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PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONTROLE ADMINISTRATIVO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. FRAUDE NO RECEBIMENTO. FALECIMENTO DA TITULAR. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO....

Data da publicação: 15/07/2020, 06:36:25

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONTROLE ADMINISTRATIVO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. FRAUDE NO RECEBIMENTO. FALECIMENTO DA TITULAR. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. DEVOLUÇÃO DEVIDA. ARTIGOS 115, II, DA LEI 8.213/91 E 876 DO CÓDIGO CIVIL. CONDENAÇÃO CRIMINAL. PRESCRIÇÃO AFASTADA. ARTIGO 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. - A segurada Antonia Ferreira de Queiróz, já qualificada, requereu e obteve o pagamento de aposentadoria por invalidez nº 32/77.827.501-1, com DIB em 08/11/1985. Contudo, Antonia faleceu em 27/02/1986. - Por denúncia anônima, foi constatado que a ré, Maria Antonia de Lima Pádua, sobrinha de Antonia, continuou a receber o benefício por mais de 20 (vinte) anos, utilizando-se de ardil (levava outra pessoa parecida fisicamente com Antonia) e documento falso. - Apurada a fraude, a ré foi processada e condenada criminalmente, à penas (ínfimas, diga-se de passagem, já que legislação criminal aplicável revelou-se assaz branda) descritas à f. 91. - A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista. - Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie. - Quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. - O direito positivo veda o enriquecimento ilícito (ou enriquecimento sem causa ou locupletamento), nos artigos 876 e 884 do Código Civil. - O dolo da ré, no caso, restou sobejamente evidenciado, tendo sido inclusive condenada em processo-crime. - Quanto às alegações de prescrição, não prosperam ante o caráter fraudulento do recebimento do benefício. Deve prevalecer no caso a regra do artigo 37, § 5º, da Constituição Federal, que tem a seguinte redação: "§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento." - No tocante à alegação de "boa-fé", por ter a ré usado o dinheiro recebido supostamente para custear as despesas das irmãs, se não aberrasse do senso mínimo de justiça, aberraria do senso lógico porquanto o crime estelionato é incompatível, logicamente, com a alegada "boa-fé", afigurando-se irrelevante, para fins de repetição do indébito, o destino dado ao dinheiro ilegalmente recebido por mais de 20 (vinte) anos. - Rejeitada, ainda, o pleito de suspensão do processo até julgamento do Recurso Extraordinário 669069. Considerando que o Pretório Excelso não determinou a suspensão dos processos, não há razão plausível, nem autorizativo legal, para a pretendida suspensão. - Apelação não provida. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2236072 - 0005166-72.2015.4.03.6109, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 27/11/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/12/2017 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 13/12/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005166-72.2015.4.03.6109/SP
2015.61.09.005166-3/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
APELANTE:MARIA ANTONIA DE LIMA PADUA
ADVOGADO:SP275068 ULISSES ANTONIO BARROSO DE MOURA e outro(a)
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
No. ORIG.:00051667220154036109 1 Vr PIRACICABA/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONTROLE ADMINISTRATIVO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. FRAUDE NO RECEBIMENTO. FALECIMENTO DA TITULAR. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. DEVOLUÇÃO DEVIDA. ARTIGOS 115, II, DA LEI 8.213/91 E 876 DO CÓDIGO CIVIL. CONDENAÇÃO CRIMINAL. PRESCRIÇÃO AFASTADA. ARTIGO 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
- A segurada Antonia Ferreira de Queiróz, já qualificada, requereu e obteve o pagamento de aposentadoria por invalidez nº 32/77.827.501-1, com DIB em 08/11/1985. Contudo, Antonia faleceu em 27/02/1986.
- Por denúncia anônima, foi constatado que a ré, Maria Antonia de Lima Pádua, sobrinha de Antonia, continuou a receber o benefício por mais de 20 (vinte) anos, utilizando-se de ardil (levava outra pessoa parecida fisicamente com Antonia) e documento falso.
- Apurada a fraude, a ré foi processada e condenada criminalmente, à penas (ínfimas, diga-se de passagem, já que legislação criminal aplicável revelou-se assaz branda) descritas à f. 91.
- A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista.
- Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie.
- Quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91.
- O direito positivo veda o enriquecimento ilícito (ou enriquecimento sem causa ou locupletamento), nos artigos 876 e 884 do Código Civil.
- O dolo da ré, no caso, restou sobejamente evidenciado, tendo sido inclusive condenada em processo-crime.
- Quanto às alegações de prescrição, não prosperam ante o caráter fraudulento do recebimento do benefício. Deve prevalecer no caso a regra do artigo 37, § 5º, da Constituição Federal, que tem a seguinte redação: "§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento."
- No tocante à alegação de "boa-fé", por ter a ré usado o dinheiro recebido supostamente para custear as despesas das irmãs, se não aberrasse do senso mínimo de justiça, aberraria do senso lógico porquanto o crime estelionato é incompatível, logicamente, com a alegada "boa-fé", afigurando-se irrelevante, para fins de repetição do indébito, o destino dado ao dinheiro ilegalmente recebido por mais de 20 (vinte) anos.
- Rejeitada, ainda, o pleito de suspensão do processo até julgamento do Recurso Extraordinário 669069. Considerando que o Pretório Excelso não determinou a suspensão dos processos, não há razão plausível, nem autorizativo legal, para a pretendida suspensão.
- Apelação não provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação e lhe negar provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 27 de novembro de 2017.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005166-72.2015.4.03.6109/SP
2015.61.09.005166-3/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias
APELANTE:MARIA ANTONIA DE LIMA PADUA
ADVOGADO:SP275068 ULISSES ANTONIO BARROSO DE MOURA e outro(a)
APELADO(A):Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
No. ORIG.:00051667220154036109 1 Vr PIRACICABA/SP

