
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003584-16.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: JOAO DE SOUSA CARVALHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIA EDMAR VIEIRA MOREIRA - SP362026-A, CLOVIS BEZERRA - SP271515-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO DE SOUSA CARVALHO
Advogados do(a) APELADO: ANTONIA EDMAR VIEIRA MOREIRA - SP362026-A, CLOVIS BEZERRA - SP271515-A
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003584-16.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: JOAO DE SOUSA CARVALHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIA EDMAR VIEIRA MOREIRA - SP362026-A, CLOVIS BEZERRA - SP271515-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO DE SOUSA CARVALHO
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R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Desembargadora Federal GABRIELA ARAUJO (Relatora): Trata-se de recursos de apelação interpostos pela parte autora (Id. 127858009) e pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (Id. 127858010) em face de sentença (Id. 127858004) que julgou parcialmente procedente o pedido de concessão de aposentadoria especial, nos seguintes termos:
“Posto isto, a teor da fundamentação supra, julgo PARCIALMENTE Procedente os pedidos iniciais, para assegurar ao autor o direito ao cômputo do período de 09.08.1990 a 28.05.1995 (“VIAÇÃO SANTA MADALENA LTDA”) como exercido em atividade especial, devendo o INSS proceder à averbação aos demais períodos de trabalho já reconhecidos administrativamente, pertinentes ao processo administrativo NB 42/183.086.529-0.
Ante a sucumbência mínima do réu, condeno o autor ao pagamento da verba honorária, arbitrada em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, ficando suspensa a execução, nos termos do artigo 98, parágrafos 2º e 3º do Código de Processo Civil. Isenção de custas na forma da lei.
Sentença não sujeita ao reexame necessário, conforme artigo 496, § 3º, inc. I, do Código de Processo Civil.
Por fim, CONCEDO PARCIALMENTE a tutela antecipada, para o fim de determinar ao INSS que proceda, no prazo de 10 (dez) dias, após regular intimação, à averbação do lapso de 09.08.1990 a 28.05.1995 (“VIAÇÃO SANTA MADALENA LTDA”) como exercido em condições especiais, e a somatória aos demais já considerados administrativamente, atrelados ao processo administrativo NB 42/183.086.529-0.
Intime-se a Agência do INSS responsável (AADJ/SP), eletronicamente, com cópia desta sentença e da simulação administrativa (pgs.18/19 – ID 5147172), para cumprimento da tutela."
Em suas razões recursais, a parte autora sustenta a natureza especial dos períodos de labor exercido no cargo de cobrador em ônibus do transporte coletivo, em efetiva exposição a vibração de corpo inteiro – VCI, conforme comprovado pelos laudos técnicos de terceiros em funções análogas, e requer a concessão do benefício de aposentadoria especial. Subsidiariamente, requer a anulação para realização de perícia técnica no local de trabalho.
Por sua vez, o ente autárquico pleiteia a integral reforma da sentença sustentando a impossibilidade de reconhecimento de atividade especial por enquadramento de categoria profissional, destacando, ainda, a ausência de comprovação de efetiva exposição habitual e permanente aos agentes nocivos por laudo técnico contemporâneo.
Com contrarrazões (Id. 127858012), vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003584-16.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 52 - DES. FED. GABRIELA ARAUJO
APELANTE: JOAO DE SOUSA CARVALHO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIA EDMAR VIEIRA MOREIRA - SP362026-A, CLOVIS BEZERRA - SP271515-A
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V O T O
A Excelentíssima Desembargadora Federal GABRIELA ARAUJO (Relatora): Os recursos de apelação preenchem os requisitos normativos de admissibilidade previstos no artigo 1.010 do Código de Processo Civil, e, portanto, são conhecidos.
Objetiva a parte autora, ora apelante, a concessão do benefício de aposentadoria especial mediante o reconhecimento de tempo de serviço de natureza especial, alegando que exerceu a função de cobrador de ônibus, em efetiva exposição a vibração de corpo inteiro – VCI, nos períodos de 09/08/1990 a 28/04/1995, na VIAÇÃO SANTA MADALENA LTDA, de 28/04/1995 a 17/10/2002, também na VIAÇÃO SANTA MADALENA LTDA, de 02/02/2004 a 31/08/2013, na OAK TREE TRANSPORTES URBANOS LTDA, e de 01/10/2013 a 13/06/2017, na VIAÇÃO GATO PRETO LTDA.
