Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6071409-21.2019.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
07/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL.
CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO
PARCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social -
CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n. 8.213/1991 (31/10/1991), tem sua aplicação restrita
aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não
contempla a averbação de tempo de serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural alegado, independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º,
e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS e Perfis Profissiográficos
Previdenciários - PPPs acostados aos autos demonstram o exercício das atividades de motorista
de ônibus (CBO 98540), fato que permite o reconhecimento de sua natureza especial apenas
pelo enquadramento profissional (possível até 28/04/1995).
- Inviável o enquadramento dos períodos em que há indicação genérica da atividade de motorista
ou com evidente rasura em CTPS.
- Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP indica a exposição habitual e permanente a nível de
ruído inferior aos limites de tolerância previstos nas normas regulamentares.
- Os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do requisito da
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
- Somados os períodos ora reconhecidos aos demais interstícios apurados administrativamente,
viável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto
preenchido o requisito temporal.
- Ausência de contrariedade à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071409-21.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ BRAZ MARTINS
Advogado do(a) APELADO: GISELE BERALDO DE PAIVA - SP229788-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071409-21.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ BRAZ MARTINS
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta contra o INSS, na qual a parte autora busca o
reconhecimento e a averbação de atividade rural e especial, com vistas à concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou procedente o pedido para reconhecer o tempo de serviço do autor, em
atividade rural, de 11/12/1964 a 24/10/1978 e especial de 24/10/1978 a 05/03/1981, 27/03/1981 a
09/02/1982, 01/05/1982 a 19/01/1983, 15/02/1985 a 19/12/1986, 11/05/1988 a 19/03/1989,
03/07/1989 a 07/12/1990, 02/05/1991 a 04/11/1991, 06/07/1992 a 13/03/1995, 19/04/1996 a
07/04/1997 e 07/04/2001 a 11/05/2016 e determinar a concessão da aposentadoria por tempo de
contribuição, desde a data do requerimento administrativo (DER).
Não resignada, a autarquia interpôs apelação, na qual sustenta que a parte autora não logrou
comprovar o labor rural e especial nos interregnos reconhecidos pelo Juízo a quo. Prequestiona a
matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6071409-21.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ BRAZ MARTINS
Advogado do(a) APELADO: GISELE BERALDO DE PAIVA - SP229788-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55, e respectivos parágrafos, da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art.
12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16
de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
Ressalto que no julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves
Lima, submetido ao rito do art. 543-C, do CPC/1973, o E. Superior Tribunal de Justiça,
examinando a matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho
rural anterior ao documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova
material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o
posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso vertente, há início razoável de prova material, consubstanciado no certificado de
dispensa de incorporação, emitido em 18/05/1972 e na certidão de casamento, celebrado em
23/06/1977, ambos com a indicação da profissão de lavrador da parte autora.
Ressalto: o fato de o certificado de dispensa de incorporação do autor constar a qualificação
"lavrador" a lápis não lhe retira, por si só, a força probante. Nesse sentido: TRF/4 - APELREEX:
24176/PR, 2004.70.00.024176-0, Rel. Juiz Fed. JOÃO BATISTA LAZZARI, 5ªT, Data de
Julgamento: 14/07/2009, D.E. Publicado em: 18/08/2009.
A prova testemunhal, por sua vez, foi coerente com o início de prova material apresentado e
confirmou o labor asseverado, desde tenra idade, em auxílio à sua família.
Consoante entendimento desta Nona Turma, é possível o reconhecimento do tempo rural
comprovado desde os 12 (doze) anos de idade.
Deste modo, joeirado o conjunto probatório, entendo demonstrado o trabalho rural no intervalo de
11/12/1964 a 24/10/1978, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins
de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n.
8.213/1991).
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais
do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente habilitado
pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade
sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No caso, em relação aos intervalos controversos de 27/03/1981 a 09/02/1982, 01/05/1982 a
19/01/1983, 11/05/1988 a 19/03/1989 e 06/07/1992 a 13/03/1995, depreende-se das anotações
em Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS e dos PPPs acostados aos autos o
exercício das atividades de motorista de ônibus (CBO 98540), fato que permite o reconhecimento
de sua natureza especial apenas pelo enquadramento profissional (possível até 28/04/1995), nos
termos dos códigos 2.4.4 do anexo do Decreto n. 53.831/1964 e 2.4.2 do anexo do Decreto n.
83.080/1979.
Quanto aos períodos de 24/10/1978 a 05/03/1981, 15/02/1985 a 19/12/1986, 03/07/1989 a
07/12/1990, 02/05/1991 a 04/11/1991, porém, não prospera o pedido de contagem diferenciada.
Com efeito, apesar de os registros em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS)
apontarem, genericamente, a ocupação de motorista, não há nenhum elemento de convicção que
demonstre o desempenho das funções em caminhões de carga para fins de enquadramento na
ocupação de "motorista de caminhão".
Cumpre salientar que não há, nas anotações em CTPS ou informação no CNIS, a indicação do
CBO correspondente à atividade de motorista de caminhão, além da evidência de rasura nos
registros, como bem pontuado pela autarquia previdenciária. Inclusive, para o período de
03/07/1989 a 07/12/1990 a anotação original na carteira de trabalho revela o ofício de “motorista
B”, o que indica a condução de veículos de até 3,5 toneladas de peso bruto total (art. 143, inciso
II, do Código de Trânsito Brasileiro) e afasta a possibilidade de reconhecimento pela atividade de
motorista de caminhão de carga.
