Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5789768-92.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
20/11/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 22/11/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE RURAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. REQUISITOS PREENCHIDOS À CONCESSÃO DA
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TERMO INICIAL NA DATA DA
CITAÇÃO. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. RECURSO
ADESIVO CONHECIDO E DESPROVIDO.
- À comprovação da atividade rural exige-se início de prova material corroborado por robusta
prova testemunhal.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural alegado, independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Superadas, portanto, a limitação
temporal prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade
de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- Até a entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n.
9.032/1995, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação
de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário
preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições
prejudiciais. Contudo, para o agente agressivo o ruído, sempre houve necessidade da
apresentação de laudo técnico.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp Repetitivo n.
1.398.260).
- OSupremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar
a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- O campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) refere-se à
atenuação dos fatores de risco e não à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
- Em relação a uma parte do intervalo pleiteado, a parte autora logrou demonstrar, via PPP e
laudo técnico pericial, a exposição habitual e permanente a ruído em nível superior aos limites
previstos na norma em comento.
- Somados os lapsos incontroversos aos períodos reconhecidos, viável a concessão do benefício
de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto preenchido o requisito temporal.
- Em razão da comprovação do trabalho rural somente ser possível nestes autos, mormente em
razão da produção de prova testemunhal apta a corroborar o início de prova material, o termo
inicial do benefício será a data da citação, momento em que a autarquia teve ciência da
pretensão e a ela pôde resistir.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Fica mantida a condenação do INSS, de forma exclusiva, a pagar honorários de advogado
fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da
sentença, consoante § 2º do artigo 85 e § único do art. 86 doCPC, orientação desta Turma e nova
redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Apelação do INSS conhecida e parcialmente provida. Recurso adesivo da parte autora
conhecido e desprovido.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5789768-92.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ANTONIO HAYNES
Advogado do(a) APELADO: PAULO ROBERTO DA SILVA DE SOUZA - SP322871-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5789768-92.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ANTONIO HAYNES
Advogado do(a) APELADO: PAULO ROBERTO DA SILVA DE SOUZA - SP322871-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal DALDICE SANTANA: Trata-se de ação de conhecimento
proposta contra o INSS, na qual a parte autora busca o reconhecimento de atividade rural e
especial, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para: (i) reconhecer como tempo de
serviço do autor em atividade rural os períodos de 20/2/1975 a 30/11/1986 e 12/3/1987 a
28/2/1990; (ii) reconhecer a especialidade da atividade desenvolvida entre 1/6/2008 a 2/3/2017 e
determinar a sua conversão em tempo comum; (iii) determinar ao INSS a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER.
Na resignada, a autarquia interpôs apelação, na qual aduz, em síntese, que a parte autora não
logrou comprovar o labor rural no interregno reconhecido pelo juízo a quo, nem o labor em
condições especiais. Subsidiariamente, pugna pela alteração do termo inicial do benefício e
ajuste dos critérios de fixação dos juros de mora e correção monetária, além dos honorários.
Prequestiona a matéria para fins recursais.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso adesivo, na qual requer o enquadramento de todos
os períodos descritos na exordial.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5789768-92.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ANTONIO HAYNES
Advogado do(a) APELADO: PAULO ROBERTO DA SILVA DE SOUZA - SP322871-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal DALDICE SANTANA: Conheço dos recursos, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55, e respectivos parágrafos, da Lei n. 8.213/91:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do ReEsp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves
Lima, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, o E. Superior Tribunal de Justiça, examinando a
matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso vertente, há início razoável de prova material, consubstanciado, dentre outros
documentos colacionados aos autos, nas anotações no livro de matrícula escolar, com a
indicação do genitor como lavrador e o registro deste no sindicato dos trabalhadores rurais de
Penápolis, com data de admissão em 28/2/1980; matrícula do imóvel rural, em nome dos
genitores; guia de notificação de ITR do exercício de 1987; certidão de casamento, em 27/7/1985,
em que consta qualificado como lavrador.
Ademais, a carteira de trabalho do requerente demonstra que desempenhou atividade rurícola no
decorrer de grande parte de sua vida laboral.
Os testemunhos colhidos sob o crivo do contraditório, por sua vez, corroboraram o labor
asseverado, desde tenra idade, pela parte autora em regime de economia familiar.
Consoante entendimento desta Nona Turma, é possível o reconhecimento do tempo rural
comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Deste modo, joeirado o conjunto probatório, entendo demonstrado o trabalho rural nos intervalos
de 20/2/1975 a 30/11/1986 e 12/3/1987 a 28/2/1990, independentemente do recolhimento de
contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96,
inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
Do enquadramento e da conversão de período especial em comum
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
ESPECIAL EM COMUM. AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO AO PERÍODO TRABALHADO.
