Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5164370-27.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO
INSUFICIENTE.TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS. ENQUADRAMENTO.
REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO DESDE A DER. CONSECTÁRIOS.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- É possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Precedentes.
- A parte autora não logrou carrear, em nome próprio, indícios razoáveis de prova material
capazes de demonstrar a faina agrária aventada.
- Como os documentos apresentados não se prestam como início de prova material, a prova
testemunhal colhida torna-se isolada e, portanto, insuficiente à comprovação pretendida, nos
termos da mencionada Súmula n. 149 do STJ.
- Conjunto probatório insuficiente para demonstrar o labor rural desempenhado no interstício
pleiteado.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- Conjunto probatório apto ao enquadramento dos períodos debatidos,em razão da exposição
habitual e permanente a agentes químicos deletérios (hidrocarbonetos aromáticos, tais como:
óleo lubrificante, graxa, etc.).
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, em especial os
hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral requerida (regra permanente do artigo 201, § 7º, da CF/1988).
- O termo inicial da concessão do benefício deve ser a data do requerimento administrativo,
porquanto os elementos apresentados naquele momento já permitiam o cômputo dos períodos
reconhecidos nestes autos.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Inversão da sucumbência. Condenação do INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados
em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a
data deste acórdão, já aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo
(acórdão em vez de sentença), consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do
Superior Tribunal de Justiça.
- A autarquia previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- No caso dos autos não há que se falar em desaposentação, porquanto o objeto da ação
restringe-se ao reconhecimento de tempo rural - sem registro em Carteira de Trabalho e
Previdência Social (CTPS) - e especial , bem como à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição.
- Apelação autárquica desprovida.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5164370-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: PAULO DORTE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: LUCIANA APARECIDA ERCOLI BIANCHINI - SP358245-N,
PAULO SERGIO BIANCHINI - SP132894-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PAULO DORTE
Advogados do(a) APELADO: PAULO SERGIO BIANCHINI - SP132894-N, LUCIANA
APARECIDA ERCOLI BIANCHINI - SP358245-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5164370-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: PAULO DORTE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: LUCIANA APARECIDA ERCOLI BIANCHINI - SP358245-N,
PAULO SERGIO BIANCHINI - SP132894-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PAULO DORTE
Advogados do(a) APELADO: PAULO SERGIO BIANCHINI - SP132894-N, LUCIANA
APARECIDA ERCOLI BIANCHINI - SP358245-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de atividade rural,sem registro em
Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), e tempo de serviço especial, com vistas à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentençajulgou parcialmente procedente o pedido para: (i) reconhecer a especialidade do
intervalo de 7/3/2013 a 9/5/2016; (ii) condenar a parte autora ao pagamento das custas,
despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, nos
termos do artigos 85, § 2º e 86, parágrafo único, ambos do Código de Processo Civil,
observada a gratuidade de justiça deferida.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual alega, em síntese, a impossibilidade dos
enquadramentos efetuados. Subsidiariamente, suscita a vedação à desaposentação.
Prequestiona a matéria para fins recursais.
Não resignada, a parte autora também apresentou apelação, na qual exora a procedência
integral dos pedidos arrolados na inicial. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5164370-27.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: PAULO DORTE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: LUCIANA APARECIDA ERCOLI BIANCHINI - SP358245-N,
PAULO SERGIO BIANCHINI - SP132894-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PAULO DORTE
Advogados do(a) APELADO: PAULO SERGIO BIANCHINI - SP132894-N, LUCIANA
APARECIDA ERCOLI BIANCHINI - SP358245-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante
o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento,
observado o disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do
art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a
16 de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia
familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula n. 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser:"(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a
sua eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência."(AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
No julgamento do REsp n. 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima,
submetido ao rito do art. 543-C do CPC, oSuperior Tribunal de Justiça (STJ), examinando a
matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material
juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o
posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
Ademais, consoante entendimento desta Nona Turma e do STJ, é possível o reconhecimento
do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade(STJ, AR n. 3.629, Ministra Maria
Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, DJ 9/9/2008).
No caso vertente, a parte autora alega ter trabalhado em atividade rurícola, sem registro em
CTPS, de 1º/3/1974 a 31/1/1983.
Contudo, não logrou carrear, em nome próprio, indícios razoáveis de prova material capazes de
demonstrar a faina agrária aventada.
De fato, a parte autora não juntou aos autos documentos como certificado de dispensa de
incorporação ou título eleitoral - comumente utilizados para essa finalidade -, capazes de
estabelecer liame entre o alegado ofício rural e a forma de sua ocorrência.
Ressalta-se que as anotações em nome do genitor do autor, como certidão de registro de
imóvel rural (1974), guia de recolhimento de contribuição sindical rural (1998) e notificação
emitida pelo Sindicato Rural de Vila Valério (2000), não são indicativas do labor rural aventado,
uma vez que não caracterizaram, de forma convincente, a sua real participação nas atividades
rurais asseveradas.
No mais, o único documento coligido aos autos em nome do autor, sua certidão de casamento,
datada de 2003, além de ser extemporânea aos fatos em contenda, qualifica-o como
“mecânico”.
Frise-se, ainda, que os dados constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)
e as anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) revelam apenas vínculos
de natureza urbana que se iniciam em 25/2/1983.
Dessa forma, como os documentos apresentados não se prestam como início de prova
material, a prova testemunhal colhida torna-se isolada e, portanto, insuficiente à comprovação
pretendida, nos termos da mencionada Súmula n. 149 do STJ.
