
| D.E. Publicado em 27/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002658-44.2010.4.03.6105/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão de aposentadoria por idade, mediante o reconhecimento de atividade rural e urbana, sobreveio sentença de extinção sem resolução do mérito, por falta de interesse da agir superveniente, a teor do art. 267, VI, do Código de Processo Civil/1973, deixando-se de condenar a parte autora ao pagamento das verbas de sucumbência, ressalvada a sua condição de beneficiária da assistência judiciária.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, alegando, preliminarmente, nulidade da sentença, por desrespeito ao princípio da identidade física do juiz e requerendo o afastamento da extinção sem resolução do mérito, alegando que o pedido inicial não foi acolhido integralmente pela autarquia. No mérito, pugna pela integral reforma da sentença, para que seja julgado procedente o pedido, sustentando ter preenchido os requisitos legais para a concessão do benefício.
Com as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): A alegação de nulidade da sentença ao argumento de ofensa ao princípio da identidade física do juiz deve ser afastada, uma vez que tal princípio não se reveste de caráter absoluto, tendo em vista que o art. 132 do Código de Processo Civil de 1973 prevê situações que permitem a sua inobservância, sendo necessário ainda demonstrar o efetivo prejuízo causado à parte. Nesse sentido, os seguintes julgados:
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. 2. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. POSSIBILIDADE DE MITIGAÇÃO. ART. 132 DO CPC. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. 3. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. A Primeira Turma do STF e as Turmas que compõem a Terceira Seção do STJ, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. Para que se possa cogitar de eventual nulidade por ofensa ao princípio da identidade física do juiz, necessário demonstrar que não se tratam das hipóteses que autorizam sua mitigação (art. 132 do CPC). Outrossim, revela-se imprescindível, igualmente, demonstrar em que consistiu eventual prejuízo causado à parte. Contudo, a parte não se desonerou dos referidos ônus.
3. Habeas corpus não conhecido.
(HC 340.548/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/02/2016, DJe 10/02/2016)
PROCESSO CIVIL. AGRAVO PREVISTO NO ART. 557, § 1º, DO CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. NULIDADE NÃO CONFIGURADA.
I - Não há que se falar em nulidade da decisão agravada por afronta ao princípio da identidade física do juiz, em primeiro lugar, por se tratar de decisão interlocutória, e, de outro lado, em razão de não se revestir de caráter absoluto, de modo a admitir a prolação de sentença por magistrado que não presidiu a audiência se não for constatado qualquer prejuízo para as partes. No caso concreto, o procurador do INSS teve efetiva participação na audiência, tendo oportunidade de inquirir as testemunhas, não se verificando, assim, ofensa ao princípio do contraditório ou à ampla defesa.
II - Agravo da autora improvido (art. 557, §1º, do CPC).
(TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, AI 0021232-63.2011.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, julgado em 13/12/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/12/2011)
Superada tal questão prévia, passo ao exame e julgamento do mérito.
Quando do ajuizamento da demanda, a autora buscava a concessão de aposentadoria por idade. Às fls. 398/402 foi informado que o benefício pretendido nestes autos foi concedido administrativamente desde 21/07/2011.
Contudo, observo que o fato de o INSS ter concedido administrativamente o benefício pleiteado pela parte autora, no curso do processo, implica em reconhecimento jurídico do pedido, de forma que não há falar em perda do interesse processual da parte autora, sendo, consequentemente, incabível a extinção do feito sem a apreciação do mérito.
Caracterizada a lide com a pretensão resistida e demais pressupostos legais, o reconhecimento do pedido pela parte requerida leva à extinção com apreciação do mérito da demanda, nos termos do artigo 487, inciso III, alínea a, do Código de Processo Civil/2015 (artigo 269, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973).
Outrossim, o interesse processual de todo não desapareceu, eis que o reconhecimento do pedido pela Administração não foi na extensão do objeto do pedido.