RELATÓRIO


O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta pela ré em face da r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido apresentado pelo INSS, a fim de condená-la à devolução das prestações recebidas por meio de fraude, concernentes ao benefício previdenciário de sua tia falecida (NB 32/77.827.505-1), no período de 02/1986 a 07/2007, mantida a antecipação dos efeitos da tutela, determinado o imediato bloqueio de contas bancárias e aplicações financeiras da ré.

Em razões de recurso, pugna pela reforma do julgado alegando que: a) a parte autora recebeu a aposentadoria de boa-fé por destinar os valores fraudulentamente recebidos para o sustento de suas irmãs; b) irrepetibilidade das verbas alimentares; c) prescrição trienal ou quinquenal. Requer, ainda, a suspensão do processo até julgamento do Recurso Extraordinário 669069.

Contrarrazões apresentadas.

Subiram os autos a esta egrégia Corte, redistribuídos estes autos à Terceira Seção.

É o relatório.


VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos recurso, porquanto presentes os requisitos legais.

A r. sentença merece ser integralmente mantida pelas razões que passo a expor.

Dito isso, já pode ser adiantado que as alegações do impetrante não devem medrar.

A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista.

Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie.

A Administração pode rever seus atos. Ao final das contas, a teor da Súmula 473 do E. STF:

"A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial".

Por um lado, quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91.

Trata-se de norma cogente, que obriga o administrador a agir, sob pena de responsabilidade.

A lei normatizou a hipótese fática controvertida nestes autos e já trouxe as consequências para tanto, de modo que não cabe ao juiz fazer tabula rasa do direito positivo.

Trata-se de caso de enriquecimento ilícito (ou enriquecimento sem causa ou locupletamento).

O Código Civil estabelece, em seu artigo 876, que, tratando-se de pagamento indevido, "Todo aquele que recebeu o que não era devido fica obrigado a restituir".

Além disso, deve ser levado em conta o princípio geral do direito, positivado como regra no atual Código Civil, consistente na proibição do enriquecimento ilícito.

Assim reza o artigo 884 do Código Civil:

"Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido."

Segundo César Fiuza, em texto intitulado "O princípio do enriquecimento sem causa e seu regramento dogmático", publicado no site arcos.gov.br, esses são os requisitos para a sua configuração:

"1º) Diminuição patrimonial do lesado.

