
| D.E. Publicado em 16/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação interposta pelo INSS, para reconhecer a inexigibilidade do título judicial, em virtude de a obrigação nele consignada ser inconstitucional, condenando o embargado no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais devem ser arbitrados em 10% (dez por cento) do valor dos embargos, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0016223-69.2009.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, em ação ajuizada por EDUARDO PIACENTINI, em fase de execução.
A r. sentença, de fls. 39/41, julgou parcialmente procedentes os embargos opostos à execução de título judicial, para fixar o quantum debeatur em R$ 321.810,93 (trezentos e vinte e um mil, oitocentos e dez reais e noventa e três centavos), atualizados até junho de 2010, conforme apurado pela Contadoria Judicial. Não houve arbitramento de verba honorária, em razão da sucumbência recíproca.
Em suas razões recursais de fls. 49/54, o INSS sustenta, em síntese, ser inconstitucional a obrigação consignada no título judicial, pois a renda mensal inicial do benefício deve ser calculada conforme a lei vigente na data da concessão, ainda que seus requisitos tenham sido satisfeitos pelo segurado em momento anterior, uma vez que não há direito adquirido a regime jurídico. Por conseguinte, pede o reconhecimento da inexigibilidade do título judicial, em virtude do disposto no artigo 741, inciso V e parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973.
A parte embargada apresentou contrarrazões às fls. 58/60.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
A execução embargada refere-se à revisão de renda mensal inicial de benefício previdenciário.
A apreciação desta questão impõe a observância do quanto restou consignado no título judicial.
Na sentença prolatada no processo de conhecimento, a ação foi julgada procedente para condenar o INSS a proceder à "revisão do benefício previdenciário do(a) autor(a), de molde a se substituir a sua renda mensal inicial, pelo valor da renda mensal que o autor receberia caso houvesse se aposentado em 13 de janeiro de 1989, com os devidos reajustes, condenando, ainda, o réu ao pagamento das diferenças apuradas entre os valores devidos e aqueles efetivamente pagos, regularmente apuradas em liquidação de sentença, corrigidas monetariamente desde a data do vencimento e acrescidas de juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano, estes computados a partir da citação até do efetivo pagamento, aplicando-se o Provimento nº 26/97 da Corregedoria-Geral do Tribunal Federal da 3ª Região. Condeno, ainda, o Instituto Nacional do Seguro Social ao pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% (dez por cento) do valor da condenação (valores vencidos apenas)" (fl. 73/74 - autos principais).
Por se tratar de típico dispositivo remissivo, impende observar que o "benefício previdenciário (...) caso houvesse se aposentado em 13 de janeiro de 1989" a que faz alusão a sentença, integra a res judicata para todos os fins, devendo, portanto, ser elucidado o seu significado. No segundo parágrafo da fl. 70, o MM. Juízo de 1º grau de jurisdição explica que se trata do benefício de "aposentadoria por tempo de serviço proporcional".
Irresignado, o INSS interpôs recurso de apelação da mencionada sentença (fls. 76/89 - autos principais).
O v. Acórdão deste Egrégio Tribunal negou provimento à apelação do INSS e deu parcial provimento à remessa oficial apenas para reduzir a base de cálculo dos honorários advocatícios para os limites fixados na Súmula 111 do STJ (fls. 120/121 - autos principais).
Em suma, depreende-se do título judicial que o INSS foi condenado a recalcular a renda mensal inicial do benefício recebido pelo autor, ora embargado, pelo valor da aposentadoria proporcional a que teria direito em 13 de janeiro de 1989, com os devidos reajustes, pagando as diferenças eventualmente apuradas, acrescidas de correção monetária, juros de mora e de honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% (dez por cento) das prestações vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Insurge-se a Autarquia Previdenciária contra a r. sentença, sob o argumento de ser inconstitucional a obrigação consignada no título judicial. Neste sentido, afirma que a renda mensal inicial do benefício deve ser obtida mediante a aplicação da norma vigente para tal fim, na data do requerimento administrativo, não obstante os requisitos para a percepção da prestação previdenciária tenha se dado em momento anterior, uma vez que não há direito adquirido a regime jurídico.