Remanesce, portanto, controvérsia quanto ao reconhecimento da atividade rural no período de 01/01/1964 a 30/09/1991 e da atividade urbana nos períodos de 17/01/1992 a 09/12/1994, junto à empresa Squema - Construtora e empreendimentos Ltda, e de 01/11/1994 a 01/02/1996, junto à empresa Antonio Carlos Razza, bem assim quanto aos consectários da condenação.
Todavia, não é caso de se restituir os autos à primeira instância para que outra sentença seja prolatada, podendo a questão ventilada nos autos ser imediatamente apreciada pelo Tribunal, incidindo na espécie a regra do artigo 1.013, § 3º, inciso I, do novo Código de Processo Civil.
O artigo 48 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 11.718 de 20/06/2008, dispõe que:
A referida alteração legislativa possibilitou aos segurados que tenham completado 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a soma de períodos de trabalho rural efetivamente comprovados, mesmo que anteriores a novembro de 1991, a períodos de contribuição sob outras categorias de segurado, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Nesse sentido, já decidiu esta Turma:
Assim, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade na forma do artigo 48, §3º, da Lei n.º 8.213/91, são requisitos: o implemento do requisito etário acima especificado e o cumprimento da carência, a qual pode ser comprovada mediante o reconhecimento do exercício de atividade rural e considerando períodos de contribuição do segurado sob outras categorias.
Tendo o autor nascido em 10/04/1944, implementou o requisito idade (65 anos) em 10/04/2009.
A carência é de 168 (cento e sessenta e oito) contribuições mensais para o segurado que implementou a idade legal em 2009 (tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/91).
Nos termos do artigo 55, §3º, da Lei nº 8.213/91 e do entendimento jurisprudencial consubstanciado na Sumula 149 do Superior Tribunal de Justiça, para a comprovação do trabalho rural é necessária a apresentação ao menos de início de prova material, corroborável por prova testemunhal. Ressalta-se que o início de prova material, exigido pelo §3º do artigo 55 da Lei n.º 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade à prova testemunhal para demonstração do labor rural.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica questionada, desde que associada a outros dados probatórios.
No presente caso, há início de prova material da condição de rurícola da parte autora, consistente nas cópias das certidões de casamento e de nascimento de filhos, nas quais o autor está qualificado profissionalmente como lavrador (fls. 167/173). Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tal documentação, em conjunto com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, é hábil ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como rurícola, conforme revela a seguinte ementa de julgado:
As testemunhas ouvidas complementaram plenamente esse início de prova documental ao asseverarem, perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sem contraditas, que a parte autora exerceu atividade rural no período pleiteado (fls. 584/586).
Assim, nos termos do artigo 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91, e em estrita observância à Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecido o exercício de trabalho rural, sem registro em CTPS, no período compreendido entre 01/01/1964 e 30/09/1991.
No caso em exame, verifica-se que a parte autora esteve filiada à Previdência Social, como empregada urbana, nos períodos de 01/11/1994 a 01/02/1996, conforme cópia da Carteira de Trabalho e Previdência Social (fl. 107), e de 17/01/1992 a 09/12/1994, conforme cópia da Carteira de Trabalho e Previdência Social (fls.112/113) e da reclamação trabalhista, autos n.º 3.100/94 (fls. 38/40).
Cumpre salientar que, a CPTS é documento obrigatório do trabalhador, nos termos do art. 13 da CLT, e gera presunção "juris tantum" de veracidade, constituindo-se em meio de prova do efetivo exercício da atividade profissional, produzindo efeitos previdenciários (art. 62, § 2º, I, do Decreto nº 3.048/99). Sendo assim, o INSS não se desincumbiu do ônus de provar que as anotações efetuadas na CTPS da parte autora são inverídicas, de forma que não podem ser desconsideradas referidas anotações.
Outrossim, o trabalho exercido no período de 17/01/1992 a 09/12/1994 foi reconhecido por sentença trabalhista, com trânsito em julgado.
