Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5172380-60.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO.PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO.ATIVIDADE RURAL. PERÍODO APÓS A LEI N. 8.213/1991. NECESSIDADE
DE CONTRIBUIÇÕES. CONJUNTO PROBATÓRIO PARCIALMENTE ATENDIDO. ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO ACIMA DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA. PPP. LAUDO PERICIAL POR
SIMILARIDADE. PRESSUPOSTOS AO BENEFÍCIO NÃO ATENDIDOS.
- À comprovação da atividade rural exige-se início de prova material corroborado por robusta
prova testemunhal.
- É possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Precedentes.
- A jurisprudência admite a extensão da condição de lavrador para filhos eesposa (mormente nos
casos do trabalho em regime de economia familiar, nos quais é imprescindível sua ajuda para a
produção e subsistência da família).
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n.
8.213/1991 (24/7/1991), tem sua aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e
no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não contempla a averbação de tempo de serviço
rural com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
- Para a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural sem registro em CTPS, posterior ao
início de vigência da Lei n. 8.213/1991, torna-se fundamental o aporte contributivo, comprovação
que a parte demandante deixou de fazer.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar em parte o labor rural alegado,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC/73).
- A parte autora logrou demonstrar, via Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP e laudo pericial
por similaridade, exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos limites
previstos nas normas regulamentares - códigos 1.1.6 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964 e 2.0.1
dos anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
- Perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado de fazer prova de
condição de trabalho especial. Precedentes.
- Ausente o quesito temporalna DER.
- Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n.
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em 5%
(cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5172380-60.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: REVAIL CORREA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: DIEGO AUGUSTO DE CAMARGO - SP331306-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5172380-60.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: REVAIL CORREA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: DIEGO AUGUSTO DE CAMARGO - SP331306-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o
reconhecimento de labor rural e o enquadramento de atividade especial, com vistas à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer o período rural informal de 10/5/1980 a
30/10/1994, enquadrar o intervalo de 1º/11/1994 a 16/8/2001 e conceder a prestação em foco
da DER. Ademais, fixou os consectários e a verba de sucumbência.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual se insurge contra a tutela antecipada. Na
questão de fundo, sustenta, em síntese, a improcedência do pedido rural e a impossibilidade do
enquadramento efetuado, por falta de comprovação de exposição a agentes nocentes.
Comcontrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5172380-60.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: REVAIL CORREA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: DIEGO AUGUSTO DE CAMARGO - SP331306-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
De largada, não se cogita de suspensão de tutela, pois não concedida.
Assim, passo à apreciação as questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante
o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento,
observado o disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do
art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a
16 de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia
familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula n. 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a
sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
No julgamento do REsp n. 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima,
submetido ao rito do art. 543-C do CPC/73, o Superior Tribunal de Justiça, examinando a
matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material
juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o
posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
Ademais, consoante entendimento desta Nona Turma e do Colendo Superior Tribunal de
Justiça, é possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de
idade (STJ, AR n. 3.629, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, DJ 9/9/2008).
Destaque-se, ainda, que a jurisprudência admite a extensão da condição de lavrador para a
filha e a esposa (mormente nos casos do trabalho em regime de economia familiar, nos quais é
imprescindível sua ajuda para a produção e subsistência do núcleo).
A parte autora pretende demonstrar o trabalho rural prestado de 10/5/1980 a 30/10/1994.
No caso dos autos, há suporte probatório mínimo atrelado à parte autora com os afazeres
campesinos junto da família, como: (i) certidão de nascimento qualificando o genitor como
lavrador (1968); (ii) certidão de casamento dos pais (1944); (iii) registro imobiliário de
propriedade rural (1991); (iv) declaração emitida pela Secretaria Municipal de Educação de São
José da Boa Vista/PR de frequência escolar do demandante em zona rural (1978/1979); (v)
atestado da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná, constando a profissão de
lavrador do demandante por ocasião do requerimento da carteira de identidade (1989).
Por sua vez, os testemunhos colhidos, sob o crivo do contraditório, corroboraram o mourejo
asseverado, sobretudo ao afirmarem o labor agrícola da litigante com a família à frente do
cultivo de feijão, arroz e milho.
Insta enfatizar, consoante entendimento desta Nona Turma, ser possível o reconhecimento do
tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Tal se dá porque, conquanto histórica a vedação constitucional do trabalho infantil, na década
1960 a proibição alcançava apenas os menores de 12 anos. Isso indica que nossos
constituintes viam, àquela época, como realidade incontestável, que o menor efetivamente
desempenhava atividade no campo ao lado dos pais.
A questão, inclusive, já foi decidida pela Turma de Uniformização das Decisões dos Juizados
Especiais Federais, que editou a Súmula n. 5: "A prestação de serviço rural por menor de 12 a
14 anos, até o advento da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode
ser reconhecida para fins previdenciários." (DJ 25.09.2003).