Nessa esteira (g. n.):
"AGRAVO REGIMENTAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - MOTORISTA DE
VEÍCULO DE MÉDIO PORTE - ATIVIDADE ESPECIAL NÃO RECONHECIDA NO PERÍODO DE
01.02.1989 A 02.02.1995. TEMPO COMPROVADO INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
I. O autor era motorista, dirigindo veículos de médio porte, atividade não contemplada pelo
Decreto 53.831/64 nem tampouco pelo Decreto 83.080/79, que reconhecem como especiais, em
seus códigos 2.4.4 e 2.4.2, respectivamente, as atividades realizadas por motoristas de Ônibus e
de Caminhões de Carga, o que não é o caso dos autos.
II. Não é possível reconhecer o exercício de atividade especial pelo autor, no período de
01.02.1989 a 02.02.1995.
III. Somados o tempo rural de 31.12.1965 a 31.08.1970, os períodos especiais de 13.08.1980 a
30.03.1983 e de 07.10.1986 a 28.11.1988 e o tempo comum anotado em CTPS, totaliza o autor
28 (vinte e oito) anos, 7 (sete) meses e 12 (doze) dias de trabalho, tempo insuficiente para a
concessão da aposentadoria por tempo de serviço.
IV. Agravo regimental provido. Decisão monocrática e sentença reformadas." (TRF 3ª R, AC
2000.03.99.069410-9/SP, 9ª Turma, Relatora Juiz Convocado Hong Kou Hen, Julgado em
18/8/2008, DJF3 17/9/2008)
Em relação ao período de 19/04/1996 a 07/04/1997, é inviável o reconhecimento pela simples
atividade e a parte autora não juntou aos autos nenhum elemento de convicção que demonstre a
sujeição a agentes nocivos.
Sendo assim, conclui-se que a parte autora não se desincumbiu dos ônus que lhe cabia quando
instruiu a peça inicial (art. 373, I, do CPC), de trazer à colação formulários ou laudos técnicos
certificadores das condições insalutíferas do labor, indicando a exposição com permanência e
habitualidade.
Por fim, no tocante ao interstício de 07/04/2001 a 11/05/2016, o PPP coligido aos autos
demonstra que a parte autora esteve exposta ao agente nocivo “ruído” em nível inferior ao limite
de tolerância vigente à época, de modo que também é inviável o enquadramento.
Ademais, não cabe o enquadramento pela exposição aos agentes nocivos “frio”, “umidade”,
“biológicos”, genericamente indicados no referido formulário e com anotação, nas células '15.3' e
'15.4' do aludido documento: "N/A" (Não Avaliado), ou pela exposição ao agente químico
“detergente”, diante da ausência de previsão nos decretos regulamentares.
Destarte, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas
apenas nos interregnos de 27/03/1981 a 09/02/1982, 01/05/1982 a 19/01/1983, 11/05/1988 a
19/03/1989 e 06/07/1992 a 13/03/1995.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da
aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de
contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens)
e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do
requisito da carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
Quanto ao tempo de serviço, somados os períodos especiais e rural ora reconhecidos ao
montante incontroverso apurado administrativamente, a parte autora contava mais de 35 anos de
serviço na data requerimento administrativo (DER).
Em decorrência, conclui-se pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição integral deferida (regra permanente do art. 201, § 7º, da
CF/1988).
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma
à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS somente para, nos termos da
fundamentação, delimitar o enquadramento da atividade especial aos interstícios de 27/03/1981 a
09/02/1982, 01/05/1982 a 19/01/1983, 11/05/1988 a 19/03/1989 e 06/07/1992 a 13/03/1995.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL.
CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO
PARCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- A questão relativa à comprovação de atividade rural encontra-se pacificada no Superior Tribunal
de Justiça, que exige início de prova material e afasta por completo a prova exclusivamente
testemunhal (Súmula n. 149 do STJ).
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em Carteira de Trabalho e Previdência Social -
CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n. 8.213/1991 (31/10/1991), tem sua aplicação restrita
aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não
contempla a averbação de tempo de serviço rural com o fito de obtenção de aposentadoria por
tempo de serviço/contribuição.
- Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural alegado, independentemente do
recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º,
e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991).
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS e Perfis Profissiográficos
Previdenciários - PPPs acostados aos autos demonstram o exercício das atividades de motorista
de ônibus (CBO 98540), fato que permite o reconhecimento de sua natureza especial apenas
pelo enquadramento profissional (possível até 28/04/1995).
- Inviável o enquadramento dos períodos em que há indicação genérica da atividade de motorista
ou com evidente rasura em CTPS.
- Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP indica a exposição habitual e permanente a nível de
ruído inferior aos limites de tolerância previstos nas normas regulamentares.
- Os períodos em carteira de trabalho são suficientes para o preenchimento do requisito da
carência, em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
- Somados os períodos ora reconhecidos aos demais interstícios apurados administrativamente,
viável a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto
preenchido o requisito temporal.
- Ausência de contrariedade à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
- Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
