D.E. Publicado em 21/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do réu, à remessa oficial tida por interposta e ao recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017298-29.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação e recurso adesivo de sentença que julgou procedente o pedido para averbar o exercício de atividade rural, sem registro em carteira, nos períodos de 04.08.1987 a 08.05.1988, 01.12.1988 a 06.05.1990, 08.12.1990 a 02.05.1993, 09.11.1993 a 14.12.1993, 25.02.1995 a 31.07.1996, 01.12.1996 a 03.08.1997, 15.11.1997 a 27.10.2000, 19.11.2000 a 21.10.2001 e de 25.11.2001 a 17.02.2002, bem como para reconhecer como especial o trabalho exercido pela autora a partir de 18.02.2002, totalizando 30 anos, 03 meses e 08 dias de tempo de serviço. Consequentemente, condenou o réu a conceder à autora o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, com termo inicial na data da citação (11.12.2015). Pela sucumbência, o réu foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença. Sem custas.
Em suas razões de inconformismo, busca o réu a reforma da sentença alegando, em síntese, que para o segurado trabalhador que laborou nesta condição anteriormente à vigência da Lei 8.213/1991, o tempo de serviço pode ser computado para efeitos de carência tão somente em caso de recolhimento das contribuições referentes; que não há início de prova material indicando que, nos intervalos entre vínculos anotados em CTPS, a demandante trabalhou como rurícola. Sustenta que não restou comprovado o exercício de atividade especial, uma vez que não foi apresentado nenhum PPP que demonstrasse sua exposição a agentes de risco ou condições insalubres que caracterizassem sua atividade como especial. Prequestiona a matéria para acesso às instâncias recursais superiores.
Em atendimento ao despacho de fls. 205, a parte autora foi intimada acerca do recurso de apelação do INSS, dando-lhe oportunidade de apresentar contrarrazões e/ou interposição de recurso adesivo no prazo legal (art. 1.010, § 2º, CPC).
A parte autora, por meio de recurso adesivo, pugna pela averbação do período de atividade rural, sem registro em carteira, de 09.08.1984 a 17.05.1987, uma vez que trouxe aos autos início de prova material corroborado por prova testemunhal. Sustenta que a sentença foi omissa quanto à forma de atualização monetária e dos juros de mora, de modo que as parcelas em atraso devem ser corrigidas de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e acrescidas de juros de mora à taxa de 6% (seis por cento) ao ano até 11.01.2003, sendo que a partir dessa data serão devidos à taxa de 1% (um por cento) ao mês; a partir de 30.06.2009, os juros moratórios incidirão de uma só vez e pelo mesmo percentual aplicado à caderneta de poupança (0,5%), conforme disposto na Lei 11.960/2009. Alega que a sentença apresenta erro no somatório de alguns dos períodos reconhecidos e/ou relacionados no dispositivo da referida decisão, pois na data da distribuição ação possui o tempo necessário para concessão do benefício. Requer, ainda, a alteração do termo inicial do benefício para 03.08.2015, ocasião em que já contava com 34 anos, 01 mês e 29 dias de tempo de serviço.
Contrarrazões da parte autora às fls. 206/211.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017298-29.2018.4.03.9999/SP
VOTO
Nos termos do artigo 1.011 do CPC, recebo a apelação interposta pelo réu (fls. 189/196).
Da remessa oficial tida por interposta
Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica às sentenças ilíquidas.
Do mérito
Na petição inicial, busca a autora, nascida em 09.08.1971, a averbação de atividade rural, sem registro em carteira, no período de 09.08.1984 a 17.02.2002, abatendo-se os períodos em que houve anotação em carteira, bem como o reconhecimento da especialidade desde 18.02.2002, momento em que passou a trabalhar como gari para a Prefeitura de Guará/SP. Consequentemente, requer a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com termo inicial na data do ajuizamento da ação.
A jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
Todavia, a autora trouxe aos autos cópia da sua CTPS (fls. 10/15), através da qual se verifica que ela trabalhou como rurícola nos períodos de 18.05.1987 a 03.08.1987, 09.05.1988 a 30.11.1988, 07.05.1990 a 07.12.1990, 03.05.1993 a 08.11.1993, 15.12.1993 a 24.02.1995, 01.08.1996 a 30.11.1996 e de 04.08.1997 a 14.11.1997, constituindo prova material plena do seu labor rural, no que se refere a tais períodos. Trouxe, ainda, cópia da certidão de casamento dos seus pais (30.05.1970 - fl. 09), documento no qual o seu genitor foi qualificado como lavrador. Assim, tais documentos constituem início de prova material do seu exercício de atividade rural, no período que se pretende comprovar.
