
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5332775-60.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO CARLOS DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: DANIEL MARQUES DOS SANTOS - SP264811-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5332775-60.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO CARLOS DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: DANIEL MARQUES DOS SANTOS - SP264811-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
"RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 184, § 5º, DA CF/88. TÍTULOS DA DÍVIDA AGRÁRIA (TDA's) EM PODER DE TERCEIROS. EFICÁCIA PRECLUSIVA DA COISA JULGADA. PREVALÊNCIA DE DECISÃO ANTERIOR PROFERIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO JULGADO POR ESTA CORTE.
(...)
6. Destarte, a amplitude do julgado é aferível à luz do seu contexto, como se asseverou no AgRg no Ag 162593/RS, 'A coisa julgada refere-se ao dispositivo da sentença. Essa, entretanto, há de ser entendida como a parte do julgamento e que o juiz decide sobre o pedido, podendo ser encontrada no corpo da sentença e não, necessariamente, em sua parte final.' (Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 08.09.1998).
(...)
8. A coisa julgada atinge o pedido e a sua causa de pedir. Destarte, a eficácia preclusiva da coisa julgada (art. 474, do CPC) impede que se infirme o resultado a que se chegou em processo anterior com decisão trânsita, ainda que a ação repetida seja outra, mas que por via oblíqua desrespeita o julgado anterior.
(...)"
(REsp 712.164/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ 20/02/2006, p. 224)
"Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido."
O novel art. 508, do CPC/2015, repetiu a disposição legal com a seguinte redação:
"Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em 28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 6/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC/73, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n. 9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade sob condições especiais.
Neste caso, no que tange aos intervalos enquadrados, de 3/2/2003 a 31/3/2004 e de 15/9/2004 a 15/1/2010, a parte autora logrou demonstrar, mediante Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) e laudo técnico pericial produzido no curso da demanda, exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância - código 2.0.1 do anexo ao Decreto n. 3.048/1999.
Por outro giro, não se cogita de inviabilidade do reconhecimento do caráter especial com fundamento em metodologia diversa da determinada pela legislação (NHO-01 da FUNDACENTRO), uma vez que possíveis irregularidades no preenchimento dos formulários e na adoção dos critérios técnicos e metodológicos aplicáveis ao laudo técnico são de responsabilidade do empregador e não podem prejudicar o empregado quanto à avaliação do agente nocivo. E ao INSS cabe a fiscalização da empresa e eventual punição, se o caso.
De qualquer sorte, a adoção de técnica distinta não impede a descaracterização do período especial, uma vez constatada, claramente, a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre, comprovado por meio de PPP, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os elementos degradantes apontados no laudo ambiental – sucedâneo deste, inclusive – e no qual consta o nome do profissional que efetuou o laudo técnico e a assinatura da empresa ou de seu preposto.
Nesse sentido já decidiu este Tribunal: Ap – Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia – 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 365227 0007103-66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 19/7/2017.
Frisa-se, ainda, que o uso de EPI não elimina os riscos à integridade física do segurado.
Em síntese, prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas no interregno supracitado, o que autoriza a revisão do benefício em foco.
Em virtude da sucumbência, mantenho a condenação do INSS nos honorários advocatícios, só que fixados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto,
não conheço
da remessa oficial edou parcial provimento
ao apelo da autarquia para extinguir o processo, sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, V, §3º, do CPC, em relação aos períodos de 1º/8/1990 a 5/2/1993 e de 9/8/1993 a 28/2/1994.É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. COISA JULGADA CONFIGURADA. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. ENQUADRAMENTO. PPP. LAUDO PERICIAL. SUCUMBÊNCIA.
- A sentença proferida no CPC vigente cuja condenação ou proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos não se submete ao duplo grau de jurisdição.
- Eficácia preclusiva da coisa julgada no tocante aos lapsos veiculados na demanda n. 0003543-98.2015.4.03.6326 aforada no Juizado Especial Federal em Piracicaba/SP, com decisão transitada em julgado.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC/73).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente à ruído superior aos limites de tolerância.
- O uso de EPI não elimina os riscos à integridade física do segurado.
- Em virtude da sucumbência, mantida a condenação do INSS nos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Reexame necessário não conhecido.
- Apelação autárquica provida em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial e dar parcial provimento à apelação da parte ré, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
