
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005009-08.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: NOE GOMES DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO - SP119377-A, TAINAN PEREIRA ZIBIANI CRESPILHO - SP323143-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005009-08.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: NOE GOMES DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO - SP119377-A, TAINAN PEREIRA ZIBIANI CRESPILHO - SP323143-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. (grifo nosso)
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir." (RE 631.240 , Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014)
No caso dos autos, não há falar em ausência de prévio requerimento administrativo. A parte autora pretende com a presente demanda o restabelecimento do benefício de auxílio-doença, requerido em 25/09/2017 e suspenso na via administrativa, em razão de alta programada, ocasião em que a autarquia constatou a capacidade laborativa do segurado, em 07/01/2018 (Id 134708033 - Pág. 44), para que seja reconhecido o seu direito ao benefício desde a data do cancelamento, com pagamento dos valores atrasados.
Portanto, a parte autora tem interesse processual, não havendo necessidade de novamente provocar a via administrativa, pois o INSS já se manifestou pela negativa do benefício requerido em 07/01/2018. Ademais, o direito ao benefício desde a data do cancelamento é questão que demanda análise de prova e, portanto, afeta ao mérito. Observando-se, ainda, que no julgamento do RE nº 631240, o E. STF não fixou prazo para a parte autora ingressar na via judicial após o indeferimento ou cancelamento na via administrativa.
Assim, além de utilizar-se da ação adequada é evidente a utilidade do pedido, consoante a pacífica jurisprudência do STF, do STJ e precedentes desta Corte Regional.
Desta forma, não há falar em extinção do processo sem resolução do mérito, por falta de interesse de agir da parte autora.
Contudo, não é caso de aplicação do disposto no artigo 1.013, §3º, do Código de Processo Civil, por não estar a lide em condições de imediato julgamento.
Dessa maneira, a sentença deve ser anulada, com o retorno dos autos à Vara de origem para o prosseguimento do feito.
Diante do exposto,
DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA
, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para prosseguir com a instrução do feito, nos termos da fundamentação.É o voto.
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V O T O V I S T A
Cuida-se de apelação de sentença que extinguiu o feito, sem resolução do mérito, com fundamento em falta de interesse de agir por ausência de prévio requerimento administrativo.
A e. Relatora deu provimento à apelação com fundamento da inexigibilidade de requerimento administrativo em sede de pedido de restabelecimento de auxílio doença cessado em decorrência de alta programada.
De outro lado, o e. Desembargador Nelson Porfírio apresentou voto divergente no sentido do desprovimento do recurso em razão de que a alta programada tem previsão legal no Art. 60, § 8º da Lei 8.213/91 e que, embora conste pedido de prorrogação, com agendamento de exame para 14.03.2018 (ID 134708033 - Pág. 46), não foi juntada aos autos a decisão acerca de tal requerimento, nem tampouco comprovado que a parte autora compareceu à perícia agendada, o que caracteriza fato novo não levado à conhecimento da Administração Pública, conforme item 4 do RE 631.240.
Com a devida vênia ao voto divergente, acompanho integralmente os fundamentos da e. Relatora por não reconhecer a ocorrência de fato novo, mas sim o julgamento da evolução do quadro de incapacidade laboral decorrente de uma mesma enfermidade cuja discussão restringe-se à permanência ou não da necessidade de afastamento da atividade.
Vale dizer, o interesse recursal já havia sido constatado quando do primeiro indeferimento do benefício na via administrativa e eventual cessação posterior do benefício, seja por alta programada ou por realização de nova perícia, integra o objeto de julgamento de mérito na ação em curso e não tem o condão de descaracterizar o interesse de agir que já havia sido aferido.
Ante o exposto, dou provimento à apelação para anulação da sentença recorrida.
É o voto.
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V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio: Em Sessão realizada pela Décima Turma desta E. Corte em 15.09.2020, a Exma. Desembargadora Federal Lucia Ursaia, em ação de conhecimento pleiteando a concessão de benefício por incapacidade, proferiu voto para dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para prosseguir com a instrução do feito.
