, por qualquer meio em Direito admitido, de que a atividade profissional enquadra-se no rol dos Decretos nos 53.831/64 ou 83.080/79 (seja por agente nocivo, seja por categoria profissional) é suficiente para a caracterização da atividade como especial, exceto para ruído e calor, sempre exigentes de aferição técnica.
- Com a vigência da Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, passou a ser necessária a comprovação da real exposição de forma habitual (não ocasional) e permanente (não intermitente) aos agentes nocivos à saúde ou integridade física do segurado, independentemente da profissão exercida. Exige-se, para tanto, a apresentação de formulários para todo e qualquer agente nocivo.
- Desde 06/03/97, com a entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei nº 8.213/91 pela MP nº 1596-14 (convertida na Lei nº 9.528/97), a comprovação da exposição às condições especiais passou a ser realizada mediante a apresentação de laudo técnico.
- A partir de 01/01/2004, o único documento exigido para comprovação da exposição a agentes nocivos é o PPP (artigo 256, inciso IV, e artigo 272, § 1º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010).
- Sobre ruído, cabe considerar especial a atividade exposta permanentemente a níveis acima de 80 dB, consoante o anexo do Decreto nº 53.831/64 (item 1.1.6), para os períodos laborados até 05/03/1997, véspera da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997. Este último diploma passou a exigir a exposição a nível superior a 90 dB, nos termos do seu anexo IV. E a partir de 19/11/2003, com a vigência do Decreto nº 4882/03, que alterou o anexo IV do Decreto nº 3.048/1999, o limite de exposição ao agente ruído foi diminuído para 85 dB.
- Conjunto probatório apto ao enquadramento parcial dos períodos controvertidos.
- A parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Deve ser observada a incompatibilidade do exercício da atividade especial com o gozo do benefício deferido, sob pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
- O termo inicial da concessão do benefício deve recair na data do requerimento administrativo, porquanto os elementos apresentados naquele momento já permitiam o cômputo dos períodos reconhecidos nestes autos.
- Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações (diferenças) vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
- Juros de mora correm da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
- A contar do mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
- Inversão da sucumbência. Condenação do INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Indene de custas a autarquia previdenciária, na forma do artigo 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
- Ausência de contrariedade à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
