Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5284142-18.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
01/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/10/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PEDIDO DE DESISTÊNCIA DA AÇÃO. DISCORDÂNCIA
DO INSS. EXIGÊNCIA DE RENÚNCIA AO DIREITO. ART. 3.º DA LEI N.º 9.469/97. EXTINÇÃO
DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA ANULADA. TEORIA DA CAUSA
MADURA. PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E DA ECONOMIA PROCESSUAL. ART. 143 DA LEI
N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO
REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Intimado a respeito do pedido de desistência, o INSS se opôs, condicionando a homologação da
desistência da parte autora à renúncia do direito sobre o qual se funda a ação.
- Processo extinto sem resolução do mérito com fundamento no art. 485, inciso IV, do Código de
Processo Civil.
- Na apelação, o INSS requer a declaração de nulidade da sentença e o julgamento da causa
com base no artigo 1.013, §3.º, I, do Código de Processo Civil.
- Não se vislumbra, no presente caso, “ausência de início de prova material do exercício de
atividade rural” a ensejar a confirmação da sentença de extinção do processo tal como decidido
pelo STJ no REsp n.º 1.352.721/SP.
- No caso, restou preclusa a produção da prova testemunhal, não havendo que se falar em
cerceamento de defesa. Aplicando-se a TeoriadaCausaMadura (art. 1.013, § 3.º, III, do CPC), o
Tribunal pode enfrentar pedido não apreciado pelo órgão ad quem, decidindo o mérito. Princípios
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
da celeridade e da economia processual.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício
vindicado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5284142-18.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TEONIRIA MARIANO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO CARLOS RUIZ - SP352752-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5284142-18.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TEONIRIA MARIANO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO CARLOS RUIZ - SP352752-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural,
prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.
O INSS apresentou contestação, sustentando inexistir prova material válida a favor da autora,
ensejando o não cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão do benefício
previdenciário em questão.
A parte autora requereu a "homologação da desistência da ação por sentença”, com a
consequente extinção do processo, sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, inciso
VIII do CPC (ID n.º 136569115 – pág. 01).
Instada a se manifestar, a Autarquia Previdenciária concordou com o pedido de desistência,
“desde que a parte autora renuncie ao direito em que a ação se funda” (ID n.º 136569118 – págs.
01 e 02).
Em seguida, houve intimação da autora para informar se renunciaria ao direito sobre o qual se
funda a ação ou se optaria pela continuidade do feito, apresentando réplica (ID n.º 136569120 –
pág. 01). Contudo, quedou-se inerte (ID n.º 136569122 – pág. 01).
O juízo a quo proferiu sentença de extinção do processo, sem resolução do mérito, condenando a
autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre
o valor atualizado da causa, ressalvada a gratuidade da justiça (ID n.º 136569123 – pág. 01).
O INSS apela, requerendo “a declaração de nulidade da sentença e o julgamento da causa com
base no 1.013, § 3.º, I, do Código de Processo Civil”, para que seja julgado improcedente o
pedido formulado na petição inicial. Ao final, prequestiona a matéria. (ID n.º 136569126 – págs.
01 a 04).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5284142-18.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: TEONIRIA MARIANO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: FRANCISCO CARLOS RUIZ - SP352752-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Em conformidade com a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, "a profundidade
do efeito devolutivo na apelação corresponde aos argumentos expostos para justificar o pedido
ou a defesa, vale dizer, a causa de pedir ou o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito
do autor, sempre dentro do limite da matéria impugnada, segundo preconizam os § 1.º e § 2.º do
artigo 515 do CPC/1973 e os § 1.º e § 2.º do artigo 1.013 do CPC/2015" (EREsp n.º 970.708/BA,
Relator Ministro JORGE MUSSI, Corte Especial, DJe de 20/10/2017).
Na doutrina, sobreleva a anotação do ilustre Professor Daniel Amorim Assumpção Neves, in
verbis:
“Efeito devolutivo dos recursos:
A dimensão horizontal da devolução é entendida pela melhor doutrina como a extensão da
devolução, estabelecida pela matéria em relação à qual uma nova decisão é pedida, ou seja, pela
extensão o recorrente determina o que pretende devolver ao tribunal, com a fixação derivando da
concreta impugnação à matéria que é devolvida.
