Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0005618-04.2014.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
09/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/12/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO INDEVIDA DE BENEFÍCIO. BOA-FÉ
OBJETIVA PRESENTE. INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. PERCEPÇÃO DA
IRREGULARIDADE PELO HOMEM COMUM. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 979 STJ.
1. A controvérsia no presente feito se refere à exigibilidade dos valores pagos indevidamente à
parte autora, a título de benefício previdenciário, na seara administrativa.
2. Nas hipóteses de erros administrativos oriundos de interpretação errônea ou má aplicação da
lei, o entendimento jurisprudencial amplamente dominante sempre entendeu pela impossibilidade
de repetição dos valores recebidos indevidamente. Precedentes.
3. No que se refere ao pagamento de valores indevidos em razão de erros materiais e
operacionais imputáveis exclusivamente ao INSS, a jurisprudência vinha dando o mesmo
tratamento jurídico dispensado às outras duas categorias - interpretação errônea e má aplicação
da lei.
4. Entretanto, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1.381.734/RN, submetido ao rito
dos recursos repetitivos, o C. Superior Tribunal de Justiça modificou o seu entendimento, exigindo
nos casos de erros operacionais ou materiais do INSS a demonstração da boa-fé objetiva na
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
conduta do segurado para reconhecer a inexigibilidade do débito previdenciário. Eis a tese
firmada pelo Tribunal da Cidadania sobre esta questão: “Com relação aos pagamentos indevidos
aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em
interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o
desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao
segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto,
comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível
constatar o pagamento indevido.” (Tema nº 979)
5. Os efeitos definidos no mencionado representativo da controvérsia foram modulados com base
na segurança jurídica e no interesse social envolvido, de modo a atingir somente os processos
distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do v. acórdão (23/04/2021).
6. Assim, o pagamento indevido de valores em razão de falha imputável exclusivamente ao INSS
não seriam passíveis de restituição até 23/04/2021 e, a partir da referida data, em razão da
modulação de efeitos, seria exigido, como condição para o reconhecimento da inexigibilidade do
débito previdenciário, a demonstração da boa-fé objetiva do segurado ou pensionista nas
hipóteses de erro operacional ou material.
7. In casu, constata-se equívoco do INSS em relação à concessão do beneficio de auxílio
acidente. Assim, considerando que seria impossível ao homem leigo compreender a ilegalidade
no recebimento dos valores pagos pelo INSS no caso dos autos, uma vez que o próprio ente
previdenciário concluiu pelo preenchimento dos requisitos e deferiu a benesse, a boa-fé objetiva
do apelado perante a Autarquia Previdenciária é evidente.
8. Apelação do INSS improvida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005618-04.2014.4.03.6114
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDSON DE OLIVEIRA SILVA
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005618-04.2014.4.03.6114
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDSON DE OLIVEIRA SILVA
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Trata-se de ação previdenciária ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em
face de EDSON DE OLIVEIRA SILVA, objetivando o ressarcimento ao erário.
A r. sentença (ID 123718521, págs. 144/152) julgou improcedente. Indevidos honorários
advocatícios, em razão da revelia.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação ((ID 123718521, págs. 155/163), alegando que o recebimento
indevido de beneficio previdenciário deve ser ressarcido, independente de boa fé no seu
recebimento, pouco importando tenha concessão advindo de dolo, fraude, má-fé ou erro
administrativo, o que é consequência do disposto no art. 115 da Lei n°8.213/1999 e do principio
da vedação ao enriquecimento sem causa (Código Civil, artigos 876, 884 e 885). Faz
prequestionamentos para fins recursais. Eventualmente, requer que seja excluída a
condenação em honorários advocatícios, visto que a Defensoria Pública que atua na defesa do
réu.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Em sede recursal, o feito foi sobrestado, em virtude de decisão proferida pelo C. STJ, em sede
de julgamento de recursos repetitivos (Tema 979) (ID 123718521, pág. 178).
Tendo em vista o julgamento do Tema nº 979 em 10/03/2021, com a consequente revogação
da suspensão dos processos que tratavam da mesma matéria (REsp nº 1.381.734/RN, Relator
Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 23/04/2021). Desta forma, levanto o
sobrestamento do feito.
É o relatório.
