
| D.E. Publicado em 23/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo legal, em juízo de retratação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001509-60.2004.4.03.6125/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de incidente de retratação encaminhado pela Excelentíssima Vice-Presidente desta Corte, nos termos do art. 543-C, § 7º, II, do Código de Processo Civil/1973, em razão da matéria veiculada no Recurso Especial interposto pela parte autora contra acórdão da 10ª Turma, o qual negou provimento ao seu agravo, para manter a improcedência do pedido de benefício assistencial.
Tendo em vista que o E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do art. 543-C do CPC/1973, ao apreciar Recurso Especial nº 1.112.557/MG, assentou entendimento de que a aferição da miserabilidade poderá, também, ser feita com base em elementos de prova colhidos ao longo do processo, observada as circunstâncias específicas relativas ao postulante do benefício, bem como Recurso Especial nº 1.355.052/SP de que o benefício recebido pelo idoso no valor de um salário mínimo deve ser excluído do cálculo da renda familiar do requerente.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): De início, impõe-se observar que, publicada a r. decisão recorrida e interposto o agravo em data anterior a 18/03/2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, consoante as conhecidas orientações a respeito do tema adotadas pelos C. Conselho Nacional de Justiça e Superior Tribunal de Justiça, as regras de interposição do presente recurso a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
Objetiva a parte autora com a presente ação a condenação do INSS ao pagamento do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e regulamentado pela Lei 8.742/93. Alega que não possui meios de prover a sua subsistência ou de tê-la provida por sua família.
A r. sentença (fls. 222/232) julgou improcedente o pedido inicial em razão de a renda familiar "per capita" superar o limite estabelecido no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93, deixando de condenar a parte autora ao pagamento das verbas sucumbenciais, uma vez que é beneficiária da gratuidade judiciária.
A parte autora apelou (fls. 236/258) alegando que não apresenta capacidade laborativa, seu marido é idoso e recebe benefício previdenciário no valor mínimo, bem como que o valor da renda recebida por seu neto não deve compor a base de cálculo do benefício, uma vez que ele não integra o núcleo familiar. Requer, ainda, que seja excluído do cálculo da renda "per capita" o valor da aposentadoria recebida pelo marido, nos termos do parágrafo único, do art. 34 da Lei 10.741/2003.
O Ministério Público Federal opinou pela improcedência do pedido inicial (fls. 276/277).
A r. decisão monocrática de relatoria da Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal Diva Malerbi (fls.279/282), em 08/04/2011, nos termos do art. 557 "caput", do Código de Processo Civil revogado, negou seguimento à apelação interposta pela parte autora, em razão da não comprovação da hipossuficiência econômica, tendo em vista que a renda familiar "per capita" demonstrada no estudo social supera ¼ do salário mínimo vigente à época.
Contra a r. decisão monocrática a parte autora interpôs agravo interno, em 07/12/2009 (fls. 284/309), que restou desprovido, nos termos do acórdão de fls. 313/320vº, proferido em 23/02/2010.
Tendo sido interposto recurso especial pela parte autora, objetivando a procedência do pedido de benefício assistencial.
Estabelece o art. 203, inciso V, da CF, que a assistência social será prestada à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem "não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família".
Em relação à matéria ora tratada o E. Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 567985, pelo voto de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, em 18/04/2013, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, estabelecendo que no contexto de significativas mudanças econômico-sociais, as legislações em matéria de benefícios previdenciários e assistenciais trouxeram critérios econômicos mais generosos, aumentado para ½ do salário mínimo o valor padrão da renda familiar per capita, como o do Programa Bolsa Família (Lei 10.836/2004), nos termos da ementa a seguir transcrita:
Lembrando, ainda, que nesta ocasião também foi julgado o Recurso Extraordinário nº 580.963, sob o rito da repercussão geral, declarando, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, e por omissão, sem a pronúncia de nulidade, do parágrafo único, do artigo 34, da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), sob o fundamento de que o normativo deixou de excluir o valor de até um salário mínimo dos benefícios assistenciais e previdenciários recebidos por pessoas com deficiência ou idosa, no cálculo da renda per capita do benefício assistencial.