Por seu turno, as testemunhas ouvidas em Juízo (mídia digital às fls. 175) afirmaram que conhecem a autora desde os seus 12/15 anos de idade, época em que ela já trabalhava na roça; que trabalharam com a demandante em diversas propriedades, como as Fazendas São José, Santa Luzia e Santa Maria, mormente no cultivo de algodão e café.
A orientação colegiada é pacífica no sentido de que razoável início de prova material não se confunde com prova plena, ou seja, constitui indício que deve ser complementado pela prova testemunhal quanto à totalidade do interregno que se pretende ver reconhecido.
Portanto, os documentos apresentados, complementados por prova testemunhal idônea, comprovam o labor rural antes das datas neles assinaladas, conforme entendimento firmado na Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
Com o objetivo de comprovar o exercício de atividade especial alegado, foi elaborado laudo pericial judicial (fls. 144/154), segundo o qual a autora, desde 18.02.2002, trabalhava como gari para o Município de Guará, cujas atividades consistiam em catar restos de lixos domésticos, sendo comum a catação de animais mortos, em estado de decomposição; que o trabalho era realizado com vassoura, carrinho de mão, sacos de lixo, tambores para acondicionamento dos lixos, enxada e pá.
Concluiu o expert que a autora, no exercício de suas atividades, mantinha contato direto com agentes biológicos (enterobactérias, salmonelas e crostridios) decorrentes de lixo doméstico, fezes de animais e de humanos (fotografias às fls. 148).
Relativamente ao desempenho da atividade de gari sob condições especiais, este Tribunal possui julgados no seguinte sentido:
Desse modo, devem ser mantidos os termos da sentença que reconheceu a especialidade do labor da autora como gari para a Prefeitura de Guará/SP, ante a exposição a agentes biológicos previstos nos códigos 1.3.2 do Decreto 83.080/1979 (Anexo I) e 3.0.1 do Decreto 3.048/1999 (Anexo IV), porém, limitando-se ao período de 18.02.2002 a 31.12.2014, uma vez que a partir de janeiro de 2015 a autora passou a trabalhar como auxiliar de serviços gerais numa creche do Município.
Saliento que as conclusões vertidas no laudo pericial devem prevalecer, pois foi realizada no local de trabalho em que a autora exerceu suas funções, bem como foi emitido por perito judicial, equidistante das partes, não tendo a autarquia previdenciária arguido qualquer vício a elidir suas conclusões.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF expressamente se manifestou no sentido de que, relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, etc.), pode-se dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo autor (caldeireiro) demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
Somados os períodos especiais ora reconhecidos aos demais comuns, a autora totaliza 09 anos, 06 meses e 20 dias de tempo de serviço até 15.12.1998 e 25 anos, 07 meses e 20 dias de tempo de serviço até 25.06.2015, data do ajuizamento da ação, conforme planilha anexa, parte integrante da presente decisão. Todavia, além de não ter cumprido o requisito etário, contando com apenas 45 anos de idade na data do ajuizamento da ação, também não cumpriu o pedágio previsto na E.C. nº 20/98, no caso em tela correspondente a 06 anos, 02 meses e 04 dias, não fazendo jus, portanto, à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, inclusive na modalidade proporcional.
Ante a sucumbência recíproca, fixo os honorários advocatícios em R$1.000,00 (mil reais) para ambas as partes, conforme previsto no artigo 85, §§ 4º, III, e 8º, do CPC. Em relação à parte autora, a exigibilidade da verba honorária ficará suspensa por 05 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, §3º, do mesmo estatuto processual.
Prejudicada a questão relativa às verbas acessórias, tendo em vista que os requisitos necessários à jubilação não foram preenchidos.
As autarquias são isentas das custas processuais (artigo 4º, inciso I da Lei 9.289/96), devendo reembolsar, quando vencidas, as despesas judiciais feitas pela parte vencedora (artigo 4º, parágrafo único).
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do réu e à remessa oficial tida por interposta para limitar a averbação de atividade rural, sem registro carteira, aos períodos de 04.08.1987 a 08.05.1988, 01.12.1988 a 06.05.1990 e de 08.12.1990 a 31.10.1991 (exceto para efeito de carência), e o reconhecimento de atividade especial ao período de 18.02.2002 a 31.12.2014, julgando improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Dou parcial provimento ao recurso adesivo da autora para determinar a averbação do período de atividade rural de 09.08.1984 a 17.05.1987, sem registro em carteira (exceto para efeito de carência).
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, devidamente instruído com os documentos da parte autora LUCIANA LOPES FELIPE, a fim de que seja imediatamente averbado o exercício de atividade rural nos períodos de 09.08.1984 a 17.05.1987, 04.08.1987 a 08.05.1988, 01.12.1988 a 06.05.1990 e de 08.12.1990 a 31.10.1991, bem como de atividade especial no intervalo de 18.02.2002 a 31.12.2014, nos termos do artigo 497, caput, do CPC.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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