Na dimensão vertical, entendida como sendo a profundidade da devolução, estabelece-se a
devolução automática ao tribunal, dentro dos limites fixados pela extensão, de todas as
alegações, fundamentos e questões referentes à matéria devolvida. Trata-se do material com o
qual o órgão competente para o julgamento do recurso irá trabalhar para decidi-lo.
No tocante à extensão da devolução, análise que deve ser feita em primeiro lugar, é determinada
a devolução a partir da matéria impugnada pelo recorrente, podendo o recurso ser total ou
parcial. É correto mencionar nesse momento os capítulos da decisão que geram sucumbência à
parte, sendo dela a escolha de impugnar todos eles, devolvendo-os ao tribunal, ou impugnar
somente alguns, limitando assim tal devolução. Trata-se de aplicação do dispositivo legal que
consagra a máxima do direito romano tantum devolutum quantum appellatum.
As previsões do art. 515, caput e §§ 1.º e 2.º, do CPC/1973, que tratam da profundidade do efeito
devolutivo, são substancialmente mantidas pelo art. 1.013, caput e §§ 1.º e 2.º, do Novo CPC.
Apenas especifica-se no § 1.º que a profundidade da devolução quanto a todas as questões
suscitadas e discutidas, ainda que não tenham sido solucionadas, está limitada ao capítulo
impugnado, ou seja, à extensão da devolução.”
(Novo Código de Processo Civil: inovações, alterações e supressões comentadas/ Daniel Amorim
Assumpção Neves – 5.ª edição, revista e atualizada – São Paulo: Editora Método, 2020, pags.
663/664).
No caso em tela, o objeto do recurso de apelação do INSS é a declaração de nulidade da
sentença e o julgamento da causa com base no 1.013, § 3.º, I, do Código de Processo Civil, para
que seja julgado improcedente o pedido formulado na petição inicial.
Como razões de apelação, a Autarquia Previdenciária argumenta que o Magistrado sentenciante
“incorreu em equívoco” quando extinguiu o feito sem julgamento do mérito após a manifestação
expressa do INSS quanta à discordância do pedido de desistência da ação.
De fato, o § 4.º do art. 485 do Código de Processo Civil estabelece que “oferecida a contestação,
o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação”.
Nos termos dos arts. 1.º e 3.º, ambos da Lei n.º 9.469/97 os representantes da União, das
Autarquias, das Fundações e das Empresas Públicas Federais podem concordar com pedido de
desistência da ação, desde que a parte autora “renuncie expressamente ao direito sobre o qual
se funda a ação”.
Tenha-se presente que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso
Especial Repetitivo de n.º 1.267.995/PB, de Relatoria do Excelentíssimo Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, assentou o entendimento de que após o oferecimento da contestação,
não pode o autor desistir da ação, sem o consentimento do réu, considerando legítima a oposição
à desistência com fundamento no mencionado art. 3.º da Lei n.º 9.469/97.
Na mesma linha, os seguintes julgados desta Corte Regional: ApCiv n.º 6203620-
21.2019.4.03.9999/SP – Relator: Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN -
Publicado em 08/06/2020; ApCiv n.º 0027883-14.2016.4.03.9999/SP – Relator: Desembargador
Federal LUIZ STEFANINI - Publicado em 28/10/2019; ApCiv n.º 5002289-05.2019.4.03.9999/MS
– Relatora: Desembargadora Federal TANIA MARANGONI – Publicado em 29/08/2019 e ApCiv
n.º 0026927-95.2016.4.03.9999/SP – Relator: Desembargador Federal DAVID DANTAS -
Publicado em 30/09/2016.
Na presente hipótese, em que pese a argumentação do INSS na apelação, não se pode perder
de vista que o MM. Juízo da Vara Única da Comarca de Porangaba-SP reconheceu que o
processo não poderia ser extinto pela desistência da ação sem o consentimento do réu e proferiu
sentença de extinção do processo, sem resolução do mérito, com fundamento no art. 485, inciso
IV, do Código de Processo Civil, condenando a autora ao pagamento das custas, despesas
processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, ressalvada a
gratuidade da justiça (ID n.º 136569123 – pág. 01).
O magistrado de 1.º grau registrou, como fundamento do decisum: (sic) “embora o processo não
possa ser extinto pela desistência da ação, é certo que não tendo o autor comprovado a atividade
rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício e não tendo sido produzida
prova testemunhal para o período anterior, o feito deve ser extinto o feito, sem resolução do
mérito, para possibilitar o reconhecimento de nova causa de pedir e o ajuizamento de outra
demanda, nos termos dos artigos 485, IV, e 320 do Código de Processo Civil, nos termos do
julgamento proferido pelo E. Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 1.352.721/SP, de
relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Representativo de Controvérsia, em
16/12/2015.”
