Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5100781-61.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL.
RUÍDO. FRIO. ENQUADRAMENTO PARCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS À
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.REAFIRMAÇÃO DA DER.
POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Conjunto probatório apto ao enquadramento parcial dos períodos debatidos,em razão da
exposição habitual e permanente aos agentes nocivos "ruído" - em níveis superiores aos limites
de tolerância previstos nas normas regulamentares - e "frio", decorrente do trabalho no interior de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
câmaras frigoríficas.
- Não há que se falar em inviabilidade do reconhecimento da especialidade com fundamento na
utilização de metodologia diversa da determinada pela legislação. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- A parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, pois não se
fazem presentes os requisitos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral requerida (regra permanente do artigo 201, § 7º, da CF/1988),
diante da possibilidade de reafirmação da data de entrada do requerimento (DER).
- O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei n. 9.876/99, com a incidência do fator
previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 86 pontos (Lei n. 8.213/91, art. 29-
C, inc. II, incluído pela Lei n. 13.183/2015).
- O Superior Tribunal de Justiça assentou tese jurídica para o Tema Repetitivo n. 995, de modo a
considerar que "É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o
momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso
se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas
instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir"
(REsp 1.727.063/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado
em 22/10/2019, DJe 2/12/2019).
- O termo inicial da aposentadoria por tempo de contribuição corresponde à data da reafirmação
da DER, momento em que já havia implementado o requisito temporal necessário à concessão do
benefício previdenciário em debate.
- Não há que se falar em prescrição quinquenal, pois entre o requerimento administrativo e o
ajuizamento da causa não decorreu lapso superior a 5 (cinco) anos.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em 5%
(cinco por cento) sobre as prestações vencidas até a data deste acórdão, consoante critérios do
artigo 85 do CPC. Em relação à parte autora, porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do
artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Apelação autárquica parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5100781-61.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARLI MENDES DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: VALDINEIA VALENTINA DE CAMPOS RODRIGUES - SP220214-
N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5100781-61.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
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APELADO: MARLI MENDES DA SILVA
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N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), na qual a parte autora busca o reconhecimento de tempo de serviço especial, com
vistas à concessão de aposentadoria especial, ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo
de contribuição.
A sentença, integralizada por embargos de declaração, julgou procedente o pedido para: (i)
reconhecer a especialidade dos intervalos de 22/5/1989 a 22/2/1991, de 1º/2/1992 a 18/7/1994,
de 1º/2/1995 a 25/8/1996, de 1º/4/1997 a 31/3/2005 e de 16/11/2005 a 8/8/2014; (ii) determinar
que o INSS proceda à averbação e conversão dos períodos reconhecidos, concedendo à parte
autora o benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição (o
que lhe for mais vantajoso), desde a data do requerimento administrativo (DER 8/7/2016) ou
desde a data de implementação dos requisitos legais à concessão (reafirmação da DER),
fixados os consectários.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual alega, em síntese, a impossibilidade dos
enquadramentos efetuados. Subsidiariamente, insurge-se contra o termo inicial do benefício e
os critérios de incidência dos consectários legais, bem como suscita a ocorrência da prescrição
quinquenal. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5100781-61.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARLI MENDES DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: VALDINEIA VALENTINA DE CAMPOS RODRIGUES - SP220214-
N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria
profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ,
AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No caso vertente, em relação aos intervalos de 22/5/1989 a 22/2/1991, de 1º/2/1992 a
18/7/1994, de 1º/2/1995 a 25/8/1996 e de 1º/4/1997 a 31/3/2005, constam dos autos Perfil
Profissiográfico Previdenciário - PPP (id. 160669045, p. 6/7) e laudos técnicos periciais (id.
