
| D.E. Publicado em 11/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 26/02/2019 18:13:43 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018317-58.2008.4.03.6301/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de ação ajuizada em face do INSS objetivando o cômputo do tempo de serviço prestado na Argentina e a posterior conversão do benefício de aposentadoria por idade para aposentadoria por tempo de serviço,
A r. sentença julgou improcedente o pedido sob os seguintes fundamentos: que os documentos referentes aos vínculos mantidos no exterior não servem de prova, pois foram juntados aos autos sem a tradução juramentada; que todos os trabalhos foram realizados entre as décadas de 1950 e 1970, anteriormente à vigência do Acordo Internacional (Decreto nº 87.918/82), o que afasta sua aplicação; e que a parte autora não pleiteou administrativamente o cômputo do tempo de serviço até 30/05/2005, data limite fixada pelo artigo 547 da IN 20/2007 do INSS, que regulamentou a situação dos segurados após a derrogação do referido acordo.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, que o artigo XVIII do Acordo Bilateral dispensa a tradução. Ademais, afirma que o artigo XI do referido Acordo permite sua aplicação para períodos anteriores, desde que o segurado tenha também períodos de serviço posteriores à sua vigência, destacando-se que não há exigência de que esses períodos sejam no país de origem. Aduz não ser exigência legal o prévio requerimento administrativo e, ainda que o fosse, há pedido administrativo do segurado para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Por fim, requer a procedência dos pedidos, nos termos inicialmente pleiteados.
O INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo o recurso de apelação, haja vista ser tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
Trata-se de ação ordinária objetivando a averbação de tempo serviço prestado no exterior (Argentina), fundada em acordo internacional, para que seja reconhecida a soma de 34 anos, 09 meses e 18 dias, e posteriormente, seja convertida a aposentadoria por idade em aposentadoria por tempo de contribuição.
Como cediço, com a celebração de acordo internacional de seguridade social, o ordenamento pátrio admite a contagem de tempo de serviço prestado no exterior, observada a reciprocidade. Nesse sentido, o Congresso Nacional aprovou, pelo Decreto Legislativo nº 95, de 05 de outubro de 1982, o Acordo de Previdência Social entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Argentina, celebrado em Brasília, a 20 de agosto de 1980. Através do Decreto nº 87.918, de 07 de dezembro de 1982, foi promulgado o referido acordo. Posteriormente, em 2005, o acordo bilateral foi derrogado pelo Acordo Multilateral de Seguridade Social do Mercado Comum do Sul, promulgado pelo Decreto nº 5.722, de 13 de março de 2006.
Verifica-se que os documentos acostados aos autos para comprovar as atividades laborais encontram-se em língua estrangeira, sem a devida tradução juramentada, conforme exigido pelo artigo 157, do CPC/73, vigente à época, verbis: "Só poderá ser junto aos autos documento redigido em língua estrangeira, quando acompanhado de versão em vernáculo, firmada por tradutor juramentado".
No entanto, o Acordo Bilateral, internalizado no ordenamento jurídico pelo Decreto supracitado, dispõe:
Da mesma forma, dispõe o Acordo de Seguridade Social do MERCOSUL (DECRETO Nº 5.722, DE 13 DE MARÇO DE 2006):
Esclareça-se, ainda, que, nos termos do artigo 2, do Acordo Multilateral (Decreto nº 5.722/06):
Destaque-se que, conforme o artigo 85-A da Lei nº 8.212/91, reproduzido no artigo 382 do Decreto 3.048/99, acordos internacionais são considerados normas previdenciárias especiais para fins de interpretação, in verbis: "Os tratados, convenções e outros acordos internacionais de que Estado estrangeiro ou organismo internacional e o Brasil sejam partes, e que versem sobre matéria previdenciária, serão interpretados como lei especial.".
Portanto, diante da expressa dispensa prevista em norma especial e considerada a tramitação do requerimento administrativo perante a entidade gestora brasileira (INSS), instruído com documentos e certidões emitidas pelo órgão competente argentino - ANSES, despicienda é a tradução dos documentos pelo beneficiário.
Salienta-se, por fim, que os documentos encontram-se autenticados pelo cônsul adjunto da Argentina.
Quanto à aplicação do Acordo Bilateral (Dec. 87.918/82), aos períodos anteriores ao início da vigência, dispõe o seu artigo XI:
No caso dos autos, verifica-se que a parte autora possui períodos de serviço após 1982 (fls. 328/329), aplicável, assim, o referido acordo previdenciário. Ressalta-se que não se exigiu que o período de serviços posterior ocorra no Estado de origem, como alega o INSS, bastando período de serviço após a vigência do acordo.
Verifica-se que o artigo 547 da Instrução Normativa nº 20/2007 do INSS, assegura o direito adquirido daqueles segurados que implementaram todos requisitos para o benefício, verbis:
Dessa forma, inexiste a limitação legal para o requerimento administrativo ser realizado até 30/05/2005 para o cômputo do tempo de serviço prestado no exterior. Ao contrário, o dispositivo ressalva expressamente que, por força do direito adquirido, serão reconhecidos os períodos cumpridos em outro Estado, desde que tenha implementado os requisitos para a concessão do benefício durante a vigência do acordo bilateral.