Importante ressaltar que a Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o referido
Recurso Especial n.º 1.352.721/SP, firmou posição na linha de que a ausência de prova material
apta a comprovar o exercício de atividade rural implica a extinção do processo, sem resolução de
mérito, por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido, possibilitando ao
segurado o ajuizamento de nova demanda, caso reúna os elementos necessários à concessão do
benefício.
Confira-se, a propósito, a ementa do aludido julgado:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a suaextinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido."
Nesse contexto, passo a examinar se, no presente caso, a “ausência de início de prova material
do exercício de atividade rural” enseja a confirmação da sentença de extinção do processo tal
como decidido pelo STJ no REsp n.º 1.352.721/SP.
Cabe lembrar que o benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se
disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.
Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de
1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que
a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão
do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).
Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria
comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do
benefício.
Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou
para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do
benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.
Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve
comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de
verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral
durante o período respectivo.
Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o
entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de
atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de
25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em
14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos
rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15
(quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.
Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.
Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como
segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a
uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2
(dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na
Lei n.º 11.368/06.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu
nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art.
2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de
24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art.
3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao
salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a
atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro
de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três),
limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro
de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze)
meses dentro do respectivo ano civil”.
É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra
permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por
idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de
forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo
igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido",
consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.
Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á
por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada
Lei, corroborada por prova testemunhal.
Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa
conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova
testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
DO CASO DOS AUTOS
O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 22/08/2014,
devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.
Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:
- certidão de casamento, celebrado em 28/06/1975, qualificando o cônjuge (ANTONIO MARIANO
DA SILVA) como lavrador, assim como os pais de ambos os nubentes (ID n.º 136569105 – pág.
01). Na referida certidão, houve averbação de divórcio do casal em 21/07/2009;
- Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS da requerente (ID n.º 136569106 – págs. 01 a
04), emitida em 24/07/1978, com registros de diversos vínculos empregatícios, conforme se
transcreve adiante:
- de 01/04/1980 a 10/06/1980 - para o empregador “PLUMA CONFORTO E TURISMO S.A. –
espécie de estabelecimento: “transporte coletivo de passageiros”, no cargo de “servente”;
- de 14/03/1983 a 19/08/1985 - para o empregador “UNIÃO SÃO PAULO S.A. AGRICULTURA
INDÚSTRIA E COMÉRCIO”, - no cargo de “serviços gerais - lavoura”;
– de 12/05/1987 a 20/11/1987 - para o empregador “AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA” - no cargo de
“trabalhadora braçal”, na Fazenda Vista Alegre - SP;
- de 01/07/1988 a 14/12/1988 - para o empregador “SIMA EMPREITEIRA S/C LTDA” - no cargo
de “trabalhadora da cultura de cana de açúcar”, na Fazenda Velha - SP;
- de 22/05/1989 a 23/02/1990 - para o empregador “AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA” - no cargo de
“trabalhadora braçal”, na Fazenda Vista Alegre - SP;
- de 07/06/1990 a 11/12/1990 - para o empregador “DESTILARIA NOVA ESPERANÇA LTDA”, no
cargo de “trabalhadora da cultura de cana de açúcar”, na Fazenda Nova Esperança - SP;
- de 01/06/1991 a 15/12/1991 - para o empregador “FAZENDAS REUNIDAS PILON S/A.”, no
cargo de “trabalhadora rural”, na Fazenda Santa Maria, localizada na zona rural do município de
Cerquilho - SP;
- de 25/05/1992 a 20/11/1992 - para o empregador “AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA”, no cargo de
“trabalhadora braçal”, na Fazenda Vista Alegre - SP;
- de 01/12/1992 a 24/02/1995 - para o empregador “AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA”, no cargo de
“trabalhadora braçal”, na Fazenda Vista Alegre - SP;
- de 01/03/1995 a 30/06/1995 - para o empregador JURANDIR PROENÇA LOPES - no cargo de
“trabalhadora braçal rural”, em estabelecimento rural,
- de 13/10/2010 a 15/10/2014 - para o empregador CLOVIS VIEIRA - SORVETERIA no cargo de
“servente”.