160669217, p. 1/8; id.160669241, p. 1/3 e id. 160669277, p. 1/11), os quais indicam a exposição
habitual e permanente aos agentes nocivos “ruído” - em níveis superiores aos limites previstos
nas normas de regência - e "frio" (temperaturas entre -17º C e 5º C), o que possibilita o
reconhecimento da atividade insalutífera em conformidade com os códigos 1.1.2 e 1.1.6 do
anexo do Decreto n. 53.831/1964, 1.1.2 e 1.1.5 do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 2.0.1 e
2.0.4 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Nesse sentido, trago à colação os seguintes julgados desta Corte Federal: TRF3 – 9ª Turma,
AC 5002191-33.2017.4.03.6105, Desembargador Federal Gilberto Jordan, e - DJF3 Judicial 1
DATA: 02/03/2020; TRF3 - Décima Turma, AC 00011442020114036138, Desembargador
Federal Nelson Porfirio, e-DJF3 Judicial 1 data: 07/04/2017; e TRF3 - Décima Turma,
APELREEX 00091018220134036112, Desembargador Federal Sergio Nascimento, e-DJF3
Judicial 1 data: 24/02/2016.
No mais, a eventual utilização de metodologia diversa não desnatura a especialidade do
período, uma vez constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e
comprovado por meio de PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte (Ap –
Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia
– 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 3652270007103-
66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1
Data: 19/7/2017).
Frise-se, ainda, que a perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado
de fazer prova de condição de trabalho especial (REsp 1370229/RS, MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/2/2014; RESP 201700371993, HERMAN
BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA: 2/5/2017).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Contudo, no que tange ao período de 16/11/2005 a 8/8/2014, não obstante a presença de PPP
(id. 160669045, p. 1/5), constata-se a ausência de fator de risco capaz de ensejar o
reconhecimento da especialidade.
De fato, o mencionado documento indica a sujeição ao fator de risco “baixas temperaturas”.
Todavia, inexiste a indicação da temperatura a que o demandante estava exposto. Assim, tendo
em vista que não foi aferida a temperatura a que esteve a parte autora submetida durante sua
jornada de trabalho, não é possível o enquadramento em razão do agente agressivo
mencionado.
Ressalte-se que os demais fatores de risco mencionados no documento (levantamento e
transporte manual de pesos, quedas de mesmo e diferentes níveis e projeção de pesos sobre
os pés), não possuem o condão de denotar a insalubridade ou penosidade aventadas.
Dessa forma, inviável o reconhecimento da natureza especial do período em comento.
No mais, questões afetas ao recolhimento de contribuições previdenciárias ou divergências na
GFIP não devem, em tese, influir no cômputo da atividade especial exercida pelo segurado, à
vista do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei n. 8.212/1991), aplicável neste enfoque.
Com efeito, inexiste violação da regra inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, haja vista
caber ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias, inclusive as devidas
pelo segurado. Nesse sentido: TRF3, Ap 00204944120174039999, AC 2250162, Rel. DES.
FED. TORU YAMAMOTO, 7ª Turma, Fonte e-DJF3 Judicial 1, DATA: 25/9/2017.
Em síntese, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas
nos interregnos de 22/5/1989 a 22/2/1991, de 1º/2/1992 a 18/7/1994, de 1º/2/1995 a 25/8/1996
e de 1º/4/1997 a 31/3/2005.
Nessas circunstâncias, a parte autora não conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em
atividade especial e, desse modo, não faz jus ao benefício de aposentadoria especial, nos
termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Passo à análise do pedido sucessivo.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para
obtenção da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia,
a qualquer tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época
da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional,
requisito de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres),
além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para
completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou
chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Quanto ao tempo de serviço, somado os períodos ora reconhecidos judicialmente (devidamente
convertidos - fator de conversão 1,2) ao montante incontroverso (24 anos, 3 meses e 15 dias),
constata-se que na data do requerimento administrativo (DER: 8/7/2016), a parte autora não
contava 30 anos de profissão.
Não obstante, o requisito restou preenchido em 21/7/2019 (conforme requerido pela parte
autora na exordial), tendo em vista que a demandante continuou vertendo contribuições na
qualidade de segurado facultativo, conforme consulta realizada ao sistema cadastral do INSS
(Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS).
Em decorrência, conclui-se pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição integral (regra permanente do artigo 201, § 7º, da
CF/1988), consoante planilha disponível em:
https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/RXQJM-ZW7M6-P4
O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei n. 9.876/99, com a incidência do fator
previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 86 pontos (Lei n. 8.213/91, art.
