Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001834-06.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
17/12/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/01/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR ARTESANAL. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 42, CAPUT E § 2.º, 59 e 62 DA LEI N.º 8.213/91.
ATIVIDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, apresentado início de prova
material, corroborado pela prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é
possível o reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como pescador artesanal, equiparado
ao trabalhador rural para fins previdenciários (art. 11, Lei n.º 8.213/91).
- Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como presentes os
demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e § 2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão
do benefício de aposentadoria por invalidez.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Apelação desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001834-06.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA ROSA BICHOFE
Advogado do(a) APELADO: MARCIO JOSE LISBOA DA SILVA - MS15629-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001834-06.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA ROSA BICHOFE
Advogado do(a) APELADO: MARCIO JOSE LISBOA DA SILVA - MS15629-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento
de natureza previdenciária, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença, sobreveio sentença de procedência do pedido, condenando-se a autarquia previdenciária
a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez, desde o requerimento administrativo, com
correção monetária e juros de mora, além do pagamento de honorários advocatícios, fixados em
10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos
da Súmula 111 do STJ. Por fim, determina a imediata implantação do benefício.
A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação pugnando pela integral
reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, sustentando a ausência de
cumprimento dos requisitos legais para a concessão do benefício. Subsidiariamente, requer a
alteração da sentença quanto à correção monetária.
Com as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001834-06.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA ROSA BICHOFE
Advogado do(a) APELADO: MARCIO JOSE LISBOA DA SILVA - MS15629-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso de apelação
do INSS, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil,
ressalvando que a apelação tem efeito suspensivo, salvo no tocante à concessão da tutela
provisória (art. 1012, caput e § 1º, inciso V, do referido Código).
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput
e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que se seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas.
Em se tratando de segurado especial, a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, afasta a
sujeição à carência, desde que tal exercício tenha ocorrido em período igual ao número de meses
correspondentes ao da carência do benefício pleiteado, nos termos do art. 26, inciso III, c.c. inciso
I do art. 39 da Lei n° 8.213/91.
O Superior Tribunal de Justiça também já decidiu que "o trabalhador rural, na condição de
segurado especial, faz jus não só à aposentadoria por invalidez, como também a auxílio-doença,
auxílio-reclusão, pensão e aposentadoria por idade, isentas de carência, no valor equivalente a
um salário-mínimo" (REsp n° 416658/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, j. 01/04/2003, DJ
28/04/2003, p. 240).
Nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência
consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do
trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta ser
complementada por prova testemunhal. Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo §
3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês,
ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois
isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente,
sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim
começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da
situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
O pescador artesanal, a teor do artigo 11, da Lei n.º 8.213/91, está equiparado ao trabalhador
rural para efeitos previdenciários.
A comprovação da atividade de pescador artesanal, assim como de trabalhador rural, é realizada
mediante a apresentação de início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso
de inexistência de documentação suficiente que demonstre o exercício da atividade durante todo
o período questionado (art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim
começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da
situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
No caso dos autos, há início de prova material da condição de pescador do marido da parte
autora, consistente na cópia da certidão de casamento (Id 130143422, página 178), na qual está
qualificado profissionalmente como lavrador, bem assim da carteira de pescador profissional
expedida pelo Ministério da Pesca e Aquicultura – MPA (Id 130143422, páginas 176/177); do
extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS (Id 130143422, página 174), no qual
consta a filiação como segurado especial, com ocupação pescador artesanal de água doce; dos
protocolos do pescador – manutenção da licença de pescador profissional artesanal (Id
130143422, páginas 132/133) e da nota fiscal de produtor (Id 130143422, página 131), em nome
do marido.
Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto
com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de
tempo de serviço trabalhado como segurado especial, conforme revela a seguinte ementa de
julgado:
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADORA RURAL. DOCUMENTO NOVO.
CERTIDÕES DE NASCIMENTO DOS FILHOS DA AUTORA ONDE O GENITOR CONSTA
COMO LAVRADOR. CONDIÇÃO ESTENDIDA À ESPOSA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
SUFICIENTE. INFORMAÇÕES CONFIRMADAS POR ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL.