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RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDSON DE OLIVEIRA SILVA
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO (RELATOR):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente
regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de
adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse
recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do
artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
A controvérsia no presente feito se refere à exigibilidade dos valores pagos indevidamente a
Edson de Oliveira Silva, a título de benefício previdenciário, na seara administrativa.
Na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos
indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei
8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99, in verbis:
"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou
além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão
judicial, nos termos do disposto no Regulamento. (Redação dada pela Medida Provisória nº
871, de 2019)"
Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio
financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais
segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
No caso concreto, após decisão proferida em juízo, o INSS concedeu auxílio acidente a Edson
de Oliveira Silva no período de 01/03/2010 a 30/06/2012 (ID 123718521 - Pág. 14/43). O
benefício foi implantado erroneamente ao ora apelado, homônimo do requerente, razão pela
qual a autarquia requer o ressarcimento.
A devolução, contudo, é indevida, pois houve erro exclusivo do INSS na implantação do
benefício e não restam dúvidas sobre a boa-fé da parte ré, a qual informou que “como havia
processo de datas +- 93/94 – confiei que fosse real” (ID 123718521 - Pág. 75).
A possibilidade da Administração Pública em rever seus atos eivados de ilegalidade por ela
praticados é reconhecida há muito pela jurisprudência da Suprema Corte. Todavia, ainda
remanesce a controvérsia acerca das consequências jurídicas de tal anulação para os
segurados e pensionistas, mormente no que se refere ao dever de restituição de valores.
Na relação entre particulares, o próprio estatuto da propriedade estabelece as balizas para
dirimir conflitos de ressarcimento, pautando-se, sobretudo, no primado de que todo
enriquecimento individual deve ter uma justificativa jurídica aceitável, sob pena de ser
considerado indevido.
A mesma diretriz é utilizada nos casos em que fica demonstrado que o segurado usou de meios
fraudulentos para obter proveito econômico indevido, sendo o entendimento jurisprudencial
dominante de que, em tais circunstâncias, os valores são passíveis de restituição. O
fundamento, contudo, não é mais o direito de propriedade, como ocorre no âmbito privado, mas
sim o princípio geral de direito de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza.
A questão se torna mais discutível quando se trata de valores recebidos pelo segurado de boa-
fé.
Isso ocorre porque os benefícios pagos pelo INSS constituem verbas de caráter alimentar e,
portanto, presume-se que seus titulares as utilizaram para suprir suas necessidades básicas de
subsistência, razão pela qual o retorno das partes ao status quo ante se torna improvável na
maioria das vezes.
Além disso, o segurado que age de boa-fé, fornecendo as informações solicitadas pela
Autarquia Previdenciária, sem adulterar ou ocultar nada, bem como se submetendo a todos os
procedimentos administrativos, nutre a expectativa de que os valores por ele recebidos estão de
acordo com a lei, uma vez que a concessão de seu benefício foi precedida de análise por
agentes públicos ou alicerçada em pareceres técnicos especializados, que são muitas vezes
incompreensíveis para o homem comum, leigo em questões jurídicas ou contábeis.
A fim de dirimir a controvérsia acerca da restituição de valores em tais casos, a jurisprudência
distinguiu as falhas praticadas pela Administração Pública em três categorias, de acordo com a
natureza do ato que resultou no pagamento da vantagem indevida: interpretação errônea, má
aplicação da lei ou erro da administração latu sensu, entendido este último como àquele
operacional ou material.
Interpretação errônea consistiria no ato de atribuir ao preceito normativo um sentido que não
corresponde ao seu verdadeiro conteúdo, seja descaracterizando seus elementos materiais
objetivos, - como, por exemplo, a natureza ou a dimensão quantitativa da prestação -, mediante
a supressão, a alteração ou a adição de elementos, sob a justificativa de que eles estariam
"implícitos" no texto legal, seja ampliando seu alcance subjetivo, pela via hermenêutica, para
incluir em seu rol destinatários que, de outra forma, não seriam atingidos pelo preceito legal.
Já a má aplicação da lei ocorre quando se subsume uma determinada situação fática a norma
geral positivada que não se amolda ao caso concreto, muitas vezes olvidando que já existe
outro preceito legal, mais específico, que disciplina exatamente aquele fato gerador.