A sentença de parcial procedência, indeferindo a produção de prova pericial no ambiente de trabalho, reconheceu a natureza especial apenas do período compreendido entre 09/08/1990 a 28/04/1995, por enquadramento na categoria profissional no item 2.4.4, do Decreto nº 53.831/64:
“Em relação ao período de 09.08.1990 a 17.10.2002 (“VIAÇÃO SANTA MADALENA LTDA”) trazido o PPP de pgs. 10/11 – ID 5147167, emitido em 15.10.2013, no qual assinalado que o autor exerceu o cargo de ‘cobrador’, com exposição ao agente nocivo ‘ruído’, ao nível de 69 dB. Com efeito, a cópia da CTPS de pg. 18 – ID 8437136 corrobora a informação de que autor trabalhou como cobrador. Em razão disso, é possível o enquadramento pela atividade, no Anexo 2.4.4., do Decreto 53.831/64, até 28.04.1995. Após tal período, necessária a existência de laudos técnicos ou, sendo o PPP, dos registros ambientais abrangendo todo o período. No caso, no campo afeto a tais registros, indicados somente os anos de 1996 e 1997, sem delimitar corretamente o início e fim das avaliações ambientais, como deveria; além de que, existente discrepância da informação, uma vez que o campo ‘observações’ informa que “as medições técnicas (laudos) iniciaram em 1999”. Ao período exercido após 05.03.1997, quando em vigor as normas do Decreto 2.172/97, pressuposto essencial à consideração da atividade como especial, a partir de então, seria o fático enquadramento da atividade exercida, em dito Ato Normativo. Na situação, contudo, o nível de ruído informado encontra-se abaixo do limite de tolerância. Portanto, passível o enquadramento do labor em atividade especial somente ao lapso entre 09.08.1990 a 28.05.1995".
Quanto à caracterização do denominado trabalho em regime especial, a jurisprudência consolidada é no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, consoante o preceito tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.310.034-PR – Tema 546).
O reconhecimento do tempo de trabalho especial, decorrente da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado, de modo permanente, não ocasional nem intermitente, submete-se às principais normas de regência, reconhecidas pela jurisprudência das Cortes Superiores.
Até o início de vigência da Lei nº 9.032, de 28/04/1995, que deu nova redação ao artigo 57, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, o reconhecimento da especialidade do trabalho ocorria mediante a prova do exercício da atividade, segundo as normas de regência da época, especialmente os Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979, cujo rol é exemplificativo, admitindo-se qualquer meio probatório, independentemente da existência de laudo técnico, nos termos do artigo 295 do Decreto nº 357/1991 e da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos - TFR.
A partir de 29/04/1995 até a data publicação da Lei nº 9.528/1997, em 10/12/1997, o enquadramento não ocorre mais em relação às atividades especiais por categoria profissional, passando a ser imprescindível a demonstração da exposição ao agente nocivo, admitindo-se a apresentação de formulário-padrão (DIRBEN-8030, DSS-8030, DISES BE 5235, SB-40) preenchido pela empresa (art. 260 da IN INSS 77, de 21/01/2015), independentemente de laudo técnico.
A Lei nº 9.528, de 10/12/97 (decorrente da conversão da Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/96), por sua vez, dispôs que a comprovação da efetiva sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde deveria ser formalizada mediante laudo técnico das condições ambientais de trabalho.
Assim, após 11/12/1997, o enquadramento se dá mediante apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), fundamentado em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) ou perícia/laudo técnico, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o artigo 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação da citada Lei nº 9.528/1997, pois, conforme o entendimento adotado nesta E. Décima Turma, apoiado em jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, de sorte que a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser de exigido a partir de então.
Nesse sentido, precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça: AgInt no REsp n. 2.000.792/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 21/12/2023; AgInt no AREsp 1326336/SP; Relatora Ministra ASSUSETE MAGALHÃES; j. 13/02/2023; DJe 17/02/2023. No mesmo sentido, julgado desta E. Décima Turma: ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP 0000391-37.2022.4.03.9999; Relator Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, j. 28/08/2024; DJEN DATA: 03/09/2024.
No caso dos autos, examinados os documentos apresentados verifica-se que os Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPS fornecidos pelo ex-empregadores, de ID. 127858000, ID. 127857919, págs. 10-22, não apontam a presença de vibração como fator de risco, em contrariedade aos diversos laudos técnicos periciais acostados pela parte autora (Id. 127857919, págs. 24 – Id. 127857920, pág. 09, Id. 127857924, e Id. 127857922), justificando a necessidade de realização de perícia técnica no local de trabalho para o deslinde das questões.