2º) Aumento patrimonial do beneficiado sem causa jurídica que o justifique. A falta de causa se equipara à causa que deixa de existir. Se, num primeiro momento, houve causa justa, mas esta deixou de existir, o caso será de enriquecimento indevido. O enriquecimento pode ser por aumento patrimonial, mas também por outras razões, tais como, poupar despesas, deixar de se empobrecer etc., tanto nas obrigações de dar, quanto nas de fazer e de não fazer.

3º) Relação de causalidade entre o enriquecimento de um e o empobrecimento de outro. Esteja claro, que as palavras "enriquecimento" e "empobrecimento" são usadas, aqui, em sentido figurado, ou seja, por enriquecimento entenda-se o aumento patrimonial, ainda que diminuto; por empobrecimento entenda-se a diminuição patrimonial, mesmo que ínfima.

4º) Dispensa-se o elemento subjetivo para a caracterização do enriquecimento ilícito. Pode ocorrer de um indivíduo se enriquecer sem causa legítima, ainda sem o saber. É o caso da pessoa que, por engano, efetua um depósito na conta bancária errada. O titular da conta está se enriquecendo, mesmo que não o saiba. Evidentemente, os efeitos do enriquecimento ocorrido de boa-fé, não poderão ultrapassar, por exemplo, a restituição do indevidamente auferido, sem direito a indenização."

Como se vê do item quarto do parágrafo anterior, dispensa-se o elemento subjetivo (ou seja, a presença de má-fé) para a caracterização do enriquecimento ilícito e do surgimento do dever de restituir a quantia recebida.

Para além, não há previsão de norma (regra ou princípio) no direito positivo brasileiro determinando que, por se tratar de verba alimentar, o benefício é irrepetível.

A construção jurisprudencial, que resultou no entendimento da irrepetibilidade das rendas recebidas a título de benefício previdenciário, por constituírem verba alimentar, pode incorrer em negativa de vigência à norma do artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91.

E as regras acima citadas, previstas na lei e regulamentadas no Decreto nº 3.048/99, não afrontam a Constituição Federal. Logo, são válidas e eficazes.

A Justiça, a propósito, avançou na análise das questões relativas à repetibilidade de prestações previdenciárias.

Com efeito, quanto aos casos de revogação da tutela antecipada, há inúmeros precedentes na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que abordaram a questão.

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, uniformizou o entendimento quanto à necessidade de devolução, consoante se observa da análise da seguinte ementa:

"PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. REVOGAÇÃO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA-FÉ PELA PARTE SEGURADA. REPETIBILIDADE. A Primeira Seção, em 12.6.2013, por maioria, ao julgar o Resp 1.384.418/SC, uniformizou o entendimento no sentido de que é dever do titular de direito patrimonial devolver valores recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada. Nesse caso, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até dez por cento da remuneração dos benefícios previdenciários recebidos pelo segurado, até a satisfação do crédito. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes. Recurso (EDcl no AgRg no AREsp 321432 / DF, EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL, 2013/0092073-0, Relator(a) Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento, 05/12/2013, Data da Publicação/Fonte, DJe 16/12/2013, RDDP vol. 132 p. 136)

Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido ao regime de repetitivo, consolidou o entendimento de que, em casos de cassação de tutela antecipada, a lei determina a devolução dos valores recebidos, ainda que se trate de verba alimentar e ainda que o beneficiário aja de boa-fé:

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REJULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL DETERMINADO PELO STF. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE CASSADA. POSSIBILIDADE. MATÉRIA DECIDIDA EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. 1. Rejulgamento do feito determinado pelo Supremo Tribunal Federal, ante o reconhecimento de violação ao art. 97 da Constituição Federal e à Súmula Vinculante 10 do STF. 2. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do Resp 1.401.560/MT, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, pacificou o entendimento de que é possível a restituição de valores percebidos a título de benefício previdenciário, em virtude de decisão judicial precária posteriormente revogada, independentemente da natureza alimentar da verba e da boa-fé do segurado. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido" (REsp 995852 / RS, RECURSO ESPECIAL, 2007/0242527-4, Relator(a) Ministro GURGEL DE FARIA, Órgão Julgador, T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento, 25/08/2015, Data da Publicação/Fonte, DJe 11/09/2015).