O erro material, por sua vez, é caracterizado pelas inexatidões puramente aritméticas ou de
digitação, não tendo origem na ignorância do agente público quanto ao sentido e alcance da
norma, tampouco na dificuldade por ele encontrada de identificar se o fato se enquadra na
hipótese de incidência positivada. Trata-se de mera falha humana decorrente de desatenção
que, em circunstâncias normais, seriam perceptíveis imediatamente pelos próprios agentes
públicos, caso tivessem feito a mera conferência dos atos após sua produção.
Por fim, o erro operacional decorre de negligência nas práticas administrativas puramente
burocráticas e está relacionado com a gestão ineficaz dos sistemas de informação, dos
documentos ou das rotinas próprias da repartição pública, tais como: a conferência das datas
de vencimento de benefícios, agendamento de revisões periódicas, incompatibilidade
inequívoca entre a prestação recebida e o segurado ou pensionista, perceptível imediatamente
até para o homem leigo.
Nas hipóteses de erros administrativos oriundos de interpretação errônea ou má aplicação da
lei, o entendimento jurisprudencial amplamente dominante sempre entendeu pela
impossibilidade de repetição dos valores recebidos indevidamente.
Isso porque à Administração Pública não é dado o direito de equivocar-se quanto à
interpretação ou à aplicação da lei. Justamente por considerar que os atos praticados por seus
agentes estão em conformidade com a legislação é que se atribui a eles a presunção de
veracidade, derivada de sua condição de terem sido produzidos por detentores de fé pública.
Ademais, conquanto ninguém possa invocar a ignorância como justificativa para se escusar de
cumprir a lei, não é razoável exigir dos segurados e pensionista que possuam conhecimento
técnico especializado suficiente para compreender a ilegalidade dos valores por ele recebidos.
Neste sentido, cito os seguintes precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça:
"ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DE LEI.
DEVOLUÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO.
ANÁLISE. SÚMULA 7 DO STJ.
1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos com fundamento no
CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os
requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então
pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2).
2. É firme o entendimento desta Corte no sentido de que é incabível a devolução de valores
percebidos por servidor público de boa-fé, decorrente de interpretação equivocada ou má
aplicação da lei pela Administração.
3. A análise da tese recursal, a fim de derrogar o entendimento da Corte de origem, encontra
óbice na Súmula 7 do STJ.
4. Agravo interno desprovido."
(AgInt no AREsp 1528427/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado
em 18/11/2019, DJe 02/12/2019)
"ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SEGURADO DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL. VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE POR ERRO OPERACIONAL
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ. DESCABIMENTO DA
PRETENSÃO ADMINISTRATIVA DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES. AGRAVO INTERNO DO
INSS DESPROVIDO.
1. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do Recurso Especial Representativo da
Controvérsia 1.244.182/PB, firmou o entendimento de que não é devida a restituição de valores
pagos de boa-fé, por força de interpretação errônea ou má aplicação da lei por parte da
Administração.
2. O mesmo entendimento tem sido aplicado por esta Corte nos casos de mero equívoco
operacional da Administração Pública, como na hipótese dos autos.
3. O requisito estabelecido para a não devolução de valores pecuniários indevidamente pagos é
a boa-fé do benefíciário que, ao recebê-los na aparência de serem corretos, firma
compromissos com respaldo na pecúnia; a escusabilidade do erro cometido pelo agente
autoriza a atribuição de legitimidade ao recebimento da vantagem.
4. Agravo Interno do INSS desprovido."
(AgInt no REsp 1606811/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 03/02/2017)
Tal posicionamento foi construído a partir da análise das hipóteses de restituição de valores
recebidos indevidamente pelos servidores públicos, em virtude de interpretação errônea e má
aplicação da lei. Assim, considerando o fato de que os Regimes Geral e Próprio de Previdência
Social, ao menos no âmbito federal, passaram a ter disciplina normativa muito similar após a
edição da Lei Complementar n. 12.618/2012, inclusive com teto remuneratório equivalente, o
Tribunal da Cidadania entendeu por aplicar a mesma ratio juris e reconhecer a inexigibilidade
do débito previdenciário em tais casos aos segurados e pensionistas do INSS.
No que se refere ao pagamento de valores indevidos em razão de erros materiais e
operacionais imputáveis exclusivamente ao INSS, a jurisprudência vinha dando o mesmo
tratamento jurídico dispensado às outras duas categorias - interpretação errônea e má
aplicação da lei.