O valor probatório dos documentos dos quais é possível inferir a profissão exercida pela parte
autora, à época dos fatos que se pretende comprovar, é inconteste.
A consulta atualizada ao Sistema CNIS confirma os vínculos empregatícios constantes da CTPS
da autora, sendo que o último vínculo (de 13/10/2010 a 15/10/2014) está registrado como
"EMANUEL FERNANDO DE JESUS MARQUES & CIA LTDA".
No entanto, a CTPS da autora também revela vínculo urbano no período de carência, de
13/10/2010 a 15/10/2014 no cargo de “servente”.
No extrato do CNIS para o referido interregno consta o empregador: “EMANUEL FERNANDO DE
JESUS MARQUES & CIA LTDA”, nos cargos de “vendedora de comércio varejista” (de
13/10/2010 a 31/01/2011) e “coletora de lixo domiciliar” (de 01/02/2011 a 15/10/2014), ambos
vínculos urbanos.
A referida consulta ainda aponta o recolhimento como contribuinte individual pela autora no
período de 01/10/2019 a 30/06/2020.
Quanto ao extrato atualizado do CNIS do ex-marido da autora (ANTONIO MARIANO DA SILVA),
partindo da premissa de que a separação ocorreu em 2007, foram examinados os vínculos
empregatícios do cônjuge da requerente apenas no que tange ao período de carência, que
abrange o interregno de agosto de 1999 a agosto de 2014. Foram encontrados os seguintes
registros no CNIS:
- de 03/11/1998 a 13/04/1999 - para o empregador “COMÉRCIO E BENEFICIAMENTO DE
MADEIRAS SICOPI LTDA” - ocupação no CNIS: "OUTROS MARCENEIROS, O M L M T
ASSEMEL N SOB OUTRAS EPÍGRAFES".
Enquanto trabalhava para a referida empresa, o ex-marido da autora recebeu o benefício
previdenciário de “auxílio-doença por acidente do trabalho” (espécie 91) de 21/11/1998 a
29/03/1999;
- de 12/02/2001 a 30/04/2001 e de 21/05/2001 a 21/12/2001 - para o empregador “AGRÍCOLA
ALMEIDA LTDA” (ocupação não informada no CNIS);
- de 03/11/2004 a 30/04/2005 e de 02/05/2005 a 15/07/2005 - para o empregador “PRH GLOBAL
MÃO DE OBRA TEMPORÁRIA LTDA” - ocupação: "ARMADOR DE ESTRUTURA DE
CONCRETO";
- de 01/06/2006 (sem data fim) - para o empregador “S.L. PRODUTOS AGRÍCOLAS LTDA” -
ocupação: "TRABALHADOR AGROPECUÁRIO EM GERAL".
Cabe ressaltar a inexistência de prova oral. Da análise dos autos, é possível verificar que foram
arroladas três testemunhas: Juraci de Morais, Irene Simões Almeida e Ezequias Rodrigues de
Oliveira, todas com endereço no município de Guareí, em São Paulo (ID n.º 136569098 – pág.
06).
Todavia, após a apresentação da peça contestatória, a parte autora alegou não haver interesse
no prosseguimento do processo e requereu a sua extinção, sem resolução do mérito (ID n.º
136569115 – pág. 01).
Como já referido, houve intimação da autora para informar se renunciaria ao direito em que se
funda a ação (condição sine qua non apresentada pelo INSS para concordar com o pedido de
desistência) ou se optaria pela continuidade ao feito (ID n.º 136569120 – pág. 01).
Tendo em vista que a autora permaneceu inerte (ID n.º 136569122 – pág. 01), resta preclusa a
produção da prova testemunhal, não havendo que se falar em cerceamento de defesa.
Nessa linha de entendimento, os seguintes julgados deste Tribunal: ApCiv n.º 5668713-
77.2019.4.03.9999 – Relator: Desembargador Federal TORU YAMAMOTO - Publicado em
17/03/2020; ApReeNec n.º 0011947-67.2011.4.03.6104 – Relator: Desembargador Federal
NEWTON DE LUCCA - Publicado em 17/03/2020.
Cumpre mencionar que a jurisprudência do Colendo STJ é firme no sentido de que “o início de
prova material deverá ser corroborado por idônea e robusta prova testemunhal” (Súmula/STJ n.º
149).