Discute-se, portanto, os efeitos de lei nova sobre a forma de cálculo da renda mensal inicial vigente na época da aquisição do direito a benefício previdenciário.
Em nosso sistema jurídico, não há proteção absoluta contra a irretroatividade dos efeitos de lei nova, entretanto, determinadas situações jurídicas são expressamente resguardadas de seu âmbito de incidência pela Constituição Federal, no artigo 5º, XXXVI, dentre elas encontra-se o direito adquirido.
Assim, um direito, que já foi definitivamente incorporado ao patrimônio de seu titular, pode continuar a produzir efeitos jurídicos, ainda que a legislação sob a qual ele foi adquirido venha a ser posteriormente revogada. Tal atributo da lei é denominado pela doutrina de ultratividade.
Na seara previdenciária, o segurado apenas adquire direito a um benefício quando reúne todos os requisitos legais mínimos para a sua fruição. Assim, não há proteção jurídica das expectativas de direito diante das modificações das regras da Previdência Social.
Entretanto, as reformas previdenciárias sempre buscaram criar regras de transição, a fim de atenuar os impactos das modificações recém-introduzidas sobre aqueles que já se encontrassem vinculados ao sistema, bem como deixaram expressamente consignado que os direitos já adquiridos dos segurados seriam respeitados.
Neste sentido, o artigo 3º da Emenda Constitucional n. 20/98 prevê que "É assegurada a concessão de aposentadoria e pensão, a qualquer tempo, aos servidores públicos e aos segurados do regime geral de previdência social, bem como aos seus dependentes, que, até a data da publicação desta Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente". Na mesma linha, o artigo 6º da Lei n. 9.876/99 dispõe que "É garantido ao segurado que até o dia anterior à data de publicação desta Lei tenha cumprido os requisitos para a concessão de benefício o cálculo segundo as regras até então vigentes".
Dessa forma, dessume-se dos dispositivos supramencionados que a forma de cálculo da renda mensal inicial do benefício, cujo direito já foi adquirido por seu titular, está no âmbito de proteção constitucional do direito adquirido e, portanto, não pode sofrer alterações pela entrada em vigor de lei nova que prevê critério de apuração menos benéfico.
Ademais, a Suprema Corte, no julgamento do RE 630.501/RS, sob o regime de repercussão geral, firmou entendimento no sentido de "ser possível aos segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial possível no cotejo com aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data, caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior".
O mesmo posicionamento vem sendo adotado pelo C. Superior Tribunal de Justiça:
Isso não significa, todavia, que o segurado possa adotar critério híbrido de cálculo da renda mensal, mantendo a concessão do benefício na data do requerimento administrativo, mas aplicando o critério normativo pretérito que lhe for mais benéfico para a apuração da renda mensal inicial.
A propósito, cito o seguinte precedente desta Corte que dirimiu caso análogo, baseando-se no julgamento do C. Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no RE nº 575.089-2/RS:
No caso concreto, infere-se da fundamentação do v. Acórdão transitado em julgado que "o benefício terá como termo inicial data posterior à vigência dos regramentos da Lei nº 8.213/91. (...) As diferenças somente serão devidas a partir da data de início efetivo do benefício, em 13 de janeiro de 1993, sem incidência do lapso prescricional, dado que a ação foi proposta em julho de 1996" (fl. 212 - principais).
Constata-se, portanto, que o título judicial autorizou apenas o recálculo da renda mensal inicial conforme as regras vigentes em 13 de janeiro de 1989, mas sem modificar o termo inicial do benefício (13/1/1993).
Assim, deve ser reconhecida a inexigibilidade do título judicial, em virtude do disposto no artigo 741, parágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973, já que permitiu a utilização de critério híbrido de cálculo da renda mensal inicial do benefício, em confronto com o precedente firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no RE nº 575.089-2/RS.
Ante o exposto, dou provimento à apelação interposta pelo INSS, para reconhecer a inexigibilidade do título judicial, em virtude de a obrigação nele consignada ser inconstitucional.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando o embargado no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor dos embargos, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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