Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5100949-63.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
16/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 22/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO ULTRA PETITA. CONCESSÃO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECOLHIMENTOS COMO
CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CÔMPUTO DE PERÍODO POSTERIOR À DER. POSSIBILIDADE
RUÍDO. ENQUADRAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a
1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- Sentença ultra petita, o que impõe sua adequação aos limites da pretensão veiculada, na forma
dos artigos 141 e 492 do CPC.
- Afastada a alegação do INSS de descabimento da tutela jurídica deferida. Convencido o
julgador do direito da parte e presentes os requisitos do artigo 497 do CPC, a tutela jurisdicional
pode ser antecipada na própria sentença.
- No tocante ao cômputo do tempo de serviço do segurado contribuinte individual, impõe-se a
comprovação dos respectivos recolhimentos, à luz dos artigos 12, V c/c 21 e 30, II, todos da Lei n.
8.212/1991.
- As competências em debate (posteriores à data do requerimento administrativo) restaram
devidamente comprovadas consoante extrato previdenciário do Cadastro Nacional de
Informações Sociais (CNIS).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Comprovada a exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos limites de
tolerância previstos nas normas regulamentares, situação que possibilita a contagem
diferenciada.
- Não há que se falar em inviabilidade do reconhecimento da especialidade com fundamento na
utilização de metodologia diversa da determinada pela legislação. Precedentes.
- A parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição; por
estarem ausentes os requisitos insculpidos nos artigos 52 da Lei n. 8.213/91 e 201, § 7º, inciso I,
da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998. Ainda, não
tinha interesse na aposentadoria por tempo de contribuição proporcional (regras de transição da
EC n. 20/1998) porque o pedágio da EC n. 20/1998, art. 9°, § 1°, inc. I, é superior a 5 anos.
- No último dia de recolhimento como contribuinte individual constante no Cadastro Nacional de
Informações Sociais (CNIS), a parte autora também não faz jus à aposentadoria, porquanto não
preenchidos os requisitos constantes nos artigos 15, 16, 17, 18 e 20 da EC n. 103/2019.
- Com a sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n.
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em 5%
(cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa. Em relação à parte autora, porém, fica
suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se
de beneficiária da justiça gratuita.
- Matéria preliminar arguida pelo INSS rejeitada.
- Apelações das partes parcialmente providas.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5100949-63.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: EDSON LUIZ DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N,
CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, EDSON LUIZ DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N,
CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5100949-63.2021.4.03.9999
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CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), na qual a parte autora busca o reconhecimento de atividade especial, com vistas à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a especialidade da
atividade desempenhada nos períodos de 20/3/1985 a 28/2/1987 e de 1º/3/1987 a 15/4/1993 e
determinar o pagamento dos valores acumulados desde a data do indeferimento administrativo
do benefício. Fixou a sucumbência recíproca e antecipou os efeitos da tutela jurídica.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual exora a procedência
integral dos pedidos arrolados na inicial, com o cômputo do período contribuído posterior à data
do requerimento administrativo, de 6/2/2019 a 7/9/2019, e a obtenção do benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição desde a data de 7/9/2019 ou em momento posterior.
Prequestiona a matéria para fins recursais.
Não resignada, a autarquia também interpôs apelação, na qual aduz, preliminarmente, a
suspensão da tutela antecipada. No mérito, impugna o enquadramento da atividade especial e
a concessão do benefício em contenda. Requer a reforma da decisão recorrida, com a
improcedência dos pedidos.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5100949-63.2021.4.03.9999
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APELANTE: EDSON LUIZ DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) APELANTE: PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N,
CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, EDSON LUIZ DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: PAULO HENRIQUE DE OLIVEIRA ROMANI - SP307426-N,
CRISTIANO ALEX MARTINS ROMEIRO - SP251787-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
De início, cumpre destacar não ser o caso de ter por interposta a remessa oficial, pois a
sentença foi proferida na vigência do atual Código de Processo Civil (CPC), cujo artigo 496, §
3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito
econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
No caso, à evidência, esse montante não é alcançado, devendo a certeza matemática
prevalecer sobre o teor da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Malgrado tenha a parte autora pleiteado o reconhecimento do labor especial realizado somente
nos interstícios de 20/3/1985 a 13/8/1991 e de 1º/9/1991 a 15/4/1993, o julgado considerou
também a especialidade do período de 14/8/1991 a 31/8/1991.