Note-se que a sentença trabalhista (fls. 38/40) não só reconheceu o vínculo empregatício, mas também condenou o empregador ao pagamento das verbas trabalhistas e ao recolhimento das contribuições previdenciárias pertinentes ao período reconhecido, mantendo-se, assim, o equilíbrio atuarial e financeiro previsto no art. 201 da Constituição da República, tornando-se impossível a autarquia não ser atingida pelos efeitos reflexos da coisa julgada produzida naquela demanda. Nesse sentido:
"PROCESUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DO ART, 557, § 1º, DO CPC. REVISÃO DE RENDA MENSAL DE BENEFÍCIO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA.
I - Sendo o autor vitorioso em parte em reclamação trabalhista, na qual a empresa demandada fora condenada ao pagamento das diferenças ocorridas no decorrer do pacto laboral, assiste-lhe o direito de ter recalculado o valor da renda mensal inicial do benefício previdenciário de que é titular, uma vez que os salários-de-contribuição do período-básico-de-cálculo restaram majorados em seus valores.
II. - O fato de a Autarquia não ter integrado a lide trabalhista não lhe permite se furtar dos efeitos reflexos emanados da coisa julgada ocorrida no âmbito daquela demanda.
III - Agravo previsto no artigo 557, § 1º, do Código de Processo Civil, interposto pelo réu, improvido."
(AC 2009.03.99.022729-8, Rel. Desembargador Federal Sergio Nascimento, Décima Turma, j. 04/05/201, DJ 12/05/2010)
Eventuais irregularidades praticadas pelo empregador não transferem ao empregado a obrigação de demonstrar os valores que efetivamente entenda corretos. O desconto, o recolhimento das contribuições, assim como a correta informação para os fins de aposentadoria no que tange à figura do empregado, é de responsabilidade exclusiva de seu empregador, sob pena de sofrer as penalidades cabíveis pela legislação previdenciária, e de responsabilidade do INSS a fiscalização de toda a documentação apresentada e necessária a concessão do benefício. Nesse sentido, confira precedente desta Corte Regional: "Este E. Tribunal tem entendido reiteradamente que, quando se trata de empregado, o dever legal de recolher as contribuições é do empregador. Caso não tenha sido efetuado tal recolhimento, é este quem deve ressarcir o INSS e não o empregado, não podendo este último ser penalizado por uma desídia que não foi sua." (TRF-3ª R., AC-Proc. nº 94030296780/SP, Relatora Desembargadora Federal SYLVIA STEINER, j. 30/04/2002, DJ 28/06/2002, p. 547).
Não bastasse, no caso dos autos as testemunhas ouvidas perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sem contraditas, confirmaram referido vínculo (fls. 375/376).
Verifica-se, ainda, que a parte autora esteve filiada à Previdência Social, na condição de empregada, no período de 06/07/1996 a 10/04/2009 (data em que completou o requisito etário), contando com 12 (doze) anos, 09 (nove) meses e 05 (cinco) dias de tempo de contribuição, conforme documento de fl. 205.
Computando-se os períodos de atividade rural e urbana ora reconhecidos, com o tempo em que parte autora esteve filiada à Previdência Social, verifica-se que ela, ao completar a idade, possuía carência em número superior ao exigido.
Portanto, atendidos os requisitos legais, a parte autora faz jus à aposentadoria por idade, nos termos dos §§ 3º e 4º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (08/06/2009), nos termos do artigo 49, inciso II, da Lei n.º 8.213/91.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o decidido pelo Plenário do C. STF, no julgamento do RE 870.947/SE, em Repercussão Geral, em 20/09/2017, Rel. Min. Luiz Fux, adotando-se no tocante à fixação dos juros moratórios o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, e quanto à atualização monetária, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do Novo Código de Processo Civil/2015.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para afastar a extinção sem resolução de mérito e, nos termos do artigo 1.013, § 3º, I, do CPC/2015, condenar a autarquia previdenciária a conceder a aposentadoria por idade, com termo inicial, juros de mora, correção monetária e honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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