Entretanto, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1.381.734/RN, submetido ao rito
dos recursos repetitivos, o C. Superior Tribunal de Justiça modificou o seu entendimento,
exigindo nos casos de erros operacionais ou materiais do INSS a demonstração da boa-fé
objetiva na conduta do segurado para reconhecer a inexigibilidade do débito previdenciário. Eis
a tese firmada pelo Tribunal da Cidadania sobre esta questão:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por
cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o
segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com
demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.” (Tema nº 979)
Os efeitos definidos no mencionado representativo da controvérsia foram modulados com base
na segurança jurídica e no interesse social envolvido, de modo a atingir somente os processos
distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do v. acórdão (23/04/2021).
Ao esclarecer os fundamentos de sua decisão, o Eminente Ministro Relator do voto condutor
consignou o seguinte:
"(...) Diferentemente das hipóteses anteriores (interpretação errônea e má aplicação da lei),
onde o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o segurado recebeu
o benefício de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor indevidamente, a
hipótese de erro material ou operacional deve ser analisado caso a caso, de modo a averiguar
se o beneficiário/segurado tinha condições de compreender a respeito do não pertencimento
dos valores recebidos, de modo a se lhe exigir comportamento diverso, diante do seu dever de
lealdade para com a Administração Previdenciária. Neste contexto, é possível afirmar que há
erros materiais ou operacionais que se mostram incompatíveis com a indispensável boa-fé
objetiva, dando ensejo ao ressarcimento do débito, situação que foi muito bem retratada no MS
n. 19.260/DF, da relatoria do Ministro Herman Benjamin, DJe 3/9/2014, ao exemplificar uma
situação hipotética de um servidor que não possui filhos, e recebeu, por erro a Administração,
auxílio natalidade. Conforme fixado no precedente precitado, "descabe ao receptor da verba
alegar que presumiu o caráter legal do pagamento em hipótese de patente cunho
indevido"(grifo nosso).
Assim, o pagamento indevido de valores em razão de falha imputável exclusivamente ao INSS
não seriam passíveis de restituição até 23/04/2021 e, partir da referida data, em razão da
modulação de efeitos, seria exigido, como condição para o reconhecimento da inexigibilidade
do débito previdenciário, a demonstração da boa-fé objetiva do segurado ou pensionista nas
hipóteses de erro operacional ou material.
Tal entendimento não destoa daquele firmado por esta Corte, conforme se infere dos seguintes
precedentes:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PREENCHIDOS OS REQUISITOS.
INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. BENEFICIO CONCEDIDO.
1. Da análise dos autos, verifico que o benefício de amparo social foi concedido pelo INSS após
a avaliação do preenchimento dos requisitos legais para sua concessão. Assim, os valores
pagos a esse título foram recebidos de boa-fé pela autora, não se restando configurada, in
casu, qualquer tipo de fraude.
2. Nesse passo observo que, em observância ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos, da
boa-fé da autora e da natureza alimentar do benefício previdenciário, não há que se falar em
devolução dos valores pagos indevidamente.
3. Portanto, indevida a cobrança pleiteada pelo INSS, devendo ser cessado qualquer desconto
e devolvido valores eventualmente pago pela parte autora.
4. Apelação parcialmente provida."
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5907619-55.2019.4.03.9999, Rel.
Desembargador Federal FERNANDO MARCELO MENDES, julgado em 08/01/2021, Intimação
via sistema DATA: 12/02/2021)
"PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO
ADMINISTRATIVAMENTE. POSTERIOR CESSAÇÃO. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS.
DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER
ALIMENTAR
1. Para comprovar o labor rural em regime de economia familiar no período compreendido entre
07/07/1962 até a 02/04/1998, a autora apresentou os seguintes documentos: a) Matrícula do
Sítio Tanquinho, onde a Autora declarou a profissão de “lavradora”, b) Comprovante de
recolhimento de INCRA referentes aos anos de 1988/1996, onde se verifica que a profissão
declarada do esposo, nos INCRA's de 1992/1996 é trabalhador rural e com a informação de
que nunca houve trabalhadores assalariados; c) Notas Fiscais de entrada, referentes à venda
de produtos agrícolas, confeccionadas em 1993, 1995 e 1997 1997 (ID 73539694 - Pág. 102 ,
ID 73539694 - Pág. 32/46); d) Notas Fiscais de compra de insumos agrícolas, confeccionadas
em 1994/1996; e) Comprovante de cadastro de trabalhador/contribuinte individual da Autora,
referente ao NIT 114.369.193- 33, onde a Autora declarou a atividade de segurada especial; e)
declaração do Sindicato Rural..
