Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5256524-98.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
21/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE RURAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. AGROPECUÁRIA. AGENTES NOCIVOS. ENQUADRAMENTO
DELIMITADO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a
1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social -
CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n. 8.213/1991 (24/7/1991), tem sua aplicação restrita
aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não
contempla a averbação de tempo de serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar em parte o labor rural alegado,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Constatado o exercício de atividades em estabelecimento agropecuário, enquadrando-se nos
exatos termos do código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964.
- No tocante ao período posterior a 28/4/1995, não obstante a presença de PPP, constata-se a
ausência de fator de risco capaz de ensejar o reconhecimento da especialidade.
- Os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do requisito da
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
- No entanto, somados os períodos ora reconhecidos aos demais interstícios apurados
administrativamente, inviável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição, porquanto não preenchido o requisito temporal.
- Apelações do INSS e da parte autora parcialmente providas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5256524-98.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: LUIZ HENRIQUE NUNES ARF, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogados do(a) APELANTE: THIAGO AURICHIO ESPOSITO - SP343085-A, CLAUDIO DOS
SANTOS - SP153855-A, CARLOS RENATO LOPES RAMOS - SP123309-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUIZ HENRIQUE NUNES
ARF
Advogados do(a) APELADO: CLAUDIO DOS SANTOS - SP153855-A, CARLOS RENATO
LOPES RAMOS - SP123309-A, THIAGO AURICHIO ESPOSITO - SP343085-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5256524-98.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: LUIZ HENRIQUE NUNES ARF, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
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SANTOS - SP153855-A, CARLOS RENATO LOPES RAMOS - SP123309-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUIZ HENRIQUE NUNES
ARF
Advogados do(a) APELADO: CLAUDIO DOS SANTOS - SP153855-A, CARLOS RENATO
LOPES RAMOS - SP123309-A, THIAGO AURICHIO ESPOSITO - SP343085-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS,
na qual a parte autora busca o reconhecimento de atividade rural e especial, com vistas à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a atividade especial nos
períodos de 01/03/1990 a 01/02/1992; 01/06/1993 a 30/05/1994; 17/01/1995 a 29/04/1995;
29/04/1995 a 31/01/1996; 01/02/1996 a 10/05/1999 e 02/03/2011 a 07/03/2017 e determinar a
respectiva averbação.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual requer o reconhecimento do
labor rural desde os 12 (doze) anos e a concessão benefício postulado, com reafirmação da data
do requerimento administrativo (DER), se necessário. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Não resignada, a autarquia também interpôs apelação, na qual aduz, preliminarmente, a
necessidade de reexame necessário. No mérito, impugna os enquadramentos efetuados.
Também prequestiona a matéria para fins de recuso.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5256524-98.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: LUIZ HENRIQUE NUNES ARF, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogados do(a) APELANTE: THIAGO AURICHIO ESPOSITO - SP343085-A, CLAUDIO DOS
SANTOS - SP153855-A, CARLOS RENATO LOPES RAMOS - SP123309-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUIZ HENRIQUE NUNES
ARF
Advogados do(a) APELADO: CLAUDIO DOS SANTOS - SP153855-A, CARLOS RENATO
LOPES RAMOS - SP123309-A, THIAGO AURICHIO ESPOSITO - SP343085-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
Insta frisar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, pois a sentença foi proferida na
vigência do atual CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
Neste caso, à evidência, esse montante não é alcançado.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55, e respectivos parágrafos, da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art.
12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16
de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves
Lima, submetido ao rito do art. 543-C, do CPC/1973, o Superior Tribunal de Justiça, examinando
a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso, há início razoável de prova material, consubstanciado nas anotações em Carteira de
Trabalho e Previdência Social - CTPS do primeiro vínculo de trabalho (01/03/1990 a 01/02/1992),
de natureza rural.
Ademais, a carteira de trabalho da parte autora demonstra que desempenhou atividade rurícola
no decorrer de grande parte de sua vida laboral.
A prova testemunhal, por sua vez, foi coerente com o início de prova material apresentado e
confirmou o labor asseverado, desde a tenra idade, em auxílio à família.
Consoante entendimento desta Nona Turma, é possível o reconhecimento do tempo rural
comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Deste modo, joeirado o conjunto probatório, entendo demonstrado o trabalho rural de 11/02/1986
a 28/02/1990, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência
e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais
do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso, no tocante aos intervalos controversos de 01/03/1990 a 01/02/1992, 01/06/1993 a
30/05/1994 e 17/01/1995 a 28/04/1995, constam CTPS e PPP, os quais indicam o exercício de
atividades em estabelecimento agropecuário, enquadrando-se nos exatos termos do código 2.2.1,
do anexo do Decreto n. 53.831/1964.