Assim, diante dos laudos periciais de terceiros apresentados, bem como considerando as notórias características do cargo de cobrador de ônibus, impõe-se o acolhimento do pedido de produção de prova pericial, necessária a dirimir a fundada dúvida quanto aos fatos alegados.
Portanto, no caso sub judice, a prolação de sentença pelo Juízo a quo sem a determinação da produção das provas essenciais ao julgamento da lide, especialmente a pericial, resultou em cerceamento de defesa.
Nesse sentido, é a jurisprudência desta E. Décima Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. ATIVIDADE ESPECIAL. SENTENÇA ANULADA PARA REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA.
1. Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
2. Para o reconhecimento da especialidade da atividade, o Art. 58, §§ 1º a 4º, da Lei 8.213/91, impõe aos empregadores a obrigação de fornecer os formulários, com base em laudos técnicos elaborados por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, especificando os agentes nocivos com as respectivas quantidades e níveis, se existentes no ambiente de trabalho.
3. Ao Tribunal, por também ser destinatário da prova, é permitido o reexame de questões pertinentes à instrução probatória, não sendo alcançado pela preclusão.
4. Sentença anulada, determinando-se o retorno dos autos ao Juízo de origem para reabertura da instrução processual.
5. Apelação do autor provida e remessa oficial, havida como submetida, e apelação do réu prejudicadas."
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002812-39.2019.4.03.6144, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 11/09/2024, DJEN DATA: 19/09/2024);
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. PRELIMINAR ACOLHIDA.
1. Os documentos apresentados não contêm informações suficientes para se apurar se a parte autora efetivamente foi submetida à ação de agentes agressivos durante todos os períodos em que laborou nas empresas elencadas na peça inaugural, sendo imprescindível, para o fim em apreço, a realização da perícia técnica.
2. A inexistência de prova pericial, com prévio julgamento da lide por valorização da documentação acostada aos autos caracterizou, por conseguinte, cerceamento de defesa.
3. Sentença anulada a fim de restabelecer a ordem processual e assegurar os direitos e garantias constitucionalmente previstos.
4. Preliminar acolhida para anular a sentença. Prejudicada a análise do mérito do recurso adesivo da parte autora, bem como da apelação do INSS."
(APELAÇÃO CÍVEL / SP; 5002790-17.2018.4.03.6111, Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 29/10/2019).
Logo, diante do cerceamento de defesa, é de rigor a anulação da sentença para que, após a oportunizar a produção da perícia técnica no local de trabalho, ainda que por similaridade, e o consequente exaurimento da instrução processual, outra seja proferida.
Diante do exposto, ACOLHO A MATÉRIA PRELIMINAR ARGUIDA NA APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA, determinando o retorno dos autos à Vara de Origem para prosseguir com a instrução do feito, notadamente para realização de perícia técnica, nos termos da fundamentação, RESTANDO PREJUDICADA A ANÁLISE DO MÉRITO DOS RECURSOS DE APELAÇÃO.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE DE NATUREZA ESPECIAL. VIBRAÇÃO DE CORPO INTEIRO – VCI. PROVA PERICIAL. NECESSIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR ACOLHIDA. SENTENÇA ANULADA.
- Quanto à caracterização do denominado trabalho em regime especial, a jurisprudência consolidada é no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, consoante o preceito tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.310.034-PR – Tema 546).
- Examinados os documentos apresentados verifica-se que, para os períodos posteriores a vigência da Lei nº 9.032, de 28/04/1995, os Perfis Profissiográficos Previdenciários - PPPS fornecidos pelo ex-empregadores não apontam a presença de vibração como fator de risco, em contrariedade aos diversos laudos técnicos periciais acostados pela parte autora, justificando assim a necessidade de realização de perícia técnica no local de trabalho para o deslinde das questões.
- A omissão pelo r. Juízo a quo na determinação da produção das provas necessárias ao julgamento do mérito resultou em cerceamento de defesa.
- Sentença anulada para determinar o retorno dos autos à Vara de origem a fim de que seja realizada prova técnica no local de trabalho, ainda que por similaridade, proferindo-se, após a conclusão da prova, nova decisão, como se entender de direito. Prejudicados os recursos de apelação.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