PEDIDO RESCISÓRIO PROCEDENTE.
1. Diante da especialíssima situação dos trabalhadores rurais, esta Corte Superior elasteceu o
conceito de "documento novo", para efeito de ajuizamento de ação rescisória onde se busca
demonstrar a existência de início de prova material do labor campesino. Precedentes.
2. Se nas certidões de nascimento dos filhos da autora consta o genitor de ambos como
"lavrador", pode-se presumir que ela, esposa, também desempenhava trabalho no meio rural,
conforme os vários julgados deste Sodalício sobre o tema, nos quais se reconhece que "a
condição de rurícola da mulher funciona como extensão da qualidade de segurado especial do
marido. Se o marido desempenhava trabalho no meio rural, em regime de economia domiciliar, há
a presunção de que a mulher também o fez, em razão das características da atividade - trabalho
em família, em prol de sua subsistência". (AR 2.544/MS, Relatora Excelentíssima Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
3. Reconhecido que a autora cumpriu o prazo de carência exigido pelos artigos 48 e 49 da Lei n.
8.213/1991, qual seja, 180 (cento e oitenta) meses de labor campesino, tendo em vista os
documentos novos admitidos nesta ação rescisória e a robusta prova testemunhal colhida nos
autos originais e não refutada na instância ordinária, deve ser afastada a incidência da Súmula n.
149/STJ.
4. Ação rescisória procedente." (AR 43/40 / SP, Relator Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, j.
26/09/2018, DJe 04/10/2018);
Por sua vez, as testemunhas ouvidas complementaram plenamente esse início de prova material
ao asseverarem, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e
do devido processo legal, sem contraditas, que a parte autora exerceu o ofício de pescador
artesanal, deixando as lides em razão dos males que a acometiam (mídia digital). Assim, nos
termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e em estrita observância à Súmula 149 do Superior
Tribunal de Justiça, restou comprovado que o autor exerceu a atividade de pescador artesanal
por tempo superior ao equivalente à carência necessária.
Ressalte-se que não há falar em perda da qualidade de segurado em razão de ter o autor
abandonado as lides rurais no período que antecedeu o ajuizamento da presente ação. Deflui da
prova dos autos, especialmente do laudo pericial e do relato testemunhal, que a autora, em razão
de seu precário estado de saúde, não mais pôde exercer suas atividades laborais. Assim, em
decorrência do agravamento de seus males, a autora tornou-se incapaz para o trabalho rural,
atividade esta que lhe garantia a subsistência. Note-se que a perda da qualidade de segurado
somente se verifica quando o desligamento da Previdência Social é voluntário, não determinado
por motivos alheios à vontade do segurado, consoante iterativa jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, de que é exemplo a ementa deste julgado:
''PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - PERDA DA QUALIDADE DE
SEGURADO.
1. Não perde a qualidade de segurado o trabalhador que, por motivo de doença, deixa de recolher
as contribuições previdenciárias.
2. Precedente do Tribunal.
3. Recurso não conhecido.'' (REsp nº 134212-SP, Relator Ministro Anselmo Santiago, j. 25/08/98,
DJ 13/10/1998, p. 193).
Por outro lado, para a solução da lide, é de substancial importância a prova técnica produzida.
Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada
pelo laudo médico (Id. 130143422, páginas 74/79). De acordo com referido laudo, a parte autora,
em virtude das patologias diagnosticadas, está incapacitada de forma total e permanente para o
trabalho.
Assim, uma vez preenchidos os requisitos legais, faz jus a parte autora à concessão da
aposentadoria por invalidez.
A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, nos termos da
fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR ARTESANAL. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 42, CAPUT E § 2.º, 59 e 62 DA LEI N.º 8.213/91.
ATIVIDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, apresentado início de prova
material, corroborado pela prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é
possível o reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como pescador artesanal, equiparado
ao trabalhador rural para fins previdenciários (art. 11, Lei n.º 8.213/91).
- Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como presentes os
demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e § 2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão
do benefício de aposentadoria por invalidez.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
- Apelação desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento a apelacao, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
