Processo
ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / SP
6080812-14.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
20/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 25/03/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONVERSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE
ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. REQUISITOS PREENCHIDOS.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a
1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), PPP e laudo técnico, atestam o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
desempenho das atividades de enfermeira, com exposição, habitual e permanente, a agentes
biológicos (microrganismos - vírus, bactérias e parasitas), fato que permite o enquadramento em
conformidade com as normas regulamentares.
- A parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo,
faz jus à revisão do benefício para a conversão em aposentadoria especial, nos termos do artigo
57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Diferentemente do benefício por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é
incompatível com a própria natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor sob
condições especiais na pendência de demanda judicial, revelaria cautela do segurado e não
atentaria contra os princípios gerais de direito; ao contrário, privilegiaria norma protetiva do
trabalhador
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº6080812-14.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA LILIAN FERRO BONACIM DITADI
Advogados do(a) APELADO: MAYARA LINDA FIRMINO DA COSTA - SP347051-N, LUCILENE
SANCHES - SP103889-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº6080812-14.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA LILIAN FERRO BONACIM DITADI
Advogados do(a) APELADO: MAYARA LINDA FIRMINO DA COSTA - SP347051-N, LUCILENE
SANCHES - SP103889-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço
especial, com vistas à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, para conversão em
aposentadoria especial.
A sentença julgou procedente o pedido, para enquadrar como atividade especial o período de
06/03/1997 a 18/05/2012, bem como determinar a conversão do benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição em aposentadoria especial, fixando o termo inicial dos efeitos financeiros
na data do requerimento administrativo. Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação, no qual impugna o enquadramento
efetuado e requer seja julgado improcedente o pedido. Subsidiariamente, insurge-se contra o
termo inicial dos efeitos financeiros.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº6080812-14.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA LILIAN FERRO BONACIM DITADI
Advogados do(a) APELADO: MAYARA LINDA FIRMINO DA COSTA - SP347051-N, LUCILENE
SANCHES - SP103889-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: o recurso atende aos pressupostos de
admissibilidade e merece ser conhecido.
Não obstante, não deve ser conhecida a remessa oficial, por ter sido proferida a sentença na
vigência do atual CPC, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
Neste caso, à evidência, esse montante não é alcançado.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais
do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Neste caso, em relação ao intervalo de 06/03/1997 a 18/05/2012, a parte autora logrou
demonstrar, via anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), PPP e laudo
técnico, o desempenho das atividades de enfermeira, com exposição, habitual e permanente, a
agentes biológicos (microrganismos - vírus, bactérias e parasitas), fato que permite o
enquadramento nos termos dos códigos 1.3.2 do anexo do Decreto n. 53.831/64, 1.3.4 e 2.1.3 do
anexo do Decreto n. 83.080/79 e 3.0.1 dos anexos dos Decretos n. 2.172/97 e n. 3.048/99.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas no formulário, concluo que, na hipótese,
o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Destarte, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas no
interregno debatido.
Nessas circunstâncias, somado o período ora reconhecido aos intervalos incontroversos, a parte
autora conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, faz jus à
revisão do benefício para a conversão em aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e
parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
O termo inicial dos efeitos financeiros da revisão deve ser mantido na data do requerimento
administrativo (DER – 18/05/2012), uma vez que a especialidade da atividade ficou demonstrada
pelos documentos juntados no processo administrativo e a parte autora já cumpria o requisito
temporal para o deferimento da aposentadoria especial em tal data.
No tocante ao pedido de reconhecimento da aplicabilidade imediata do disposto no artigo 57, §
8º, da Lei n. 8.213/1991, saliento que, diferentemente do benefício por incapacidade, cujo
exercício de atividade remunerada é incompatível com a própria natureza da cobertura
securitária, a continuidade do labor sob condições especiais na pendência de demanda judicial,
revelaria cautela do segurado e não atentaria contra os princípios gerais de direito; ao contrário,
privilegiaria norma protetiva do trabalhador.
A vedação prevista no artigo 46 da Lei n. 8.213/1991, cuja remissão fez o seu artigo 57, §8º,
obsta o recebimento conjunto de aposentadoria especial da Previdência Social e de salário
decorrente de atividade considerada especial, somente no caso de o segurado "retornar
voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data
do retorno".
Nesse diapasão, não se cogita de aplicação dos artigos 46 e 57, §8º, da Lei n. 8.213/1991,
direcionados aos aposentados que continuam no exercício da atividade laborativa que os sujeite
a agentes nocivos, aos segurados que tenham permanecido no ofício após o indeferimento do
benefício na via administrativa.
Forçoso concluir que a continuidade do exercício da atividade até então exercida, ocorre em
virtude da espera do segurado pelo julgamento da demanda.
Nesse sentido: TRF 3ª Região - Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2276133 0035779-74.2017.4.03.9999,
DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN, NONA TURMA, e-DJF3: 8/2/2018; AC -
APELAÇÃO CÍVEL - 2013635 - 0003331-94.2012.4.03.6128, DESEMBARGADORA FEDERAL
MARISA SANTOS, julgado em 12/06/2017, e-DJF3: 28/6/2017; AC - APELAÇÃO CÍVEL -
2193481 - 0002262-54.2016.4.03.6106, DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO,
DÉCIMA TURMA, julgado em 25/04/2017, e-DJF3: 4/5/2017.
Insta acrescentar, ainda, que cabe ao INSS, após a implantação do benefício de aposentadoria
especial, tomar as providências administrativas pertinentes à verificação da continuidade do labor
ou retorno do segurado à atividade especial, nos termos do art. 46 e art. 57, §8º, da Lei n.
8.213/1991.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial e nego provimento à apelação do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONVERSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE
ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. REQUISITOS PREENCHIDOS.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a
1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Anotação em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), PPP e laudo técnico, atestam o
desempenho das atividades de enfermeira, com exposição, habitual e permanente, a agentes
biológicos (microrganismos - vírus, bactérias e parasitas), fato que permite o enquadramento em
conformidade com as normas regulamentares.
- A parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo,
faz jus à revisão do benefício para a conversão em aposentadoria especial, nos termos do artigo
57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Diferentemente do benefício por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é
incompatível com a própria natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor sob
condições especiais na pendência de demanda judicial, revelaria cautela do segurado e não
atentaria contra os princípios gerais de direito; ao contrário, privilegiaria norma protetiva do
trabalhador
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA