Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6084842-92.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
22/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. PENSÃO POR MORTE. JULGAMENTO CITRA PETITA.
NULIDADE. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM. ATIVIDADE ESPECIAL.
TRABALHADOR DA AGROPECUÁRIA. RUÍDO. FRIO. ENQUADRAMENTO PARCIAL. NÃO
CUMPRIDOS OS REQUISITOS PARA A OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA ANTES DO
FALECIMENTO. AFASTADA A INCIDÊNCIA DO ART. 102 DA LEI N. 8.213/1991.QUALIDADE
DE SEGURADO DO FALECIDO NÃO COMPROVADA. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- Sentença citra petita anulada. Julgamento com base no artigo 1.013, § 3º, II, do CPC.
- Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão da pensão por
morte, a lei vigente à época do fato que a originou, qual seja, a da data do óbito.
- São requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente e a qualidade
de segurado do falecido (artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991).
- Falecido que, na data do óbito, não era mais segurado, pois já superado o “período de graça”
previsto no artigo 15 da Lei n. 8.213/1991.
- Reconhecimento da especialidade da atividade desenvolvida em apenas parte dos períodos
trabalhados, os quais convertidos em comum (fator de conversão de 1,4) e somados aos demais
lapsos comuns, não perfazem o tempo exigido à aposentação. Conquanto cumprida a carência,
em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/1991, não se fazem presentes os requisitos
dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a redação
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Aplicação do artigo 102, § 2º, da Lei n. 8.213/1991 afastada, porquanto ausente a demonstração
do preenchimento, pelo falecido, dos requisitos necessários à concessão deaposentadoria por
tempo de contribuição.Benefício de pensão por morte indevido.
- Condenada a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, que arbitro
em 10% (dez por cento) conforme critérios do artigo 85, § 4º, do CPC, suspensa, porém, a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação da parte autora provida. Sentença anulada.
- Improcedência do pedido de pensão por morte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6084842-92.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARIA DE FATIMA REZENDE SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: CLERIO FALEIROS DE LIMA - SP150556-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6084842-92.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARIA DE FATIMA REZENDE SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: CLERIO FALEIROS DE LIMA - SP150556-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou improcedente o pedido de
concessão de pensão por morte.
Nas razões de recurso, a parte autora suscita a nulidade da sentença por julgamento citra
petita, porquanto não analisados os pedidos de reconhecimento da especialidade das
atividades desenvolvidas pelo falecido, bem como de tempo de trabalho prestado sem
anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) pelo extinto, cuja soma
comprova que, ao tempo do óbito, ele fazia jus à aposentadoria por tempo de contribuição e, via
de consequência, garante à sua esposa o direito à pensão por morte pleiteada.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6084842-92.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARIA DE FATIMA REZENDE SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: CLERIO FALEIROS DE LIMA - SP150556-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Conheço da apelação em razão da satisfação de seus requisitos.
Inicialmente, insta analisar a alegação de nulidade da sentença, por tratar-se de decisão citra
petita.
Com efeito, a parte autora, nestes autos, pleiteia o benefício de pensão por morte e, para tanto,
pretende comprovar que seu falecido marido, na época do óbito, fazia jus à aposentadoria por
tempo de contribuição, o que lhe garante o direito ao benefício pleiteado.
De fato, o Juízo a quo, no exercício da atividade jurisdicional, proferiu sentença citra petita, pois
sob o argumento de que o falecido não possuía o requisito de idade mínima à obtenção do
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, deixou de apreciar os pedidos de
reconhecimento de tempo de serviço comum e de enquadramento da atividade especial para
fins de demonstrar que o de cujus havia preenchidos os requisitos para a aposentadoria por
tempo de contribuição.
Nesse caso, estando a decisão contaminada de vício que afeta sua eficácia, deve ser anulada,
conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSUAL CIVIL. JULGAMENTO CITRA-PETITA. NULIDADE. DECRETAÇÃO DE
OFÍCIO PELO TRIBUNAL. POSSIBILIDADE.
- "A nulidade da sentença que deixa de apreciar pretensão material que integra o pedido
formulado na inicial, decidindo citra-petita, pode ser decretada de ofício pelo Tribunal ad quem"
(Resp 243.294-SC, Ministro Vicente Leal, DJ 24/4/2000). - Recurso especial não conhecido."
(STJ, Quarta Turma, RESP 180442/SP, proc. 1998/0048352-7, DJU 13.11.2000, pg. 145, rel.
Min. CESAR ASFOR ROCHA, v.u.)
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA CITRA
PETITA. ANULAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL
PROVIDO.
1. A Eg. Terceira Seção desta Corte, pelas Turmas que a compõem, firmou entendimento no
sentido de que a decretação de nulidade da sentença citra petita pode ser realizada de ofício
pelo Tribunal ad quem. Nesse caso, o recurso de apelação não está condicionado à prévia
oposição de embargos de declaração. 2. Recurso especial improvido."
(STJ, Sexta Turma, RESP 243988/SC, proc. 1999/0120502-6, DJU 22.11.2004, pg. 393, rel.
Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, v.u.).
Assim, a sentença ora recorrida está eivada de nulidade.
Nesse passo, estando o feito em condições de imediato julgamento, não há óbice a que o
julgador passe à análise do mérito propriamente dito.
Esse entendimento decorre do artigo 1.013, § 3º, II, do CPC:
"§ 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde
logo o mérito quando:
(...)
II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da
causa de pedir;
(...)".
Passo, pois,à apreciação da matéria de fundo.
Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de pensão
por morte, previsto nos artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991, cujo texto original, alterado
diversas vezes ao longo dos anos, vigora atualmente com a redação dada pela Lei n.
13.846/2019.
No entanto, em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão
desse benefício previdenciário, a lei vigente à época do fato que o originou, qual seja, a da data
do óbito.
De toda forma, são requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente
e a qualidade de segurado do falecido.
Segundo o artigo 26, I, da Lei n. 8.213/1991, a concessão do benefício independe do
cumprimento de período de carência, conquanto sua duração possa variar conforme a
quantidade de contribuições recolhidas pelo instituidor, como previsto no artigo 77 da mesma
lei.
Quanto à condição de dependente do segurado, o artigo 16 da Lei n. 8.213/1991 estabelece o
rol dos beneficiários, divididos em três classes, e indica as hipóteses em que a dependência
econômica é presumida e aquelas em que esta deverá ser comprovada.
No caso, o óbito ocorreu em 28/05/2015.
O ponto controvertido refere-se à comprovação da qualidade de segurado do falecido na data
do óbito.
Dispõe o artigo 102, § 2º, da Lei n. 8.213/1991 que a pensão por morte não será concedida aos
dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do artigo15 da
Lei n. 8.213/1991, salvo se já havia preenchido todos os requisitos para obtenção de
aposentadoria.
Com base na parte final desse dispositivo legal, a parte autora pleiteia o reconhecimento de que
o falecido, à época do óbito, fazia jus à aposentadoria por tempo de contribuição, já que,
segundo alega,a soma dos períodos trabalhados, inclusive em atividades consideradas
especiais, totaliza mais de 35 (trinta e cinco) anos de contribuição.
Do tempo de serviço comum
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante
o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento,
observado o disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento."
No caso, busca a parte autora o reconhecimento do tempo de serviço comum exercido por
Antônio Sebastião dos Santos nos intervalos de 10/5/1979 a 31/8/1988, para o empregador
“Edison Leite de Moraes” e de 15/9/1988 a 30/11/1990 para “Lindolpho Pio de Carvalho Dias”
(“Genoveva Dias Krapp”).
Saliente-se que o lapso de 15/9/1988 a 30/11/1990 já consta do CNIS (Cadastro Nacional de
Informações Sociais) do falecido e, portanto, é incontroverso.
O referido tempo de serviço foi, inclusive, reconhecido pelo INSS quando do cômputo do tempo
de contribuição do falecido, na análise do requerimento administrativo da aposentadoria por
tempo de contribuição, formulado por ele em 24/2/2014, e do pedido de pensão por morte
protocolado pela parte autora (DER 24/9/2016).
No mais,há início de prova material presente na ficha de registro de empregados e na rescisão
de contrato de trabalho coligidas aos autos referentes ao interstício controverso de 10/5/1979 a
31/8/1988.
Além disso, a prova testemunhal, colhida sobre o crivo do contraditório, corrobora o
reconhecimento pretendido.
Dessa forma, embora não conste no CNIS as contribuições referentes ao vínculo estabelecido
no período pleiteado, tal omissão não pode ser imputada ao trabalhador, pois sua remuneração
sempre tem o desconto das contribuições, segundo legislação trabalhista e previdenciária, atual
e pretérita.
Importante ressaltar que o INSS não produziu prova inequívoca em contrário, apta a infirmar os
argumentos aqui trazidos e que não há ofensa à regra do artigo 55, § 3º, da Lei n. 8.213/1991,
tampouco violação da regra escrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, diante do princípio da
automaticidade (artigo 30, I, da Lei n. 8.212/1991), haja vista caber ao empregador o
recolhimento das contribuições previdenciárias, inclusive as devidas pelo segurado.
Desse modo, joeirado o conjunto probatório, entendo que restou demonstrado o labor comum
desempenhado pelo extinto no período de 10/5/1979 a 31/8/1988.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016,
DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n.
664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso
concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar
completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na
hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do
EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Neste caso, no tocante aos períodos de 10/5/1979 a 31/8/1988, de 15/9/1988 a 30/11/1990, de
2/1/1993 a 18/1/1994 e de 1º/6/1994 a 28/4/1995, depreende-se dos documentos trazidos aos
autos o exercício de atividades em estabelecimento agropecuário, enquadrando-se nos exatos
termos do código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964.
Nesse sentido: STJ, AINTARESP – Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial - 860631
2016.00.32469-5, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado
em 16/6/2016; RESP – Recurso Especial - 1309245 2012.00.30818-2, Rel. Ministro SÉRGIO
KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJE 22/10/2015.
Em relação aos intervalos controversos, de 2/12/1998 a 12/11/2003 e de 3/2/2012 a 2/4/2012, a
parte autora logrou demonstrar, via Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), exposição
habitual e permanente a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância previstos na
legislação previdenciária, o que possibilita o reconhecimento da atividade insalutífera em
conformidade com os códigos 1.1.5 do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 2.0.1 dos anexos
dos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Ressalta-se: eventual utilização de metodologia diversa não desnatura a especialidade do
período, uma vez constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e
comprovado por meio de PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte (Ap –
Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia
– 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 3652270007103-
66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1
Data: 19/7/2017).
No que tange ao interstício de 7/1/2008 a 14/6/2010, consta Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) e Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), os quais
apontam a exposição habitual e permanente ao agente nocivo “frio” (temperaturas inferiores a
10º C) em razão do trabalho no interior de câmaras frigoríficas, situação que viabiliza a
especialidade requerida conforme os códigos 2.0.4 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n.
3.048/1999.
De acordo com o Anexo IX da NR-15 do MTE, as atividades executadas no interior de câmaras
frigoríficas (ou em locais que apresentem condições similares) que exponham os trabalhadores
ao agente agressivo frio, serão consideradas insalubres.
Nesse sentido, são os julgados desta Corte Federal: TRF3 - AC 00011442020114036138,
Desembargador Federal Nelson Porfírio – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 7/4/2017; TRF3
- APELREEX 00091018220134036112, Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª
Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 24/2/2016.
Ademais, diante das circunstâncias da prestação laboral descritas nos documentos coligidos
aos autos, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade
dos agentes.
Cabe acrescentar que o reconhecimento da especialidade em relação a somente um agente
nocivo já é suficiente para a sua caracterização.
Contudo, inviável o reconhecimento da natureza especial dos lapsos de 2/1/1991 a 6/3/1991, de
8/4/1991 a 16/11/1992, de 15/4/1997 a 12/4/1998 e de 13/11/2003 a 14/7/2004.
Com efeito, quanto aos intervalos de 2/1/1991 a 6/3/1991 e de 8/4/1991 a 16/11/1992, não foi
coligida aos autos qualquer prova de que a atividade rurícola desempenhada era
exclusivamente de natureza agropecuária (código 2.2.1 do anexo do Decreto n. 53.831/1964),
situação que impossibilita qualquer tentativa de reconhecimento do seu labor como especial
(STJ - AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1595250 2016.01.04669-2,
HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJE: 18/8/2016, AGRESP - AGRAVO
REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - 1084268 2008.01.86008-6, SEBASTIÃO REIS
JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJE: 13/3/2013).
A simples sujeição às intempéries da natureza (- condições climáticas - sol, chuva, frio, calor,
radiações não ionizantes, poeira etc.), como ocorre nesse meio, é insuficiente a caracterizar a
atividade no campo como insalubre ou penosa.
Nessa esteira: TRF-3 - AC: 35126 SP 0035126-48.2012.4.03.9999, Relator Desembargador
Federal Baptista Pereira, Julgamento de: 14/10/2014, 10ª Turma; AC n. 2001.03.99.013747-
0/SP; 3ª Seção; Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos; J 11.05.2005; DJU
14.07.2005, p. 167.
Não se olvida de que a ausência de previsão em regulamento específico não constitui óbice à
comprovação do caráter especial da atividade laboral. Esse é o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça (STJ, 5ªT, REsp 227946, Rel. Min. Gilson Dipp, v.u., julgado em 8/6/2000,
DJ 1º/8/2000, p. 304).