Ao assim atuar, o magistrado incorreu nas vedações expressas dos artigos 141 e 492 do
Código de Processo Civil, caracterizando sua decisão como ultra petita, o que impõe sua
adequação aos limites da pretensão veiculada.
No mais, afasta-se a alegação de não cabimento da tutela jurídica antecipada. Convencido o
julgador do direito da parte, e presentes os requisitos do art. 497 do CPC, a tutela jurisdicional
pode ser antecipada na prolação da sentença.
Com efeito, não merece acolhida a pretensão do INSS de suspensão do cumprimento da
decisão por esta relatoria, uma vez que não configuradas as circunstâncias dispostas no art.
1.012 do CPC.
Dessa forma, rejeito a matéria preliminar arguida pela autarquia.
Feitas essas considerações, passo à análise das questões de mérito trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço comum
Segundo o artigo 55, e respectivos parágrafos, da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante
o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento,
observado o disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento."
No caso dos autos, a parte autora busca o reconhecimento das contribuições previdenciárias
vertidas no período de 6/2/2019 a 7/9/2019, na condição de contribuinte individual, para fins de
cômputo no tempo de serviço necessário à concessão da aposentadoria pretendida.
No tocante ao cômputo do tempo de serviço do segurado contribuinte individual, impõe-se a
comprovação dos respectivos recolhimentos, à luz dos artigos 12, V c/c 21 e 30, II, todos da Lei
n. 8.212/1991.
Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte: Apelação Cível 1837023/SP, P.0000618-
03.2012.4.03.6111 Rel. Desembargador Federal Paulo Domingues, 7ª Turma, Data do
Julgamento 4/6/2018, Data da Publicação/Fonte e-DJF3: 15/6/2018; Apelação Cível- 669575,
Desembargadora Federal Marisa Santos, 9ª Turma, DJU DATA:14/6/2007, p. 795.
Com efeito, constata-se que as competências supracitadas (período posterior à data do
requerimento administrativo - DER 5/2/2019) restaram devidamente comprovadas consoante
extrato previdenciário do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).
Desse modo, os recolhimentos efetuados nos meses acima apontados devem ser computados
no cálculo de tempo de contribuição da parte autora, para fins de obtenção do benefício
pretendido.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria
profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ,
AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No caso dos autos, em relação aos intervalos controvertidos, de 20/3/1985 a 13/8/1991 de
1º/9/1991 a 15/4/1993, constam Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP - (id. 60682819, p.
10/14) e laudo técnico (id. 160682848, p. 1/15), o qual indica exposição habitual e permanente a
ruído em níveis superiores aos limites de tolerância previstos na legislação previdenciária, o que
possibilita o reconhecimento da atividade insalutífera em conformidade com os códigos 1.1.6 do
anexo do Decreto n. 53.831/1964 e 1.1.5 do anexo do Decreto n. 83.080/1979.
Ressalta-se: possível utilização de metodologia diversa não desnatura a especialidade do
período, uma vez constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e
comprovado por meio de PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte (Ap –
Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia
– 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 3652270007103-
66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1
Data: 19/7/2017).
Cumpre destacar, ainda, que o reconhecimento da especialidade em relação a somente um
agente nocivo já é suficiente para a sua caracterização.
No mais, questões afetas ao recolhimento de contribuições previdenciárias ou divergências na
GFIP não devem, em tese, influir no cômputo da atividade especial exercida pelo segurado, à
vista do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei n. 8.212/1991), aplicável neste enfoque.
Com efeito, inexiste violação da regra inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, haja vista
caber ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias, inclusive as devidas
pelo segurado. Nesse sentido: TRF3, Ap 00204944120174039999, AC 2250162, Rel. DES.
FED. TORU YAMAMOTO, 7ª Turma, Fonte e-DJF3 Judicial 1, DATA: 25/9/2017.
Destarte, os interregnos supracitados devem ser reconhecidos como especiais, convertidos em
comum (fator de conversão de 1,4) e somados aos lapsos incontroversos.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para
obtenção da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia,
a qualquer tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época
da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional,
requisito de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres),
além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para
completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou
chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Contudo, na hipótese dos autos, a parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição; por estarem ausentes os requisitos insculpidos nos artigos 52 da Lei n.
