Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002156-26.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
12/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 18/11/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR ARTESANAL. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 42, CAPUT E § 2.º, 59 e 62 DA LEI N.º 8.213/91.
ATIVIDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
TERMO INICIAL. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, apresentado início de prova
material, corroborado pela prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é
possível o reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como pescador artesanal, equiparado
ao trabalhador rural para fins previdenciários (art. 11, Lei n.º 8.213/91).
2. Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como presentes os
demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e § 2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão
do benefício de aposentadoria por invalidez.
3. Configurada a hipótese descrita no artigo 45 da Lei nº 8.213/91, faz jus o segurado ao
acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor da sua aposentadoria por invalidez.
4. O termo inicial do benefício é a data requerimento administrativo, de acordo com a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
5. A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
6. Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
7. Sem custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária
gratuita.
8. Apelação da parte autora provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002156-26.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: HELENA RODRIGUES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RAUAN FLORENTINO DA SILVA TEIXEIRA - MS17826-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002156-26.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: HELENA RODRIGUES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RAUAN FLORENTINO DA SILVA TEIXEIRA - MS17826-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento
de natureza previdenciária, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença, sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao
pagamento das verbas sucumbenciais, observada a gratuidade da justiça.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da decisão,
para que seja julgado procedente o pedido, em razão do cumprimento dos requisitos necessários
à concessão do benefício.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal ofereceu parecer, opinando pelo não provimento da apelação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002156-26.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: HELENA RODRIGUES DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RAUAN FLORENTINO DA SILVA TEIXEIRA - MS17826-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo o recurso
de apelação da parte autora, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo
Código de Processo Civil.
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput
e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os seguintes: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas. Enquanto que, de acordo com os artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, o benefício de
auxílio-doença é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de
suas atividades profissionais habituais, bem como àquele cuja incapacidade, embora
permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que
garanta o seu sustento.
Em se tratando de segurado especial, a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que
de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, afasta a
sujeição à carência, desde que tal exercício tenha ocorrido em período igual ao número de meses
correspondentes ao da carência do benefício pleiteado, nos termos do art. 26, inciso III, c.c. inciso
I do art. 39 da Lei n° 8.213/91.
O Superior Tribunal de Justiça também já decidiu que "o trabalhador rural, na condição de
segurado especial, faz jus não só à aposentadoria por invalidez, como também a auxílio-doença,
auxílio-reclusão, pensão e aposentadoria por idade, isentas de carência, no valor equivalente a
um salário-mínimo" (REsp n° 416658/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, j. 01/04/2003, DJ
28/04/2003, p. 240).
Nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência
consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do
trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta ser
complementada por prova testemunhal. Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo §
3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês,
ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois
isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente,
sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim
começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da
situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios.
O pescador artesanal, a teor do artigo 11, da Lei n.º 8.213/91, está equiparado ao trabalhador
rural para efeitos previdenciários.
A comprovação da atividade de pescador artesanal, assim como de trabalhador rural, é realizada
mediante a apresentação de início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso
de inexistência de documentação suficiente que demonstre o exercício da atividade durante todo
o período questionado (art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).
No presente caso, não há dúvida de que foi apresentado início de prova material da atividade de
pesca, consubstanciado em cópia da Carteira de Pescador Profissional, expedida pelo Ministério
da Pesca e Agricultura (ID 130566996 - Pág. 18) e Comprovante de Inscrição no Cadastro da
Agropecuária – Mato Grosso do Sul, indicando como atividade econômica a pesca de peixes (ID
130566996 - Pág. 19).
Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto
com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de
tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revela a seguinte ementa de julgado:
"As anotações em certidões de registro civil, a declaração de produtor rural, a nota fiscal de
produtor rural, as guias de recolhimento de contribuição sindical e o contrato individual de
trabalho em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, todos contemporâneos à época
dos fatos alegados, se inserem no conceito de início razoável de prova material." (REsp
280402/SP, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJ 10/09/2001, p. 427).
Ademais, sobre tal documento, o STJ aduz que é hábil ao reconhecimento do exercício da
atividade rural desenvolvida, mas desde que sejam corroborados pela prova testemunhal "A
valoração da prova testemunhal quanto à atividade que se busca reconhecer, é válida se apoiada
em início razoável de prova material, assim considerados a Certidão de Casamento e o
Certificado de Reservista, onde constam a respectiva profissão." (REsp nº 252535/SP, Relator
Ministro Edson Vidigal, DJ 01/08/2000, p. 328).