1. Com as modificações legislativas acerca da possibilidade de conversão do tempo exercido em
atividades insalubres, perigosas ou penosas, em atividade comum, infere-se que não há mais
qualquer tipo de limitação quanto ao período laborado, ou seja, as regras aplicam-se ao trabalho
prestado em qualquer período, inclusive após 28/05/1998. Precedente desta 5.ª Turma.
2. Recurso especial desprovido."
(STJ; REsp 1010028/RN; 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz; julgado em 28/2/2008; DJe
7/4/2008)
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria
profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt
no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento
da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu
nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Nesse sentido, o STJ, ao julgar o Recurso especial n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do
CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que
reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo
de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na
legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do
trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso, em relação ao intervalo 1/6/2008 a 2/3/2017, a parte autora logrou demonstrar, via PPP
e LTCAT, a exposição habitual e permanente a ruído em nível superior aos limites previstos na
norma em comento.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é
realmente capaz de neutralizar a nocividade do agente.
Por outro lado, quanto ao interstício de 15/4/2002 a 31/5/2008, não há que se falar em
enquadramento como tempo especial, porquanto evidenciado, no PPP e LTCAT, que a exposição
ao agente nocivo ruído se deu de forma eventual.
Destarte, irretorquívelo decisum a quo quanto ao reconhecimento da especialidade apenas do
interregno de 1/6/2008 a 2/3/2017.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da
aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de
contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens)
e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Ainda, somados os lapsos incontroversos ao labor rural reconhecido e ao especial devidamente
convertido, a parte autora conta mais de 35 anos na data do requerimento administrativo, de
modo que estão presentes os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição.
Dos consectários.
Em razão da comprovação do trabalho rural somente ser possível nestes autos, mormente em
razão da produção de prova testemunhal apta a corroborar o início de prova material, o termo
inicial do benefício será a data da citação, momento em que a autarquia teve ciência da
pretensão e a ela pôde resistir.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017).
Fica afastada a incidência da Taxa Referência (TR) na condenação, pois a Suprema Corte, ao
apreciar embargos de declaração apresentados nesse recurso extraordinário, decidiu pela não
modulação dos efeitos.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados
da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do
CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux), observada, quanto ao
termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em
19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Fica mantida a condenação do INSS, de forma exclusiva, a pagar honorários de advogado que
fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da
sentença, consoante § 2º do artigo 85 e § único do art. 86 do CPC, orientação desta Turma e
nova redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça. Considerado o parcial
provimento ao recurso interposto pela autarquia, não incide ao caso a regra do artigo 85, §§ 1º e
11, do CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma
à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, douparcial provimento à apelação do INSS enegoprovimentodo recursos da
parte autora para: (i) fixar o termo inicial na data da citação;(ii) ajustar os consectários.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE RURAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. REQUISITOS PREENCHIDOS À CONCESSÃO DA
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TERMO INICIAL NA DATA DA
CITAÇÃO. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. RECURSO
ADESIVO CONHECIDO E DESPROVIDO.
- À comprovação da atividade rural exige-se início de prova material corroborado por robusta
prova testemunhal.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural alegado, independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Superadas, portanto, a limitação
temporal prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade
de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- Até a entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n.
9.032/1995, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação
de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário
preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições
prejudiciais. Contudo, para o agente agressivo o ruído, sempre houve necessidade da
apresentação de laudo técnico.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp Repetitivo n.
1.398.260).
- OSupremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar
a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto,
divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a
nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
- O campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) refere-se à
atenuação dos fatores de risco e não à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
- Em relação a uma parte do intervalo pleiteado, a parte autora logrou demonstrar, via PPP e
laudo técnico pericial, a exposição habitual e permanente a ruído em nível superior aos limites
previstos na norma em comento.
- Somados os lapsos incontroversos aos períodos reconhecidos, viável a concessão do benefício
de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto preenchido o requisito temporal.
- Em razão da comprovação do trabalho rural somente ser possível nestes autos, mormente em
razão da produção de prova testemunhal apta a corroborar o início de prova material, o termo
inicial do benefício será a data da citação, momento em que a autarquia teve ciência da
pretensão e a ela pôde resistir.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Fica mantida a condenação do INSS, de forma exclusiva, a pagar honorários de advogado
fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da
sentença, consoante § 2º do artigo 85 e § único do art. 86 doCPC, orientação desta Turma e nova
redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
- Apelação do INSS conhecida e parcialmente provida. Recurso adesivo da parte autora
conhecido e desprovido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação do INSS e lhe dar parcial provimento e conhecer do
recurso adesivo da parte autora e lhe negar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