Nesse sentido: STJ, AINTARESP – Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial - 860631
2016.00.32469-5, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em
16/6/2016; RESP – Recurso Especial - 1309245 2012.00.30818-2, Rel. Ministro SÉRGIO
KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJE 22/10/2015.
Contudo, em relação aos interstícios de 29/04/1995 a 31/01/1996, 01/02/1996 a 10/05/1999 e
02/03/2011 a 07/03/2017, não obstante a presença de PPP, constata-se a ausência de fator de
risco capaz de ensejar o reconhecimento da especialidade.
Nessa esteira, o mencionado documento se mostra genérico, não demonstrando a efetiva
exposição do segurado aos agentes nocivos, exigida a partir de 29/4/1995, com a Lei n.
9.032/1995.
Ressalte-se que, em relação aos agentes agressivos biológicos e químicos descritos no laudo
pericial como intermitentes no exercício da atividade de serviços gerais rurais, também não é
suficiente ao enquadramento, que requer a exposição com habitualidade e permanência,
consideradas as peculiaridades do trabalho desenvolvido.
Cabe consignar que a sujeição às intempéries da natureza (condições climáticas - sol, chuva, frio,
calor, radiações não ionizantes, poeira etc.), por si só, é insuficiente a caracterizar o trabalho no
campo como insalubre ou penoso.
Nesse sentido: TRF3, 10ª Turma, AC n. 0035126-48.2012.4.03.9999, Relator: Des. Fed. Baptista
Pereira, Julgamento: 14/10/2014; e TRF3, 3ª Seção AC n. 2001.03.99.013747-0/SP, Rel. Des.
Fed. Marisa Santos; Julgamento 11/05/2005; DJU 14/07/2005.
Por fim, quanto à sujeição da parte autora à postura inadequada (risco ergonômico), trata-se de
fator de risco não previsto nos decretos regulamentadores como apto a conferir caráter insalubre
à atividade desenvolvida.
Ademais, o agente ergonômico não legitima a caracterização do trabalho como especial, porque o
esforço físico é inerente à profissão, que atua sobre o trabalhador em níveis normais, não
autorizando a conclusão de que causa danos à saúde.
Desse modo, não resta evidenciada a insalubridade asseverada durante esses períodos, de
modo que devem ser considerados como tempo comum.
Em síntese, apenas os interregnos de 01/03/1990 a 01/02/1992, 01/06/1993 a 30/05/1994 e
17/01/1995 a 28/04/1995 devem ser enquadrados como especiais, convertidos em comum (fator
de conversão de 1,4) e somados aos demais lapsos incontroversos.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da
aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de
contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens)
e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso dos autos, os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do
requisito da carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
No entanto, somado o período rural ora reconhecido aos especiais (devidamente convertidos) e
demais interstícios já averbados na via administrativa, a parte autora não conta mais de 35 anos
de serviço na data do requerimento administrativo (DER – 07/03/2017).
Não obstante, ainda que admitida a reafirmação da DER, conforme tese firmada no Tema
Repetitivo n. 995, do STJ (REsp n. 1.727.063/SP, 1.727.064/SP e 1.727.069/SP), não é o caso de
deferimento do benefício postulado, porquanto não preenchido o requisito temporal.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma
à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, dou parcial provimento às apelações da parte autora e do INSS para, nos
termos da fundamentação: (i) reconhecer a atividade rural desempenhada pela parte autora de
11/02/1986 a 28/02/1990, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins
de carência e contagem recíproca; e (ii) delimitar o reconhecimento do labor especial aos
interstícios de 01/03/1990 a 01/02/1992, 01/06/1993 a 30/05/1994 e 17/01/1995 a 28/04/1995.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE RURAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. AGROPECUÁRIA. AGENTES NOCIVOS. ENQUADRAMENTO
DELIMITADO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a
1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social -
CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n. 8.213/1991 (24/7/1991), tem sua aplicação restrita
aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não
contempla a averbação de tempo de serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar em parte o labor rural alegado,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Constatado o exercício de atividades em estabelecimento agropecuário, enquadrando-se nos
exatos termos do código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964.
- No tocante ao período posterior a 28/4/1995, não obstante a presença de PPP, constata-se a
ausência de fator de risco capaz de ensejar o reconhecimento da especialidade.
- Os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do requisito da
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
- No entanto, somados os períodos ora reconhecidos aos demais interstícios apurados
administrativamente, inviável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição, porquanto não preenchido o requisito temporal.
- Apelações do INSS e da parte autora parcialmente providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento às apelações da parte autora e do INSS, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