No entanto, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu
a peça inicial, qual seja: carrear prova documental como formulários padrão, laudo técnico
individualizado e PPP - documentos aptos a individualizar a situação fática do falecido e
comprovar a especificidade ensejadora do reconhecimento de possível agressividade, durante
os períodos apontados, inviabilizando, portanto, o enquadramento pretendido.
Da mesma forma, no tocante aos interregnos de 15/4/1997 a 12/4/1998 e de 13/11/2003 a
14/7/2004, não procede a pretensão autoral, uma vez que não era mais possível o
enquadramento por categoria profissional (até 28/4/1995) e também não há nenhum elemento
de convicção que demonstre a sujeição a agentes nocivos.
Destarte, apenas os interstícios de 10/5/1979 a 31/8/1988, de 15/9/1988 a 30/11/1990, de
2/1/1993 a 18/1/1994, de 1º/6/1994 a 28/4/1995, de 2/12/1998 a 12/11/2003, de 7/1/2008 a
14/6/2010 e de 3/2/2012 a 2/4/2012 podem ser reconhecidos como especiais, convertidos em
comum (fator de conversão de 1,4) e somados aos lapsos incontroversos.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês,
e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar
seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo
inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a
integridade física, definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para
obtenção da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia,
a qualquer tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época
da Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional,
requisito de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres),
além de um adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para
completar 30 anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou
chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Contudo, não se fazem presentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º,
inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
Ressalta-se, ainda, que em 24/2/2014(DER), o segurado falecido nãotinha direito à
aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC
20/1998), porque não preenchia o pedágio da EC 20/1998, art. 9°, § 1°, inc. I, que é superior a 5
anos.
Não obstante, ainda que admitida a reafirmação da DER, conforme tese firmada no Tema
Repetitivo n. 995, do STJ (REsp n. 1.727.063/SP, 1.727.064/SP e 1.727.069/SP), não é o caso
de reconhecimento do direito à aposentadoria, uma vez que o falecido Antônio Sebastião dos
Santos trabalhou até a data de 2/4/2012 (último vínculo empregatício constante no CNIS – de
3/2/2012 a 2/4/2012 – para o empregador JBS S/A), não havendo tempo de contribuição
posterior a ser computado.
Assim, não restou demonstrado o preenchimento pelo falecido dos requisitos necessários à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, o que garantiria a aplicação do artigo
102 da Lei n. 8.213/1991.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do
benefício de pensão por morte.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, que arbitro em
10% (dez por cento) conforme critérios do artigo 85, § 4º, do CPC, suspensa, porém, a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou provimento à apelação da parte autora para anular a sentença e, nos
termos do artigo 1.013, § 3º, III, do CPC, julgo improcedente o pedido de concessão de pensão
por morte deduzido na inicial.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. PENSÃO POR MORTE. JULGAMENTO CITRA
PETITA. NULIDADE. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO COMUM. ATIVIDADE
ESPECIAL. TRABALHADOR DA AGROPECUÁRIA. RUÍDO. FRIO. ENQUADRAMENTO
PARCIAL. NÃO CUMPRIDOS OS REQUISITOS PARA A OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA
ANTES DO FALECIMENTO. AFASTADA A INCIDÊNCIA DO ART. 102 DA LEI N.
8.213/1991.QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO NÃO COMPROVADA. BENEFÍCIO
INDEVIDO.
- Sentença citra petita anulada. Julgamento com base no artigo 1.013, § 3º, II, do CPC.
- Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão da pensão por
morte, a lei vigente à época do fato que a originou, qual seja, a da data do óbito.
- São requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente e a qualidade
de segurado do falecido (artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991).
- Falecido que, na data do óbito, não era mais segurado, pois já superado o “período de graça”
previsto no artigo 15 da Lei n. 8.213/1991.
- Reconhecimento da especialidade da atividade desenvolvida em apenas parte dos períodos
trabalhados, os quais convertidos em comum (fator de conversão de 1,4) e somados aos
demais lapsos comuns, não perfazem o tempo exigido à aposentação. Conquanto cumprida a
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/1991, não se fazem presentes os
requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com
a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Aplicação do artigo 102, § 2º, da Lei n. 8.213/1991 afastada, porquanto ausente a
demonstração do preenchimento, pelo falecido, dos requisitos necessários à concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição.Benefício de pensão por morte indevido.
- Condenada a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, que arbitro
em 10% (dez por cento) conforme critérios do artigo 85, § 4º, do CPC, suspensa, porém, a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação da parte autora provida. Sentença anulada.
- Improcedência do pedido de pensão por morte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença e, nos
termos do artigo 1.013, § 3º, III, do CPC, julgar improcedente o pedido de concessão de pensão
por morte deduzido na inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