8.213/91 e 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda
Constitucional n. 20/1998.
Com efeito, tanto na data do requerimento administrativo (DER 5/2/2019), como em 7/9/2019
(conforme requerido pela parte autora) e em 13/11/2019 (último dia de vigência das regras pré-
reforma da Previdência - art. 3º da EC n. 103/2019), a parte autora não tinha direito à
aposentadoria por tempo de contribuição integral (CF/1988, art. 201, § 7º, inc. I, com redação
dada pela EC n. 20/1998), porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição de 35 anos
de profissão.
Ainda, não tinha interesse na aposentadoria por tempo de contribuição proporcional (regras de
transição da EC n. 20/1998) porque o pedágio da EC n. 20/1998, art. 9°, § 1°, inc. I, é superior a
5 anos.
Da mesma forma, em 31/12/2019 e em 31/5/2020 (último dia de recolhimento como contribuinte
individual constante no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS -), a parte autora não
faz jus à aposentadoria, porquanto não preenchidos os requisitos constantes nos artigos 15, 16,
17, 18 e 20 da EC n. 103/2019.
Em virtude de sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n.
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em
5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa.
Em relação à parte autora, porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do
mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade
alguma à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, de ofício, reduzo a sentença aos limites do pedido, rejeito a matéria
preliminar arguida pelo INSS e dou parcial provimento às apelações das partes para, nos
termos da fundamentação: (i) determinar o reconhecimento e averbação dos recolhimentos
previdenciários efetuados entre 6/2/2019 a 7/9/2019. (ii) julgar improcedente o pedido de
concessão de benefício previdenciário.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. JULGAMENTO ULTRA PETITA. CONCESSÃO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECOLHIMENTOS COMO
CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CÔMPUTO DE PERÍODO POSTERIOR À DER.
POSSIBILIDADE RUÍDO. ENQUADRAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a
1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- Sentença ultra petita, o que impõe sua adequação aos limites da pretensão veiculada, na
forma dos artigos 141 e 492 do CPC.
- Afastada a alegação do INSS de descabimento da tutela jurídica deferida. Convencido o
julgador do direito da parte e presentes os requisitos do artigo 497 do CPC, a tutela jurisdicional
pode ser antecipada na própria sentença.
- No tocante ao cômputo do tempo de serviço do segurado contribuinte individual, impõe-se a
comprovação dos respectivos recolhimentos, à luz dos artigos 12, V c/c 21 e 30, II, todos da Lei
n. 8.212/1991.
- As competências em debate (posteriores à data do requerimento administrativo) restaram
devidamente comprovadas consoante extrato previdenciário do Cadastro Nacional de
Informações Sociais (CNIS).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC).
- Comprovada a exposição habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos limites de
tolerância previstos nas normas regulamentares, situação que possibilita a contagem
diferenciada.
- Não há que se falar em inviabilidade do reconhecimento da especialidade com fundamento na
utilização de metodologia diversa da determinada pela legislação. Precedentes.
- A parte autora não faz jus à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição; por
estarem ausentes os requisitos insculpidos nos artigos 52 da Lei n. 8.213/91 e 201, § 7º, inciso
I, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998. Ainda,
não tinha interesse na aposentadoria por tempo de contribuição proporcional (regras de
transição da EC n. 20/1998) porque o pedágio da EC n. 20/1998, art. 9°, § 1°, inc. I, é superior a
5 anos.
- No último dia de recolhimento como contribuinte individual constante no Cadastro Nacional de
Informações Sociais (CNIS), a parte autora também não faz jus à aposentadoria, porquanto não
preenchidos os requisitos constantes nos artigos 15, 16, 17, 18 e 20 da EC n. 103/2019.
- Com a sucumbência recíproca e da vedação à compensação (art. 85, § 14, da Lei n.
13.105/2015), ficam os litigantes condenados a pagar honorários advocatícios, arbitrados em
5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa. Em relação à parte autora, porém, fica
suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-
se de beneficiária da justiça gratuita.
- Matéria preliminar arguida pelo INSS rejeitada.
- Apelações das partes parcialmente providas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu, de ofício, reduzir a sentença aos limites do pedido, rejeitar a matéria
preliminar arguida pelo INSS e dar parcial provimento às apelações das partes, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