Sendo assim, não se pode simplesmente ignorar as circunstâncias absolutamente criminosas que envolveram a manutenção do pagamento da pensão por morte à autora.

Ora, Antonia Ferreira de Queiróz, já qualificada, requereu e obteve o pagamento de aposentadoria por invalidez nº 32/77.827.501-1, com DIB em 08/11/1985. Contudo, Antonia faleceu em 27/02/1986.

Por denúncia anônima, foi constatado que a autora, sobrinha de Antonia, continuou a receber o benefício por mais de 20 (vinte) anos, utilizando-se de ardil (levava outra pessoa parecida fisicamente com Antonia) e documento falso.

A ré, mesmo depois de instaurado o procedimento administrativo, recalcitrou nas condutas fraudulentas, tentando ludibriar o INSS, tendo se comprometido a levar pessoalmente a beneficiária para reconhecimento...

Enfim, apurada a fraude, a ré foi processada e condenada criminalmente, à penas (ínfimas, diga-se de passagem, já que legislação criminal aplicável revelou-se assaz branda) descritas à f. 91.

De qualquer forma, como explicado acima, nem o artigo 884 do Código Civil, nem o artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91 exigem - para a devolução do indevido - comprovação de dolo do beneficiado, ou mesmo condenação como coautor no processo criminal.

Nada obstante, o dolo resta evidenciado, diante da pletora de provas que levaram à condenação criminal, inclusive com confissão da ré.

Quanto às alegações de prescrição, não prosperam.

A regra do artigo 103-A da Lei nº 8213/91 - norma especial em relação ao Decreto nº 20.910/32 - afasta a decadência do direito de revisão da Administração Pública, no caso de existência de má-fé. Não há falar-se em prescrição no caso, mas em decadência, essa que não se verificou.

À nitidez, tal regra não deve incidir no caso de benefícios concedidos fraudulentamente, sob pena de agressão aos próprios princípios constitucionais da moralidade administrativa, da legalidade, da impessoalidade e da eficiência (artigo 37, caput, da Constituição Federal).

De todo modo, deve prevalecer no caso a regra do artigo 37, § 5º, da Constituição Federal, que tem a seguinte redação:

"§ 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento."

Uma vez patenteado o dolo da agente, beneficiária de aposentadoria recebida fraudulentamente, não há falar-se em prescrição das prestações.

No tocante à alegação de "boa-fé", por ter usado o dinheiro ilegalmente recebido supostamente para custear as despesas das irmãs, não aberrasse do senso mínimo de justiça, aberraria do senso lógico porquanto o crime estelionato é incompatível, logicamente, com a alegada "boa-fé", afigurando-se irrelevante, para fins de repetição do indébito, o destino dado ao dinheiro espoliado do pobre contribuinte brasileiro.

Rejeito, ainda, o pleito de suspensão do processo até julgamento do Recurso Extraordinário 669069, que tem a seguinte ementa:

"ADMINISTRATIVO. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PRESCRIÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA RESSALVA FINAL PREVISTA NO ARTIGO 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. Apresenta repercussão geral o recurso extraordinário no qual se discute o alcance da imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário prevista no artigo 37, § 5º, da Constituição Federal" (RE 669069 RG / MG - MINAS GERAIS, REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Julgamento: 02/08/2013, Tribunal Pleno).

Considerando que o Pretório Excelso não determinou a suspensão dos processos, não há razão plausível, nem autorizativo legal, para a pretendida suspensão.

Em derradeiro, observo que o presente caso não se enquadra na hipótese de erro administrativo cadastrada pelo Superior Tribunal de Justiça como "TEMA REPETITIVO N. 979" - (Ofício n. 479/2017- NUGEP, de 17/8/2017).

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO.

É como voto.


Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): RODRIGO ZACHARIAS:10173
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Data e Hora: 29/11/2017 15:11:47



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