Em razão do disposto em Ajuste Administrativo realizado entre Argentina e Brasil em 06/07/1990 (conforme previsão do artigo XXVI do Decreto n° 87.918/82), vedou-se a averbação de tempo de serviço cumprido na Argentina para totalizar períodos visando à concessão de aposentadoria com base exclusivamente no tempo de serviço:
Nesse sentido, colaciono precedentes desta Corte Regional e do E. STJ:
Contudo, é pacífica a jurisprudência dos Tribunais Superiores o entendimento de que a legislação aplicável à aposentadoria é aquela vigente no período de implementação dos requisitos para a aposentação, ainda que pleiteada a concessão do benefício em momento posterior, por respeito ao direito adquirido. Nesse sentido:
No caso dos autos, verifica-se que comprovou a parte autora, os seguintes períodos de tempo de serviço laborado na Argentina:
- HARRODS de 07/02/1951 a 10/02/1953 (2 anos, 0 mês e 4 dias) - fls. 117/118;
- KAISER de 29/03/1955 a 27/03/1957 (1 ano, 11 meses e 29 dias) - fls. 123/133;
- DU PONTde 24/04/1957 a 15/06/1960 (3 anos, 1 mês e 22 dias) - fls. 136/140;
- HK FERGUSON de 08/08/1960 a 04/11/1960 (2 meses e 27 dias) - fls. 144/146;
- STEIN de 08/11/1960 a 30/05/1962 (1 ano, 6 meses e 23 dias) - fls. 150/158;
- CELULOSA de 31/05/1962 a 05/10/1964 (2 anos, 4 meses e 6 dias) - fls. 162/201;
- GYPSA de 06/10/1964 a 31/08/1965 (10 meses e 26 dias) - fls. 202/205;
- CAMEA de 06/09/1965 a 30/11/1965 (2 meses e 25 dias) - fls. 208/213;
- DU PONT de 01/12/1965 a 04/01/1968 (2 anos, 1 mês e 4 dias) - fls. 136/140;
- AUSTIN de 05/01/1968 a 10/01/1969 (1 ano, 0 mês e 6 dias) - 216/223;
- ADELPHIA de 14/01/1969 a 30/09/1970 (1 ano, 8 meses e 17 dias) - fls. 227/230 e fls. 375/392;
- LEDESMAde 03/09/1971 a 16/12/1972 (1 ano, 3 meses e 14 dias) - fls. 396/398);
- ATIde 16/05/1973 a 31/10/1973 (5 meses e 16 dias) - fls. 402/410);
- SERMA de 01/12/1973a 28/02/1974 (3 meses e 0 dia) - fl. 414;
- VIALCO de 01/03/1974 a 31/12/1974 (10 meses e 0 dia) - fls. 420/421.
No Brasil, comprova a parte autora que exerceu atividade laboral remunerada nos seguintes períodos:
- TDE-SERETE de 21/02/1975a 16/03/1979 (4 anos, 0 mês e 26 dias);
- INTER UHDE de 08/05/1979 a 09/02/1983 (3 anos, 9 meses e 2 dias);
- INTEL de 05/09/1983 a 01/07/1985 (1 ano, 9 meses e 27 dias);
- INTER UHDE de 27/04/1987 a 29/09/1990 (3 anos, 2 meses e 10 dias).
Verifica-se que até 06/07/1990 a parte autora totalizava tempo de serviço de 32 anos, 11 meses e 14 dias, bem como carência de 405 meses. Assim, inaplicável a vedação prevista no Ajuste Administrativo realizado entre Argentina e Brasil de 06/07/1990, uma vez que foram preenchidos os requisitos necessários para a aposentadoria por tempo de serviço.
Considerando os períodos de serviços prestados na Argentina, listados acima, que com base no Acordo deverão computados pelo INSS, verifica-se que o autor soma 33 anos, 2 meses e 7 dias de tempo de serviço e 407 meses de carência, até 29/09/1990, última data de trabalho. Aplicando-se a legislação então vigente, qual seja, Decreto nº 89.312/1984 - CLPS, em observância ao princípio tempus regit actum, o segurado faz jus à aposentadoria por tempo de serviço (art. 33, CLPS/84), com o cálculo elaborado conforme os artigos 23 e seguintes do D. 89.312/84.
Assim, a sentença deverá ser reformada para, reconhecendo o direito à averbação do tempo de serviço prestado na Argentina, possibilitar a conversão da aposentadoria por idade em aposentadoria por tempo de contribuição, conforme pedido, observando-se o direito à opção ao benefício concedido administrativamente.
No tocante ao termo inicial, deverá ser estabelecido na data da citação. Verifica-se que a autarquia previdenciária não dispunha na época da DER, nem na data da concessão do benefício de aposentadoria por idade, de todos os documentos comprobatórios dos períodos laborais na Argentina. Ademais, o autor requereu inicialmente a aposentadoria por idade (fl. 234), que, após a inércia em apresentar documentos exigidos e a aceitação pelo segurado, foi concedida (fl. 272). Ainda, o pedido administrativo de conversão em aposentadoria por tempo de contribuição apenas foi protocolizado em 03/05/2007 (fls. 285/288). Assim, razão não há para a fixação do termo inicial na DER (2003), quando sequer havia comprovação do tempo de serviço no estrangeiro.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o decidido pelo Plenário do C. STF, no julgamento do RE 870.947/SE, em Repercussão Geral, em 20/09/2017, Rel. Min. Luiz Fux, adotando-se no tocante à fixação dos juros moratórios o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, e quanto à atualização monetária, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
No tocante aos honorários advocatícios, estes ficam a cargo do INSS, diante da sucumbência mínima da parte autora (artigo 86, parágrafo único), fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, todos do Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, para, reformando a sentença, julgar parcialmente procedente o pedido e condenar o INSS a reconhecer o exercício de atividade laboral na Argentina e converter o benefício de aposentadoria por idade (NB 131.773.043-4) em por tempo de serviço, desde a citação, observada a opção pelo benefício concedido administrativamente, bem como alterar as verbas de sucumbência, e fixar a aplicação de juros e correção monetária conforme a fundamentação supra.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 26/02/2019 18:13:40 |
