
| D.E. Publicado em 27/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação em juízo de retratação parcial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 14/08/2018 19:48:17 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001263-73.2014.4.03.6138/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de Incidente de Retratação encaminhado, em 14/06/2018, pelo Excelentíssimo Senhor Vice-Presidente desta Corte, nos termos do art. 1.040, II, do Código de Processo Civil, em razão da matéria veiculada no Recurso Especial interposto pela parte autora contra acórdão da 10ª Turma, o qual negou provimento à sua apelação, para manter a improcedência do pedido de benefício assistencial.
Tendo em vista que o E. Superior Tribunal de Justiça, adotando a sistemática do art. 543-C do CPC/73, no Recurso Especial Repetitivo nº 1.355.052/SP fixou orientação no sentido de que o benefício previdenciário recebido pelo idoso no valor de um salário mínimo deve ser excluído do cálculo da renda "per capita" para fins de concessão do benefício assistencial, bem como que no julgamento Recurso Especial Repetitivo nº 1.112.557/MG, restou fixada a tese de que a delimitação do valor da renda familiar "per capita" prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do benefício assistencial previsto no art. 203, "caput" e inciso V da CF, os autos foram devolvidos para verificação da pertinência do juízo de positivo de retratação no recurso de apelação interposto pela parte autora.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Objetiva a parte autora com a presente ação a condenação do INSS ao pagamento do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e regulamentado pela Lei 8.742/93.
A r. sentença (fls. 282/286) julgou improcedente o pedido inicial, condenando-se a autora ao pagamento de honorários advocatícios, suspensa a execução, nos termos do art. 12, da Lei nº 1.060/50.
A parte autora apelou (fls. 292/438) requerendo a restabelecimento do benefício, alegando preencher os requisitos legais.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação.
Julgado em 28/03/2017 (fls.454/457), a 10ª Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação interposta pela autora, em razão da não comprovação da hipossuficiência econômica, tendo em vista que a renda familiar "per capita" demonstrada no estudo social supera ¼ do salário mínimo vigente à época.
A requerente interpôs Recurso Especial objetivando a reforma do acórdão para que seja reconhecido o direito da parte autora ao recebimento do benefício requerido.
Estabelece o art. 203, inciso V, da CF, que a assistência social será prestada à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem "não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família".
Com efeito, conforme certidão de interdição juntada à fl. 123, a parte autora é incapaz.
Quanto à insuficiência de recursos para prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família, ressalta-se que o objetivo da assistência social é prover o mínimo para a manutenção do idoso ou incapaz, de modo a assegurar-lhe uma qualidade de vida digna. Por isso, para sua concessão não há que se exigir uma situação de miserabilidade absoluta, bastando a caracterização de que o beneficiário não tem condições de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família.
Não se tem dúvida de que o § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 é constitucional, tendo o Supremo Tribunal Federal decidido nesse sentido (ADIN nº 1.232/DF, Relator p/ acórdão Ministro Nelson Jobim, j. 27/08/1998DJ 01/06/2001).
Todavia, o disposto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 não é o único meio de comprovação da miserabilidade do deficiente ou do idoso, devendo a respectiva aferição ser feita, também, com base em elementos de prova colhidos ao longo do processo, observadas as circunstâncias específicas relativas ao postulante do benefício. Lembra-se aqui precedente do Superior Tribunal de Justiça, que não restringe os meios de comprovação da condição de miserabilidade do deficiente ou idoso: "O preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar per capita inferior a 1/4 do salário-mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade da família do autor." (REsp nº435871/SP, Relator Ministro FELIX FISCHER, j. 19/09/2002, DJ 21/10/2002, p. 391).
A jurisprudência passou, então, a admitir a possibilidade do exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família, interpretação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do CPC (REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28/10/2009; DJ 20/11/2009).
A questão voltou à análise do Supremo Tribunal Federal, sendo que após o reconhecimento da existência de repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4.374 - PE, julgada em 18/04/2013, prevaleceu o entendimento segundo o qual as significativas mudanças econômicas, bem como as legislações em matéria de benefícios previdenciários e assistenciais trouxeram outros critérios econômicos que aumentaram o valor padrão da renda familiar per capita, de maneira que, ao longo de vários anos, desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS, passou por um processo de inconstitucionalização.
Lembrando, ainda, que nesta ocasião também foi julgado o Recurso Extraordinário nº 580.963, sob o rito da repercussão geral, declarando, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, e por omissão, sem a pronúncia de nulidade, do parágrafo único, do artigo 34, da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), sob o fundamento de que o normativo deixou de excluir o valor de até um salário mínimo dos benefícios assistenciais e previdenciários recebidos por pessoas com deficiência ou idosa, no cálculo da renda "per capita" do benefício assistencial.