Assim sendo, joeirado o conjunto probatório, entendo que o labor rural em contenda não restou
demonstrado.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria
profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ,
AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No caso vertente, em relação aos intervalos de 1º/12/1995 a 19/2/2004, de 2/1/2005 a
22/10/2012 e de 7/3/2013 a 9/5/2016, constam dos autos Perfis Profissiográficos
Previdenciários - PPPs (id. 199417126, p. 34/37) e laudo técnico pericial (id. 199417166, p.
1/12), os quais indicam a exposição habitual e permanente a agentes químicos deletérios
(hidrocarbonetos aromáticos, tais como: óleo lubrificante, graxa, etc.), situação que possibilita a
contagem diferenciada em conformidade com os códigos 1.2.11 do anexo do Decreto n.
53.831/1964, 1.2.10 do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 1.0.17 dos anexos dos Decretos n.
2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Ademais, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, em especial os
hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativo (TRF-4 - APELREEX:
50611258620114047100 RS 5061125-86.2011.404.7100, Relator: (Auxílio Vânia) PAULO PAIM
DA SILVA, Data de Julgamento: 09/07/2014, SEXTA TURMA, Data de Publicação: D.E.
10/07/2014); (TRF-1- AC: 00435736820104013300 0043573-68.2010.4.01.3300, Relator: JUIZ
FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Data de Julgamento: 14/12/2015, 1ª CÂMARA
REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, Data de Publicação: 22/01/2016 e-DJF1 P. 281).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
No mais, questões afetas ao recolhimento de contribuições previdenciárias ou divergências na
GFIP não devem, em tese, influir no cômputo da atividade especial exercida pelo segurado, à
vista do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei n. 8.212/1991), aplicável neste enfoque.
Com efeito, inexiste violação da regra inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, haja vista
caber ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias, inclusive as devidas
pelo segurado. Nesse sentido: TRF3, Ap 00204944120174039999, AC 2250162, Rel. DES.
FED. TORU YAMAMOTO, 7ª Turma, Fonte e-DJF3 Judicial 1, DATA: 25/9/2017.
Em síntese, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas
nos interregnos supracitados.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para
obtenção da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia,
a qualquer tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época
da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional,
requisito de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres),
além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para
completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou
chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Nessas circunstâncias, somados os períodos ora reconhecidos judicialmente (devidamente
convertidos – fator de conversão 1,4) ao montante incontroverso (31 anos, 7 meses e 6 dias)
apurado até a data do requerimento administrativo (DER: 9/5/2016), a parte autora contava
mais de 35 anos de serviço, tempo suficiente à concessão daaposentadoria por tempo de
contribuição integral requerida (regra permanente do art. 201, § 7º, da CF/1988).
O termo inicial da concessão do benefício deve ser a data do requerimentoadministrativo,
porquanto os elementos apresentados naquele momento já permitiam o cômputo dos períodos
reconhecidos nestes autos.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os
cálculos na Justiça Federal.
Fica afastada a incidência da Taxa Referencial (TR) na condenação (Repercussão Geral no RE
n. 870.947).
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês,
contadosda citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência
do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux), observada, quanto
ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em
19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Invertida a sucumbência, condeno o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10%
(dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data
deste acórdão, já aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo (acórdão
em vez de sentença), consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do Superior
Tribunal de Justiça.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito
econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
Sobre as custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a autarquia
previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996,
bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, essa isenção não a
exime do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por
força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade
alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Por fim, não há que se falar em desaposentação no caso dos autos, porquanto o objeto da ação
restringe-se ao reconhecimento de tempo rural - sem registro em Carteira de Trabalho e
Previdência Social (CTPS) - e especial, bem como à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição.
Diante do exposto,nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação da
parte autora para, nos termos da fundamentação: (i)também enquadrar como atividade especial
os interstícios de 1º/12/1995 a 19/2/2004 e de 2/1/2005 a 22/10/2012; (ii) determinar a
concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do
requerimento administrativo (DER: 9/5/2016); (iii) fixar os consectários legais.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO
INSUFICIENTE.TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS.
ENQUADRAMENTO. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO DESDE A
DER. CONSECTÁRIOS.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior
Tribunal de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova
exclusivamente testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- É possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Precedentes.
- A parte autora não logrou carrear, em nome próprio, indícios razoáveis de prova material
capazes de demonstrar a faina agrária aventada.
- Como os documentos apresentados não se prestam como início de prova material, a prova
testemunhal colhida torna-se isolada e, portanto, insuficiente à comprovação pretendida, nos
termos da mencionada Súmula n. 149 do STJ.
- Conjunto probatório insuficiente para demonstrar o labor rural desempenhado no interstício
pleiteado.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- Conjunto probatório apto ao enquadramento dos períodos debatidos,em razão da exposição
habitual e permanente a agentes químicos deletérios (hidrocarbonetos aromáticos, tais como:
óleo lubrificante, graxa, etc.).
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, em especial os
hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI
não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral requerida (regra permanente do artigo 201, § 7º, da CF/1988).
- O termo inicial da concessão do benefício deve ser a data do requerimento administrativo,
porquanto os elementos apresentados naquele momento já permitiam o cômputo dos períodos
reconhecidos nestes autos.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por
cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração
da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo
final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Inversão da sucumbência. Condenação do INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados
em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até
a data deste acórdão, já aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo
(acórdão em vez de sentença), consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do
Superior Tribunal de Justiça.
- A autarquia previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
- No caso dos autos não há que se falar em desaposentação, porquanto o objeto da ação
restringe-se ao reconhecimento de tempo rural - sem registro em Carteira de Trabalho e
Previdência Social (CTPS) - e especial , bem como à concessão de aposentadoria por tempo
de contribuição.
- Apelação autárquica desprovida.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à
apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