29-C, inc. II, incluído pela Lei n. 13.183/2015).
Nesse contexto, incide na hipótese a tese da reafirmação da DER assentada pelo Superior
Tribunal de Justiça no julgamento do Tema Repetitivo n. 995:
"É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que
implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no
interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias
ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir".
Nessas circunstâncias, o termo inicial da aposentadoria por tempo de contribuição corresponde
à data da reafirmação da DER, ou seja, 21/7/2019, momento em que já havia implementado o
requisito temporal necessário (30 anos de serviço) à concessão do benefício previdenciário em
debate.
Ademais, não há que se falar em prescrição quinquenal, pois entre o requerimento
administrativo e o ajuizamento da causa não decorreu lapso superior a 5 (cinco) anos.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os
cálculos na Justiça Federal.
Fica afastada a incidência da Taxa Referencial (TR) na condenação (Repercussão Geral no RE
n. 870.947).
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês,
contadosda citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência
do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux), observada, quanto
ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em
19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Não obstante, em virtude de o termo inicial do benefício concedido corresponder à data de
reafirmação do requerimento administrativo (reafirmação da DER) posterior à citação, há que se
observar o que restou decidido nos REsp n. 1.727.063/SP, 1.727.064/SP e 1.727.069/SP,
representativos de controvérsia (Tema 995).
Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em
5% (cinco por cento) sobre as prestações vencidas até a data deste acórdão, consoante
critérios do artigo 85 do CPC. Em relação à parte autora, porém, fica suspensa a exigibilidade,
na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da
justiça gratuita.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade
alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto,dou parcial provimento à apelação do INSS para, nos termos da
fundamentação: (i) delimitar o enquadramento da atividade especial aos interstícios de
22/5/1989 a 22/2/1991, de 1º/2/1992 a 18/7/1994, de 1º/2/1995 a 25/8/1996 e de 1º/4/1997 a
31/3/2005; (ii) fixar o termo inicial da aposentadoria por tempo de contribuição na data de
implementação dos requisitos legais à concessão (reafirmação da DER: 21/7/2019); (iii) ajustar
a forma de incidência da correção monetária.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL.
RUÍDO. FRIO. ENQUADRAMENTO PARCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS À
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.REAFIRMAÇÃO DA DER.
POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC).
- Conjunto probatório apto ao enquadramento parcial dos períodos debatidos,em razão da
exposição habitual e permanente aos agentes nocivos "ruído" - em níveis superiores aos limites
de tolerância previstos nas normas regulamentares - e "frio", decorrente do trabalho no interior
de câmaras frigoríficas.
- Não há que se falar em inviabilidade do reconhecimento da especialidade com fundamento na
utilização de metodologia diversa da determinada pela legislação. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI
não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- A parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, pois não se
fazem presentes os requisitos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral requerida (regra permanente do artigo 201, § 7º, da CF/1988),
diante da possibilidade de reafirmação da data de entrada do requerimento (DER).
- O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei n. 9.876/99, com a incidência do
fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada é inferior a 86 pontos (Lei n. 8.213/91,
art. 29-C, inc. II, incluído pela Lei n. 13.183/2015).
- O Superior Tribunal de Justiça assentou tese jurídica para o Tema Repetitivo n. 995, de modo
a considerar que "É possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o
momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso
se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas
instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de
pedir" (REsp 1.727.063/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA,
julgado em 22/10/2019, DJe 2/12/2019).
- O termo inicial da aposentadoria por tempo de contribuição corresponde à data da reafirmação
da DER, momento em que já havia implementado o requisito temporal necessário à concessão
do benefício previdenciário em debate.
- Não há que se falar em prescrição quinquenal, pois entre o requerimento administrativo e o
ajuizamento da causa não decorreu lapso superior a 5 (cinco) anos.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por
cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração
da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo
final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em
5% (cinco por cento) sobre as prestações vencidas até a data deste acórdão, consoante
critérios do artigo 85 do CPC. Em relação à parte autora, porém, fica suspensa a exigibilidade,
na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da
justiça gratuita.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
- Apelação autárquica parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