De outro lado, os acórdãos paradigmas, Recursos Especiais Repetitivos nº 1. 355.052/SP e nº 1.112.557/MG também fixaram orientação no sentido de que a norma em causa não se mostra como o único critério possível para a apuração da necessidade do recebimento do benefício.
Por sua vez, a Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) incluiu o § 11 ao art. 20 da LOAS, acolhendo outros elementos de prova com condição da miserabilidade e da situação de vulnerabilidade do núcleo familiar do requerente de benefício, além do critério objetivo de renda mensal "per capita" no valor inferior a ¼ do salário mínimo.
Assim, deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
No caso dos autos, o laudo assistencial, às fls. 187/194, demonstrou que o núcleo familiar é composto por duas pessoas, a requerente e sua genitora. Não pagam aluguel, eis que a casa em que residem pertence a família (moradia cedida pela irmã da autora). A renda da família provém de benefícios previdenciários recebidos pela mãe da requerente (aposentadoria por idade e pensão por morte), ambos no valor de um salário mínimo. Foi relatado que a família recebe auxílio financeiro de familiares, bem como as contas de telefone e de energia elétrica são pagas pelo irmão da autora, micro empreendedor.
Não desconhece esta relatora que o Supremo Tribunal Federal, na sessão de julgamento realizada em 18/04/2013, no Recurso Especial 580963/PR, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, consignou que o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo recebido por idoso integrante do grupo familiar não pode compor o cálculo da renda familiar "per capita" para a apuração da condição de hipossuficiente da parte requerente do benefício assistencial.
Do mesmo modo, firmou-se a orientação, na análise do REsp. 1.355.052/SP, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, de que o art. 34, parágrafo único da Lei 10.741/2003 deve ser interpretado analogicamente, de modo que outros benefícios já concedidos a outro membro da família possam ser excluídos do cálculo da renda familiar para fins de concessão de benefício assistencial.
Tem-se assim, que o benefício ora requerido é uma garantia constitucional, de caráter assistencial, previsto no artigo 203,V, da Constituição Federal de 1988, regulamentado pelo artigo 20 da Lei 8.742/1993 e também pela Lei 10.741/2003, o Estatuto do Idoso, e consiste no pagamento de um salário mínimo mensal às pessoas com deficiência ou idosas, desde que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família.
De fato, nos termos da orientação jurisprudencial firmada pelas Cortes Superiores, deve ser excluído do cômputo o benefício previdenciário recebido pela mãe da requerente e integrante do núcleo familiar no valor de um salário mínimo.
Todavia, a mãe da autora recebe dois benefícios previdenciários de valor mínimo. Assim, a exclusão deve recair apenas em um dos benefícios, devendo ser analisada a composição da renda com os demais elementos de prova.
Não obstante a comprovação do requisito da deficiência, não há no conjunto probatório elementos que possam induzir à convicção de que a parte autora está entre o rol dos beneficiários do benefício, eis que não comprovou a miserabilidade, essencial à concessão do benefício assistencial.
Acerca da apuração das condições socioeconômicas em que vivem a parte autora e as pessoas de sua família, cumpre ressaltar que devem ser analisados além da renda per capta, todo o conjunto probatório produzido.
In casu, os elementos constantes dos autos permitem concluir pela ausência de miserabilidade da parte autora, não havendo violação ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003, nem a orientação do STF ou STJ, tendo em vista que a autora não apresenta sinais de hipossuficiência ou vulnerabilidade social, considerando, sobretudo, que os familiares prestam assistência financeira.
Dessa foram, embora esteja demonstrado que a requerente não possui renda, é possível concluir que é auxiliada pelos familiares, recebendo a assistência material necessária à sua subsistência. Assim, não faz jus à garantia constitucional, que prevê o direito ao benefício no valor de um salário mínimo ao deficiente ou ao idoso que não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido por seus familiares (CF, art. 203, inc. V), pois, mesmo excluído um benefício no valor mínimo, resta ainda mais um benefício, no valor de salário mínimo, bem como a família da autora lhe preta a assistência.
Diante do exposto, nos termos do artigo 1.040, II, do CPC, procedo a retratação parcial quanto à fundamentação do acórdão para constar a exclusão do cômputo de um benefício previdenciário recebido pela mãe da requerente e integrante do núcleo familiar no valor de um salário mínimo, mas com a manutenção do julgamento de improcedência do pedido inicial, na forma da fundamentação.
Oportunamente, retornem-se os autos à Vice-Presidência desta Egrégia Corte
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 14/08/2018 19:48:13 |