De outro lado, os acórdãos paradigmas, Recursos Especiais Repetitivos nº 1. 355.052/SP e nº 1.112.557/MG também fixaram orientação no sentido de que a norma em causa não se mostra como o único critério possível para a apuração da necessidade do recebimento do benefício.
Por sua vez, a Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), alterou a redação do art. 20 da LOAS para incluir o § 11, que acolhe outros elementos de prova com condição da miserabilidade e da situação de vulnerabilidade do núcleo familiar do requerente de benefício, além do critério objetivo de renda mensal "per capita" no valor inferior a ¼ do salário mínimo.
Assim, deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
Razão assiste à agravante. Explico.
In casu, a parte autora comprovou mais de 65 anos quando do ajuizamento da presente ação, em 02/04/2004.
Por sua vez, o estudo social protocolado em 12/11/2007 (fls. 132/151) revela que seu núcleo familiar é formado por 3 (três) pessoas, a Autora, seu marido e um neto. Residem em casa própria, em boas condições de moradia, guarnecida por mobiliário em bom estado de conservação.
A renda familiar resume-se ao benefício de aposentadoria do cônjuge varão (82 anos), no valor de um salário mínimo, somado ao valor R$ 250,00 proveniente de "bico" que ele faz e do valor "aproximado" de R$ 250,00 recebido pelo neto que trabalha como "moto taxista".
Conforme relatado no estudo social o neto da requerente é alcóolatra e não contribui para as despesas da casa.
Anoto, também, que a ajuda financeira dos filhos não deve ser computada na renda familiar da requerente, uma vez que eles compõem núcleo familiar independente, conforme relatado no estudo social.
De outra parte, conforme a pacífica jurisprudência das cortes superiores o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo recebido pelo cônjuge da Autora deve ser excluído do cálculo da renda familiar "per capita" para a apuração da condição de hipossuficiente.
Sendo assim, há elementos suficientes para evidenciar as condições econômicas em que vive a parte autora, inserindo-se ela no grupo de pessoas economicamente carentes que a norma instituidora do benefício assistencial visou amparar, uma vez que os recursos obtidos pela família da parte requerente são insuficientes para cobrir os gastos ordinários, bem como tratamentos médicos e cuidados especiais que lhe são imprescindíveis.
E nessas condições, não é possível à parte autora ter vida digna, ou, consoante assevera a Carta Magna, permitir-lhe a necessária dignidade da pessoa humana ou o respeito à cidadania, que são, às expressas, tidos por princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.
Por tais razões, a parte autora faz jus à percepção do benefício assistencial, uma vez que restou demonstrado o implemento dos requisitos legais para sua concessão.
À míngua de comprovação de protocolização de requerimento administrativo, o benefício é devido a partir da data da citação do INSS (11/01/2006 - fl. 96vº), pois desde então o Instituto foi constituído em mora, nos termos do artigo 240 do Código de Processo Civil de 1973, atualmente disciplinado no art. 230 do NCPC.
Tendo em vista que em consulta feita ao MPAS/INSS Sistema Único de Benefícios, em terminal instalado no Gabinete desta Relatora, revela a existência, em favor da parte autora, do benefício nº NB 21/143.724.019-1, desde 05/08/2008 e, considerando que o benefício assistencial é inacumulável com a pensão o termo final do benefício, deve ser fixado nesta data.
Juros de mora e correção monetária na forma da legislação de regência.
No tocante à verba honorária, esta fica a cargo do INSS, uma vez que restou vencido na demanda, ora arbitrada em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento sufragado pela 10ª Turma desta Corte Regional.
Ressalte-se que a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, em juízo de retratação, nos termos do art. 543-C, § 7º, II, do Código de Processo Civil/1973, DOU PROVIMENTO AO AGRAVO LEGAL INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA para, reformar a decisão monocrática de fls. 279/282 e, em novo julgamento, dar parcial provimento à apelação da parte autora para condenar o INSS ao pagamento das parcelas do benefício assistencial, com termo inicial na data da citação, em 11/01/2006, e termo final, em 05/08/2008, acrescidas de juros mora, correção monetária e honorários advocatícios fixados em 15% sobre o valor da condenação, nos termos da fundamentação.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 15/06/2016 15:53:57 |