Solicitei vista dos autos, para melhor analisar as questões trazidas à discussão, especialmente quanto à necessidade de requerimento administrativo.
Inicialmente, anoto que restou definida pelo E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 631.240, com repercussão geral reconhecida, a questão relativa à necessidade de requerimento administrativo para os processos judiciais envolvendo a concessão ou o restabelecimento de benefício previdenciário, estabelecendo-se, ainda, regras de transição para as ações distribuídas até 03.09.2014:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir." (STF, Tribunal Pleno, RE 631240 / MG, Rel. Min. Roberto Barroso, j. em 03/09/14, DJe em 10/11/2014).
Assim, revi posicionamento anterior, em que afastava a necessidade de requerimento administrativo nos quais já havia tido julgamento com resolução do mérito, e passei a adotar o entendimento de que, em se tratando de pedido de concessão de benefício previdenciário posterior a 03.09.2014, independentemente do andamento do processo, é indispensável a formulação de prévio requerimento administrativo, não se configurando ameaça ou lesão a direito antes de sua análise e rejeição pelo INSS, sendo este o caso dos autos.
Observo que a parte autora requereu o benefício de auxílio doença NB 31/619.563.903-0 em 01.08.2017, o qual foi deferido até 07.10.2017, com a possibilidade de requerer a prorrogação do benefício, em caso de ainda se sentir incapacitado (ID 134708033 - Pág. 45). Tal benefício foi prorrogado até 08.01.2018, igualmente com a possibilidade de requerer a prorrogação do benefício (ID 134708033 – Pág. 44).
Embora conste pedido de prorrogação, com agendamento de exame para 14.03.2018 (ID 134708033 - Pág. 46), não foi juntada aos autos a decisão acerca de tal requerimento, nem tampouco comprovado que a parte autora compareceu à perícia agendada.
Por determinação do MM. Juízo, a parte autora formulou novo requerimento administrativo, com perícia agendada para 07.05.2018 (ID 134708034 - Pág. 48). Determinada a juntada da decisão indeferitória, manifestou-se a parte autora informando que compareceu na data designada, mas que a perícia não teria se realizado em razão de manter vínculo empregatício em aberto, sendo necessário que o agendamento fosse efetuado pelo empregador.
Determinada a intimação da Autarquia para se manifestar sobre tal alegação, foi informado que a parte autora não compareceu à perícia, bem como que não foi informada a data de afastamento do trabalho, apesar de intimada para regularizar tal pendência (ID 134708034 - Pág. 56).
Novamente intimada a parte autora para comprovar o indeferimento do benefício, foi informada a nova data da perícia para 18.03.2019, não tendo sido apresentado o resultado do pedido, apesar de intimada a parte autora por diversas vezes.
Anoto, ainda, que a fixação de prazo de gozo do benefício encontra amparo legal no artigo 60, §8º, da Lei nº 8.213/1991, com a redação da Lei nº 13.457/2017, que resultou da conversão da Medida Provisória nº 767/2017:
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.
(...).
§ 8o Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.
Embora se trate de caso de restabelecimento / manutenção de benefício, hipótese em que inicialmente o prévio requerimento administrativo seria dispensável, o pedido não pode ser formulado diretamente em juízo, uma vez que sua apreciação depende da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
Assim, considerando que a matéria não foi levada ao conhecimento da Autarquia, deve ser aplicado o item 4 do julgado, com a manutenção da r. sentença.
Ante o exposto, com a máxima vênia, divirjo da E. Desembargadora Federal Relatora, para negar provimento à apelação da parte autora.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. Havendo a comprovação da prévia postulação administrativa, fica afastada a extinção do processo sem resolução do mérito, ante a falta de interesse de agir da parte autora.
2. Sentença anulada, determinando-se o retorno dos autos à Vara de Origem para o regular prosseguimento do feito.
3. Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, após o voto-vista do Des. Fed. Baptista Pereira, no sentido de acompanhar o voto da Relatora, no que foi seguido pelo Des. Fed. Sergio Nascimento, a Décima Turma, por maioria, decidiu DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para prosseguir com a instrução do feito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