2. A declaração de sindicato rural não pode ser considerada início de prova material, uma vez
que não foi homologada pelo Instituto. Ela equivale a declaração particular subscrita por
terceiro, colhida sem o crivo do contraditório e, portanto, não se enquadra no conceito de prova
material (ID 73539694 - Pág. 4).-.
3. Por sua vez, a qualificação da autora na Certidão do Livro 3-O de Transcrições das
Transmissões (termo n. 15.122), expedida pelo Serviço de Registro de Imóveis e Anexos da
Comarca de Pederneiras-SP, não pode se estender após o seu casamento em 26/10/63, já que
na certidão de casamento ela está qualificada como “do lar” e seu marido como “motorista” . Por
outro lado, as demais provas acostadas aos autos (documentos fiscais), apenas identificam o
marido da autora.
4. Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um
cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade
campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp
1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver
documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, o que só é possível quando
se tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido em regime de
economia familiar.
5. Todavia, o seu marido era trabalhador urbano, pois qualificado como motorista (Certidão de
casamento 26/10/1963 onde ele está qualificado como motorista e ela do lar - ID 73539694 -
Pág. 143), além de aposentar-se por tempo de contribuição na condição de industriário, de
modo que a jurisprudência não autoriza a extensão da prova em nome do marido nestas
situações.
6. Ainda que se reconheça que a função de tratorista agrícola é essencialmente de natureza
rural, porque lida com a terra, o plantio, a colheita, de sorte que o trator deve ser considerado
instrumento de trabalho de qualidade rural, diverso do motorista, que labora no transporte em
função tipicamente urbana, fato é que, em 1998, o marido da autora se aposentou por tempo de
contribuição na condição de industriário, conforme INFBEN juntado aos autos com DIB em
21/10/98 e cujo valor, em 2009, era R$ 758,67 (ID 73539694 - Pág. 64) superior ao salário
mínimo da época que era R$ 465,00.
7. No caso concreto, embora a autora tenha demonstrado a existência de imóvel rural em seu
nome, isto não é suficiente para demonstrar o alegado trabalho nas lides campesinas em
regime de economia familiar, que pressupõe uma forma rudimentar de trabalho rural em que os
membros da família realizam trabalho indispensável à própria subsistência e mútua
colaboração.
8. Insta dizer que a simples existência de imóvel rural em nome da autora, por si só, não a
equipara a trabalhadora rural, principalmente em regime de economia familiar, devendo
demonstrar o efetivo exercício do seu trabalho na referida propriedade por um período mínimo,
contínuo e duradouro, o que não restou demonstrado.
9. Não comprovado o labor rural em regime de economia familiar, correta a cessação do
benefício.
10. O benefício foi concedido administrativamente após a avaliação do preenchimento dos
requisitos legais para sua concessão.
11. Os valores pagos a esse título foram recebidos de boa-fé pela autora, não se restando
configurada, in casu, qualquer tipo de fraude.
12. Conforme jurisprudência, é incabível a devolução de valores percebidos pelo beneficiário de
boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração.
13. Não se aplica ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT,
julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores
recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada.
14. Recursos desprovidos."
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5790971-89.2019.4.03.9999, Rel.
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 11/09/2020, e - DJF3
Judicial 1 DATA: 17/09/2020)
"AGRAVO LEGAL. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS POR TEMPO MÍNIMO. ERRO DA AUTARQUIA.
RESTITUIÇÃO DE VALORES. INVIÁVEL. CARÁTER ALIMENTAR DAS VERBAS E BOA-FÉ
DO SEGURADO.
1. O extrato do Sistema Único de Benefícios (fls. 61) comprova que a autora desistiu do
benefício de prestação continuada, o que evidencia sua boa-fé. Assim, o desconto é indevido.
2. É necessário observar que a garantia de benefício não inferior ao salário mínimo, no caso,
também impossibilita os descontos na pensão por morte que a autora recebe.
