Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5003095-13.2017.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
15/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 22/04/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE RURAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
- A sentença proferida no Código de Processo Civil (CPC) vigente cuja condenação ou proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar em parte o labor rural alegado,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- As profissões de “ajudante de motorista”, “ajudante de laminação”, “½ oficial mecânico” e
“mecânico” não estão previstas nos decretos regulamentadores, nem podem ser caracterizadas
como insalubres, perigosas ou penosas por simples enquadramento da atividade.
- “Perfis Profissiográficos Previdenciários” - PPPs revelam a exposição habitual e permanente a
agentes químicos e ruído em nível superior ao limite de tolerância, situação que autoriza o
enquadramento.
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise
quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- Os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do requisito da
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/1991.
- Somados os períodos ora reconhecidos aos demais interstícios apurados administrativamente,
viável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto
preenchido o requisito temporal.
- Termo inicial fixado na data do requerimento administrativo.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majora-se
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data
da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§
1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o
valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.
85, § 4º, II, do CPC).
- Ausência de contrariedade à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
- Remessa oficial não conhecida.
- Apelação do INSS desprovida.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5003095-13.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: DURVALINO GONCALVES DE SENA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS - SP268187-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DURVALINO GONCALVES
DE SENA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS - SP268187-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5003095-13.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: DURVALINO GONCALVES DE SENA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS - SP268187-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DURVALINO GONCALVES
DE SENA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS - SP268187-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS, na qual a parte autora busca o reconhecimento de atividade rural e especial, com vistas à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer a atividade rural desempenhada no
período de 24/02/1972 a 24/02/1984 e especial no interstício de 15/04/2008 a 10/02/2016, bem
como determinar a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de
contribuição, desde a data do requerimento administrativo (DER), com efeitos financeiros desde
data da citação, em 27/04/2018. Fixados os consectários. Decisão submetida ao reexame
necessário e concedida a antecipação dos efeitos da tutela.
Não resignada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual pugna pelo reconhecimento
da especialidade dos demais períodos descritos na exordial e a fixação do termo inicial dos
efeitos financeiros na DER.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação, no qual sustenta a impossibilidade do
reconhecimento do labor rural e especial e requer a total improcedência dos pedidos.
Subsidiariamente, insurge-se contra os critérios de fixação da correção monetária e dos juros de
mora. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5003095-13.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: DURVALINO GONCALVES DE SENA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS - SP268187-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DURVALINO GONCALVES
DE SENA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS - SP268187-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
Não obstante, não deve ser conhecida a remessa oficial, por ter sido proferida a sentença na
vigência do atual Código de Processo Civil (CPC), cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do
duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil)
salários mínimos.
Neste caso, à evidência, esse montante não é alcançado.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55, e respectivos parágrafos, da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art.
12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16
de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves
Lima, submetido ao rito do art. 543-C, do CPC/1973, o Superior Tribunal de Justiça, examinando
a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso, há início razoável de prova material, consubstanciado na declaração para cadastro de
imóvel rural, em nome do genitor, emitida em 20/05/1978, na certidão de casamento dos
genitores, em 04/04/1977, em que consta a indicação de profissão pai em meio rural, e no Título
de Eleitor da parte autora, emitido em 03/08/1978, em que consta a sua profissão de lavrador.
A prova testemunhal, por sua vez, foi coerente com o início de prova material apresentado e
confirmou o labor asseverado, desde a tenra idade, em auxílio à família.
Consoante entendimento desta Nona Turma, é possível o reconhecimento do tempo rural
comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Deste modo, joeirado o conjunto probatório, entendo demonstrado o trabalho rural de 24/02/1972
a 24/02/1984, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência
e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: Superior Tribunal de Justiça - STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra
Laurita Vaz, julgado em 28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais
do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente habilitado
pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade
sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Neste caso, quantos aos períodos de 01/11/1984 a 04/01/1985, 17/01/1985 a 10/11/1986,
01/10/1990 a 13/12/1993 e 01/09/1994 a 16/01/1995, constam anotações em Carteira de
Trabalho e Previdência Social (CTPS), com os ofícios de “ajudante de motorista”, “ajudante de
laminação”, “½ oficial mecânico” e “mecânico”. Tais profissões, porém, não estão previstas nos
decretos regulamentadores, nem podem ser caracterizadas como insalubres, perigosas ou
penosas por simples enquadramento da atividade.
Não se olvida de que a ausência de previsão em regulamento específico não constitui óbice à
comprovação do caráter especial da atividade laboral. Esse é o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça (STJ, 5ªT, REsp 227946, Rel. Min. Gilson Dipp, v.u., julgado em 8/6/2000, DJ
1º/8/2000, p. 304).
No entanto, para esses períodos e para o interstício de 01/12/1995 a 20/01/1997 não há nenhum
elemento de convicção que demonstre a sujeição a agentes nocivos.
Assim, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a peça
inicial (art. 373, I, do CPC), qual seja: carrear prova documental descritiva das condições
insalubres às quais permaneceu exposta, com permanência e habitualidade, no ambiente laboral,
como formulários padrão e laudo técnico individualizado ou PPP, inviabilizando, portanto, o
enquadramento pretendido.