Portanto, no caso dos autos, o conjunto probatório é insuficiente para fins de concessão do
benefício vindicado. Cite-se, por oportuno, precedentes desta Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRECLUSÃODAPROVATESTEMUNHAL.
AUSÊNCIA DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. NÃO PREENCHIDOS OS
REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. APELAÇÃO IMPROVIDA.
(...) A MM Juíza de primeiro grau julgou improcedente o pedido porque o autor perdeu a
qualidade de segurado desde o último vínculo empregatício até a comprovação do início da
incapacidade laborativa e que não houve a produção da prova testemunhal para confirmar o
trabalho rural após o término do último vínculo em CTPS.
- E foi dada à parte autora a oportunidade de produzir a prova testemunhal requerida, para
comprovar o exercício de atividade rural, que apenas não se realizou em razão do seu não
comparecimento, nem das testemunhas arroladas à audiência de instrução, tornando precluso o
direito.
(...) Apelo da parte autora improvido.”
(TRF 3.ª Região, AC n.º 0002006-38.2017.4.03.9999, Relatora Desembargadora Federal TÂNIA
MARANGONI, 8.ª TURMA, DJ-e de 17/06/2019).
“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL. PROVA
EXCLUSIVAMENTE MATERIAL.
(...) Sem a prova oral, fica comprometida a documentação que se presta a servir de início de
prova material.
- Apelação da parte autora desprovida.”
(TRF 3.ª Região, AC n.º 0046630-27.2007.4.03.9999, Relator Desembargador Federal CASTRO
GUERRA, 10.ª TURMA, DJU 27/02/2008).
Diante do exposto, não se vislumbra, no presente caso, “ausência de início de prova material do
exercício de atividade rural” a ensejar a confirmação da sentença de extinção do processo tal
como decidido pelo STJ no REsp n.º 1.352.721/SP.
Aplicando-se a TeoriadaCausaMadura (art. 1.013, § 3.º, III, do CPC), o Tribunal pode enfrentar
pedido não apreciado pelo órgão ad quem, decidindo o mérito.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado o exercício de
atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do art.98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.
Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação
federal ou a dispositivos constitucionais.
Por fim, cabe observar que os períodos de trabalho rural e urbano podem ser somados para
obtenção da carência exigida para fins de aposentadoria por idade híbrida, desde que alcançado
o requisito etário, nos termos do art. 48, §§ 3.º e 4.º, da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada
pela Lei n.º 11.718/2008. No cômputo da carência do benefício híbrido, é possível contar o tempo
de atividade rural exercida em período remoto e descontínuo, ainda que não tenha sido efetivado
o recolhimento de contribuições (Tema Repetitivo n.º 1.007 do STJ).
Posto isso, dou provimento à apelação, para anular a sentença e, com base no art. 1.013, § 3.º,
III, do Novo CPC, julgar improcedente o pedido formulado.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PEDIDO DE DESISTÊNCIA DA AÇÃO. DISCORDÂNCIA
DO INSS. EXIGÊNCIA DE RENÚNCIA AO DIREITO. ART. 3.º DA LEI N.º 9.469/97. EXTINÇÃO
DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SENTENÇA ANULADA. TEORIA DA CAUSA
MADURA. PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E DA ECONOMIA PROCESSUAL. ART. 143 DA LEI
N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO
REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Intimado a respeito do pedido de desistência, o INSS se opôs, condicionando a homologação da
desistência da parte autora à renúncia do direito sobre o qual se funda a ação.
- Processo extinto sem resolução do mérito com fundamento no art. 485, inciso IV, do Código de
Processo Civil.
- Na apelação, o INSS requer a declaração de nulidade da sentença e o julgamento da causa
com base no artigo 1.013, §3.º, I, do Código de Processo Civil.
- Não se vislumbra, no presente caso, “ausência de início de prova material do exercício de
atividade rural” a ensejar a confirmação da sentença de extinção do processo tal como decidido
pelo STJ no REsp n.º 1.352.721/SP.
- No caso, restou preclusa a produção da prova testemunhal, não havendo que se falar em
cerceamento de defesa. Aplicando-se a TeoriadaCausaMadura (art. 1.013, § 3.º, III, do CPC), o
Tribunal pode enfrentar pedido não apreciado pelo órgão ad quem, decidindo o mérito. Princípios
da celeridade e da economia processual.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício
vindicado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, para anular a sentença e, com base no art.
1.013, § 3.º, III, do Novo CPC, julgar improcedente o pedido formulado, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