Por outro lado, o possível laborrural desenvolvido sem registro em CTPS, ou na qualidade de
produtor rural em regime de economia familiar, depois da entrada em vigor da legislação
previdenciária (24/7/1991), tem sua aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo
39 e no artigo 143, ambos da Lei n. 8.213/1991, que não contempla a averbação de tempo de
serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Nesse sentido, a jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OCORRÊNCIA DE VÍCIO
PROCESSUAL. NECESSIDADE DE CORREÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. SEGURADO
ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO SEM
CONTRIBUIÇÕES MENSAIS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 272 DO STJ. OMISSÃO
VERIFICADA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITO INFRINGENTE. RECURSO
ESPECIAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. Constatado erro na decisão embargada, cumpre o acolhimento dos embargos, com efeitos
modificativos para sanar o defeito processual.
2. A autora, produtora rural, ao comercializar os seus produtos, via incidir sobre a sua receita
bruta um percentual, recolhido a título de contribuição obrigatória, que poderia lhe garantir, tão-
somente, a percepção de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de
auxílio-reclusão ou de pensão. Tal contribuição em muito difere da contribuição facultativa
calculada sobre o salário-base dos segurados e que, nos termos do art. 39, inciso II, da Lei
8.213/91, é requisito para a aposentadoria por tempo de serviço ora pleiteada.
(...)."
(STJ; EDcl nos EDcl; REsp n. 208.131/RS; 6ª Turma; Relatora Ministra Maria Thereza De Assis
Moura; J 22/11/2007; DJ 17.12.2007, p. 350)
Também, a Súmula n. 272 daquele Tribunal:
"O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre
a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se
recolher contribuições facultativas."
No mesmo sentido, os demais julgados desta Corte: AC n. 2005.03.99.035804-1/SP, Rel. Des.
Federal Marisa Santos, 9ª Turma, DJF3 8/10/2010 e ED na AC 2004.03.99.001762-2/SP, Rel.
Des. Federal Nelson Bernardes, 9ª Turma, DJF3 29/7/2010.
Assim, para a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural sem registro em CTPS,
posterior ao início de vigência da Lei n. 8.213/1991, torna-se fundamental o aporte contributivo,
comprovação que o demandante deixou de fazer.
Desse modo, de acordo com o conjunto fático probatório, entendo demonstrado o labor rural no
interstício de 10/5/1980 a 24/7/1991, independentemente do recolhimento de contribuições,
exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos
da Lei n. 8.213/1991).
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016,
DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/73, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições
ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No caso em tela, em relação ao período reconhecido, de 1º/11/1994 a 16/8/2001, a parte autora
trouxe à colação Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP do empregador Recefra
Revestimentos Cerâmicos Fragnani Ltda., atestando o labor em ambiente com ruído acima de
80 dB, durante sua ocupação como "encarregado de moagem".
Durante a instrução, sobreveio laudo pericial por similaridade, diante do encerramento das
atividades do empregador do autor, asseverando exposição habitual e permanente a níveis de
ruído superiores a 90 dB para a época de prestação do serviço, o que autoriza o devido
enquadramento nos códigos 1.1.6 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964 e 2.0.1 dos anexos aos
Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Insta salientar que a perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado
de fazer prova de condição de trabalho especial (REsp 1370229/RS, MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/2/2014; RESP 201700371993, HERMAN
BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA: 2/5/2017).
Por outro lado, diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na
hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Em suma, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades
supramencionadas, cujos lapsos devem ser somados aos demais períodos incontroversos.
Não obstante, a parte autora não possui direito a aposentadoria por tempo de contribuição, pois
não se faz presente o requisito temporal no requerimento administrativo, nos termos do artigo
201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.
20/1998.
Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n.
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em
5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa.
Em relação à parte autora, porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do
mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade
alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para, nos termos da
fundamentação: (i) restringir a atividade rural informal desenvolvida de 10/5/1980 a 24/7/1991,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca; (ii) rejeitar o pedido de aposentadoria.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO.PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO.ATIVIDADE RURAL. PERÍODO APÓS A LEI N. 8.213/1991. NECESSIDADE
DE CONTRIBUIÇÕES. CONJUNTO PROBATÓRIO PARCIALMENTE ATENDIDO. ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO ACIMA DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA. PPP. LAUDO PERICIAL POR
SIMILARIDADE. PRESSUPOSTOS AO BENEFÍCIO NÃO ATENDIDOS.
- À comprovação da atividade rural exige-se início de prova material corroborado por robusta
prova testemunhal.
- É possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Precedentes.
- A jurisprudência admite a extensão da condição de lavrador para filhos eesposa (mormente
nos casos do trabalho em regime de economia familiar, nos quais é imprescindível sua ajuda
para a produção e subsistência da família).
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n.
8.213/1991 (24/7/1991), tem sua aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e
no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não contempla a averbação de tempo de
serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
- Para a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural sem registro em CTPS, posterior ao
início de vigência da Lei n. 8.213/1991, torna-se fundamental o aporte contributivo,
comprovação que a parte demandante deixou de fazer.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar em parte o labor rural alegado,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC/73).
- A parte autora logrou demonstrar, via Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP e laudo
pericial por similaridade, exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos
limites previstos nas normas regulamentares - códigos 1.1.6 do anexo ao Decreto n.
53.831/1964 e 2.0.1 dos anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
- Perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado de fazer prova de
condição de trabalho especial. Precedentes.
- Ausente o quesito temporalna DER.
- Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n.
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em
5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa.
- Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