3. Como se vê, a decisão agravada resolveu de maneira fundamentada as questões discutidas
na sede recursal, na esteira da orientação jurisprudencial já consolidada em nossas cortes
superiores acerca da matéria. O recurso ora interposto não tem, em seu conteúdo, razões que
impugnem com suficiência a motivação exposta na decisão monocrática, que merece ser
sustentada.
4. Agravo legal improvido."
(TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1401151 - 0006634-
51.2009.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em
24/08/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/08/2015 )
In casu, constata-se equívoco do INSS em relação à concessão do beneficio de auxílio
acidente. Assim, considerando que seria impossível ao homem leigo compreender a ilegalidade
no recebimento dos valores pagos pelo INSS no caso dos autos, uma vez que o próprio ente
previdenciário concluiu pelo preenchimento dos requisitos e deferiu a benesse, a boa-fé objetiva
do apelado perante a Autarquia Previdenciária é evidente.
Não pode ser desconsiderada a legítima expectativa da segurada de que os atos do INSS
foram praticados conforme a lei, com a finalidade de responsabilizá-la pela reparação de erro
decorrente de má aplicação da legislação por órgão da Administração Pública, sobretudo tendo
em vista que ela não concorreu de forma alguma para a concessão indevida do benefício.
Não há condenação em honorários advocatícios, tendo em vista que o INSS, por ser integrante
da Administração Pública Federal Indireta, é vinculado à União Federal, tal qual a DPU, ambos
custeados por recursos federais, sob pena de configuração de confusão entre credor e devedor,
na forma do Art. 381, do CC, e da Súmula 421, do STJ.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, nos termos consignados.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO INDEVIDA DE BENEFÍCIO. BOA-FÉ
OBJETIVA PRESENTE. INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO PREVIDENCIÁRIO. PERCEPÇÃO DA
IRREGULARIDADE PELO HOMEM COMUM. IMPOSSIBILIDADE. TEMA 979 STJ.
1. A controvérsia no presente feito se refere à exigibilidade dos valores pagos indevidamente à
parte autora, a título de benefício previdenciário, na seara administrativa.
2. Nas hipóteses de erros administrativos oriundos de interpretação errônea ou má aplicação da
lei, o entendimento jurisprudencial amplamente dominante sempre entendeu pela
impossibilidade de repetição dos valores recebidos indevidamente. Precedentes.
3. No que se refere ao pagamento de valores indevidos em razão de erros materiais e
operacionais imputáveis exclusivamente ao INSS, a jurisprudência vinha dando o mesmo
tratamento jurídico dispensado às outras duas categorias - interpretação errônea e má
aplicação da lei.
4. Entretanto, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1.381.734/RN, submetido ao
rito dos recursos repetitivos, o C. Superior Tribunal de Justiça modificou o seu entendimento,
exigindo nos casos de erros operacionais ou materiais do INSS a demonstração da boa-fé
objetiva na conduta do segurado para reconhecer a inexigibilidade do débito previdenciário. Eis
a tese firmada pelo Tribunal da Cidadania sobre esta questão: “Com relação aos pagamentos
indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não
embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis,
sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício
pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso
concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido.” (Tema nº 979)
5. Os efeitos definidos no mencionado representativo da controvérsia foram modulados com
base na segurança jurídica e no interesse social envolvido, de modo a atingir somente os
processos distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do v. acórdão (23/04/2021).
6. Assim, o pagamento indevido de valores em razão de falha imputável exclusivamente ao
INSS não seriam passíveis de restituição até 23/04/2021 e, a partir da referida data, em razão
da modulação de efeitos, seria exigido, como condição para o reconhecimento da
inexigibilidade do débito previdenciário, a demonstração da boa-fé objetiva do segurado ou
pensionista nas hipóteses de erro operacional ou material.
7. In casu, constata-se equívoco do INSS em relação à concessão do beneficio de auxílio
acidente. Assim, considerando que seria impossível ao homem leigo compreender a ilegalidade
no recebimento dos valores pagos pelo INSS no caso dos autos, uma vez que o próprio ente
previdenciário concluiu pelo preenchimento dos requisitos e deferiu a benesse, a boa-fé objetiva
do apelado perante a Autarquia Previdenciária é evidente.
8. Apelação do INSS improvida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