Por outro lado, quanto aos períodos controversos de 27/10/1987 a 19/02/1988 e 15/04/2008 a
10/02/2016, consta dos PPPs que a parte autora exercia suas atividades com exposição habitual
e permanente ao agente nocivo “ruído” em níveis superiores aos limites previstos nas normas em
comento.
Ademais, o labor especial não pode ser afastado em razão da metodologia utilizada para a
aferição do ruído. Os registros ambientais constantes do formulário, expedido por engenheiro ou
médico do trabalho, indicam a metodologia usada para medição, sendo que a fidedignidade das
informações está sob a responsabilidade do empregador ou de seu representante legal. Nesse
sentido, já decidiu a 3ª Seção deste Tribunal: Ap - APELAÇÃO - 5000006-92.2017.4.03.6114,
Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 21/6/2018, e - DJF3
Judicial 1 DATA: 28/6/2018.
Em relação aos interstícios de 04/05/1999 a 12/03/2008 e 15/04/2008 a 10/02/2016, a parte
autora também logrou comprovar, via PPPs, que esteve exposta, de forma habitual e
permanente, a agentes químicos hidrocarbonetos aromáticos, fato que se amolda aos itens 1.2.10
do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 1.0.17 do anexo do Decreto n. 3.048/1999.
Sobre o tema, cabe destacar que os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes
químicos, em especial os hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa e sim qualitativa
(TRF-4 - APELREEX: 50611258620114047100 RS 5061125-86.2011.404.7100, Relator: (Auxílio
Vânia) PAULO PAIM DA SILVA, Data de Julgamento: 09/07/2014, SEXTA TURMA, Data de
Publicação: D.E. 10/07/2014); (TRF-1- AC: 00435736820104013300 0043573-68.2010.4.01.3300,
Relator: JUIZ FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Data de Julgamento: 14/12/2015, 1ª
CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, Data de Publicação: 22/01/2016 e-DJF1 P.
281).
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é
realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Em síntese, prospera o pleito de reconhecimento da atividade especial dos interregnos de
27/10/1987 a 19/02/1988 e 04/05/1999 a 12/03/2008, em acréscimo ao período já reconhecido
pelo Juízo a quo (15/04/2008 a 10/02/2016), ora mantido.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da
aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de
contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens)
e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso dos autos, os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do
requisito da carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/1991.
Ademais, somado o período rural ora reconhecido ao especial (devidamente convertido) e demais
interstícios já averbados na via administrativa, a parte autora conta mais de 35 anos de serviço na
data do requerimento administrativo (DER – 10/02/2016).
Em decorrência, concluo pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição integral deferida.
O termo inicial do benefício e, consequentemente, dos efeitos financeiros, deve ser fixado na
DER - 10/02/2016, consoante entendimento sedimentado no STJ, pois preenchidos os requisitos
para a obtenção do benefício previdenciário desde aquela data.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal.
Fica afastada a incidência da Taxa Referencial (TR) na condenação (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
Com relação aos juros moratórios, estes devem ser contados da citação (art. 240 do CPC), à
razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, por força do art. 1.062 do CC/1916, até a vigência do
CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a
taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações
introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009 (Repercussão
Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a
tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017.
Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para
12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da
sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º,
2º, 3º, I, e 11, do CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do
proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma
à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, nego provimento à apelação do INSS e dou
parcial provimento à apelação da parte autora para, nos termos da fundamentação: (i) também
reconhecer especialidade dos interstícios de 27/10/1987 a 19/02/1988 e 04/05/1999 a
12/03/2008; (ii) fixar o termo inicial do benefício e os efeitos financeiros na data do requerimento
administrativo (DER - 10/02/2016), e (iii) ajustar os honorários sucumbenciais. Mantido, no mais,
o r. decisum a quo.
Informe-se ao INSS, via sistema, para fins de readequação da tutela antecipatória de urgência
concedida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE RURAL.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. REQUISITOS PREENCHIDOS PARA A CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
- A sentença proferida no Código de Processo Civil (CPC) vigente cuja condenação ou proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar em parte o labor rural alegado,
independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem
recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- As profissões de “ajudante de motorista”, “ajudante de laminação”, “½ oficial mecânico” e
“mecânico” não estão previstas nos decretos regulamentadores, nem podem ser caracterizadas
como insalubres, perigosas ou penosas por simples enquadramento da atividade.
- “Perfis Profissiográficos Previdenciários” - PPPs revelam a exposição habitual e permanente a
agentes químicos e ruído em nível superior ao limite de tolerância, situação que autoriza o
enquadramento.
- Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a hidrocarbonetos não requerem análise
quantitativa e sim qualitativa. Precedentes.
- Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
- Os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do requisito da
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/1991.
- Somados os períodos ora reconhecidos aos demais interstícios apurados administrativamente,
viável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto
preenchido o requisito temporal.
- Termo inicial fixado na data do requerimento administrativo.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majora-se
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data
da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§
1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o
valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.
85, § 4º, II, do CPC).
- Ausência de contrariedade à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
- Remessa oficial não conhecida.
- Apelação do INSS desprovida.
- Apelação da parte autora parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação do INSS e
dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