Por sua vez, a testemunha ouvida complementou plenamente esse início de prova material ao
asseverar, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do
devido processo legal, sem contraditas, que a autora sempre exerceu atividade de pescadora
artesanal, deixando ao trabalho em razão dos males que a acometiam (ID 130566997 – págs.
79/85). Assim, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e em estrita observância à
Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, restou comprovado que a autora exerceu trabalho de
pescadora por tempo superior ao equivalente à carência necessária.
Ressalte-se que não há falar em perda da qualidade de segurado em razão de ter a autora
abandonado as lides de pesca no período que antecedeu o ajuizamento da presente ação. Deflui
da prova dos autos, especialmente do laudo pericial e do relato testemunhal, que a autora, em
razão de seu precário estado de saúde, não pôde mais exercer suas atividades laborais. Assim,
em decorrência do agravamento de seus males, o autor tornou-se incapaz para o trabalho rural,
atividade esta que lhe garantia a subsistência. Note-se que a perda da qualidade de segurado
somente se verifica quando o desligamento da Previdência Social é voluntário, não determinado
por motivos alheios à vontade do segurado, consoante iterativa jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça, de que é exemplo a ementa deste julgado:
''PREVIDENCIÁRIO - APOSENTA-DORIA POR INVALIDEZ - PERDA DA QUALIDADE DE
SEGURADO.
1. Não perde a qualidade de segurado o trabalhador que, por motivo de doença, deixa de recolher
as contribuições previdenciárias.
2. Precedente do Tribunal.
3. Recurso não conhecido.'' (REsp nº 134212-SP, Relator Ministro Anselmo Santiago, j. 25/08/98,
DJ 13/10/1998, p. 193).
Para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste
passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada pelo
laudo pericial (ID 130566996 – págs. 79/85). De acordo com referido laudo, a parte autora, em
virtude das patologias diagnosticadas, está incapacitada de forma total e permanente para o
trabalho que lhe garantia o sustento.
Por outro lado, dispõe o artigo 45 da Lei nº 8.213/91: "O valor da aposentadoria por invalidez do
segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25%
(vinte e cinco por cento).".
Da análise do laudo pericial realizado, restou configurada a hipótese descrita no artigo 45 da Lei
nº 8.213/91, para que o segurado obtenha o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o
valor da sua aposentadoria por invalidez, uma vez que restou caracterizada a necessidade de
assistência permanente de terceiros.
Diante do quadro relatado pelo perito judicial e considerando as condições pessoais da autora,
tornam-se praticamente nulas as chances de ela se inserir novamente no mercado de trabalho,
não havendo falar em possibilidade de reabilitação.
Assim, uma vez preenchidos os requisitos legais, faz jus a parte autora à aposentadoria por
invalidez, com o acréscimo de 25%.
O termo inicial do benefício é a data requerimento administrativo (27/05/2015 – ID 130566996 -
Pág. 20), de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme revela a
ementa deste julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL .
"O termo inicial do benefício de aposentadoria por invalidez, havendo negativa do pedido
formulado pelo segurado na via administrativa, recai sobre a data desse requerimento. Recurso
desprovido."
(REsp nº 200100218237, Relator Ministro Felix Fischer. DJ 28/05/2001, p. 208)
A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do Novo
Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos
termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo
acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que
não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a
obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na
lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a
autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para, reformando a
sentença, condenar o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por invalidez, com termo
inicial, correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, na forma da fundamentação.
Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS, a fim de que se adotem as
providências cabíveis à imediata implantação do benefício de aposentadoria por invalidez, em
nome de HELENA RODRIGUES DOS SANTOS, com data de início - DIB em 27/05/2015 e renda
mensal inicial – RMI a ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do CPC.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR ARTESANAL. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 42, CAPUT E § 2.º, 59 e 62 DA LEI N.º 8.213/91.
ATIVIDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
TERMO INICIAL. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, apresentado início de prova
material, corroborado pela prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é
possível o reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como pescador artesanal, equiparado
ao trabalhador rural para fins previdenciários (art. 11, Lei n.º 8.213/91).
2. Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como presentes os
demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e § 2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão
do benefício de aposentadoria por invalidez.
3. Configurada a hipótese descrita no artigo 45 da Lei nº 8.213/91, faz jus o segurado ao
acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor da sua aposentadoria por invalidez.
4. O termo inicial do benefício é a data requerimento administrativo, de acordo com a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
5. A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.
6. Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
7. Sem custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária
gratuita.
8. Apelação da parte autora provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento a apelacao da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
