Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2231548 / SP
0009427-21.2013.4.03.6119
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2019
Ementa
PROCESSO CIVIL. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. RECURSO NÃO CONHECIDO.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. HIPOSSUFICIÊNCIA
ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA. AFIRMAÇÕES FALSAS NO MOMENTO DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES. RESSARCIMENTO AO
ERÁRIO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO
FINANCEIRO E ATUARIAL DA PREVIDÊNCIA. SEGUNDA APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
NÃO CONHECIDA. SENTENÇA MANTIDA. PRIMEIRO RECURSO DESPROVIDO, COM
MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA.
1 - Não conhecido o segundo apelo interposto pela autora, considerando a ocorrência da
preclusão consumativa, na medida em que ofereceu, anteriormente, recurso de apelação.
2 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na equidade, constitui
alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente
disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002. Desse modo, todo acréscimo patrimonial
obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve
possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores
serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão,
o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados
ações in rem verso, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação
de repetição de indébito.
3 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por
ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no
Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
4 - Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos
valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo
115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
5 - Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
6 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio
financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais
segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
7 - No caso concreto, a parte autora usufruiu de amparo social ao portador de deficiência desde
06/11/2003 a 01/01/2012 (fl. 61 - autos em apenso). Todavia, em auditoria interna realizada em
22/12/2011, o INSS constatou irregularidades na concessão e manutenção do benefício, uma
vez que os genitores da demandante informaram, no momento do requerimento administrativo,
06/11/2003, que estavam desempregados e não possuíam quaisquer rendimentos naquele
instante (fl. 23 - autos em apenso), o que não condizia com a realidade. Informações extraídas
do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e do Sistema Único de
Benefícios/DATAPREV, cujos extratos se encontram acostados às fls. 47/49 dos autos em
apenso, dão conta que a mãe da autora, IRANI GOMES DE PASSOS, percebeu benefícios de
auxílio-doença entre 06/10/2003 e 20/11/2003 e entre 22/12/2003 e 03/11/2008. Por outro lado,
segundo os dados constantes das fls. 50/51 e 55/57, também dos autos apensados, seu
genitor, JOSÉ FIRMINO PASSOS, promoveu recolhimentos, na condição de contribuinte
individual, de 01/2002 a 09/2006, e recebeu beneplácito de auxílio-doença, de 30/10/2006 a
07/01/2008, e vem recebendo aposentadoria por idade, desde 08/01/2008. Ou seja, em certo
momento, a família recebia 3 (três) benefícios distintos, a despeito de, na época do
requerimento administrativo da benesse assistencial, terem informado que não percebiam
quaisquer quantias financeiras.
8 - Após a ausência de interposição de recurso pela parte autora na esfera administrativa (fls.
65/70 - autos em apenso), esta foi instada a restituir a quantia de R$ 34.437,13 (trinta e quatro
mil e quatrocentos e trinta e sete reais e treze centavos), todavia, quedou-se inerte no
adimplemento da referida obrigação (fl. 71 - autos em apenso).
9 - Ora, até o leigo tem plena consciência de que o recebimento de amparo social por
deficiência visa assegurar-lhe o mínimo existencial enquanto perdurar sua hipossuficiência
econômica. Assim, não constitui erro escusável o recebimento de prestação assistencial
sabidamente indevida, razão pela qual não pode ser acolhida a alegação de boa-fé.
Precedentes.
10 - Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11º, do CPC, respeitados
os limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.
11 - Segunda apelação da parte autora não conhecida. Sentença mantida. Primeiro recurso
desprovido, com majoração da verba honorária.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do segundo
apelo interposto pela parte autora e negar provimento a seu primeiro apelo, com majoração da
verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
